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A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre
Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012
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                                            ARTIGO TEOLÓGICO
    A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas
                       Comuns aos Dois Livros Sagrados1
                                                              por
                                             Carlos Augusto Vailatti
Doutorando em Estudos Judaicos e Árabes, com concentração em Estudos Judaicos, pela Universidade de
São Paulo (USP), Mestre em Teologia, com especialização em Teologia Bíblica, pelo Seminário
Teológico Servo de Cristo (STSC), Bacharel em Teologia pela Faculdade Betel / Instituto Betel de Ensino
Superior (IBES) e também Bacharel em Teologia pela Escola Superior de Teologia (EST). Atualmente, é
professor de Teologia no Seminário Teológico Evangélico do Betel Brasileiro e na Faculdade Betel /
Instituto Betel de Ensino Superior (IBES).




RESUMO

      O presente texto tem o objetivo de refletir sobre alguns temas comuns existentes
tanto na Bíblia Hebraica quanto no Alcorão, a saber: Deus, o Livro Sagrado, a Criação,
Abraão, Determinismo versus Livre-Arbítrio e Escatologia. O estudo desses temas,
ainda que sucinto, nos mostrará como o judaísmo e o islamismo os enxergam a partir de
suas respectivas fés.

ABSTRACT

       The present text has the objective of reflect on some commom themes existent
both in the Hebrew Bible and in the Qur’an, namely: God, the Holy Book, Creation,
Abraham, Determinism versus Free Will and Eschatology. The study of these issues,
though brief, will show us how judaism and islam sighted them from their respective
faiths.




1
 Esse artigo foi apresentado pela primeira vez em forma de trabalho na Universidade de São Paulo (USP)
em julho de 2012.
A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre
Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012
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INTRODUÇÃO

        O judaísmo, o cristianismo e o islamismo, além de serem as três maiores religiões
monoteístas do mundo, também compartilham entre si o fato de terem recebido a divina
revelação na forma escrita. Isto fez com que os adeptos dessas três fés monoteístas
fossem identificados, e com justiça, como “Povo do Livro”.2 Contudo, devido às
limitações e propósitos do presente trabalho, nos restringiremos a abordar apenas alguns
temas comuns tanto à Bíblia Hebraica quanto ao Alcorão. Dessa forma, alusões ao
Novo Testamento somente serão feitas quando julgadas necessárias para a elucidação e
compreensão de algum assunto ou tópico tratado em nossa pesquisa. Depois desses
breves, mas necessários esclarecimentos, voltemos, então, a nossa atenção aos dois
livros que serão alvo do nosso estudo.
        A Bíblia Hebraica ou Tanakh3 experimentou um longo processo de formação até o
seu estabelecimento final na forma escrita que abrange um período de mais de mil
anos.4 No II século a.e.c. o livro de Eclesiástico (também conhecido por outros três
nomes: “Sabedoria de Jesus, filho de Sirac”, “Ben Sirac”, ou simplesmente “Sirácida”)
já fazia referência em seu prólogo grego à divisão tripartida da Bíblia Hebraica,
mencionando ho nómos kaì hai profēteîai kaì tà loipà tōn biblíōn,5 isto é, “a Lei e os
Profetas e o resto dos Livros” (Prólogo do Eclesiástico 1.24,25). Contudo, foi somente
entre o I e II séculos e.c. que o cânon da Bíblia Hebraica foi definitivamente
estabelecido para todas as comunidades judaicas.6 Já o Alcorão ou simplesmente Corão7
contém exclusivamente ditos do profeta Maomé, os quais foram pronunciados


2
 PATERSON, Andrea C. Three Monotheistic Faiths – Judaism, Christianity, Islam. Bloomington,
AuthorHouse, 2009, p.139.
3
  Tanakh é o acrônimo usado para se referir às três principais divisões da Bíblia Hebraica: Tōrâ
(Pentateuco), Nevī‘īm (Profetas) e Ketūvīm (Escritos). Hoje, em ambiente acadêmico cristão, a fim de
promover o diálogo interreligioso entre judeus e cristãos, por ex., dá-se preferência ao uso do nome
“Primeiro Testamento” em vez do conhecido “Antigo Testamento”, como designação da Bíblia Hebraica.
(Para maiores informações quanto à discussão sobre essas nomenclaturas, veja: ZENGER, Erich et al.
Introdução ao Antigo Testamento. [trad. Werner Fuchs]. São Paulo. Edições Loyola, 2003, pp.19-21).
4
 GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa. [trad. Irineu J. Rabuske]. São
Paulo, Edições Loyola, 2006, pp.44,45.
5
  A minha transliteração e tradução do texto grego estão baseadas em: RAHLFS, Alfred. Septuaginta.
Stuttgart, Deutsche Bibelgesellschaft, 2004, p.378.
6
 BARRERA, Júlio Trebolle. A Bíblia Judaica e a Bíblia Cristã: introdução à história da Bíblia. [trad.
Ramiro Mincato]. Petrópolis, Vozes, 1995, pp.183,184.
7
  O termo qur’ān significa tradicionalmente “recitação, leitura”. Para outras possibilidades de tradução do
termo, veja: LEAMAN, Oliver. (ed.). The Qur’an: an encyclopedia. New York, Routledge, 2006, p.521.

                                                                                                                                 2
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Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012
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“aproximadamente do seu quadragésimo ano de vida até sua morte, isto é, entre os anos
610 e 632”.8 A composição definitiva do Alcorão só ocorreu a partir de 632, logo após a
morte de Maomé.9
         Estas informações de cunho histórico são importantes para o nosso trabalho, pois
nos servem de base para comprovar a ordem cronológica em que os três livros sagrados
surgiram em sua forma escrita definitiva: Bíblia Hebraica (II século e.c.), Novo
Testamento (IV século e.c.)10 e Alcorão (VII século e.c.). Não obstante isso, esses
dados, além de apontarem para a anterioridade da Bíblia Hebraica em relação ao Novo
Testamento e ao Alcorão, também nos ajudam a compreender porque estes dois últimos
fazem inúmeras referências e alusões, diretas e indiretas, à Bíblia Hebraica, a qual lhes
serve inúmeras vezes de fonte.11 No caso da Bíblia Hebraica e do Alcorão em particular,
nota-se, portanto, um entrelaçamento textual o qual ocorre, contudo, apenas neste
último, que, ao ocupar-se das histórias e das tradições da Bíblia Hebraica, acaba por
reconhecê-las e legitimá-las dentro de seu próprio contexto de fé. Ora, essa
intertextualidade presente no Alcorão nos será especialmente importante, pois nos
permitirá refletir sobre alguns temas compartilhados por estas duas fés, a judaica e a
muçulmana, descortinando assim diante de nossos olhares algumas incríveis
semelhanças conceituais e temáticas entre ambas. Em nosso estudo, veremos que há
mais elementos que unem a Bíblia Hebraica e o Alcorão, do que os separam.
         No presente trabalho, escolhemos como objeto de nossas reflexões seis temas que
são compartilhados entre a Bíblia Hebraica e o Alcorão. Esses temas são: Deus, o Livro
Sagrado, a Criação, Abraão, Determinismo versus Livre-Arbítrio e Escatologia. A
escolha pela abordagem desses assuntos em nossa pesquisa se deve não apenas à
importância que o pensamento bíblico e qurânico lhes conferem em seus textos, mas se
deve, antes de tudo, ao caráter agregador desses temas, que permite, por sua vez, maior
proximidade e diálogo entre judeus e muçulmanos, os principais observadores dos
princípios contidos nestes dois livros sagrados.


8
    GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa, p.47.
9
    Idem, Ibidem, p.48.
10
   CULLMANN, Oscar. A Formação do Novo Testamento. [trad. Bertoldo Weber]. São Leopoldo,
Sinodal, 2001, p.92.
11
  O Alcorão também faz muitas referências ao Novo Testamento e, mais particularmente, às tradições
sobre Jesus. Porém, tais referências não são tão numerosas quanto aquelas que o Alcorão faz à Bíblia
Hebraica.

                                                                                                                                 3
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        Depois dessas observações, vejamos o que o estudo em conjunto da Bíblia
Hebraica e do Alcorão nos reserva.




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1. DEUS

         O primeiro tema comum à Bíblia Hebraica e ao Alcorão que nós destacamos aqui
é: Deus. Não poderia ser diferente. No Tanakh, Deus é conhecido principalmente como
’ēl ou ’ĕlōhīm. Aliás, deve-se dizer que o termo semítico ocidental, ’ēl, que tem relação
com o ugarítico il(u), é comumente usado nas línguas semíticas para se referir a “deus”
em sentido amplo.12 Já o termo árabe usado com referência a Deus, allāh, é a forma
contraída de al-ilah (literalmente, “o Deus”).13 Provavelmente, a evolução do termo (de
al-ilah para allāh) deve ter acontecido por assimilação do “i” nesta última forma do
vocábulo. Tal assimilação pode ter ocorrido devido ao uso bastante freqüente da
palavra.14 Quanto ao tetragrama divino (YHWH), este curiosamente não é mencionado
no Alcorão.15 Seja como for, tanto ’ēl quanto allāh são vocábulos muito semelhantes em
termos de sua morfologia e significado.16
         Aliás, um dos temas comuns à Bíblia Hebraica e ao Alcorão é o monoteísmo. Na
Bíblia Hebraica, a centralidade da fé monoteísta se destaca, de maneira que ninguém
pode duvidar que um de seus grandes temas seja o “seu monoteísmo puro, penetrante e
inflexível”.17 Vemos no Tanakh,18 por exemplo, que “Deus é um” (Deuteronômio 6.4),
que “não há outros deuses diante dele” (Êxodo 20.3) e que, tal fato é admitido,
inclusive, pelo próprio Deus, que diz: “fora de mim não há Deus”, “fora de mim não há
outro” e “eu sou o Senhor, e não há outro” (Isaías 45.5,6). Esta unicidade divina


12
  POPE, Marvin H. El in the Ugaritic Texts. Vol.2. [Vetus Testamentum: Supplements]. Leiden, Brill,
1955, p.1; CHANAN, Ami Ben. Qur’an-Bible Comparison: A Topical Study of the Two Most Influential
and Respectful Books in Western and Middle Eastern Civilizations. Bloomington, Trafford Publishing,
2011, p.316. Para outras informações sobre o termo ’ēl e a sua relação com Yahweh, veja: DAY, John.
Yahweh and the Gods and Goddesses of Canaan. New York, Sheffield Academic Press, 2000, pp.13-41.
13
  CAMPO, Juan E. Encyclopedia of Islam. [Encyclopedia of World Religions]. New York, Infobase
Publishing, 2009, p.34.
14
     GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa, p.86.
15
   Khalil entende que Yahweh era o nome do Deus particular de Israel. (Cf. KHALIL, Shauqi Abu. Atlas
of the Qur’an: Places, Nations, Landmarks. Houston, Darussalam Publications, 2003, p.63).
16
  COOGAN, Michael David. (ed.). Stories From Ancient Canaan. Louisville, The Westminster Press,
1978, p.12. Veja também: HASTINGS, James. Encyclopedia of Religion and Ethics. [Vol.11]. Whitefish,
Kessinger Publishing, 2003, p.248.
17
  YOUNGBLOOD, Ronald F. The Heart of the Old Testament: a survey of key theological themes.
Grand Rapids, Baker Book House, 1998, p.13.
18
  Todas as citações da Bíblia Hebraica, salvo indicação contrária, são extraídas de: ALMEIDA, João
Ferreira de. (trad.). Bíblia Sagrada. [Edição Revista e Corrigida]. Rio de Janeiro, Imprensa Bíblica
Brasileira, 1991.

                                                                                                                                 5
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também encontra eco nas páginas do Alcorão,19 que afirma: “Vosso Deus é o Deus
único. Não há deus senão Ele” (A Vaca, 2.163), “Não há deus senão Ele” (o Gado,
6.106) e, nas palavras do próprio allāh, “Não adoteis dois deuses. Somente eu sou o
Deus único” (As Abelhas, 16.51).
         Ora, mas será que a maneira como a Bíblia Hebraica compreende a Deus é
exatamente a mesma pela qual Ele é compreendido no Alcorão? Para Gnilka, há uma
diferença decisiva na imagem de Deus retratada nos dois livros. Segundo ele, “o Deus
da Bíblia age na história”. Já o Deus retratado no Alcorão, “mantém-se fora da
história”.20 Em outras palavras, se na visão bíblica Deus se relaciona com os seres
humanos, na visão qurânica, por outro lado, Ele permanece inacessível, devido à Sua
absoluta transcendência.21
         Contudo, na visão do Alcorão, o Deus da Bíblia Hebraica e o Deus do próprio
Alcorão são o mesmo Deus: “Cremos no que nos foi revelado [o Alcorão] e no que vos
foi revelado [a Bíblia Hebraica e o Novo Testamento]. Nosso Deus e vosso Deus é o
mesmo”. (A Aranha, 29.46).22
         Seja como for, a compreensão do Alcorão sobre a unicidade divina, somada às
declarações semelhantes que tanto o Tanakh quanto o Alcorão fazem sobre Deus, como
vimos acima, favorecem uma aproximação entre as duas teologias, bem como,
contribuem para a existência de um proveitoso diálogo interreligioso capaz de promover
uma maior proximidade entre judeus e muçulmanos.




19
   Todas as citações do Alcorão, salvo indicação contrária, são extraídas de: CHALLITA, Mansour.
(trad.). O Alcorão. Rio de Janeiro, BestBolso, 2011.
20
     GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa, p.93.
21
   Idem, Ibidem, p.94. Essa idéia da transcendência divina pode ser vista no seguinte trecho do Alcorão:
“E a nenhum mortal é dado que Deus lhe fale, exceto por revelação ou por detrás de um véu ou por
intermédio de um Mensageiro enviado para transmitir o que Deus determinar”. (A Consulta, 42.51).
22
     Os acréscimos entre colchetes são meus.

                                                                                                                                 6
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2. O LIVRO SAGRADO

         Além da fé monoteísta, a Bíblia Hebraica e o Alcorão também compartilham o
fato de serem, ambos, livros sagrados. Para os judeus, o seu livro sagrado (hasēfer) é o
Tanakh, que está originalmente dividido em 24 livros, os quais estão dispostos em três
seções, Tōrâ (Pentateuco), Nevī‘īm (Profetas) e Ketūvīm (Escritos).23 Já para os
muçulmanos, o seu livro sagrado (al-kitāb) é o Alcorão, ou simplesmente Corão. Este
último está dividido em 114 suras ou capítulos, os quais são subdivididos por sua vez
em versículos, somando o total de 6.235.24 Isso torna o Alcorão semelhante ao Novo
Testamento em termos de sua extensão.25
         É digna de nota a afirmação que tanto a Bíblia Hebraica quanto o Alcorão fazem
sobre a sua procedência divina. Com relação à primeira, tal afirmação pode ser vista em
cada uma de suas três divisões, como podemos notar nas seguintes expressões que nos
servem de exemplo: a) Na Tōrâ: “falou Deus todas estas palavras” (Êxodo 20.1) e
“falou o Senhor a Moisés” (Números 1.1; 2.1; 4.1); b) Nos Nevī‘īm: “Josué escreveu
estas palavras no livro da lei de Deus” (Josué 24.26); e c) Nos Ketūvīm: “leram no livro
da lei de Deus” (Neemias 8.8) e “o livro da lei do Senhor” (2 Crônicas 34.14). Já no
Alcorão, essa reivindicação de origem divina é ainda mais explícita, como se pode
perceber nos seguintes trechos qurânicos: “Foi no mês de Ramadã que o Alcorão foi
revelado, um guia para os homens” (A Vaca, 2.185), “[Deus] revelou-me este Alcorão”
(O Gado, 6.19), “é uma blasfêmia atribuir este Alcorão senão a Deus” (Jonas, 10.37),
“o Alcorão é a verdade enviada por teu Senhor” (A Peregrinação, 22.54) e “este é, sem
dúvida, o livro enviado pelo Senhor dos mundos” (A Prostração, 32.2).
         Ora, este caráter sagrado do Alcorão é ainda reforçado não somente pelas próprias
declarações qurânicas sobre sua procedência divina, mas também pelo seu conteúdo
como um todo que, apesar de datar do VII século e.c., é capaz de atualizar a sua
mensagem ao leitor contemporâneo, transformando assim as suas palavras em palavras
supra-históricas. Tal aspecto é observado por Khalidi, que diz:




23
  ROTH, Cecil. (ed.). The Standard Jewish Encyclopedia. Jerusalem, Massadah Publishing Company
Ltd., 1958/9, p.306.
24
     CHALLITA, Mansour. (trad.). O Alcorão. Rio de Janeiro, BestBolso, 2011, p.11.
25
     KALTNER, John. Introducing the Qur’an for Today’s Reader. Minneapolis, Fortress Press, 2011, p.3.

                                                                                                                                 7
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                                  [...] as narrativas são expressas como contos meta-históricos e
                                  parábolas do espírito humano e da perigosa jornada da fé, em vez de
                                  histórias. Em quase todos os casos, o Alcorão assume familiaridade
                                  com os contornos do conto em questão, e assim procura recordar sua
                                  audiência da verdadeira importância do conto e da moral.26

         Além disso, esse conteúdo meta-histórico também tem estado presente na Bíblia
Hebraica desde sempre, fato este que explica o profundo impacto que ela tem exercido
no mundo (principalmente ocidental) em termos de avanços em questões éticas e
sociais, por exemplo, as quais receberam novas dimensões e novo tratamento a partir
dos valores ensinados neste livro sagrado.27
         É evidente que não podemos negar os inúmeros males praticados ao longo da
história em nome da religião e em nome de Deus. Contudo, tais atrocidades perpetradas
em nome do sagrado não sobrepujam, a meu ver, os incontáveis benefícios que estes
dois livros têm proporcionado à humanidade de uma forma geral.
         Aliás, o Alcorão novamente nos fornece uma postura reconciliadora com a Bíblia
Hebraica, ao declarar: “Creio em todos os Livros que Deus fez descer [...]. Que não haja
discussões entre nós. Deus nos unificará. É para Ele que todos caminhamos” (A
Consulta, 42.15) e “Antes dele [o Alcorão], havia o Livro de Moisés: uma orientação e
uma misericórdia. E este livro corrobora o outro em língua árabe para advertir os que
prevaricam e trazer boas-novas aos benfeitores” (As Dunas, 46.12).
         O reconhecimento da Bíblia Hebraica como livro sagrado por parte do Alcorão e o
compartilhamento da crença comum da sacralidade de seus livros também se constituem
fatores que contribuem substancialmente para o diálogo e para uma maior proximidade
entre estes dois “povos do livro”.




26
     KHALIDI, Tarif. The Qur’an. New York, Viking Penguin, 2008, p.xvi.
27
  STRAUSS, Mark L. How to Read the Bible in Changing Times: understanding and applying God’s
word today. Grand Rapids, Baker Books, 2011, p.2.

                                                                                                                                 8
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3. A CRIAÇÃO

         A compreensão do mundo como criação (em hebraico, berī’â; em árabe, khalq) de
Deus é, talvez, um dos temas que mais aproxime a Bíblia Hebraica do Alcorão.28 Isso
não deve nos causar surpresa, pois, como a primeira influenciou profundamente este
último, logo, já era de se esperar a existência de certa afinidade temática entre ambos.
         A concepção de que Deus criou o mundo e tudo o que há nele é algo tão
importante e fundamental para a Bíblia Hebraica que tal pensamento lhe serve de
prefácio.29 Lemos já no início do primeiro livro do Tanakh que berēšīt bārā’ ’ĕlōhīm ’ēt
hašāmayim we’ēt hā’ārets,30 “no princípio criou Deus os céus e a terra” (Gênesis 1.1).
Tal assertiva será repetida várias vezes ao longo do texto bíblico, como, por exemplo,
nas expressões: “o Senhor Deus fez a terra e os céus” (Gênesis 2.4), “Ele [Deus] é o
criador de todas as coisas [...]. Senhor dos Exércitos é o seu nome” (Jeremias 10.16) e
“[...] vejo os teus céus, obra dos teus dedos, a lua e as estrelas que preparaste” (Salmo
8.3). Além disso, a criação do ser humano por Deus também é enfatizada no Tanakh,
onde lemos que “criou Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; macho
e fêmea os criou” (Gênesis 1.27).
         No Alcorão, allāh também é descrito várias vezes como o criador de todas as
coisas. Vejamos alguns textos que indicam isso: “Louvado seja Deus que criou os céus
e a terra” (O Gado, 6.1 – compare com Gênesis 1.1), “Foi Ele quem vos fez descender
de um único homem” (O Gado, 6.98), “Vosso Senhor é o Deus que criou os céus e a
terra em seis dias” (As Alturas, 7.54 – compare com Gênesis 1.31; 2.1), “Foi Ele quem
vos criou de um só homem e dele lhe tirou a esposa para que com ela convivesse” (As
Alturas, 7.189 – compare com Gênesis 1.21,22), “Deus disse aos anjos: ‘Vou criar um
homem de argila seca, de barro maleável’” (Al-Hijr, 15.28 – compare com Gênesis 2.7).
Como podem ser percebidos, são notáveis os paralelos entre o Alcorão e a Bíblia
Hebraica sobre o tema da criação do mundo e do homem.
         Além do mais, também chama a nossa atenção o emprego da “palavra” como
instrumento criador divino tanto no Alcorão quanto na Bíblia Hebraica. Nós
28
     GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa, p.99.
29
  Essa concepção também está presente em várias solenidades judaicas, como, por exemplo, na festa de
casamento, durante a qual é pronunciada a seguinte bênção: “Bendito és tu, Senhor nosso Deus, Rei do
Universo, que criaste tudo para a tua glória”. (Cf. DORFF, Elliot N. & ROSETT, Arthur. A Living Tree:
The Roots and Growth of Jewish Law. Albany, State University of New York Press, 1988, p.502).
30
  Minha transliteração do texto hebraico baseia-se em: ELLIGER, K. & RUDOLPH, W. (eds.). Biblia
Hebraica Stuttgartensia. Stuttgart, Deutsche Bibelgesellschaft, 1997.

                                                                                                                                 9
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encontramos no Tanakh vários registros sobre a palavra criadora divina. Eis alguns
exemplos: “E disse Deus: haja luz. E houve luz” (Gênesis 1.3),31 “pela palavra do
Senhor foram feitos os céus” (Salmo 33.6), “Porque [Deus] falou, e tudo se fez;
mandou, e logo tudo apareceu” (Salmo 33.9). A importância dada à “palavra” como
elemento criador do universo é explicitamente declarada no Sêfer Ietsirá (Livro da
Criação), o qual afirma que “foi através das letras do alfabeto hebraico que o Universo
foi criado”.32 Além disso, o Sêfer Ietsirá ainda diz:


                                  Os decretos mediante os quais Deus trouxe a Criação a ser consistiram
                                  em ditos. Estes, por sua vez, consistiam em palavras, e estas eram
                                  compostas por letras. Portanto, foi através das letras do alfabeto que o
                                  Universo foi criado.33

         Embora essas palavras reflitam o pensamento do misticismo judaico, o qual está
relacionado, sobretudo, com a cabalá, todavia, elas retratam de forma bastante vívida
(ainda que mágica) a relevância da “palavra” no processo divino da criação.
         Contudo, é no contexto do período do judaísmo rabínico (II-VI Século e.c.) que a
palavra criadora divina mostra sua maior semelhança (em termos morfológicos e
semânticos) com a sua equivalente árabe. Nesta época, encontramos nos escritos dos
sábios o termo aramaico mēmrā’, “palavra”, o qual é utilizado para se referir à palavra
criadora de Deus, isto é, o agente por meio do qual Deus criou o mundo.34 Para
exemplificar o emprego desse termo, podemos citar duas referências encontradas nos
targumim. No targum de Isaías 48.13 encontramos escrito: “pela minha mēmrā’ eu
fundei a terra, e pela minha força eu suspendi os céus” e no targum de Deuteronômio
33.27 lemos: “O Deus eterno é o teu refúgio, e pela sua mēmrā’ o mundo foi criado”.35
         No Alcorão, encontramos o vocábulo ’amr que, por sua vez, está relacionado ao


31
  A fórmula wayyō’mer ’ĕlōhīm yehī...wayehī, “e disse Deus: ‘haja’...e houve” é recorrente no primeiro
capítulo de Gênesis, o qual apresenta as várias etapas (dias) da criação do mundo sendo criadas através da
palavra divina. Veja: Gênesis 1.3,6,9,11,14,20,24,29,30.
32
  KAPLAN, Arieh. Sêfer Ietsirá: O Livro da Criação. [Trad. Erwin Von-Rommel Vianna Pamplona].
São Paulo, Editora e Livraria Sêfer Ltda, 2002, p.58.
33
     KAPLAN, Arieh. Sêfer Ietsirá: O Livro da Criação, p.58.
34
   SHERBOK, Dan Cohn. A Concise Encyclopedia of Judaism. Oxford, Oneworld Publications, 1998,
p.129.
35
  Estas duas referências targúmicas foram extraídas de: BARCLAY, William. Great Themes of the New
Testament. Louisville, Westminster John Knox Press, 2001, p.28.

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aramaico mēmrā’ e ao grego logos.36 Em árabe moderno, ’amr significa “ordem,
comando, instrução, regulamento, decreto”.37 Porém, a partir de estudos realizados na
década de 1930, “tornou-se impossível estudar o significado de ’amr no Alcorão sem
considerar sua possível relação com mēmrā’, seja ele o da Síria ou o do Targum”.38
Neste último caso, portanto, ’amr pode ser mais bem entendido como “palavra”, ou
seja, o instrumento do qual Deus se vale para levar a efeito a Sua criação.39 Vejamos
dois exemplos do uso de ’amr com este sentido: “Sua ’amr, quando Ele deseja alguma
coisa, basta dizer: ‘Sê!’ para que seja” (Yā-Sīn, 36.82)40 e “Vosso Senhor é Deus que
criou os céus e a terra em seis dias, depois assentou-se no trono para dirigir o ’amr”
(Jonas, 10.3). De qualquer forma, há fortes evidências que apontam para uma influência
targúmica sobre o Alcorão, uma vez que “os targumim estavam aparentemente em uso
na Arábia na época da pregação de Maomé”.41
         Em suma, vimos neste item que a criação do mundo e do homem, bem como, o
uso da palavra como instrumento divino da criação, estão presentes tanto no Alcorão
quanto no Tanakh, além de fazerem parte também do pensamento místico judaico e
muçulmano. Aqui, mais uma vez a teologia bíblica e qurânica se encontram. E essa
concordância teológica, em vez de afastar as duas religiões, estabelece uma importante
ponte que as liga e as une.




36
     ALI, Michael Nazir. Islam, a Christian Perspective. Philadelphia, The Westminster Press, 1983, p.15.
37
 COWAN, J. Milton (ed.). A Dictionary of Modern Written Arabic. [Arabic-English]. Wiesbaden, Otto
Harrassowitz Verlag, 1979, p.33.
38
  CROLLIUS, Ary A. Roest. The Word in the Experience of Revelation in Qur’ān and Hindu Scriptures.
[Documenta Missionalia | Vol. 8]. Roma, Gregorian & Biblical Press, 1974, p.58.
39
  GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa, p.111. À semelhança do uso
mágico de mēmrā’ no judaísmo rabínico, Nicholson descreve um emprego mágico similar do termo ’amr
no Alcorão. Segundo ele, “Deus criou o anjo chamado Ruh da sua própria luz e, a partir dele, Ele criou
o mundo e o tornou seu órgão da visão no mundo. Um de seus nomes é a Palavra de Alá (’Amr Allāh)”.
(NICHOLSON, Reynold Alleyne. Studies in Islamic Mysticism. Charleston, Forgotten Books, 1967,
p.103).
40
  CROLLIUS, Ary A. Roest. The Word in the Experience of Revelation in Qur’ān and Hindu Scriptures,
pp.67,68.
41
     Idem, Ibidem, p.74.

                                                                                                                                11
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4. ABRAÃO

        Se há um personagem que desfruta de bastante prestígio tanto no judaísmo quanto
no islamismo, esse personagem é Abraão. Como já dissemos anteriormente, isso não é
de estranhar, pois como o Alcorão se vale da Bíblia Hebraica em seu texto, é, por
conseguinte, natural que alguns temas sejam compartilhados entre os dois livros.
        Na Bíblia Hebraica Abraão recebe destaque, sobretudo, no primeiro livro da Tōrâ,
o qual lhe dedica especial atenção em Gênesis 11.26-25.11. Ele é a primeira pessoa do
Tanakh a ser chamada de “hebreu”42 (Gênesis 14.13) e, além disso, “todos os judeus
traçam sua ancestralidade a Abraão, como pai da nação hebraica”. 43 A Bíblia Hebraica
dá a entender que Abraão, antes de conhecer a YHWH, era idólatra (cf. Josué 24.2,3).
Entretanto, em um determinado dia YHWH se encontra com Abraão e lhe promete uma
grande descendência (Gênesis 12.2) e a posse de um pedaço de terra (Gênesis 12.6,7).
Neste ínterim, Abraão é submetido a um grande teste, que é oferecer Isaque, o filho da
promessa (Gênesis 21.12), em sacrifício a Deus no monte Moriá (Gênesis 22.1-19).
Depois de passar por vários reveses em sua caminhada de fé com Deus, Abraão
finalmente se sagra vitorioso. Assim, ele serve de exemplo pela sua obediência aos
mandamentos de Deus.44 Na literatura bíblica posterior, Abraão será conhecido como
“amigo de Deus” (cf. Isaías 41.8; 2 Crônicas 20.7).
        No Alcorão, Abraão também recebe bastante destaque, sendo chamado ali,
contudo, de Ibrahim.45 Aliás, a importância de Abraão é vista, por exemplo, na
referência feita às “Escrituras de Abraão e de Moisés” (O Altíssimo, 87.19). Além disso,

42
  Aqui, o termo ‘ivrī (“hebreu”) pode ser derivado do verbo ‘āvar, “atravessar”. Se esta opinião estiver
correta, então o vocábulo pode estar apontando para o fato de os hebreus, em seu passado distante, serem
nômades que viviam andando de um lugar para o outro. (Cf. HOROWITZ, Edward. How the Hebrew
Language Grew. Jersey City, KTAV Publishing House, 1993, p.48).
43
  WILSON, Marvin R. Our Father Abraham: Jewish Roots of the Christian Faith. Grand Rapids, Wm.
B. Eerdmans Publishing Company / Dayton, Center for Judaic-Christian Studies, 1989, p.4. O autor
prefere usar aqui a expressão “nação hebraica” em vez de “nação judaica” por entender que o adjetivo
“hebraica” descreve melhor os aspectos lingüísticos e culturais do povo de Israel, enquanto que o adjetivo
“judaica” carrega uma conotação mais extensa e contemporânea. Para maiores informações sobre Abraão,
veja ainda: GARDNER, Paul. (ed.). Quem é Quem na Bíblia Sagrada. [trad. Josué Ribeiro]. São Paulo,
Vida, 2000, pp.10-16.
44
  BASKIN, Judith R. (ed.). The Cambridge Dictionary of Judaism & Jewish Culture. Cambridge,
Cambridge University Press, 2011, p.2.
45
  Abraão é citado em 35 dos 114 capítulos do Alcorão. (Cf. PETERS, F. E. Islam: a guide for Jews and
Christians. New Jersey, Princeton University Press, 2003, p.9). Como a tradução do Alcorão que está
sendo utiliza neste trabalho, feita por Mansour Challita, emprega o nome “Abraão”, também adotarei esse
nome aqui, em vez de usar o nome “Ibrahim”.

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o Alcorão se apropria da figura de Abraão, desvinculando-o assim de sua matriz
judaica: “Não era Abraão judeu ou cristão. Era um homem de fé pura e um submisso. E
não era um idólatra” (A Tribo de Omram, 3.67).46 Outro trecho do Alcorão diz: “Segue
a religião de Abraão, um homem de fé pura, que não era um dos idólatras” (As Abelhas,
16.123). O Alcorão também dedica um grande espaço para tratar do relato lendário que
descreve Abraão destruindo os ídolos de seu pai, Terá, onde ele, Abraão, atribui a um
dos ídolos a culpa pela prática de tal ato (Os Profetas, 21.51-69).47 Deve-se dizer ainda
que, assim como a Bíblia Hebraica, o Alcorão também se refere a Abraão como amigo
de Deus, dizendo: “Deus elegeu Abraão por amigo (ḥalil)” (As Mulheres, 4.125).
Entretanto, talvez a questão mais divergente entre a Bíblia Hebraica e o Alcorão, no que
diz respeito a Abraão, seja a questão que envolve a identidade daquele que Abraão
ofereceria em sacrifício a Deus. A Bíblia Hebraica diz que Isaque seria sacrificado
(Gênesis 22.1-19). Já o Alcorão, embora também mencione esse episódio em suas
páginas, todavia, acaba não mencionando o nome daquele que seria sacrificado (cf. As
Fileiras, 37.99-111). Porém, como em seguida fala-se sobre as boas novas que Abraão
recebeu de Isaque (“e nós demos-lhe as boas novas de Isaque”, As Fileiras, 37.111),48
os comentaristas e exegetas do Alcorão entendem que a referência só poderia ser feita a
Ismael, uma vez que Abraão acabara de receber “as boas novas do nascimento de
Isaque”.49
         Em resumo, apesar da existência de algumas poucas divergências, a Bíblia
Hebraica e o Alcorão concordam, em linhas gerais, sobre a centralidade de Abraão para


46
  Outra tradução diz que “Abraão não era nem judeu nem cristão, mas monoteísta sincero, moslim. E não
era dos idólatras”. (Cf. NASR, Helmi. (Trad.). Tradução do Sentido do Nobre Alcorão para a Língua
Portuguesa. Al-Madinah Al-Munauarah, Complexo do Rei Fahd para a impressão do Alcorão Nobre,
S.d.).
47
  Essa lenda sobre Abraão e os ídolos de seu pai aparece em um famoso conto midráshico. Isso significa
que o conto era bastante antigo, a ponto de Maomé já conhecê-lo em sua época e empregá-lo no Alcorão.
Para saber mais sobre esse conto, veja: PATTERSON, José. Angels, Prophets, Rabbis and Kings from the
Stories of the Jewish People. Wallingford, Peter Lowe, 1991, p.22ss; UNTERMAN, Alan. (ed.).
Dicionário Judaico de Lendas e Tradições. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1992, p.11.
48
     KHALIDI, Tarif. (Trad.). The Qur’an, p.365.
49
   ALI, Maulana Muhammad. The Holy Qur’ān: Arabic Text, English Translation and Commentary.
Lahore, Pakistan, Ahmadiyyah Anjuman Isha‘at Islam, 1973, p.860. Para um excelente estudo
comparativo sobre o sacrifício de Isaque relatado na Bíblia Hebraica versus o sacrifício de Ismael
encontrado no Alcorão, veja: FIRESTONE, Reuven. Comparative Studies in Bible and Qur’ān: A Fresh
Look at Genesis 22 in Light of Sura 37. In: HARY, Benjamin H., HAYES, John L. & ASTREN, Fred.
(eds.). Judaism and Islam Boundaries, Communication, and Interaction: Essays in Honor of William M.
Brinner. Leiden, Brill, 2000, pp.169-184.

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a sua fé em suas Escrituras.50 Ora, se Ismael e Isaque eram, ambos, filhos de Abraão e,
portanto, irmãos, logo, não há motivo para que judeus e muçulmanos não partilhem da
mesma bênção de seu personagem ancestral.




50
   ELKAYAM, Asher. The Qur’an and Biblical Origins: Hebrew, Christian and Aramaic Influences In
Striking Similarities. Bloomington, Xlibris Corporation, 2009, p.37.

                                                                                                                                14
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5. DETERMINISMO VERSUS LIVRE-ARBÍTRIO

         O ser humano é “livre” em suas ações ou está fadado a vestir sempre uma “camisa
de força invisível” que tolhe a sua liberdade? Antes de verificar sucintamente como a
Bíblia Hebraica e o Alcorão abordam essa controversa questão, é necessário definirmos
primeiro o que queremos dizer com os termos “determinismo” e “livre-arbítrio”.
Segundo Rudman, determinismo é:

                                  a crença de que o pensamento, ação e sentimentos humanos são, em
                                  um maior ou menor grau, controlados por uma grande força e que os
                                  seres humanos têm pouco ou nenhum livre-arbítrio de si mesmos. Esta
                                  força pode ser chamada Deus ou Destino, ou os dois podem ser vistos
                                  como idênticos.51


         Já o livre-arbítrio pode ser definido como “o poder das pessoas de originar ou
trazer à existência os propósitos e fins que guiam suas ações”. 52 Apesar de reconhecer a
insuficiência e a complexidade de tais conceitos, iremos, contudo, adotá-los em nosso
trabalho. Verifiquemos, então, como os dois livros sagrados ora em estudo abordam
esse controverso tema.
         De acordo com a Bíblia Hebraica, está determinado, entre outras coisas, que cada
ano tenha várias estações (Gênesis 1.14), que o homem irá morrer algum dia (Gênesis
3.19; 1 Reis 2.2), que Deus é tanto o doador da vida quanto Aquele que dá um fim a ela
(1 Samuel 2.6), que as águas fiquem represadas, de maneira que não avancem além dos
limites estipulados por Deus (Jó 38.8-11) e que nada e ninguém pode ir contra as ações
e a vontade de Deus (Isaías 43.13). Por outro lado, o mesmo Tanakh que enquadra o
homem dentro de um esquema cósmico com leis definidas e pré-determinadas também
classifica este mesmo homem como um agente livre. Tal fato pode ser constatado em
textos que dizem, por exemplo, “te tenho proposto a vida e a morte, a bênção e a
maldição; escolhe, pois, a vida, para que vivas, tu e a tua semente” (Deuteronômio
30.19) e “se quiserdes e ouvirdes, comereis o bem desta terra. Mas, se recusardes e
fordes rebeldes, sereis devorados à espada” (Isaías 1.19,20). Como pode ser percebido
nestes breves exemplos, a Bíblia Hebraica vive numa constante tensão filosófico-

51
 RUDMAN, Dominic. Determinism and Anti-Determinism in the Book of Koheleth. [The Jewish Bible
Quarterly]. Vol.XXX, Nº 2. Jerusalem, Jewish Bible Association Press, 2002, p.1.
52
     KANE, R. Free Will and Values. Albany, State University of New York Press, 1985, p.22.

                                                                                                                                15
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teológica que, ora enfatiza o determinismo divino, ora ressalta a liberdade humana.
Como o Tanakh ensina estas duas verdades, então, torna-se necessário apresentar uma
“terceira via” argumentativa que leve em consideração estes dois pontos extremos em
conjunto. Creio que Arthur W. Pink faz isso muito bem, ao dizer:

                                  Duas coisas são indisputáveis: a soberania de Deus e a
                                  responsabilidade do homem. [...] Reconhecemos que existe, sem
                                  dúvida, o perigo de salientar demais uma delas e negligenciar a outra.
                                  [...] Ressaltar a soberania de Deus, sem afirmar, ao mesmo tempo, a
                                  responsabilidade do homem, tende ao fatalismo; [Por outro lado],
                                  preocupar-se tanto em manter a responsabilidade do homem, ao ponto
                                  de perder de vista a soberania de Deus, é exaltar a criatura e desonrar
                                  o Criador.53

        O Alcorão, apesar de ensinar tanto sobre a liberdade humana54 quanto sobre o
determinismo divino, tende a enfatizar este último. Os seguintes textos exemplificam
isso muito bem: “Deus guiou os que acreditavam na verdade e desencaminhou os
outros. Deus guia quem quiser na senda da retidão” (A Vaca, 2.213), “Nada nos
acontecerá senão o que Deus determinou” (O Arrependimento, 9.51), “se Deus não o
tivesse determinado, eu não vo-lo teria recitado [o Alcorão]” (Jonas 10.16), “Quem
determina todas as coisas? Responderão: Deus” (Jonas 10.31), “Deus não criou os céus
e a terra e [tudo] quanto existe entre eles senão pela verdade e por um prazo
predeterminado” (Os Bizantinos, 30.8), “Cada um de nós tem seu lugar predestinado”
(As Fileiras, 37.164), “Não pertence a crente algum e a crente alguma, quando Deus e
Seu Mensageiro decidirem algo, escolher outra opção” (Os Coligados, 33.36),
“predeterminamos a data de vossa morte – e ninguém escapa de Nós” (O Dia Inelutável,
56.60),55 “Ele [Deus] determinou uma medida para cada coisa” (O Divórcio, 65.3) e
“[Deus] determinou e orientou o destino de tudo o que criou” (O Altíssimo, 87.3).

53
  PINK, A. W. Deus é Soberano. São José dos Campos, Editora Fiel, 1997, p.5. Os acréscimos entre
colchetes são meus.
54
  Algumas suras falam sobre a responsabilidade humana de forma ampla, destacando, portanto, o
conceito de livre-arbítrio. Alguns exemplos: 4.84; 10.41; 42.30; 46.19; 57.11.
55
  Aqui, o Alcorão entende tradicionalmente que o pronome na primeira pessoa do plural, “nós”, que
ocorre indiretamente no início da oração e diretamente no seu final seja uma referência a Deus. Para uma
ampla discussão sobre o significado desse pronome em todo o Alcorão, como uma possível referência a
Deus, aos anjos, ou a uma mera figura de linguagem, veja: MCCANTS, William F. Founding Gods,
Inventing Nations: Conquest and Culture Myths from Antiquity to Islam. New Jersey, Princeton
University Press, 2012, pp.37-40.

                                                                                                                                16
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        Todavia, assim como ocorre com a Bíblia Hebraica, o fato de o Alcorão também
conter ensinamentos tanto sobre a liberdade humana quanto sobre o determinismo
divino, requer, de igual modo, uma posição equilibrada sobre o assunto. Dessa vez, o
pensador muçulmano, aiatolá Nasir Makarim Shirazi, nos ajuda com sua concisa, mas
certeira opinião, ao dizer:


                                  [...] nós sabemos que os seres humanos têm liberdade de escolha e
                                  livre-arbítrio, ao mesmo tempo em que sabemos que Deus é o
                                  Governante sobre todas as pessoas e ações.56


        Ora, diante dessa tensão bíblica e qurânica sobre o complexo tema do
determinismo divino e da liberdade humana, a que conclusão podemos chegar? Penso
que as posições extremas devem ser evitadas. Creio que se adotarmos apenas o
pensamento determinista como verdade e negarmos o livre-arbítrio, acabaremos
pendendo inevitavelmente para o fatalismo. Por outro lado, se aceitarmos unicamente o
conceito do livre-arbítrio e rejeitarmos o determinismo divino, estaremos criando um
mundo totalmente ilusório. Além disso, ao adotarmos esta última opção estaremos
reduzindo Deus à condição de um ser totalmente impotente e insignificante e, por
conseguinte, dispensável em “nosso” mundo. Sendo assim, devemos dizer neste ponto
que “determinismo” e “livre-arbítrio” não são duas verdades necessariamente
irreconciliáveis. Isso foi argumentado de maneira bastante convincente por Geisler, que,
dentre outras coisas, disse:


                                  [...] ninguém jamais demonstrou uma contradição entre predestinação
                                  e livre-escolha. Não há conflito insolúvel entre um acontecimento
                                  predeterminado por um Deus onisciente e um evento que é livremente
                                  escolhido por nós.57

56
  SHIRAZI, Nasir Makarim. Principios Basicos del Pensamiento Islamico. (Vol. IV: Justicia Divina).
Tehran, Bonyad Be‘zat, 1987, p.43. Há entre os muçulmanos um grupo chamado qadarīah que nega a
predestinação absoluta e acredita no poder (qadr) do livre-arbítrio humano. (Cf. HUGHES, Thomas
Patrick. A Dictionary of Islam. New Dehli, AES Publications, 2001, p.478). O pensamento exposto por
Shirazi lembra a declaração do Pirkê Avot 3:15, que diz: ‟Tudo está previsto, [mas] a liberdade de
escolha é concedida”. (Cf. BERKSON, William. Pirke Avot: Timeless Wisdom for Modern Life.
Philadelphia, The Jewish Publication Society, 2010, p.126. O acréscimo entre colchetes é meu).
57
  GEISLER, Norman. Eleitos, Mas Livres: uma perspectiva equilibrada entre a eleição divina e o livre-
arbítrio. São Paulo, Editora Vida, 2001, pp.47,48.

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        A meu ver, apesar desse relacionamento entre determinismo divino e livre-arbítrio
humano se constituir um verdadeiro mistério, tal relacionamento não significa
necessariamente contradição. Os argumentos produzidos pela razão humana, limitada e
falível, não podem comprovar de forma inequívoca a suposta contradição entre essas
duas verdades ensinadas tanto pelo Tanakh quanto pelo Alcorão. Assim, tanto o
determinismo quanto o livre-arbítrio, apesar de serem duas coisas distintas e
aparentemente paradoxais, podem ser vistas, igualmente, como duas verdades
complementares, que não são necessariamente mutuamente excludentes.




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6. ESCATOLOGIA


         Finalmente, chegamos ao último tema de nosso estudo, o tema referente à
escatologia. O vocábulo “escatologia” é oriundo de duas palavras gregas, eschatos,
“último” e logos, “palavra, relato, declaração, consideração”.58 Trata-se da consideração
ou estudo acerca dos eventos futuros e, portanto, últimos.
         No judaísmo, o termo “escatologia” está relacionado à esperança de “um futuro
cumprimento das promessas de Deus no momento em que Deus julgará todos os seres
humanos e iniciará uma era messiânica”.59 Contudo, como bem observou Gnilka:

                                  Escatologia trata da ação definitiva de Deus, que também acontece na
                                  história. Isso também se aplica quando ainda não se quer olhar para
                                  além das fronteiras da história, para uma vida no além. Tal é a
                                  situação no Antigo Testamento, que – não levando em conta os
                                  escritos mais tardios – ainda desconhece uma continuidade da vida do
                                  ser humano para além da morte, uma vida eterna no além. A história
                                  do mundo é o julgamento do mundo. Existe uma escatologia
                                  veterotestamentária.60

         Essa escatologia histórica mencionada por Gnilka, a qual está presente na Bíblia
Hebraica, irá sofrer uma grande mudança com o surgimento da apocalíptica judaica.61
A partir do surgimento desse gênero literário, a história passa a ser compreendida de
outra forma. Agora, a ação definitiva de Deus se realiza não somente na própria história,
mas, sobretudo, além das fronteiras históricas, dando ensejo para que surjam, por




58
  LIDDELL, H. G. & SCOTT, R. An Intermediate Greek-English Lexicon. [Founded upon the Seventh
Edition of Liddell and Scott’s Greek-English Lexicon]. Oxford, Oxford University Press, 1889,
pp.319,476-477.
59
  PECK, Alan J. Avery. Eschatology (In Judaism). In: ESPÍN, Orlando O. & NICKOLOFF, James B.
(eds.). An Introductory Dictionary of Theology and Religious Studies. Collegeville, The Liturgical Press,
2007, p.410.
60
     GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa, p.175.
61
  A expressão “apocalíptica judaica” é usada para se referir a um tipo de gênero literário que emprega
imagens simbólicas e visões que descrevem acontecimentos futuros nos fins dos tempos. (Cf.
EISENBERG, Ronald L. Dictionary of Jewish Terms: a guide to the language of Judaism. Lanham,
Taylor Trade Publishing, 2011, p.18).

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exemplo, a esperança em uma vida no além, bem como, a crença na ressurreição dos
mortos (cf. Daniel 12.1-3).62
        A apocalíptica judaica é importante não somente para a compreensão da
escatologia bíblica, mas também para a compreensão do próprio Alcorão, o qual
também compartilha esse mesmo tema em suas páginas. Aliás, verifiquemos isso com
maiores detalhes.
        Na Bíblia Hebraica, encontramos várias referências ao “dia do Senhor”.63
Entender esse conceito não é algo fácil. Tal expressão pode fazer referência: a) a um
julgamento divino decisivo, breve ou remoto, na história, b) ao reinado soberano divino
sobre todas as coisas, ou c) à manifestação divina especial num contexto de julgamento
e salvação, bem como, nos principais eventos da história humana. 64 Seja como for,
parece que o sentido de “juízo” está mais presente nessa expressão.65 Esse conceito de
julgamento como o “dia” também aparece no Alcorão, onde lemos, por exemplo, sobre
“o Soberano do dia do julgamento” (Abertura, 1.4) e sobre “o último dia” (A Vaca,
2.228, 232).
        Além disso, encontramos também na Bíblia Hebraica, em seu estágio tardio, uma
referência explícita à ressurreição, à vida eterna e ao sofrimento eterno: “e muitos que
dormem no pó da terra ressuscitarão, uns para a vida eterna, e outros para vergonha e
desprezo eterno” (Daniel 12.2). Esses mesmos elementos também podem ser
verificados no Alcorão, onde encontramos dezenas de referências ao “dia da
ressurreição”,66 além de várias outras menções feitas às recompensas e aos castigos


62
   Neusner, Chilton e Graham chamam essa abordagem escatológica que aparece tanto no judaísmo
tardio, quanto no cristianismo e no islamismo de “compreensão linear, unidirecional e teleológica da
história”. (Cf. NEUSNER, Jacob, CHILTON, Bruce & GRAHAM, William. Three Faiths, One God: the
formative faith and practice of Judaism, Christianity, and Islam. Boston, Brill Academic Publishers,
2002, p.290).
63
  Veja, por exemplo: Isaías 2.12; 13.6,9; Joel 1.15; 2.1,11,31; Amós 5.18-20; Sofonias 1.7,14; Zacarias
14.1.
64
  CHAMPLIN, R. N. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. Vol.2. [D-G]. São Paulo, Hagnos,
2001, p.440.
65
 METZGER, Bruce M. & COOGAN, Michael D. (eds.). The Oxford Companion to the Bible. Oxford,
Oxford University Press, 1993, p.157.
66
   Veja, por exemplo, as suras: 2.85, 113, 174, 212, 275; 3.55, 77, 161, 180, 185, 194; 4.87, 109, 141,
159; 5.14, 36, 64; 6.12; 7.32, 167, 172; 10.60, 93; 11.98, 99; 16.25, 27, 124; 17.13, 58, 62, 97; 18.105;
19.95; 20.100, 124; 21.47; 22.9 etc. (Para maiores informações sobre o significado do “dia da
ressurreição” no Alcorão, veja: MEHAR, Iftikhar Ahmed. Al-Islam: Inception to Conclusion.
Bloomington, AuthorHouse, 2003, pp.240-242).

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existentes na vida além-túmulo.67 Dessa forma, a importância que o Alcorão confere à
vida no além e à ressurreição o insere dentro do contexto da apocalíptica judaica, um
subtema da escatologia.
        Além desses temas, a Bíblia Hebraica e o Alcorão também têm em comum o
discurso sobre um novo céu e uma nova terra futuros (compare Isaías 65.17; 66.22, com
Abraão, 14.48).
        De uma forma geral, podemos notar que a escatologia presente no Alcorão possui
traços que a aproximam mais da apocalíptica judaica tardia do que da escatologia
histórica presente na Bíblia Hebraica. Além do mais, podemos perceber também que a
referência ao “dia do juízo” (yawm al-dīn) no Alcorão (Abertura, 1.4) encontra o seu
paralelo nas várias alusões ao “juízo” divino (mišppāṭ) encontradas na Bíblia Hebraica.
De qualquer modo, a temática escatológica pode ser claramente notada nestes dois
livros sagrados e em suas teologias.




67
  Confira, por exemplo, as suras: 2.85, 114, 162; 4.93, 102, 151 (sobre os castigos) e 2.58, 62, 112; 3.57,
136, 144 (sobre as recompensas).

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CONCLUSÃO

        Este breve estudo que fizemos sobre alguns temas em comum entre a Bíblia
Hebraica e o Alcorão nos permitiu chegar às seguintes conclusões:
        Primeira, a Bíblia Hebraica e o Alcorão falam sobre a crença em um Deus único,
o qual é, ao mesmo tempo, o Criador de todas as coisas. Nestes dois livros sagrados, o
politeísmo é fortemente rejeitado como idolatria, pois o que importa, de fato, é a fé em
’ēl / allāh (termos estes que, como vimos, possuem afinidades morfológicas e
semânticas) e a obediência (ou “submissão”) à Sua vontade. Este Deus único usou a Sua
Palavra (mēmrā’ / ’amr) como instrumento da Sua obra criadora, trazendo assim à
existência os céus, a terra e o próprio homem.
        Segunda, o Deus único da Bíblia Hebraica e do Alcorão resolveu dar-se a
conhecer à humanidade. Para isso, Ele escolheu se auto-revelar através de um livro
sagrado que traz consigo o registro das Suas divinas palavras, que devem ser lidas,
estudadas e praticadas. E este (s) livro (s) sagrado (s), por sua vez, veio (vieram) a ser
escrito (s) através da instrumentalidade de Seus servos: Moisés (especialmente) e
Maomé.
        Terceira, a Bíblia Hebraica e o Alcorão conferem, ambos, grande destaque à
pessoa de Abraão. Ele é tanto o patriarca dos judeus, que se veem como seus filhos
(“filhos de Abraão”), quanto é o pai de Ismael, ancestral do povo árabe, segundo as
tradições judaica e árabe.
        Quarta, tanto a Bíblia Hebraica quanto o Alcorão apresentam em suas páginas a
tensão existente entre o determinismo divino e o livre-arbítrio humano. Apesar de o
Alcorão pender mais para o primeiro destes conceitos do que o Tanakh, contudo, ambos
mencionam tais elementos em seus escritos, retratando assim a sua compreensão
teológica, cosmológica e antropológica da complexa relação Deus-homem-mundo.
        Quinta, a escatologia também é um tema comum à Bíblia Hebraica e ao Alcorão.
Porém, é um assunto muito mais trabalhado neste último, que, valendo-se
principalmente da apocalíptica judaica, acabou desenvolvendo um conteúdo
escatológico mais rico e variado do que aquele apresentado no Tanakh. Entretanto, os
dois livros ressaltam tal tema, à sua maneira, em seus textos.
        Finalmente, a sexta e última conclusão à qual pudemos chegar neste trabalho e,
talvez, a mais importante de todas, é que toda esta afinidade temática, todo este
compartilhamento de conceitos e crenças (ainda que de forma parcial) por parte da

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Bíblia Hebraica e do Alcorão, a despeito de todas as suas idiossincrasias teológicas e
filosóficas, devem servir de incentivo ao diálogo, à fraternidade, à cooperação mútua e,
sobretudo, à paz, não somente entre judeus e muçulmanos, como também entre todos os
demais povos. Neste estudo sobre alguns temas comuns ao Alcorão e à Bíblia Hebraica
pudemos aprender, acima de tudo, que quando nos dispomos a conhecer melhor o outro
e as suas crenças, acabamos, na verdade, conhecendo melhor a nós mesmos!




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Bíblia Hebraica e Alcorão em Diálogo

  • 1. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ ARTIGO TEOLÓGICO A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns aos Dois Livros Sagrados1 por Carlos Augusto Vailatti Doutorando em Estudos Judaicos e Árabes, com concentração em Estudos Judaicos, pela Universidade de São Paulo (USP), Mestre em Teologia, com especialização em Teologia Bíblica, pelo Seminário Teológico Servo de Cristo (STSC), Bacharel em Teologia pela Faculdade Betel / Instituto Betel de Ensino Superior (IBES) e também Bacharel em Teologia pela Escola Superior de Teologia (EST). Atualmente, é professor de Teologia no Seminário Teológico Evangélico do Betel Brasileiro e na Faculdade Betel / Instituto Betel de Ensino Superior (IBES). RESUMO O presente texto tem o objetivo de refletir sobre alguns temas comuns existentes tanto na Bíblia Hebraica quanto no Alcorão, a saber: Deus, o Livro Sagrado, a Criação, Abraão, Determinismo versus Livre-Arbítrio e Escatologia. O estudo desses temas, ainda que sucinto, nos mostrará como o judaísmo e o islamismo os enxergam a partir de suas respectivas fés. ABSTRACT The present text has the objective of reflect on some commom themes existent both in the Hebrew Bible and in the Qur’an, namely: God, the Holy Book, Creation, Abraham, Determinism versus Free Will and Eschatology. The study of these issues, though brief, will show us how judaism and islam sighted them from their respective faiths. 1 Esse artigo foi apresentado pela primeira vez em forma de trabalho na Universidade de São Paulo (USP) em julho de 2012.
  • 2. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ INTRODUÇÃO O judaísmo, o cristianismo e o islamismo, além de serem as três maiores religiões monoteístas do mundo, também compartilham entre si o fato de terem recebido a divina revelação na forma escrita. Isto fez com que os adeptos dessas três fés monoteístas fossem identificados, e com justiça, como “Povo do Livro”.2 Contudo, devido às limitações e propósitos do presente trabalho, nos restringiremos a abordar apenas alguns temas comuns tanto à Bíblia Hebraica quanto ao Alcorão. Dessa forma, alusões ao Novo Testamento somente serão feitas quando julgadas necessárias para a elucidação e compreensão de algum assunto ou tópico tratado em nossa pesquisa. Depois desses breves, mas necessários esclarecimentos, voltemos, então, a nossa atenção aos dois livros que serão alvo do nosso estudo. A Bíblia Hebraica ou Tanakh3 experimentou um longo processo de formação até o seu estabelecimento final na forma escrita que abrange um período de mais de mil anos.4 No II século a.e.c. o livro de Eclesiástico (também conhecido por outros três nomes: “Sabedoria de Jesus, filho de Sirac”, “Ben Sirac”, ou simplesmente “Sirácida”) já fazia referência em seu prólogo grego à divisão tripartida da Bíblia Hebraica, mencionando ho nómos kaì hai profēteîai kaì tà loipà tōn biblíōn,5 isto é, “a Lei e os Profetas e o resto dos Livros” (Prólogo do Eclesiástico 1.24,25). Contudo, foi somente entre o I e II séculos e.c. que o cânon da Bíblia Hebraica foi definitivamente estabelecido para todas as comunidades judaicas.6 Já o Alcorão ou simplesmente Corão7 contém exclusivamente ditos do profeta Maomé, os quais foram pronunciados 2 PATERSON, Andrea C. Three Monotheistic Faiths – Judaism, Christianity, Islam. Bloomington, AuthorHouse, 2009, p.139. 3 Tanakh é o acrônimo usado para se referir às três principais divisões da Bíblia Hebraica: Tōrâ (Pentateuco), Nevī‘īm (Profetas) e Ketūvīm (Escritos). Hoje, em ambiente acadêmico cristão, a fim de promover o diálogo interreligioso entre judeus e cristãos, por ex., dá-se preferência ao uso do nome “Primeiro Testamento” em vez do conhecido “Antigo Testamento”, como designação da Bíblia Hebraica. (Para maiores informações quanto à discussão sobre essas nomenclaturas, veja: ZENGER, Erich et al. Introdução ao Antigo Testamento. [trad. Werner Fuchs]. São Paulo. Edições Loyola, 2003, pp.19-21). 4 GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa. [trad. Irineu J. Rabuske]. São Paulo, Edições Loyola, 2006, pp.44,45. 5 A minha transliteração e tradução do texto grego estão baseadas em: RAHLFS, Alfred. Septuaginta. Stuttgart, Deutsche Bibelgesellschaft, 2004, p.378. 6 BARRERA, Júlio Trebolle. A Bíblia Judaica e a Bíblia Cristã: introdução à história da Bíblia. [trad. Ramiro Mincato]. Petrópolis, Vozes, 1995, pp.183,184. 7 O termo qur’ān significa tradicionalmente “recitação, leitura”. Para outras possibilidades de tradução do termo, veja: LEAMAN, Oliver. (ed.). The Qur’an: an encyclopedia. New York, Routledge, 2006, p.521. 2
  • 3. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ “aproximadamente do seu quadragésimo ano de vida até sua morte, isto é, entre os anos 610 e 632”.8 A composição definitiva do Alcorão só ocorreu a partir de 632, logo após a morte de Maomé.9 Estas informações de cunho histórico são importantes para o nosso trabalho, pois nos servem de base para comprovar a ordem cronológica em que os três livros sagrados surgiram em sua forma escrita definitiva: Bíblia Hebraica (II século e.c.), Novo Testamento (IV século e.c.)10 e Alcorão (VII século e.c.). Não obstante isso, esses dados, além de apontarem para a anterioridade da Bíblia Hebraica em relação ao Novo Testamento e ao Alcorão, também nos ajudam a compreender porque estes dois últimos fazem inúmeras referências e alusões, diretas e indiretas, à Bíblia Hebraica, a qual lhes serve inúmeras vezes de fonte.11 No caso da Bíblia Hebraica e do Alcorão em particular, nota-se, portanto, um entrelaçamento textual o qual ocorre, contudo, apenas neste último, que, ao ocupar-se das histórias e das tradições da Bíblia Hebraica, acaba por reconhecê-las e legitimá-las dentro de seu próprio contexto de fé. Ora, essa intertextualidade presente no Alcorão nos será especialmente importante, pois nos permitirá refletir sobre alguns temas compartilhados por estas duas fés, a judaica e a muçulmana, descortinando assim diante de nossos olhares algumas incríveis semelhanças conceituais e temáticas entre ambas. Em nosso estudo, veremos que há mais elementos que unem a Bíblia Hebraica e o Alcorão, do que os separam. No presente trabalho, escolhemos como objeto de nossas reflexões seis temas que são compartilhados entre a Bíblia Hebraica e o Alcorão. Esses temas são: Deus, o Livro Sagrado, a Criação, Abraão, Determinismo versus Livre-Arbítrio e Escatologia. A escolha pela abordagem desses assuntos em nossa pesquisa se deve não apenas à importância que o pensamento bíblico e qurânico lhes conferem em seus textos, mas se deve, antes de tudo, ao caráter agregador desses temas, que permite, por sua vez, maior proximidade e diálogo entre judeus e muçulmanos, os principais observadores dos princípios contidos nestes dois livros sagrados. 8 GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa, p.47. 9 Idem, Ibidem, p.48. 10 CULLMANN, Oscar. A Formação do Novo Testamento. [trad. Bertoldo Weber]. São Leopoldo, Sinodal, 2001, p.92. 11 O Alcorão também faz muitas referências ao Novo Testamento e, mais particularmente, às tradições sobre Jesus. Porém, tais referências não são tão numerosas quanto aquelas que o Alcorão faz à Bíblia Hebraica. 3
  • 4. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ Depois dessas observações, vejamos o que o estudo em conjunto da Bíblia Hebraica e do Alcorão nos reserva. 4
  • 5. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ 1. DEUS O primeiro tema comum à Bíblia Hebraica e ao Alcorão que nós destacamos aqui é: Deus. Não poderia ser diferente. No Tanakh, Deus é conhecido principalmente como ’ēl ou ’ĕlōhīm. Aliás, deve-se dizer que o termo semítico ocidental, ’ēl, que tem relação com o ugarítico il(u), é comumente usado nas línguas semíticas para se referir a “deus” em sentido amplo.12 Já o termo árabe usado com referência a Deus, allāh, é a forma contraída de al-ilah (literalmente, “o Deus”).13 Provavelmente, a evolução do termo (de al-ilah para allāh) deve ter acontecido por assimilação do “i” nesta última forma do vocábulo. Tal assimilação pode ter ocorrido devido ao uso bastante freqüente da palavra.14 Quanto ao tetragrama divino (YHWH), este curiosamente não é mencionado no Alcorão.15 Seja como for, tanto ’ēl quanto allāh são vocábulos muito semelhantes em termos de sua morfologia e significado.16 Aliás, um dos temas comuns à Bíblia Hebraica e ao Alcorão é o monoteísmo. Na Bíblia Hebraica, a centralidade da fé monoteísta se destaca, de maneira que ninguém pode duvidar que um de seus grandes temas seja o “seu monoteísmo puro, penetrante e inflexível”.17 Vemos no Tanakh,18 por exemplo, que “Deus é um” (Deuteronômio 6.4), que “não há outros deuses diante dele” (Êxodo 20.3) e que, tal fato é admitido, inclusive, pelo próprio Deus, que diz: “fora de mim não há Deus”, “fora de mim não há outro” e “eu sou o Senhor, e não há outro” (Isaías 45.5,6). Esta unicidade divina 12 POPE, Marvin H. El in the Ugaritic Texts. Vol.2. [Vetus Testamentum: Supplements]. Leiden, Brill, 1955, p.1; CHANAN, Ami Ben. Qur’an-Bible Comparison: A Topical Study of the Two Most Influential and Respectful Books in Western and Middle Eastern Civilizations. Bloomington, Trafford Publishing, 2011, p.316. Para outras informações sobre o termo ’ēl e a sua relação com Yahweh, veja: DAY, John. Yahweh and the Gods and Goddesses of Canaan. New York, Sheffield Academic Press, 2000, pp.13-41. 13 CAMPO, Juan E. Encyclopedia of Islam. [Encyclopedia of World Religions]. New York, Infobase Publishing, 2009, p.34. 14 GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa, p.86. 15 Khalil entende que Yahweh era o nome do Deus particular de Israel. (Cf. KHALIL, Shauqi Abu. Atlas of the Qur’an: Places, Nations, Landmarks. Houston, Darussalam Publications, 2003, p.63). 16 COOGAN, Michael David. (ed.). Stories From Ancient Canaan. Louisville, The Westminster Press, 1978, p.12. Veja também: HASTINGS, James. Encyclopedia of Religion and Ethics. [Vol.11]. Whitefish, Kessinger Publishing, 2003, p.248. 17 YOUNGBLOOD, Ronald F. The Heart of the Old Testament: a survey of key theological themes. Grand Rapids, Baker Book House, 1998, p.13. 18 Todas as citações da Bíblia Hebraica, salvo indicação contrária, são extraídas de: ALMEIDA, João Ferreira de. (trad.). Bíblia Sagrada. [Edição Revista e Corrigida]. Rio de Janeiro, Imprensa Bíblica Brasileira, 1991. 5
  • 6. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ também encontra eco nas páginas do Alcorão,19 que afirma: “Vosso Deus é o Deus único. Não há deus senão Ele” (A Vaca, 2.163), “Não há deus senão Ele” (o Gado, 6.106) e, nas palavras do próprio allāh, “Não adoteis dois deuses. Somente eu sou o Deus único” (As Abelhas, 16.51). Ora, mas será que a maneira como a Bíblia Hebraica compreende a Deus é exatamente a mesma pela qual Ele é compreendido no Alcorão? Para Gnilka, há uma diferença decisiva na imagem de Deus retratada nos dois livros. Segundo ele, “o Deus da Bíblia age na história”. Já o Deus retratado no Alcorão, “mantém-se fora da história”.20 Em outras palavras, se na visão bíblica Deus se relaciona com os seres humanos, na visão qurânica, por outro lado, Ele permanece inacessível, devido à Sua absoluta transcendência.21 Contudo, na visão do Alcorão, o Deus da Bíblia Hebraica e o Deus do próprio Alcorão são o mesmo Deus: “Cremos no que nos foi revelado [o Alcorão] e no que vos foi revelado [a Bíblia Hebraica e o Novo Testamento]. Nosso Deus e vosso Deus é o mesmo”. (A Aranha, 29.46).22 Seja como for, a compreensão do Alcorão sobre a unicidade divina, somada às declarações semelhantes que tanto o Tanakh quanto o Alcorão fazem sobre Deus, como vimos acima, favorecem uma aproximação entre as duas teologias, bem como, contribuem para a existência de um proveitoso diálogo interreligioso capaz de promover uma maior proximidade entre judeus e muçulmanos. 19 Todas as citações do Alcorão, salvo indicação contrária, são extraídas de: CHALLITA, Mansour. (trad.). O Alcorão. Rio de Janeiro, BestBolso, 2011. 20 GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa, p.93. 21 Idem, Ibidem, p.94. Essa idéia da transcendência divina pode ser vista no seguinte trecho do Alcorão: “E a nenhum mortal é dado que Deus lhe fale, exceto por revelação ou por detrás de um véu ou por intermédio de um Mensageiro enviado para transmitir o que Deus determinar”. (A Consulta, 42.51). 22 Os acréscimos entre colchetes são meus. 6
  • 7. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ 2. O LIVRO SAGRADO Além da fé monoteísta, a Bíblia Hebraica e o Alcorão também compartilham o fato de serem, ambos, livros sagrados. Para os judeus, o seu livro sagrado (hasēfer) é o Tanakh, que está originalmente dividido em 24 livros, os quais estão dispostos em três seções, Tōrâ (Pentateuco), Nevī‘īm (Profetas) e Ketūvīm (Escritos).23 Já para os muçulmanos, o seu livro sagrado (al-kitāb) é o Alcorão, ou simplesmente Corão. Este último está dividido em 114 suras ou capítulos, os quais são subdivididos por sua vez em versículos, somando o total de 6.235.24 Isso torna o Alcorão semelhante ao Novo Testamento em termos de sua extensão.25 É digna de nota a afirmação que tanto a Bíblia Hebraica quanto o Alcorão fazem sobre a sua procedência divina. Com relação à primeira, tal afirmação pode ser vista em cada uma de suas três divisões, como podemos notar nas seguintes expressões que nos servem de exemplo: a) Na Tōrâ: “falou Deus todas estas palavras” (Êxodo 20.1) e “falou o Senhor a Moisés” (Números 1.1; 2.1; 4.1); b) Nos Nevī‘īm: “Josué escreveu estas palavras no livro da lei de Deus” (Josué 24.26); e c) Nos Ketūvīm: “leram no livro da lei de Deus” (Neemias 8.8) e “o livro da lei do Senhor” (2 Crônicas 34.14). Já no Alcorão, essa reivindicação de origem divina é ainda mais explícita, como se pode perceber nos seguintes trechos qurânicos: “Foi no mês de Ramadã que o Alcorão foi revelado, um guia para os homens” (A Vaca, 2.185), “[Deus] revelou-me este Alcorão” (O Gado, 6.19), “é uma blasfêmia atribuir este Alcorão senão a Deus” (Jonas, 10.37), “o Alcorão é a verdade enviada por teu Senhor” (A Peregrinação, 22.54) e “este é, sem dúvida, o livro enviado pelo Senhor dos mundos” (A Prostração, 32.2). Ora, este caráter sagrado do Alcorão é ainda reforçado não somente pelas próprias declarações qurânicas sobre sua procedência divina, mas também pelo seu conteúdo como um todo que, apesar de datar do VII século e.c., é capaz de atualizar a sua mensagem ao leitor contemporâneo, transformando assim as suas palavras em palavras supra-históricas. Tal aspecto é observado por Khalidi, que diz: 23 ROTH, Cecil. (ed.). The Standard Jewish Encyclopedia. Jerusalem, Massadah Publishing Company Ltd., 1958/9, p.306. 24 CHALLITA, Mansour. (trad.). O Alcorão. Rio de Janeiro, BestBolso, 2011, p.11. 25 KALTNER, John. Introducing the Qur’an for Today’s Reader. Minneapolis, Fortress Press, 2011, p.3. 7
  • 8. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ [...] as narrativas são expressas como contos meta-históricos e parábolas do espírito humano e da perigosa jornada da fé, em vez de histórias. Em quase todos os casos, o Alcorão assume familiaridade com os contornos do conto em questão, e assim procura recordar sua audiência da verdadeira importância do conto e da moral.26 Além disso, esse conteúdo meta-histórico também tem estado presente na Bíblia Hebraica desde sempre, fato este que explica o profundo impacto que ela tem exercido no mundo (principalmente ocidental) em termos de avanços em questões éticas e sociais, por exemplo, as quais receberam novas dimensões e novo tratamento a partir dos valores ensinados neste livro sagrado.27 É evidente que não podemos negar os inúmeros males praticados ao longo da história em nome da religião e em nome de Deus. Contudo, tais atrocidades perpetradas em nome do sagrado não sobrepujam, a meu ver, os incontáveis benefícios que estes dois livros têm proporcionado à humanidade de uma forma geral. Aliás, o Alcorão novamente nos fornece uma postura reconciliadora com a Bíblia Hebraica, ao declarar: “Creio em todos os Livros que Deus fez descer [...]. Que não haja discussões entre nós. Deus nos unificará. É para Ele que todos caminhamos” (A Consulta, 42.15) e “Antes dele [o Alcorão], havia o Livro de Moisés: uma orientação e uma misericórdia. E este livro corrobora o outro em língua árabe para advertir os que prevaricam e trazer boas-novas aos benfeitores” (As Dunas, 46.12). O reconhecimento da Bíblia Hebraica como livro sagrado por parte do Alcorão e o compartilhamento da crença comum da sacralidade de seus livros também se constituem fatores que contribuem substancialmente para o diálogo e para uma maior proximidade entre estes dois “povos do livro”. 26 KHALIDI, Tarif. The Qur’an. New York, Viking Penguin, 2008, p.xvi. 27 STRAUSS, Mark L. How to Read the Bible in Changing Times: understanding and applying God’s word today. Grand Rapids, Baker Books, 2011, p.2. 8
  • 9. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ 3. A CRIAÇÃO A compreensão do mundo como criação (em hebraico, berī’â; em árabe, khalq) de Deus é, talvez, um dos temas que mais aproxime a Bíblia Hebraica do Alcorão.28 Isso não deve nos causar surpresa, pois, como a primeira influenciou profundamente este último, logo, já era de se esperar a existência de certa afinidade temática entre ambos. A concepção de que Deus criou o mundo e tudo o que há nele é algo tão importante e fundamental para a Bíblia Hebraica que tal pensamento lhe serve de prefácio.29 Lemos já no início do primeiro livro do Tanakh que berēšīt bārā’ ’ĕlōhīm ’ēt hašāmayim we’ēt hā’ārets,30 “no princípio criou Deus os céus e a terra” (Gênesis 1.1). Tal assertiva será repetida várias vezes ao longo do texto bíblico, como, por exemplo, nas expressões: “o Senhor Deus fez a terra e os céus” (Gênesis 2.4), “Ele [Deus] é o criador de todas as coisas [...]. Senhor dos Exércitos é o seu nome” (Jeremias 10.16) e “[...] vejo os teus céus, obra dos teus dedos, a lua e as estrelas que preparaste” (Salmo 8.3). Além disso, a criação do ser humano por Deus também é enfatizada no Tanakh, onde lemos que “criou Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; macho e fêmea os criou” (Gênesis 1.27). No Alcorão, allāh também é descrito várias vezes como o criador de todas as coisas. Vejamos alguns textos que indicam isso: “Louvado seja Deus que criou os céus e a terra” (O Gado, 6.1 – compare com Gênesis 1.1), “Foi Ele quem vos fez descender de um único homem” (O Gado, 6.98), “Vosso Senhor é o Deus que criou os céus e a terra em seis dias” (As Alturas, 7.54 – compare com Gênesis 1.31; 2.1), “Foi Ele quem vos criou de um só homem e dele lhe tirou a esposa para que com ela convivesse” (As Alturas, 7.189 – compare com Gênesis 1.21,22), “Deus disse aos anjos: ‘Vou criar um homem de argila seca, de barro maleável’” (Al-Hijr, 15.28 – compare com Gênesis 2.7). Como podem ser percebidos, são notáveis os paralelos entre o Alcorão e a Bíblia Hebraica sobre o tema da criação do mundo e do homem. Além do mais, também chama a nossa atenção o emprego da “palavra” como instrumento criador divino tanto no Alcorão quanto na Bíblia Hebraica. Nós 28 GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa, p.99. 29 Essa concepção também está presente em várias solenidades judaicas, como, por exemplo, na festa de casamento, durante a qual é pronunciada a seguinte bênção: “Bendito és tu, Senhor nosso Deus, Rei do Universo, que criaste tudo para a tua glória”. (Cf. DORFF, Elliot N. & ROSETT, Arthur. A Living Tree: The Roots and Growth of Jewish Law. Albany, State University of New York Press, 1988, p.502). 30 Minha transliteração do texto hebraico baseia-se em: ELLIGER, K. & RUDOLPH, W. (eds.). Biblia Hebraica Stuttgartensia. Stuttgart, Deutsche Bibelgesellschaft, 1997. 9
  • 10. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ encontramos no Tanakh vários registros sobre a palavra criadora divina. Eis alguns exemplos: “E disse Deus: haja luz. E houve luz” (Gênesis 1.3),31 “pela palavra do Senhor foram feitos os céus” (Salmo 33.6), “Porque [Deus] falou, e tudo se fez; mandou, e logo tudo apareceu” (Salmo 33.9). A importância dada à “palavra” como elemento criador do universo é explicitamente declarada no Sêfer Ietsirá (Livro da Criação), o qual afirma que “foi através das letras do alfabeto hebraico que o Universo foi criado”.32 Além disso, o Sêfer Ietsirá ainda diz: Os decretos mediante os quais Deus trouxe a Criação a ser consistiram em ditos. Estes, por sua vez, consistiam em palavras, e estas eram compostas por letras. Portanto, foi através das letras do alfabeto que o Universo foi criado.33 Embora essas palavras reflitam o pensamento do misticismo judaico, o qual está relacionado, sobretudo, com a cabalá, todavia, elas retratam de forma bastante vívida (ainda que mágica) a relevância da “palavra” no processo divino da criação. Contudo, é no contexto do período do judaísmo rabínico (II-VI Século e.c.) que a palavra criadora divina mostra sua maior semelhança (em termos morfológicos e semânticos) com a sua equivalente árabe. Nesta época, encontramos nos escritos dos sábios o termo aramaico mēmrā’, “palavra”, o qual é utilizado para se referir à palavra criadora de Deus, isto é, o agente por meio do qual Deus criou o mundo.34 Para exemplificar o emprego desse termo, podemos citar duas referências encontradas nos targumim. No targum de Isaías 48.13 encontramos escrito: “pela minha mēmrā’ eu fundei a terra, e pela minha força eu suspendi os céus” e no targum de Deuteronômio 33.27 lemos: “O Deus eterno é o teu refúgio, e pela sua mēmrā’ o mundo foi criado”.35 No Alcorão, encontramos o vocábulo ’amr que, por sua vez, está relacionado ao 31 A fórmula wayyō’mer ’ĕlōhīm yehī...wayehī, “e disse Deus: ‘haja’...e houve” é recorrente no primeiro capítulo de Gênesis, o qual apresenta as várias etapas (dias) da criação do mundo sendo criadas através da palavra divina. Veja: Gênesis 1.3,6,9,11,14,20,24,29,30. 32 KAPLAN, Arieh. Sêfer Ietsirá: O Livro da Criação. [Trad. Erwin Von-Rommel Vianna Pamplona]. São Paulo, Editora e Livraria Sêfer Ltda, 2002, p.58. 33 KAPLAN, Arieh. Sêfer Ietsirá: O Livro da Criação, p.58. 34 SHERBOK, Dan Cohn. A Concise Encyclopedia of Judaism. Oxford, Oneworld Publications, 1998, p.129. 35 Estas duas referências targúmicas foram extraídas de: BARCLAY, William. Great Themes of the New Testament. Louisville, Westminster John Knox Press, 2001, p.28. 10
  • 11. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ aramaico mēmrā’ e ao grego logos.36 Em árabe moderno, ’amr significa “ordem, comando, instrução, regulamento, decreto”.37 Porém, a partir de estudos realizados na década de 1930, “tornou-se impossível estudar o significado de ’amr no Alcorão sem considerar sua possível relação com mēmrā’, seja ele o da Síria ou o do Targum”.38 Neste último caso, portanto, ’amr pode ser mais bem entendido como “palavra”, ou seja, o instrumento do qual Deus se vale para levar a efeito a Sua criação.39 Vejamos dois exemplos do uso de ’amr com este sentido: “Sua ’amr, quando Ele deseja alguma coisa, basta dizer: ‘Sê!’ para que seja” (Yā-Sīn, 36.82)40 e “Vosso Senhor é Deus que criou os céus e a terra em seis dias, depois assentou-se no trono para dirigir o ’amr” (Jonas, 10.3). De qualquer forma, há fortes evidências que apontam para uma influência targúmica sobre o Alcorão, uma vez que “os targumim estavam aparentemente em uso na Arábia na época da pregação de Maomé”.41 Em suma, vimos neste item que a criação do mundo e do homem, bem como, o uso da palavra como instrumento divino da criação, estão presentes tanto no Alcorão quanto no Tanakh, além de fazerem parte também do pensamento místico judaico e muçulmano. Aqui, mais uma vez a teologia bíblica e qurânica se encontram. E essa concordância teológica, em vez de afastar as duas religiões, estabelece uma importante ponte que as liga e as une. 36 ALI, Michael Nazir. Islam, a Christian Perspective. Philadelphia, The Westminster Press, 1983, p.15. 37 COWAN, J. Milton (ed.). A Dictionary of Modern Written Arabic. [Arabic-English]. Wiesbaden, Otto Harrassowitz Verlag, 1979, p.33. 38 CROLLIUS, Ary A. Roest. The Word in the Experience of Revelation in Qur’ān and Hindu Scriptures. [Documenta Missionalia | Vol. 8]. Roma, Gregorian & Biblical Press, 1974, p.58. 39 GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa, p.111. À semelhança do uso mágico de mēmrā’ no judaísmo rabínico, Nicholson descreve um emprego mágico similar do termo ’amr no Alcorão. Segundo ele, “Deus criou o anjo chamado Ruh da sua própria luz e, a partir dele, Ele criou o mundo e o tornou seu órgão da visão no mundo. Um de seus nomes é a Palavra de Alá (’Amr Allāh)”. (NICHOLSON, Reynold Alleyne. Studies in Islamic Mysticism. Charleston, Forgotten Books, 1967, p.103). 40 CROLLIUS, Ary A. Roest. The Word in the Experience of Revelation in Qur’ān and Hindu Scriptures, pp.67,68. 41 Idem, Ibidem, p.74. 11
  • 12. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ 4. ABRAÃO Se há um personagem que desfruta de bastante prestígio tanto no judaísmo quanto no islamismo, esse personagem é Abraão. Como já dissemos anteriormente, isso não é de estranhar, pois como o Alcorão se vale da Bíblia Hebraica em seu texto, é, por conseguinte, natural que alguns temas sejam compartilhados entre os dois livros. Na Bíblia Hebraica Abraão recebe destaque, sobretudo, no primeiro livro da Tōrâ, o qual lhe dedica especial atenção em Gênesis 11.26-25.11. Ele é a primeira pessoa do Tanakh a ser chamada de “hebreu”42 (Gênesis 14.13) e, além disso, “todos os judeus traçam sua ancestralidade a Abraão, como pai da nação hebraica”. 43 A Bíblia Hebraica dá a entender que Abraão, antes de conhecer a YHWH, era idólatra (cf. Josué 24.2,3). Entretanto, em um determinado dia YHWH se encontra com Abraão e lhe promete uma grande descendência (Gênesis 12.2) e a posse de um pedaço de terra (Gênesis 12.6,7). Neste ínterim, Abraão é submetido a um grande teste, que é oferecer Isaque, o filho da promessa (Gênesis 21.12), em sacrifício a Deus no monte Moriá (Gênesis 22.1-19). Depois de passar por vários reveses em sua caminhada de fé com Deus, Abraão finalmente se sagra vitorioso. Assim, ele serve de exemplo pela sua obediência aos mandamentos de Deus.44 Na literatura bíblica posterior, Abraão será conhecido como “amigo de Deus” (cf. Isaías 41.8; 2 Crônicas 20.7). No Alcorão, Abraão também recebe bastante destaque, sendo chamado ali, contudo, de Ibrahim.45 Aliás, a importância de Abraão é vista, por exemplo, na referência feita às “Escrituras de Abraão e de Moisés” (O Altíssimo, 87.19). Além disso, 42 Aqui, o termo ‘ivrī (“hebreu”) pode ser derivado do verbo ‘āvar, “atravessar”. Se esta opinião estiver correta, então o vocábulo pode estar apontando para o fato de os hebreus, em seu passado distante, serem nômades que viviam andando de um lugar para o outro. (Cf. HOROWITZ, Edward. How the Hebrew Language Grew. Jersey City, KTAV Publishing House, 1993, p.48). 43 WILSON, Marvin R. Our Father Abraham: Jewish Roots of the Christian Faith. Grand Rapids, Wm. B. Eerdmans Publishing Company / Dayton, Center for Judaic-Christian Studies, 1989, p.4. O autor prefere usar aqui a expressão “nação hebraica” em vez de “nação judaica” por entender que o adjetivo “hebraica” descreve melhor os aspectos lingüísticos e culturais do povo de Israel, enquanto que o adjetivo “judaica” carrega uma conotação mais extensa e contemporânea. Para maiores informações sobre Abraão, veja ainda: GARDNER, Paul. (ed.). Quem é Quem na Bíblia Sagrada. [trad. Josué Ribeiro]. São Paulo, Vida, 2000, pp.10-16. 44 BASKIN, Judith R. (ed.). The Cambridge Dictionary of Judaism & Jewish Culture. Cambridge, Cambridge University Press, 2011, p.2. 45 Abraão é citado em 35 dos 114 capítulos do Alcorão. (Cf. PETERS, F. E. Islam: a guide for Jews and Christians. New Jersey, Princeton University Press, 2003, p.9). Como a tradução do Alcorão que está sendo utiliza neste trabalho, feita por Mansour Challita, emprega o nome “Abraão”, também adotarei esse nome aqui, em vez de usar o nome “Ibrahim”. 12
  • 13. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ o Alcorão se apropria da figura de Abraão, desvinculando-o assim de sua matriz judaica: “Não era Abraão judeu ou cristão. Era um homem de fé pura e um submisso. E não era um idólatra” (A Tribo de Omram, 3.67).46 Outro trecho do Alcorão diz: “Segue a religião de Abraão, um homem de fé pura, que não era um dos idólatras” (As Abelhas, 16.123). O Alcorão também dedica um grande espaço para tratar do relato lendário que descreve Abraão destruindo os ídolos de seu pai, Terá, onde ele, Abraão, atribui a um dos ídolos a culpa pela prática de tal ato (Os Profetas, 21.51-69).47 Deve-se dizer ainda que, assim como a Bíblia Hebraica, o Alcorão também se refere a Abraão como amigo de Deus, dizendo: “Deus elegeu Abraão por amigo (ḥalil)” (As Mulheres, 4.125). Entretanto, talvez a questão mais divergente entre a Bíblia Hebraica e o Alcorão, no que diz respeito a Abraão, seja a questão que envolve a identidade daquele que Abraão ofereceria em sacrifício a Deus. A Bíblia Hebraica diz que Isaque seria sacrificado (Gênesis 22.1-19). Já o Alcorão, embora também mencione esse episódio em suas páginas, todavia, acaba não mencionando o nome daquele que seria sacrificado (cf. As Fileiras, 37.99-111). Porém, como em seguida fala-se sobre as boas novas que Abraão recebeu de Isaque (“e nós demos-lhe as boas novas de Isaque”, As Fileiras, 37.111),48 os comentaristas e exegetas do Alcorão entendem que a referência só poderia ser feita a Ismael, uma vez que Abraão acabara de receber “as boas novas do nascimento de Isaque”.49 Em resumo, apesar da existência de algumas poucas divergências, a Bíblia Hebraica e o Alcorão concordam, em linhas gerais, sobre a centralidade de Abraão para 46 Outra tradução diz que “Abraão não era nem judeu nem cristão, mas monoteísta sincero, moslim. E não era dos idólatras”. (Cf. NASR, Helmi. (Trad.). Tradução do Sentido do Nobre Alcorão para a Língua Portuguesa. Al-Madinah Al-Munauarah, Complexo do Rei Fahd para a impressão do Alcorão Nobre, S.d.). 47 Essa lenda sobre Abraão e os ídolos de seu pai aparece em um famoso conto midráshico. Isso significa que o conto era bastante antigo, a ponto de Maomé já conhecê-lo em sua época e empregá-lo no Alcorão. Para saber mais sobre esse conto, veja: PATTERSON, José. Angels, Prophets, Rabbis and Kings from the Stories of the Jewish People. Wallingford, Peter Lowe, 1991, p.22ss; UNTERMAN, Alan. (ed.). Dicionário Judaico de Lendas e Tradições. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1992, p.11. 48 KHALIDI, Tarif. (Trad.). The Qur’an, p.365. 49 ALI, Maulana Muhammad. The Holy Qur’ān: Arabic Text, English Translation and Commentary. Lahore, Pakistan, Ahmadiyyah Anjuman Isha‘at Islam, 1973, p.860. Para um excelente estudo comparativo sobre o sacrifício de Isaque relatado na Bíblia Hebraica versus o sacrifício de Ismael encontrado no Alcorão, veja: FIRESTONE, Reuven. Comparative Studies in Bible and Qur’ān: A Fresh Look at Genesis 22 in Light of Sura 37. In: HARY, Benjamin H., HAYES, John L. & ASTREN, Fred. (eds.). Judaism and Islam Boundaries, Communication, and Interaction: Essays in Honor of William M. Brinner. Leiden, Brill, 2000, pp.169-184. 13
  • 14. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ a sua fé em suas Escrituras.50 Ora, se Ismael e Isaque eram, ambos, filhos de Abraão e, portanto, irmãos, logo, não há motivo para que judeus e muçulmanos não partilhem da mesma bênção de seu personagem ancestral. 50 ELKAYAM, Asher. The Qur’an and Biblical Origins: Hebrew, Christian and Aramaic Influences In Striking Similarities. Bloomington, Xlibris Corporation, 2009, p.37. 14
  • 15. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ 5. DETERMINISMO VERSUS LIVRE-ARBÍTRIO O ser humano é “livre” em suas ações ou está fadado a vestir sempre uma “camisa de força invisível” que tolhe a sua liberdade? Antes de verificar sucintamente como a Bíblia Hebraica e o Alcorão abordam essa controversa questão, é necessário definirmos primeiro o que queremos dizer com os termos “determinismo” e “livre-arbítrio”. Segundo Rudman, determinismo é: a crença de que o pensamento, ação e sentimentos humanos são, em um maior ou menor grau, controlados por uma grande força e que os seres humanos têm pouco ou nenhum livre-arbítrio de si mesmos. Esta força pode ser chamada Deus ou Destino, ou os dois podem ser vistos como idênticos.51 Já o livre-arbítrio pode ser definido como “o poder das pessoas de originar ou trazer à existência os propósitos e fins que guiam suas ações”. 52 Apesar de reconhecer a insuficiência e a complexidade de tais conceitos, iremos, contudo, adotá-los em nosso trabalho. Verifiquemos, então, como os dois livros sagrados ora em estudo abordam esse controverso tema. De acordo com a Bíblia Hebraica, está determinado, entre outras coisas, que cada ano tenha várias estações (Gênesis 1.14), que o homem irá morrer algum dia (Gênesis 3.19; 1 Reis 2.2), que Deus é tanto o doador da vida quanto Aquele que dá um fim a ela (1 Samuel 2.6), que as águas fiquem represadas, de maneira que não avancem além dos limites estipulados por Deus (Jó 38.8-11) e que nada e ninguém pode ir contra as ações e a vontade de Deus (Isaías 43.13). Por outro lado, o mesmo Tanakh que enquadra o homem dentro de um esquema cósmico com leis definidas e pré-determinadas também classifica este mesmo homem como um agente livre. Tal fato pode ser constatado em textos que dizem, por exemplo, “te tenho proposto a vida e a morte, a bênção e a maldição; escolhe, pois, a vida, para que vivas, tu e a tua semente” (Deuteronômio 30.19) e “se quiserdes e ouvirdes, comereis o bem desta terra. Mas, se recusardes e fordes rebeldes, sereis devorados à espada” (Isaías 1.19,20). Como pode ser percebido nestes breves exemplos, a Bíblia Hebraica vive numa constante tensão filosófico- 51 RUDMAN, Dominic. Determinism and Anti-Determinism in the Book of Koheleth. [The Jewish Bible Quarterly]. Vol.XXX, Nº 2. Jerusalem, Jewish Bible Association Press, 2002, p.1. 52 KANE, R. Free Will and Values. Albany, State University of New York Press, 1985, p.22. 15
  • 16. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ teológica que, ora enfatiza o determinismo divino, ora ressalta a liberdade humana. Como o Tanakh ensina estas duas verdades, então, torna-se necessário apresentar uma “terceira via” argumentativa que leve em consideração estes dois pontos extremos em conjunto. Creio que Arthur W. Pink faz isso muito bem, ao dizer: Duas coisas são indisputáveis: a soberania de Deus e a responsabilidade do homem. [...] Reconhecemos que existe, sem dúvida, o perigo de salientar demais uma delas e negligenciar a outra. [...] Ressaltar a soberania de Deus, sem afirmar, ao mesmo tempo, a responsabilidade do homem, tende ao fatalismo; [Por outro lado], preocupar-se tanto em manter a responsabilidade do homem, ao ponto de perder de vista a soberania de Deus, é exaltar a criatura e desonrar o Criador.53 O Alcorão, apesar de ensinar tanto sobre a liberdade humana54 quanto sobre o determinismo divino, tende a enfatizar este último. Os seguintes textos exemplificam isso muito bem: “Deus guiou os que acreditavam na verdade e desencaminhou os outros. Deus guia quem quiser na senda da retidão” (A Vaca, 2.213), “Nada nos acontecerá senão o que Deus determinou” (O Arrependimento, 9.51), “se Deus não o tivesse determinado, eu não vo-lo teria recitado [o Alcorão]” (Jonas 10.16), “Quem determina todas as coisas? Responderão: Deus” (Jonas 10.31), “Deus não criou os céus e a terra e [tudo] quanto existe entre eles senão pela verdade e por um prazo predeterminado” (Os Bizantinos, 30.8), “Cada um de nós tem seu lugar predestinado” (As Fileiras, 37.164), “Não pertence a crente algum e a crente alguma, quando Deus e Seu Mensageiro decidirem algo, escolher outra opção” (Os Coligados, 33.36), “predeterminamos a data de vossa morte – e ninguém escapa de Nós” (O Dia Inelutável, 56.60),55 “Ele [Deus] determinou uma medida para cada coisa” (O Divórcio, 65.3) e “[Deus] determinou e orientou o destino de tudo o que criou” (O Altíssimo, 87.3). 53 PINK, A. W. Deus é Soberano. São José dos Campos, Editora Fiel, 1997, p.5. Os acréscimos entre colchetes são meus. 54 Algumas suras falam sobre a responsabilidade humana de forma ampla, destacando, portanto, o conceito de livre-arbítrio. Alguns exemplos: 4.84; 10.41; 42.30; 46.19; 57.11. 55 Aqui, o Alcorão entende tradicionalmente que o pronome na primeira pessoa do plural, “nós”, que ocorre indiretamente no início da oração e diretamente no seu final seja uma referência a Deus. Para uma ampla discussão sobre o significado desse pronome em todo o Alcorão, como uma possível referência a Deus, aos anjos, ou a uma mera figura de linguagem, veja: MCCANTS, William F. Founding Gods, Inventing Nations: Conquest and Culture Myths from Antiquity to Islam. New Jersey, Princeton University Press, 2012, pp.37-40. 16
  • 17. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ Todavia, assim como ocorre com a Bíblia Hebraica, o fato de o Alcorão também conter ensinamentos tanto sobre a liberdade humana quanto sobre o determinismo divino, requer, de igual modo, uma posição equilibrada sobre o assunto. Dessa vez, o pensador muçulmano, aiatolá Nasir Makarim Shirazi, nos ajuda com sua concisa, mas certeira opinião, ao dizer: [...] nós sabemos que os seres humanos têm liberdade de escolha e livre-arbítrio, ao mesmo tempo em que sabemos que Deus é o Governante sobre todas as pessoas e ações.56 Ora, diante dessa tensão bíblica e qurânica sobre o complexo tema do determinismo divino e da liberdade humana, a que conclusão podemos chegar? Penso que as posições extremas devem ser evitadas. Creio que se adotarmos apenas o pensamento determinista como verdade e negarmos o livre-arbítrio, acabaremos pendendo inevitavelmente para o fatalismo. Por outro lado, se aceitarmos unicamente o conceito do livre-arbítrio e rejeitarmos o determinismo divino, estaremos criando um mundo totalmente ilusório. Além disso, ao adotarmos esta última opção estaremos reduzindo Deus à condição de um ser totalmente impotente e insignificante e, por conseguinte, dispensável em “nosso” mundo. Sendo assim, devemos dizer neste ponto que “determinismo” e “livre-arbítrio” não são duas verdades necessariamente irreconciliáveis. Isso foi argumentado de maneira bastante convincente por Geisler, que, dentre outras coisas, disse: [...] ninguém jamais demonstrou uma contradição entre predestinação e livre-escolha. Não há conflito insolúvel entre um acontecimento predeterminado por um Deus onisciente e um evento que é livremente escolhido por nós.57 56 SHIRAZI, Nasir Makarim. Principios Basicos del Pensamiento Islamico. (Vol. IV: Justicia Divina). Tehran, Bonyad Be‘zat, 1987, p.43. Há entre os muçulmanos um grupo chamado qadarīah que nega a predestinação absoluta e acredita no poder (qadr) do livre-arbítrio humano. (Cf. HUGHES, Thomas Patrick. A Dictionary of Islam. New Dehli, AES Publications, 2001, p.478). O pensamento exposto por Shirazi lembra a declaração do Pirkê Avot 3:15, que diz: ‟Tudo está previsto, [mas] a liberdade de escolha é concedida”. (Cf. BERKSON, William. Pirke Avot: Timeless Wisdom for Modern Life. Philadelphia, The Jewish Publication Society, 2010, p.126. O acréscimo entre colchetes é meu). 57 GEISLER, Norman. Eleitos, Mas Livres: uma perspectiva equilibrada entre a eleição divina e o livre- arbítrio. São Paulo, Editora Vida, 2001, pp.47,48. 17
  • 18. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ A meu ver, apesar desse relacionamento entre determinismo divino e livre-arbítrio humano se constituir um verdadeiro mistério, tal relacionamento não significa necessariamente contradição. Os argumentos produzidos pela razão humana, limitada e falível, não podem comprovar de forma inequívoca a suposta contradição entre essas duas verdades ensinadas tanto pelo Tanakh quanto pelo Alcorão. Assim, tanto o determinismo quanto o livre-arbítrio, apesar de serem duas coisas distintas e aparentemente paradoxais, podem ser vistas, igualmente, como duas verdades complementares, que não são necessariamente mutuamente excludentes. 18
  • 19. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ 6. ESCATOLOGIA Finalmente, chegamos ao último tema de nosso estudo, o tema referente à escatologia. O vocábulo “escatologia” é oriundo de duas palavras gregas, eschatos, “último” e logos, “palavra, relato, declaração, consideração”.58 Trata-se da consideração ou estudo acerca dos eventos futuros e, portanto, últimos. No judaísmo, o termo “escatologia” está relacionado à esperança de “um futuro cumprimento das promessas de Deus no momento em que Deus julgará todos os seres humanos e iniciará uma era messiânica”.59 Contudo, como bem observou Gnilka: Escatologia trata da ação definitiva de Deus, que também acontece na história. Isso também se aplica quando ainda não se quer olhar para além das fronteiras da história, para uma vida no além. Tal é a situação no Antigo Testamento, que – não levando em conta os escritos mais tardios – ainda desconhece uma continuidade da vida do ser humano para além da morte, uma vida eterna no além. A história do mundo é o julgamento do mundo. Existe uma escatologia veterotestamentária.60 Essa escatologia histórica mencionada por Gnilka, a qual está presente na Bíblia Hebraica, irá sofrer uma grande mudança com o surgimento da apocalíptica judaica.61 A partir do surgimento desse gênero literário, a história passa a ser compreendida de outra forma. Agora, a ação definitiva de Deus se realiza não somente na própria história, mas, sobretudo, além das fronteiras históricas, dando ensejo para que surjam, por 58 LIDDELL, H. G. & SCOTT, R. An Intermediate Greek-English Lexicon. [Founded upon the Seventh Edition of Liddell and Scott’s Greek-English Lexicon]. Oxford, Oxford University Press, 1889, pp.319,476-477. 59 PECK, Alan J. Avery. Eschatology (In Judaism). In: ESPÍN, Orlando O. & NICKOLOFF, James B. (eds.). An Introductory Dictionary of Theology and Religious Studies. Collegeville, The Liturgical Press, 2007, p.410. 60 GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão – O Que os Une, O Que os Separa, p.175. 61 A expressão “apocalíptica judaica” é usada para se referir a um tipo de gênero literário que emprega imagens simbólicas e visões que descrevem acontecimentos futuros nos fins dos tempos. (Cf. EISENBERG, Ronald L. Dictionary of Jewish Terms: a guide to the language of Judaism. Lanham, Taylor Trade Publishing, 2011, p.18). 19
  • 20. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ exemplo, a esperança em uma vida no além, bem como, a crença na ressurreição dos mortos (cf. Daniel 12.1-3).62 A apocalíptica judaica é importante não somente para a compreensão da escatologia bíblica, mas também para a compreensão do próprio Alcorão, o qual também compartilha esse mesmo tema em suas páginas. Aliás, verifiquemos isso com maiores detalhes. Na Bíblia Hebraica, encontramos várias referências ao “dia do Senhor”.63 Entender esse conceito não é algo fácil. Tal expressão pode fazer referência: a) a um julgamento divino decisivo, breve ou remoto, na história, b) ao reinado soberano divino sobre todas as coisas, ou c) à manifestação divina especial num contexto de julgamento e salvação, bem como, nos principais eventos da história humana. 64 Seja como for, parece que o sentido de “juízo” está mais presente nessa expressão.65 Esse conceito de julgamento como o “dia” também aparece no Alcorão, onde lemos, por exemplo, sobre “o Soberano do dia do julgamento” (Abertura, 1.4) e sobre “o último dia” (A Vaca, 2.228, 232). Além disso, encontramos também na Bíblia Hebraica, em seu estágio tardio, uma referência explícita à ressurreição, à vida eterna e ao sofrimento eterno: “e muitos que dormem no pó da terra ressuscitarão, uns para a vida eterna, e outros para vergonha e desprezo eterno” (Daniel 12.2). Esses mesmos elementos também podem ser verificados no Alcorão, onde encontramos dezenas de referências ao “dia da ressurreição”,66 além de várias outras menções feitas às recompensas e aos castigos 62 Neusner, Chilton e Graham chamam essa abordagem escatológica que aparece tanto no judaísmo tardio, quanto no cristianismo e no islamismo de “compreensão linear, unidirecional e teleológica da história”. (Cf. NEUSNER, Jacob, CHILTON, Bruce & GRAHAM, William. Three Faiths, One God: the formative faith and practice of Judaism, Christianity, and Islam. Boston, Brill Academic Publishers, 2002, p.290). 63 Veja, por exemplo: Isaías 2.12; 13.6,9; Joel 1.15; 2.1,11,31; Amós 5.18-20; Sofonias 1.7,14; Zacarias 14.1. 64 CHAMPLIN, R. N. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. Vol.2. [D-G]. São Paulo, Hagnos, 2001, p.440. 65 METZGER, Bruce M. & COOGAN, Michael D. (eds.). The Oxford Companion to the Bible. Oxford, Oxford University Press, 1993, p.157. 66 Veja, por exemplo, as suras: 2.85, 113, 174, 212, 275; 3.55, 77, 161, 180, 185, 194; 4.87, 109, 141, 159; 5.14, 36, 64; 6.12; 7.32, 167, 172; 10.60, 93; 11.98, 99; 16.25, 27, 124; 17.13, 58, 62, 97; 18.105; 19.95; 20.100, 124; 21.47; 22.9 etc. (Para maiores informações sobre o significado do “dia da ressurreição” no Alcorão, veja: MEHAR, Iftikhar Ahmed. Al-Islam: Inception to Conclusion. Bloomington, AuthorHouse, 2003, pp.240-242). 20
  • 21. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ existentes na vida além-túmulo.67 Dessa forma, a importância que o Alcorão confere à vida no além e à ressurreição o insere dentro do contexto da apocalíptica judaica, um subtema da escatologia. Além desses temas, a Bíblia Hebraica e o Alcorão também têm em comum o discurso sobre um novo céu e uma nova terra futuros (compare Isaías 65.17; 66.22, com Abraão, 14.48). De uma forma geral, podemos notar que a escatologia presente no Alcorão possui traços que a aproximam mais da apocalíptica judaica tardia do que da escatologia histórica presente na Bíblia Hebraica. Além do mais, podemos perceber também que a referência ao “dia do juízo” (yawm al-dīn) no Alcorão (Abertura, 1.4) encontra o seu paralelo nas várias alusões ao “juízo” divino (mišppāṭ) encontradas na Bíblia Hebraica. De qualquer modo, a temática escatológica pode ser claramente notada nestes dois livros sagrados e em suas teologias. 67 Confira, por exemplo, as suras: 2.85, 114, 162; 4.93, 102, 151 (sobre os castigos) e 2.58, 62, 112; 3.57, 136, 144 (sobre as recompensas). 21
  • 22. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ CONCLUSÃO Este breve estudo que fizemos sobre alguns temas em comum entre a Bíblia Hebraica e o Alcorão nos permitiu chegar às seguintes conclusões: Primeira, a Bíblia Hebraica e o Alcorão falam sobre a crença em um Deus único, o qual é, ao mesmo tempo, o Criador de todas as coisas. Nestes dois livros sagrados, o politeísmo é fortemente rejeitado como idolatria, pois o que importa, de fato, é a fé em ’ēl / allāh (termos estes que, como vimos, possuem afinidades morfológicas e semânticas) e a obediência (ou “submissão”) à Sua vontade. Este Deus único usou a Sua Palavra (mēmrā’ / ’amr) como instrumento da Sua obra criadora, trazendo assim à existência os céus, a terra e o próprio homem. Segunda, o Deus único da Bíblia Hebraica e do Alcorão resolveu dar-se a conhecer à humanidade. Para isso, Ele escolheu se auto-revelar através de um livro sagrado que traz consigo o registro das Suas divinas palavras, que devem ser lidas, estudadas e praticadas. E este (s) livro (s) sagrado (s), por sua vez, veio (vieram) a ser escrito (s) através da instrumentalidade de Seus servos: Moisés (especialmente) e Maomé. Terceira, a Bíblia Hebraica e o Alcorão conferem, ambos, grande destaque à pessoa de Abraão. Ele é tanto o patriarca dos judeus, que se veem como seus filhos (“filhos de Abraão”), quanto é o pai de Ismael, ancestral do povo árabe, segundo as tradições judaica e árabe. Quarta, tanto a Bíblia Hebraica quanto o Alcorão apresentam em suas páginas a tensão existente entre o determinismo divino e o livre-arbítrio humano. Apesar de o Alcorão pender mais para o primeiro destes conceitos do que o Tanakh, contudo, ambos mencionam tais elementos em seus escritos, retratando assim a sua compreensão teológica, cosmológica e antropológica da complexa relação Deus-homem-mundo. Quinta, a escatologia também é um tema comum à Bíblia Hebraica e ao Alcorão. Porém, é um assunto muito mais trabalhado neste último, que, valendo-se principalmente da apocalíptica judaica, acabou desenvolvendo um conteúdo escatológico mais rico e variado do que aquele apresentado no Tanakh. Entretanto, os dois livros ressaltam tal tema, à sua maneira, em seus textos. Finalmente, a sexta e última conclusão à qual pudemos chegar neste trabalho e, talvez, a mais importante de todas, é que toda esta afinidade temática, todo este compartilhamento de conceitos e crenças (ainda que de forma parcial) por parte da 22
  • 23. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ Bíblia Hebraica e do Alcorão, a despeito de todas as suas idiossincrasias teológicas e filosóficas, devem servir de incentivo ao diálogo, à fraternidade, à cooperação mútua e, sobretudo, à paz, não somente entre judeus e muçulmanos, como também entre todos os demais povos. Neste estudo sobre alguns temas comuns ao Alcorão e à Bíblia Hebraica pudemos aprender, acima de tudo, que quando nos dispomos a conhecer melhor o outro e as suas crenças, acabamos, na verdade, conhecendo melhor a nós mesmos! 23
  • 24. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ BIBLIOGRAFIA ALI, Maulana Muhammad. The Holy Qur’ān: Arabic Text, English Translation and Commentary. Lahore, Pakistan, Ahmadiyyah Anjuman Isha‘at Islam, 1973. ALI, Michael Nazir. Islam, a Christian Perspective. Philadelphia, The Westminster Press, 1983. ALMEIDA, João Ferreira de. (trad.). Bíblia Sagrada. [Edição Revista e Corrigida]. Rio de Janeiro, Imprensa Bíblica Brasileira, 1991. BARCLAY, William. Great Themes of the New Testament. Louisville, Westminster John Knox Press, 2001. BARRERA, Júlio Trebolle. A Bíblia Judaica e a Bíblia Cristã: introdução à história da Bíblia. [trad. Ramiro Mincato]. Petrópolis, Vozes, 1995. BASKIN, Judith R. (ed.). The Cambridge Dictionary of Judaism & Jewish Culture. Cambridge, Cambridge University Press, 2011. BERKSON, William. Pirke Avot: Timeless Wisdom for Modern Life. Philadelphia, The Jewish Publication Society, 2010. CAMPO, Juan E. Encyclopedia of Islam. [Encyclopedia of World Religions]. New York, Infobase Publishing, 2009. CHALLITA, Mansour. (trad.). O Alcorão. Rio de Janeiro, BestBolso, 2011. CHAMPLIN, R. N. Enciclopédia de Bíblia, Teologia e Filosofia. Vol.2. [D-G]. São Paulo, Hagnos, 2001. CHANAN, Ami Ben. Qur’an-Bible Comparison: A Topical Study of the Two Most Influential and Respectful Books in Western and Middle Eastern Civilizations. Bloomington, Trafford Publishing, 2011. COOGAN, Michael David. (ed.). Stories From Ancient Canaan. Louisville, The Westminster Press, 1978. COWAN, J. Milton (ed.). A Dictionary of Modern Written Arabic. [Arabic-English]. Wiesbaden, Otto Harrassowitz Verlag, 1979. CROLLIUS, Ary A. Roest. The Word in the Experience of Revelation in Qur’ān and Hindu Scriptures. [Documenta Missionalia | Vol. 8]. Roma, Gregorian & Biblical Press, 1974. CULLMANN, Oscar. A Formação do Novo Testamento. [trad. Bertoldo Weber]. São Leopoldo, Sinodal, 2001. 24
  • 25. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ DAY, John. Yahweh and the Gods and Goddesses of Canaan. New York, Sheffield Academic Press, 2000. DORFF, Elliot N. & ROSETT, Arthur. A Living Tree: The Roots and Growth of Jewish Law. Albany, State University of New York Press, 1988. EISENBERG, Ronald L. Dictionary of Jewish Terms: a guide to the language of Judaism. Lanham, Taylor Trade Publishing, 2011. ELKAYAM, Asher. The Qur’an and Biblical Origins: Hebrew, Christian and Aramaic Influences In Striking Similarities. Bloomington, Xlibris Corporation, 2009. ELLIGER, K. & RUDOLPH, W. (eds.). Biblia Hebraica Stuttgartensia. Stuttgart, Deutsche Bibelgesellschaft, 1997. ESPÍN, Orlando O. & NICKOLOFF, James B. (eds.). An Introductory Dictionary of Theology and Religious Studies. Collegeville, The Liturgical Press, 2007. GARDNER, Paul. (ed.). Quem é Quem na Bíblia Sagrada. [Trad. Josué Ribeiro]. São Paulo, Vida, 2000. GEISLER, Norman. Eleitos, Mas Livres: uma perspectiva equilibrada entre a eleição divina e o livre-arbítrio. São Paulo, Editora Vida, 2001. GNILKA, Joachim. Bíblia e Alcorão: O Que os Une – O Que os Separa. São Paulo, Edições Loyola, 2006. HARY, Benjamin H., HAYES, John L. & ASTREN, Fred. (eds.). Judaism and Islam Boundaries, Communication, and Interaction: Essays in Honor of William M. Brinner. Leiden, Brill, 2000. HASTINGS, James. Encyclopedia of Religion and Ethics. [Vol.11]. Whitefish, Kessinger Publishing, 2003. HOROWITZ, Edward. How the Hebrew Language Grew. Jersey City, KTAV Publishing House, 1993. HUGHES, Thomas Patrick. A Dictionary of Islam. New Dehli, AES Publications, 2001. KALTNER, John. Introducing the Qur’an for Today’s Reader. Minneapolis, Fortress Press, 2011. KANE, R. Free Will and Values. Albany, State University of New York Press, 1985. KAPLAN, Arieh. Sêfer Ietsirá: O Livro da Criação. [trad. Erwin Von-Rommel Vianna Pamplona]. São Paulo, Editora e Livraria Sêfer Ltda, 2002. KHALIDI, Tarif. The Qur’an. New York, Viking Penguin, 2008. 25
  • 26. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ KHALIL, Shauqi Abu. Atlas of the Qur’an: Places, Nations, Landmarks. Houston, Darussalam Publications, 2003. LEAMAN, Oliver. (ed.). The Qur’an: An Encyclopedia. Abingdon, Routledge, 2006. LIDDELL, H. G. & SCOTT, R. An Intermediate Greek-English Lexicon. [Founded upon the Seventh Edition of Liddell and Scott’s Greek-English Lexicon]. Oxford, Oxford University Press, 1889. MCCANTS, William F. Founding Gods, Inventing Nations: Conquest and Culture Myths from Antiquity to Islam. New Jersey, Princeton University Press, 2012. MEHAR, Iftikhar Ahmed. Al-Islam: Inception to Conclusion. Bloomington, AuthorHouse, 2003. METZGER, Bruce M. & COOGAN, Michael D. (eds.). The Oxford Companion to the Bible. Oxford, Oxford University Press, 1993. NASR, Helmi. (trad.). Tradução do Sentido do Nobre Alcorão para a Língua Portuguesa. Al-Madinah Al-Munauarah, Complexo do Rei Fahd para a impressão do Alcorão Nobre, S.d. NEUSNER, Jacob, CHILTON, Bruce & GRAHAM, William. Three Faiths, One God: the formative faith and practice of Judaism, Christianity, and Islam. Boston, Brill Academic Publishers, 2002. NICHOLSON, Reynold Alleyne. Studies in Islamic Mysticism. Charleston, Forgotten Books, 1967. PATERSON, Andrea C. Three Monotheistic Faiths – Judaism, Christianity, Islam. Bloomington, AuthorHouse, 2009. PATTERSON, José. Angels, Prophets, Rabbis and Kings from the Stories of the Jewish People. Wallingford, Peter Lowe, 1991. PETERS, F. E. Islam: a guide for Jews and Christians. New Jersey, Princeton University Press, 2003. PINK, A. W. Deus é Soberano. São José dos Campos, Editora Fiel, 1997. POPE, Marvin H. El in the Ugaritic Texts. Vol.2. [Vetus Testamentum: Supplements]. Leiden, Brill, 1955. RAHLFS, Alfred. Septuaginta. Stuttgart, Deutsche Bibelgesellschaft, 2004. ROTH, Cecil. (ed.). The Standard Jewish Encyclopedia. Jerusalem, Massadah Publishing Company Ltd., 1958/9. 26
  • 27. A r t i g o T e o l ó g i c o | A Bíblia Hebraica e o Alcorão em Diálogo: Reflexões Sobre Alguns Temas Comuns Aos Dois Livros Sagrados | por Carlos Augusto Vailatti | 2012 ___________________________________________________________________________________________________________________________________ RUDMAN, Dominic. Determinism and Anti-Determinism in the Book of Koheleth. [The Jewish Bible Quarterly]. Vol.XXX, Nº 2. Jerusalem, Jewish Bible Association Press, 2002. SHERBOK, Dan Cohn. A Concise Encyclopedia of Judaism. Oxford, Oneworld Publications, 1998. SHIRAZI, Nasir Makarim. Principios Basicos del Pensamiento Islamico. (Vol. IV: Justicia Divina). Tehran, Bonyad Be‘zat, 1987. STRAUSS, Mark L. How to Read the Bible in Changing Times: understanding and applying God’s word today. Grand Rapids, Baker Books, 2011. UNTERMAN, Alan. (ed.). Dicionário Judaico de Lendas e Tradições. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 1992. WILSON, Marvin R. Our Father Abraham: Jewish Roots of the Christian Faith. Grand Rapids, Wm. B. Eerdmans Publishing Company / Dayton, Center for Judaic-Christian Studies, 1989. YOUNGBLOOD, Ronald F. The Heart of the Old Testament: a survey of key theological themes. Grand Rapids, Baker Book House, 1998. ZENGER, Erich et al. Introdução ao Antigo Testamento. [trad. Werner Fuchs]. São Paulo. Edições Loyola, 2003. 27