Fundamentos Teóricos sobre Grupos
1) Alguns dos autores mais importantes para o desenvolvimento da terapia de grupo incluem J. Pratt, Freud, J. Moreno e K. Lewin.
2) A dinâmica de grupo envolve processos psicológicos como identificação, liderança e forças coesivas e disruptivas.
3) Teóricos como Foulkes, Pichon Rivière e Bion contribuíram com novos conceitos para a compreensão da terapia e dinâmica de grupo.
1. Z'7lc Zimerman,DavidE.
Comotrabalhâmoscolììgruìlis. D:Lirl E.ZtncfiÌì:1._..L:iz Ciìrìos
Osorio...[ct.al] - PorloAl.cr. : .Írs Íédì.â!. I99:.
l. TécnicaspsicoteÍápir$.L Oorio.L.C. IL TÍLrìo
cDU 615.85r
Câtalogaçlionapublicâção:Íôn i( r BaììcjoCanlo- CRB l0/ 1023
ISBN357:07-212-2
2. DAVID E. ZIMER]VIAN
LUIZ CARLOSOSORiO
H COLABORAI)ORES
COMO TRABALHAMOSCOM
GRUPOS
PORTOALEGRE,I997
õs-?,
-ã-
3. Sumário
Pref4nin
Clqudio M. Martins
PrÁìnon
Davìd E. Zímerman
PARTE1- REVISÃO GERAL SOBR-EGRUPOS
I Fundamentosteóricos ........................23
David E. Zimerman
2 Fundamentostécnicos.......... ...............33
Dqvid E. Zimerman
3 Atributosdesejáveisparaum coordenadordegrupo..............................41
David E. Zímemun
4 A famíliacomogrupoprimordial.................. ...............49
LuizCarLosOsorío
5 Gruposespontâneos:asturmâseganguesdeadolescentes....................59
David E. Zímerman
ó Processosobstrutivosnossistemassociais,nosgrupose
nasinstituições. .........69
LuízCarlosOsorío
7 Classificaçãogerâldosgrupos............... .......................75
David E. Zimerman
8 Comosupervisionamosemgrupoterapia ......................83
LuizCarlosOsorio
PARTE2 - PRÁTICA COM GRUPOSOPERATIVOSE PSICOTER(PICOS
9 Comoagemosgruposoperativos?...................... .........95
JaníceB. Fiscmann
l0 Gruposcomunitários..... ....................l0l
Salv,adorCelia
4. 11 Gruposdeauto-ajuda.... ....................107
CarlosA.S.M.de Barros
12 Comoagemosgruposterapêuticos?.................. ........119
David E. Zìmennan
13 Grupoterapiapsicânalítica ................12
Davìd E. Zimernnn
L4 Psicanálisecompartilhada:atualização........ ...............143
Gerqrdo Steín
15 Grupoterapiadasconfiguraçõesvinculares ................15
WaldemarJoséFernandes
16 Laboratórioterapêutico......... ............161
FrancíscoBapÍistaNeto
17 Psicodrama. .............16
NedíoSeminotti
PARTE3. PRÁTICACOM GRUPOSESPECIAIS
18 Grupoterapiacompacientessomáticos:25 anosdeexperiência..........185
Júlio de Mello Filho
19 Gruposcomportadoresdetranstomosalimentares..............................
RubénZukerfeld
20 Grupoterapiaparaalcoolistas. ...........219
Sérgio de Paula Ramos
2l Gruposcomdrogadictos ...................2
SílvíaBrasiliqno
22 Grupocomdeprimidos .....................2
Gilberto Brofman
23 Gruposcomautistas...... ..............,.....2
SoniMariq dosSantosLewis
VivianeCostade Leon
24 Psicoterapiacompacientesintemadoseegressos...,..........................
JoséOnildo B. Contel
PARTE4. PRT(TICACOM GRTJPOSNA ÁREÁ DE FAMÍLIA
25Ocasal:umaentidadepsicanalítica......... ...................28
Janine Puseí
xvlIl
5. 26A famíliacomogrupoe o gnÌpocomofamíIia.....................................293
.lí. Cristitú Ravazzolct
SusanaBarilari
GastórtMazieres
Gruposcomgestantes .......................305
Geraldiv RantosViçosa
Gruposcomcrianças............. ............311
RuthBlay Levislq
.....321
LuizCarlosOsorio
Gruposcomidosos...................................................
Guite L Zimerman
PARTE5 - PRÂTICA COM GRUPOSNA AREA DO ENSINOE DA
APRENDIZAGEM
27
28
t0
30 ............331
LuizCarlosllLafontCoronel
32 Gruposdeeducaçãomédicâ...
David E. Zímerman
33 O trabalhocomgnìposnaescoIa........... .....................359
JoséOuoniOuteiral
J4 Gruposdeorientaçãoprofissionalcomalunosadolescentes................373
Aidê Knijník Wainberg
PARTE6 - PRÁTICA COM GRUPOSNA ÁREA INSTITUCIONAL
35 Terapiainstitucional.............. ............389
Luiz Cqrlos Osorio
36 Formaçãodelíderes:o grupoé o fórumadequado...............................399
Mauro Nogueírade Olíveíra
37Atendimentoagruposeminstituições.. ......................405
Neidí MargarethSchneider
38 Laboratório:exercíciodaautoridade,modeloTavistok.......................413
Neidí Margareth Schneíder
Luiz Carlos Osorío
Mauro Nogueira de Olìveira
Mônica GuazellíEstrougo
Epílogo............ .............421
LuizCarlosOsorio
7. FundamentosTeóricos
DAVIDE,ZIMERMAN
Coerentecomaproposiçãogeraldestelivro,queéademanterumasimplificaçãode
naturezadidáticadosassuntospertinentesaosgrupos,opresentecapítulovaiabordar
unicamentealgunsaspectosquefundamentama teoria- tendo-seem vistaa sua
aplicabilidadeprática-, sema menorpretensãode esgotarou de explorartodaa
complexidadedeumaprofundamentoteóricoqueadinâmicadegrupopermite,pro-
piciaemerece.
Inicialmente,a fim desituaro leitorqueaindanãoestejamuitofamiliarizado
coma áreadegrupos,mencionaremosefaremosumabrevereferênciaa algunsdos
autoresmaiscitadosnaliteraturaequemaiscontribuíramparaodesenvolvimentodo
movimentogrupalista.A seguir,seráfeitaumanecessáriarevisãoacercadaconce!
tuaçãodegrupoe,porúltimo,umaabordagemdosaspectospsicológicoscontidosna
dinâmicadocampogrupal.
ALGUNS AUTORES IMPORTANTES
J. Pratt. Asgrupoterapiasestãocomemorandoo seuprimeirocentenríriodeexistên-
cia.Issosedeveaofatodequeainauguraçãodorecursogrupoteriípicocomeçoucom
estetisiologistaamericanoque,apartirde1905,emumaenfermariacommaisde50
pacientestuberculosos,criou,intüitivamente,o métodode "classescoletivas",as
quaisconsistiamemumaaulaprévia,ministradaporPratt,sobreahigienee ospro-
blemasdatuberculose,seguidadeperguntasdospacientese dasualivre discussão
comomédico.Nessasreuniões,criava-seumclimadeemulação,sendoqueospacien-
tesmaisinteressadosnasatividadescoletivase naaplicaçãodasmedidashigieno-
dietéticaserampremiadoscomo privilégiodeocuparasprimeirasfilasda salade
aula.
Essemétodo,quemostrouexcelentesresultadosnaaceleraçãodarecuperação
físicadosdoentes,estábaseadona identificaçãodessescomo médico,compondo
umaestruturafamiliar-fratemaleexercendooquehojechamamos"funçãocontinen-
te"dogrupo.Pode-sedizerqueessaseconstituinaprimeiraexperiênciagmpoterápica
registradana literaturaespecializadae que,emboratenhasidorealizadaembases
empíricas,serviucomomodeloparaoutrasorganizaçõessimilares,como,porexem-
plo,adaprestigiosa"AlcoólicosAnônimos",iniciadaem1935equeaindaseman-
témcomumapopularidadecrescente.Damesmaforma,sentimosumaemoçãofasci-
nantequesentimosaopercebermosquenaatualidadeaessênciadovelhométodode
8. 24 . ZMERìaAN&osoRlo
Pratt estásendorevitalizadae bastanteaplicadajustamenteonde ela começou,ou
seja,no campo da medicina,sob a forma de gruposhomogêneosde auto-ajuda,e
coordenadapor médicos(ou pessoaldo corpodeenfermagem)não-psiquiatras.
Freud. Emboranuncatenhatrabalhadodiretamentecom grupoterapias,Freud
trouxevaliosascontribuiçõesespecíficasà psicologiadosgruposhumanostantoim-
plícita (petosensinamentoscontidosem toda a suaobra) como também explicita-
mente,atravésde seus5 conhecidostrabalhos:As perspectivasfuturas da terapêu-
tica psicanalítica (1910),Totetne tabu (1913),Psicologiadas massase aruilisedo
ego(1921),Ofuturo de uma ilusdo (1927)e Mal-estar na civilização (1930).
Jáno trabalhode 1910,Freudrevelaumadesuasgeniaisprevisõesaoconceber
que"... o êxito que1 terapiapassaa ter no indivíduo haverádeobtêla nacoletivida-
de". Em Toteme tabu, aÍravésdo mito da hordaselvagem,ele nos mostraque,por
intermédiodoinconsciente,a humanidadetransmiteassuasleissociais,assimcomo
estasproduzema cultura.No entanto,o seutrabalhode 1921ê consideradocomo
particularmenteo mais importanteparao entendimentoda psicodinâmicados gru-
pos,eneleFreudtrazasseguintescontribuiçõesteóricas:umarevisãosobreapsicolo-
giadasmultidões;osgrandesgruposartificiais(igrejae exército);osprocessosiden-
tificatórios(projetivoseintrojetivos)quevinculamaspessoaseosgrupos;aslideranças
e asforçasqueinfluem nacoesãoe nadesagregaçãodosgrupos.Nessemesmotraba-
lho, Freud pronunciaa suaclássicaâfirmativa de que "a psicologia individual e a
socialnão diferem em suaessência",bemcomo apontaparaasforçascoesivase as
disruptivasquejuntam e separamos indivíduosdeum grupo.Estaúltima situaçãoé
ilustradapor Freud com uma metáforaque ele tomou emprestadado filósofo
Schopenaueqa qual aludeà idéia de uma manadade porcosespinhos,no invemo,
procura sejuntar em um recíprocoaconchegoaquecedor;no entanto,a excessiva
aproximaçãoprovocaferimentosadvindosdosespinhose forçauma separàção,num
contínuoe interminávelvaivém.
J. Moreno. Em 1930,estemédico romenointroduziu a expressão"terapia de
grupo".O amordeMorenopeloteatro,desdeasuainfância,propiciouautrlizaçãoda
importantetécnicagrupaldopsicodrama,bastantedifundidoepraticadonaatualidade.
K, Lewin. A vertentesociológicado movimentogrupalistaé fortementeinspi-
radaem KuÍ Lewin, criadordaexpressão"dinâmicadegrupo", com aqual elesubs-
tituiu o conceitode "classe"pelo de "campo". Desde 1936,sãorelevantesos seus
estudossobrea estruturapsicológicadasmaioriase dasminorias,especialmenteas
judaicas.Da mesmaformasãoimportantesassuasconcepçõessobreo "campogrupal"
e a formaçãodospapéis,porquantoele postulavaquequalquerindivíduo, por mais
ignoradoqueseja,fazpartedo contextodo seugruposocial,o influenciae é por este
fortementeinfluenciadoe modelado.
S,H.Foulkes. Este psicanalistabritânico inauguroua prática da psicoterapia
psicanalíticadegrupo a partir de 1948,em Londres,com um enfoquegestáltico,ou
seja,paraeleum gruposeorganizacomouma novaentidade,diferenteda somados
indivíduos,e, por essarazão,asinterpretaçõesdo grupoterapeutadeveriamsersem-
predirigidasàtotalidadegrupal.FoulkesintroduziuumasériedeconceitoseposnÌlados
que serviramcomo principal referencialde aprendizagema sucessivasgeraçõesde
grupoterapeutas,sendoconsideradoo lídermundialdapsicoterapiaanalíticadegru-
DO.
9. COMOIRABAL}IAMOsCOMARUPOS . 25
Pichon Rivière. Trata-sede um psicanalistaargentinoaltamenteconceituado,
tendo se tornadoo grandenome na áreados gruposoperativos,com contribuições
originais,mundialmenteaceitase praticadas.Esteautor,partindodo seu"esquema
conceitual-referencial-operativo"(ECRO),aprofundouo estudodos fenômenosque
surgemnocampodosgruposequeseinstituemparaa finalidadenãodeterapia,mas,
sim, a de operarnumadeterminadatarefaobjetiva,como,por exemplo,a de ensino-
aprendizagem.A partir daspostulaçõesde PichonRivière, abriu-seum vasto leque
de aplicaçõesde gruposoper'Ìtivos,asquais,com algumasvariaçõestécnicas,são
conhecidaspor múltiplase diferentesdenominações.
W.R.Bion.Duranteadécada40,esteeminentepsicanalistadasociedadebritânica
depsicanálise- fortementeinfluenciadopelasidéiasdeM. Klein,comquemseana-
lisavanaépoca-, partindodesuasexperiênciascomgruposrealizadasemum hospi-
tal militar durantea SegundaGuerraMundial, e na Tavistock Clinic, de Londres,
criou e difundiu conceitostotalmenteoriginaisacercadadinâmicado campogrupal.
Entreassuascontribuiçõesvaledestacara suaconcepçãodequequalquergru-
po semovimentaem doisplanos:o primeiro,queeÌedenomina"grupodetrabalho",
operano planodo conscientee estávoltadoparaa execuçãodealgumatarefa;subja-
centea esseexisteem estadolâtente,o "grupo depressupostosbásicos",o qual está
radicadonoinconscientee suasmanifestaçõesclínicascorrespondemaum primitivo
atavismodepulsõese defantasiasinconscientes.Bion formulou trêstipos de supos-
tosbásicos:o dedependência(exigeum lídercarismáticoqueinspirea promessade
proverasnecessidadesexistenciaisbásicas),o de/ata efuqa (denafireza,paranóide,
requeruma liderançadenaturezatirânicaparaenfrentaro supostoinimigo ameaça-
dor) e o de apareaìnento(tambémconhecidocomo "acasalamento",aludeà forma-
çãodeparesno grupoquepodemseacasalare gerarum messiassalvador;portanto,
é um supostoinconscienteque,para se manter,exige um líder que tenhaalgumas
característicasmísticas).Além disso,Bion contribuiu bastanteparao entendimento
darelaçãoqueum indivíduoportadordeidéiasnovas(queelechamade"místico" ou
"gênio") travacom o establishnlentno qualeleestáinserido.EstaúÌtima concepção
tem sereveladode imprescindívelimportânciaparaa compreensãodos problemas
quecercamasinstituições.
PelaimportânciaqueBion representaparao movimentogrupalista,vale a pena
mencionaralgunsdosaspectosqueelepostulou:
. O grupoprecedeaoindivíduo, istoé, asorigensdaformaçãoespontâneade gru-
postêm suasraízesno grupoprimordial,tipo ahordaselvagem,tal comoFreuda
menclonou.
. Os supostosbásicosantesaludidosrepresentamum atavismodo grupoprimitivo
queestáinseridonamentalidadee naculturagrupal.
. A culturagrupalconsistenapermanenteinteraçãoentreo indivíduo e o seugru-
po,ou seja,entreo narcisismoe o socialismo.
. No plano tran;-subjetivo,esteatavismogrupal aparecesob a forma de mitos
grupais,comosão,por exemplo,osmìtosdeEden(DeusversasConhecimento,
sobameaçasdepunição);Babel(DeusversrsConhecimento,atravésdoestabele-
cimentodeconfusão);Esfinge(temo Conhecimento,porémlutapelonão-conhe-
cimento,tal como aparecena clássicasentença"decifra-meou te devoro",ou,
"medevoro(suicídio)semedecifrares");Edipo(castigadopelacuriosidadeano-
santee desafiadora).
10. 2ó . zlltERrlÂN& osoRlo
. Organizâçãodacultura,atravésda instituiçãode normas,Ìeis,dogmas,conven-
çõese um código de valoresmoraise éticos.
. O modeloqueBion propôsparaa relaçãoqueo indivíduotemcom o grupoé o da
relaçãocontinente-conteúdo,a qual compoÍa trêstipos:parasitiírio,comensale
simbiótico.
. A relaçãoql'l.eo establÌshmeÌrÍmantémcom o indivíduo místico, sentidocomo
um ameçadorportadordeidéiasnovas,adquireumadessasformas:simplesmen-
te o expulsam,ouignoram,oudesqualificam,ouco-optamatravésdaatribuição
de funçõesadministrativas,ou ainda,decorrido algum tempo, adotamas suas
idéias,porémdivulgam-nascomo seelastivessempartidodos pró-homensda
cúpuladiretiva.
. A estruturaçãodequalquerindivíduo requera suaparticipaçãoem grupo.
EscolaFrancesa.Na décadade60,começama surgirostrabalhossobreadinâ-
micadosgruposcomum novoenfoque,a partirdostrabalhosdospsicanalistasfran-
cesesD. Anzieue R. Kàes,osquais,retomandoalgunsdospostuladosoriginaisde
Freud, propõem o importanteconceitode "aparelhopsíquico grupal", o qual está
dotadodasmesmasinstânciasqueo psiquismoinconscienteindividl:al,masnãodos
mesmosprincípiosdefuncionamento.Comasconcepçõesteóricasdessesdoisauto-
res,o edifício que abrigaas grupoterapiascomeçaa adquirir alicercesreferenciais
específicose representaumatentativano sentidodeasgrupoterapiasadquiriremuma
identidadeprópria.
EscolaArgentina. OsnomesdospsicanalistasargentinosL. Grinberg,M. Langer
e E. Rodriguéjá sãobastanteconhecidos,porquantoo seu livro Psicoterapiadel
grupo tornou-seumaespéciedebíblia paraalgumasgeraçõesdegrupoterapeutasem
formação.Na atualidade,é necessáriodestacar:GeraldoStein,com assuasconcep-
çõesoriginaisa respeitodo que ele denomina"psicanálisecompartida";Rubén
Zuckerfeld,com assuasimportantescontribuiçõesnautilizaçãodetécnicasgrupais
no atendimentoa pacientesportadoresde transtornosde alimentação;e grupo de
autoresargentinos- no qual, entreoutros,pontifica o nome de JaninePuget- que
vêmestudandoe divulgandoa modema" psicanálisedasconfiguraçõesvinculares",
notadamentecom casais,famíliase grupos.
Brasil. No Brasil,a psicoterapiadegrupode inspiraçãopsicanalíticateveco-
meçocomAlcion B. Bahia;outrosnomesimportantesepioneirossãoosdeWalderedo
Ismaelde Oliveirae WemerKemper,no Rio deJaneiro;BernardoBlay Neto,Luis
Miller de Paivae OscarRezendede Lima, em SãoPaulo,e Cyro Martins,David
Zimmermann e Paulo Guedes,em Porto Alegre. Na atualidade,há no Brasil uma
sériedepessoas,emdiversase múltiplasáreas,trabalhandoativamenteem buscade
novoscaminhose deumaassistênciamaisamplae abrangentecom a aplicaçãodos
recursosda dinâmicagrupal.
coNcErTUAçAODEGRUPO
O ser humanoé gregáriopor nâturezae so.Ienteexiste,ou subsiste,em função de
seusinter-relacionamentosgrupais.Sempre,desdeo nascimento,o indivíduopartici-
pa de diferentesgÍupos,numaconstantedialéticaentrea buscade suaidentidade
individuale a necessidadedeumaidentidadesruDâle social.
11. COMOI'RÂBALHAMOSCOMORUPO5
'
27
Um conjuntode pessoasconstituium grupo, um conjuntode gruposconstitui
uma comunidadee um conjuntointerativodascomunidadesconfigurauma socieda-
de.
A importânciado conhecimentoe autilizaçãodapsicologiagmpal decorrejus-
tamentedo fato de que todo indivíduo passaa maior parte do tempo de sua vida
convivendoe interagindocom distintosgrupos.Assim,desdeo primeiro gruponatu-
ral que existeem todasasculturas- a família nuclear,ondeo bebêconvive com os
pais,avós,irmãos,babá,etc.,e, a seguir,passandopor creches,escolasmaternaise
bancosescolares,alémdeinúmerosgruposdeformaçãoespontâneae oscostumeiros
cursinhosparalelos-, acriançaestabelecevínculosdiversificados.Taisgrupamentos
vão serenovandoe ampliandonavida adulta,com a constituiçãodenovasfamíliase
de gruposassociativos,profissionais,esportivos,sociais,etc.
A essênciade todo e qualquerindivíduo consisteno fato dele serportadorde
um conjuntode sistemas:desejos,identificações,valores,capacidades,mecanismos
defensivose, sobretudo,necessidadesbásicas,como a da dependênciae a de ser
reconhecidopelosoutros,com os quaisele é compelidoa conviver.Assim, como o
mundointerior e o exteriorsãoa continuidadeum do outro,damesmaforma o indi-
vidual e o social não existem separadamente,pelo contrário, eles se diluem,
interpenetram,complementame confundementresi.
Com basenessaspremissas,é legítimo afirmar que todo indívíduoé um grupo
(na medidaem que,no seumundo interno,um grupo de personagensintrojetados,
comoospais,irmãos,etc.,convivee interageentresi),damesmamaneiracomotodo
grupo pode comportar-secomouma individualidade(inclusivepodendoadquirir a
uniformidadedeuma caracterologiaespecíficae típica,o quenos levamuitasvezes
a referir determinadogrupocomo sendo"um grupoobsessivo",ou "atuadoÍ", etc.).
É muito vaga e imprecisaa definição do termo "grupo", porquantoele pode
designarconceituaçõesmuito dispersasnum amplolequede acepções.Assim, a pa-
lavra "grupo" tantodefine,concretamente,um conjuntodetrêspessoas(paramuitos
autores,umarelaçãobipessoaljáconfiguraumgrupo)comotambémpodeconceihrar
umafamflia, uma turmaou ganguedeformaçãoespontânea;umacomposiçãoartifi-
cial de grupos como, por exemplo, o de uma classede aula ou a de um grupo
terapêutico;uma fila de ônibus;um auditório;umatorcidanum estádio;uma multi-
dão reunidanum comício, etc. Da mesmaforma, a conceituaçãode grupo pode se
estenderatéo nível deuma abstração,como seriao casodeum conjuntodepessoas
que,compondouma'audiência,estejasintonizadonum mesmoprogramade televi-
são;ou pode abrangeruma nação,unificadano simbolismode um hino ou de uma
bandeira,e assimpor diante.
Existem,portanto,gruposde todosos tipos, e uma primeira subdivisãoque se
faz necessáriaé a que diferenciaos grandesgrupos(pertencemà iíreada macro-
sociologia)dos pequenosgrupos(micropsicologia).No entanto,vale adiantarque,
em linhasgerais,osmicrogrupos- comoé o casodeum grupoterapêutico- costu-
mam reproduzir,em miniatura,ascaracterísticassócio-econômico-políticase adinâ-
mica psicológicados grandesgrupos.
Em relaçãoaosmicrogrupostambémseimpõe uma necessáriadistinçãoentre
grupo propriamenÍedito e agrupamento.Por "agrupamento"entendemosum con-
junto depessoasqueconvivepartilhandodeum mesmoespaçoe queguardamentre
si uma certavalênciade inter-relacionamentoe uma potencialidadeem virem a se
constituir como um grupopropriamentedito. Podeservir de exemploa situaçãode
uma "serialidade"depessoas,comono casodeumafila àesperadeum ônibus:essas
pessoascompartemum mesmointeresse,apesardenãoestarhavendoo menorvíncu-
12. 28 . ZMERMAN&(xoRlo
lo emocionalentreelas,atéqueum determinadoincidentepodemodificartodaa
configuraçãogrupal.Umoutroexemploseriaasituaçãodeumasériedepessoasque
estãoseencaminhandoparaumcongressocientífico:elasestãopróximas,mascomo
nãoseconheceme nãoestãointeragindoelasnãoformammaisdoqueumagrupa-
mento,atéqueumpoucomaisadiantepodemparticipardeumamesmasaladedis-
cussãoclínicaeseconstituíremcomouminterativogrupodetrabalho.Pode-sedizer
quea passagemdacondiçãodeum agrupamentoparaa de um gnrpoconsistena
transformaçãode"interessescomuns"paraade"interessesemcomum".
O que,então,caracterizaum grupopropriamentedito?Quandoo grupo,quer
sejadenaturezaoperativaou terapêutica,preencheasseguintescondiçõesbásicas
mínimas,estácaracterizado:
. Um gruponãoéummerosomatóriodeindivíduos;pelocontrário,eleseconsti-
tui comonovaentidade,comleise mecanismosprópfiose específicos.
. Todososintegrantesdogrupoestãoreunidos,faceaface,emtomodeumatarefa
edeumobjetivocomunsaointeressedeles.
. O tamanhodeumgruponãopodeexcedero limitequeponhaemriscoa indis-
pensávelpreservaçãodacomunicação,tantoavisualcomoaauditivaeaconceitual.
. Devehaverainstituiçãodeumenquadre(seÍing)eocumprirnentodascombina-
çõesnelefeitas.Assim,alémdeterosobjetivosclaramentedefinidos,o grupo
develevaremcontaapreservaçãodeespaço(osdiase o localdasreuniões),de
tempo(horiários,tempodeduraçãodasreuniões,planodeférias,etc.),eacombi-
naçãodealgumasregrase outrasvariáveisquedelimiteme normatizema ativi-
dadegrupalproposta.
. O grupoéumaunidadequesecomportacomoumatotalidade,e vice-versa,de
modoque,tãoimportantequantoo fatode eleseorganizara serviçode seus
membros,é tambéma recíprocadisso-Cabeumaanalogiacoma relaçãoque
existeentreaspeçasseparadasdeumquebra-cabeçase destecomo todoa ser
arÍnado.
. Apesardeumgruposeconstituircomoumanovaentidade,comumaidentidade
grupalprópriaegenuína,étambémindispensávelquefiquemclaramentepreser-
vadas,separadamente,asidentidadesespecíficasdecadaurndosindivíduoscom-
ponentesdogrupo.
. EmtodogrupocoexistemduasforçascontraditóriaspeÍmanentementeemjogo:
umatendenteàsuacoesão,e aoutra,àsuadesintegração.
. A dinâmicagrupaldequalquergruposeprocessaemdoisplanos,tal comonos
ensinouBion:um é o da intencionalidadeconsciente(grupode trabalho),e o
outroéo dainterferênciadefatoresinconscientes(grupodesupostosbásicos).É
claroque,naprática,essesdoisplanosnãosãorigidamenteestanques,pelocontrá-
rio,costumahaverumaceÍa flutuaçãoesuperposiçãoentreeles.
. É inerenteàconceituaçãodegrupoaexistênciaentreosseusmembrosdealguma
formadeinteraçãoafetiva,aqualcostumaassumirasmaisvariadase múltiplas
formas.
Nosgmpossemprevaiexistirumahierárquicadistribuiçãodeposiçõesedepa-
péis,dedistintasmodalidades.
É inevitávelaformaçãodeumcampogrupaldinâmico,emquegravitamfantasi-
as,ansiedades,rnecanismosdefensivos,funções,fenômenosresistenciaisetrans-
ferenciais,etc.,alémdealgunsoutrosfenômenosquesãopróprioseespecíficos
dosgrupos,talcomopretendemosdesenvolvernotópicoquesegue.
13. coMo TRÂaALHAIVÍOScoM CRUPOS . 29
O CAMPO GRUPAL
Como mencionadoanteriormente,em qualquergrupoconstituídosefonna um cam-
po grupaldinâmico,o qual secomportacomoumaestruturaquevai alémda somade
seuscomponentes,da mesmaforma como uma melodia resultanão da somadas
notasmusicais,mas,sìm,dacombinaçãoe do arranjoentreelas.
Essecampoé compostopor múltiplos fenômenose elementosdo psiquismoe,
comotrata-sedeumaestrutura,resultaquetodosesteselementos,tantoosintracomo
osinter-subjetivos,estãoarticuladosentresi, detal modoquea alteraçãodecadaum
delesvai repercutirsobreos demais,em uma constanteinteraçãoentre todos. Por
outrolado,o campogrupalrepresentaum enormepotencialenergéticopsíquico,tudo
dependendodo vetor resultantedo embateentreasforçascoesivase asdisruptivas.
Tambémé útil realçarque,emboraressalvandoasóbviasdiferenças,em suaessên-
cia, asleis da dinâmicapsicológicasãoasmesmasem todosos grupos.
Como um esquemasimplificado,valedestacaros seguintesaspectosque estão
alivamentepresentesnocampogrupal:
. Uma permanenteinteraçãooscilatóriaentreo grupode trabalhoe o de supostos
básicos,antesdefinidos.
. Umapresençapermanente,manifesta,disfarçadao oculta,depulsões-libidinais,
agressivasenarcisísticas- quesemanifestamsobaformadenecessidades,dese-
jos, demandas,inveja e seusderivados,ideais,etc.
. Da mesmafoma, no campogrupal ctrcúam ansiedades- asquaispodemserde
naturezapersecutória,depressiva,confusional, aniquilamento,engolfamento,
perdadeamorou a decastração- queresultamtantodosconflitos intemoscomo
podem emergir em função das inevitáveis,e necessárias,frustraçõesimpostas
pelarealidadeexterna.
. Por conseguinte,paracontrarrestara essasansiedades,cadaum do grupo e esse
comoum todomobilizammecanismosdefensivos,quetantopodemserosmuito
primitivos (negaçãoe controle onipotente,dissociação,projeção, idealizaçío,
defesasmaníacas,etc.) como tambémcirculam defesasmais elaboradas,a re-
pressão,deslocamento,isolamento,formaçãoreativa,etc.Um tipo dedefesaque
devemerecerumaatençãoespecialporpartedocoordenadordogrupoé a quediz
respeitoàsdiversasformasdenegaçãodecertasverdadespenosas.
. Em particular,paraaquelesquecoordenamgrupoterapiaspsicanalíticas,é neces-
sárioressaltarqueapsicanálisecontemporâneaalargoua concepçãodaestrutura
damente,emrelaçãoàtradicionalfórmulasimplistadoconflito psíquicocentrado
no embateentreaspulsõesdold versasasdefesasdoegoe aprolÏsiçáodosuperego-
Na ahralidade,os psicanalistasaplicamna práticaclínica os conceitosde: ego
anxiliar (ê uma parte do superegoresultanteda introjeção,sem conflitos, dos
necessáriosvaloresnormativose delimitadoresdospais);ego recl (conesponde
aoqueo sujeitoreolmenteé emcontraposiçãoaoqueeleimaginaser);egoideal
(herdeirodireto do narcisismo,correspondea uma perfeiçãode valoresque o
sujeitoimaginapossuir,porém,defato,o sujeitonãoospossuie nemtem possi-
bilidadesfuturasparatal, masbaseiaa suavida nessacrença,o que o leva a um
constanteconflito com a realidadeexterior); ideal do ego (o sujeitofica prisio-
leiro dasexpectativasideaisque os paisprimitivos inculcaramnele); alÍer-ego
(é uma partedo sujeitoqueestáprojetadaem uma outrapessoae que,portanto.
representaseÍum "duplo" seu);contrã-ego( é uma denominaçãoqueeu propo-
nho paradesignarosaspectosque,desdedentrodo sefdo sujeito,organizam-se
14. 30 . znasru.aeNaosor.ro
deformapatológica,e agemcontraascapacidadesdo próprioego.Comofica
evidente,asituaçãopsicanalíticaâpaÍir destesreferenciaisdaestruhrradamen-
te ganhouemcomplexidade,porémcomissotambémganhouumariquezade
horizontesdeabordagemclínica,sendoqueagrupoterapiapsicanalíticapropicia
o surgimentodosaspectosantesreferidos.
Umoutroaspectodepresençaimportantenocampogmpaléo surgimentodeum
jogoativodeidentirtcações,tantoasprojetivascomoasintrojetivas,ouatémes-
moasadesivas.O problemadasidentificaçõesavultadeimportâncianamedida
emqueelasseconstituemcomoo elementoformadordosensodeidenúdade.
A comunicação,niassuasmúltiplasformasdeapresentação- asverbaiseasnão-
verbais-, representaumaspectodeespecialimportâncianadinâmicadocampo
grupal.
Igualmente,odesempenhodepapáis,emespecialosqueadquiremumacaracte-
ística derepetiçãoestereotipada- como,porexemplo,o debodeexpiatório-, é
umaexcelentefontedeobservaçãoemanejoporpartedocoordenadordogrupo.
Cadavezmaisestásendovalorizadaa formacomoos vínculos(deamor,ódio,
conhecimentoe reconhecimento),nocampogrupal,manifestam-see articulam
entresi, querno planointrapessoal,no interpessoalou aténotranspessoal.Da
mesmamaneira,háumafortetendênciaemtrabalharcomasconfiguraçõesvin-
cularcs,tal comoelasaparecemnoscasais,famílias,grupose instituições.
No campogrupal,costumaaparecerum fenômenoespecíficoe típico:a resso-
nâncìa,qu.e,comoo seunomesugere,consistenofatodeque,comoumjogode
diapasõesacústicosoudebilhar,acomunicaçãotrazidaporummembrodogru-
po vai ressoaremum outro;o qual,por suavez,vai transmitirum significado
afetivoequivalente,aindaque,Fovavelmente,venhaembutidonumanaÍrativa
deembalagembemdiferente,eassimpordiante.Pode-sedizerqueessefenôme-
noequivaleaoda"livreassociaçãodeidéias"queacontecenassituaçõesindivi-
duaiseque,porissomesmo,exigeumaatençãoespecialporpartedocoordena-
dordogrupo.
O campogrupalseconstituicomoumagaleriadeespelftos,ondecadaumpode
refletir e serrefletidonos,epelos outros.Particularmentenosgrupospsicotera-
pêuticos,essaoportunidadedeencontrodosefde umindivíduocomo deoutros
configuraumapossibilidadedediscriminar,afirmareconsolidaraprópriaidenti-
dade.
Um grupocoesoebemconstituído,porsi só,tomadonosentidodeumaabstra-
ção,exerceumaimportantíssimafunção,qualseja,a deserum continentedas
angrístiase necessidadesdecadaum e detodos-Issoadquireumaimportância
especialquandosetratadeumgrupocompostoporpessoasbastanteregressivas.
Apesardetodososavançosteóricos,como incrementodenovascorentesdo
pensamentogrupalístico-ê ateoriasistêmicaéumexemplodisso-,aindanãose
podeproclamarqueaciênciadadinâmicadocampogrupaljá tenhaencontrado
plenamentea suaautênticaidentidade,assuasleise referenciaisprópriose ex-
clusivos,porquantoelacontinuamuitopresaaosconceitosquetomouempresta-
dodapsicanáliseindividual.
Creioserlegítimoconjecturarque,indoalémdosfatos,dasfantasiasedosconfli-
tos,quepodemserpercebidossensorialeracionalmente,tambémexistenocam-
po grup;l muitosaipectosqueperÍnanecemocultos,enigmáticose secretos.À
modadeumaconjecturaimaginativa,cabeousardizerquetambémexistealgo
cercadodealgummistério,queanossa"vãpsicologiaaindanãoexplica",masque
muitasvezessemanifestapormelhorasinexplicáveis,ououtrascoisasdogênero.
15. COMOI'RABÂLHAMOSCOMGRUPOS . 31
. Da mesmaforma como, em termosde micropsicologia,foi enfatizadaa relação
do indivíduo com os diversosgruposcom os quais ele convive, é igualmente
relevantedestacar,em termosmacroscópicos,a relaçãodo sujeitocom a cultura
naqual eleestáinserido.Uma afirmativainicial queme pareceimportanteé a de
que o fator sócio-culturalsomentealterao modode agir, masnãoa naturezado
reagir.Explico melhorcomum exemplotiradodaminhapráticacomogrupotera-
peuta,parailustrar o fato de que,diantedeumamesmasituação- a vida genital
deumamulherjovem e solteira- foi vivenciadadeforma totalmentedistintaem
duasépocasdistantesuns vinte anosuma da outra. Assim, na década60, uma
jovem estudantede medicinalevou mais de um ano para "confessar"ao grupo
quemantinhaumaatividadesexuaìcom o seunamorado,devidoàssuasculpase
ao pânico de que sofreriaum repúdio generalizadopela sua transgressãoaos
valoressociaisvigentesnaquelaépoca.Em contrapartida,em um outro grupo,
em fins dadécada80,uma outramoçatambémlevou um longotempoatépoder
poderpartilharcom osdemaiso seusentimentodevergonhae o temordevir aser
ridicularizadae humilhadapor elespelo fato de "ainda sercabaçuda".Em resu-
mo, o modo deagir foi totalmenteoposto,masa natureza(medo,vergonha,cul-
pa, etc.)foi a mesma.Cabetirarmosduasconclusões:uma, é a de que costuma
havero estabelecimentode um conflito entreo ego individual e o ideal de ego
coletivo; a segundaconstataçãoé a dequeo discursodo Outro (paise cultura) é
quedeterminao sentidoe geraa estruturada mente.
. Todosos elementosteóricosdo campogrupalantesenumeradossomenteadqui-
rem um sentidodeexistênciae de validadeseencontraremum ecode reciproci-
dadeno exercícioda técnicae práticagrupal.Igualmente,a técnicatambémnão
podeprescindirda teoria,de maneiraqueambasinterageme evoluemde forma
conjugadae paralela.Pode-seafirmarqueateoriasema técnicavai resvalarpara
uma práticaabstrata,com uma intelectualizaçãoacadêmica,enquantoa técnica
semuma fundamentaçãoteóricacorre o risco de não ser mais do que um agir
intuitivo oupassional.Poressasrazões,nocapítuloquesegue,tentaremosestabe-
leceralgumasinter-Íelaçõesentreâ teoriae a técnicada práticagrupal.
16. FundamentosTécnicos
DAVIDE.ZIMERMAN
Conquantoos fundamentosteóricose as leis da dinâmica grupal que presidemos
grupos,de forma manifestaou latente.sempreestejampresentese sejamda mesma
essênciaem todoseles,é inegávelqueastécnicasempregadassãomuito distintase
variáveis,de acordo,sobretudo,com a finalidadeparaa qual determinadogrupo foi
criado.Em outraspalavras:damesmaformacomotodososindivíduosquenosprocu-
ram- pacientes,por exemplo- sãoportadoresdeuma mesmaessênciapsicológica,
é óbvio que,no casodeum tratamento,paracadasujeitoem especialigualmentevai
sernecessárioum planejamentode atendimentoparticular,com o empregode uma
técnicaadequadaàsnecessidades,possibilidadese peculiaridadesdecadaum deles.
Diante do fato de que existe um vasto polimorfismo grupalísticoe que, por
conseguinte,tambémháumaextensae múltipla possibilidadedevariaçãonasestraté-
gias,técnicase táticas,toma-seimpossívelpretender,em um único capítuÌo,esgotar
oufazerum detalhamentominuciosodetodaselas.Poressarazão,vamosnoslimitar
aenumerar,deformagenérica,osprincipaisfundamentosdatécnica,quedizemrespei
to aocotidianodapráticagrupal,tentandorastreá-losdesdeo planejamentodaforma-
çãodeum grupo,o seufuncionâmentoduranteo cursoevolutivo,procurandoacentu-
aralgumasformasdemanejotécnicodiantedosdiferentesaspectose fenômenosque
surgemno campogrupaldinâmico.
Planejamento. Inicialmente,creio ser útil fazer uma discriminaçãoentre os
conceitosde logística,estratégia,técnicae tritica,termosque,emboraprovindosda
terminologiada áreamilitar, parecem-metambémadequadosao campoda psicolo-
gia.Por logísticaentendemosum conjuntode conhecimentose equipamentose um
lastrode experiênciaque servemde suportepara o planejamentode uma ação(no
caso,o daformaçãodeum grupo).Estratégiadestgnaum estudodetalhadodecomo
utilizar a logísticaparaatingir e alcançarum êxito operativona finalidadeplanejada
(comohipótese,um grupopsicoterápicoparapacientesdeestruturaneurótica).Técnica
serefereaum conjuntodeprocedimentose deregras,deaplicabilidadeprática,e que
fundamentama exeqüibilidadeda operação(na hipóteseque estános servindode
exempÌo,poderiasera utilizaçãode umatécnicade fundamentaçãopsicanalítica).
Tótica aludeàs variadasformas de abordagemexistentes,que, de acordo com as
circunstânciasda operaçãoem cursoe com o estìlopeculiarde cadacoordenador,
emboraatécnicapermaneçaessencialmenteamesma(aindanonossoexemplohipoté-
tico, é a possibilidadede que um grupoterapeutaprefira a interpretaçãoimediatae
sistemáticano "aqui-agora-comigo"datransferência,enquantoum outro grupotera-
peutai,qualmentecapaz,e deumamesmacorrentegrupanalítica,optepelatáticade
17. 34 . ZMERMANsuosoRlo
evitaÍoempregosistemáticoeexclusivodessaformadeinterpretar,comoumatática
capazdecriarum climamaispropíciode acessibilidadeaosindivíduose ao todo
grupal).
Destarte,diantedaresoluçãodecriarecomporumgÍupo,devemosestâraptos
a respondera algumasquestõesfundamentais,comoasseguintes:Quemvai sero
coordenador?(Qualéasualogística,Qualéo seuesquemareferencial?,etc.).PaÍao
quèe paraqualfrnalidadeo grupoestásendocomposto?(E um grupodeensino-
aprendizagem?De auto-ajuda?De.saúdemental?Psicoterápico?Defamília?,etc.).
Paraquemelesedestina?(Sãopessoasqueestãomotivadas?Coincidecomuma
necessidadeporpanedeumconjuntodeindivíduosequeo grupoemplanejamento
poderápreencher?Sãocrianças,adolescentes,adultos,gestantes,psicóticos,empre-
siírios,alunos,etc.?).Comoelefuncionará?(Homogêneoouheterogêneo,abertoou
fechado,comousemco-terapia,qualseráo enquadredonúmerodeparticipantes,o
númerodereuniõessemanais,o tempodeduraçãodasmesmas,seráacompanhado
ounãoporumsupervisor?,etc.).Onde,emquaiscircunstâncias,e comquaisrecur-
sos?(Noconsultórioprivado?Emumainstituiçãoe,nestecaso,temoapoiodacúpu-
la administrativa?Vai conseguirmantera necessáriacontinuidadede um mesmo
locale doshorárioscombinadoscomo grupo?,etc.).
Comoumatentativadesintetizartudoisso,valeafirmarquea primeirareco-
mendaçãotécnicaparaquemvai organizarumgrupoé adequeeletenhaumaidéia
bemclarado quepretendecomessegrupoe decomovai operacionalizaresseseu
intentoicasocontrário,é muitoprovávelqueo seugrupopatinaránumclimade
confusão,deincertezâsedemâl-entendidos.
Seleçãoegrupamento.Osgrupoterapeutasnãosãounânimesquantoaoscrité-
riosdeseleçãodosindivíduosparaacomposiçãodeumgrupo,queressesejaoperativo,
quersejaterapêutico.Algunspreferemaceitarqualquerpessoaquemanifestarum
interesseemparticipardeumdeterminadogrupo,sobaalegaçãodequeospossíveis
contratemposserãoresolvidosduranteo próprioandamentodo grupo.Outros,no
entanto,entreosquaisparticularmentemefilio, preferemadotarumcertorigorismo
naseleção,ancoradosnosargumentosqueseguem:
É muitoimpoÍanteedelicadoo problemadasindicaçõese contra-indicações.
Umamotivaçãopordemaisfrágilacarretaumaaltapossibilidadedeumapartici-
paçãopobreouadeumabandonoprematuro.
Essetipodeabandonocausaummal-estare umasensaçãodefracassotantono
indivíduoquenãoficounogrupocomotambémnocoordenadorenatotalidade
do grupo;alémdisso,esteúltimovai ficar sobrecarregado,aomesmotempo,
comsentimentosdeculpae.comumestadodeindignaçãoporsesentirdesrespeita-
do e violentado,nãounicamentepelointrusoqueteveacessoà intimidadedos
participantesefugou,mastambémcontraanegligênciadocoordenador.
Um outroprejuízopossíveléo dacomposiçãodeuminadequado"grupamento"
(essetermonãotemomesmosignificadode"agrupamento"ealudeaumagestalt,
ouseja,aumavisãoglobalística,àformacomocadaindivíduointeragirácomos
demaisnacomposiçãodeumatotalidadegrupalsingular).
Alémdesses,podemaconteceroutrosincovenientes,comopossibilidadedeum
permanenteestadodedesconfortocontratransferencial,assimcomotambémpo-
democonercertassituaçõesconstrangedorasquando,porexemplo,muitocedo
fica patenteentreaspessoascomponentesum acentuadodesnívelde cultura,
inteligência,patologiapsíquica,etc.
18. collo 1RÂBÂLHAMOSCOÌiÍCRUPOS o 35
Podeservircomoumaexemplificaçãomaiscompletado impoÍanteprocesso
deseleção,particularmenteparaosleitoresmaisinteressadosemgrupoterapiapsica-
nalítica,a exposiçãopresenteno capítuÌoespecífico,naParte2 destelivro.
Enquadre (seÍrng).Umaimportanterecomendaçãodetécnicagrupalísticacon-
sisteno estabelecimentodeum enquadree a necessidadedepreservaçãodo mesmo.
O enquadreé conceituadocomoa somadetodososprocedimentosqueorganizam,
noÍTnatizame possibilitamo funcionamentogrupaÌ.Assim,eleresultadeumacon-
junçãode regras,atitudese combinações,como,por exemplo,o localdasreuniÕes.
os horários,a periodicidade,o planode férias,os honorários(naeventualidadede
quehajaalgumaformade pagamento,a combinaçãodesseaspectodeveficar bem
claro),o númeromédiodeparticipantes,etc.
Todosessesaspectosformam"asregrasdojogo",masnãoojogo propriamente
dito.O.retlirrgnãosecomportacomoumasituaçãomeramentepassiva,pelocontrá-
rio,eleé um importanteelementotécnicoporquerepresentaasseguintese imponan-
tesfunções:
. A criaçãodeum novoespaçoparareexperimentare ressignificarfortese antigas
experiênciasemocionais.
. Uma formadeestabelecerumanecessáriadelimitaçãode papéise de posições,
dedireitose deveres,entreo queé desejávele o queé possível,etc.
. Esteúltimoaspectoganharelevâncianosgruposcompacientesregressivos,como,
por exemplo,os borderline,porquantoelescostumamapresentaruma "difusão
de identidade"por aindanãoestaremclaramentedelimitadasasrepresentações
do sefe dosobjetos;portantoé imprescindívela colocaçãodelimites,tal como
o settÌng pÍopicia.
. O enquadreestásobumacontínuaameaçadevir a serdesvirtuadopelaspressões
oriundasdo interiordecadaum e detodos,soba formadedemandasinsaciáveis,
pordistintasmanobrasdeenvolvimento,pelaaçãodealgumasformasresistenciais
e transferenciais,etc.,e, por issomesmo,o enquadreexigeum manejotécnico
adequado,tendoporbasea necessidadedeleserpreservadoaomáximo.
. Um aspectoquemerecea atençãodo coordenadorserefereaograudeansiedade
noqualo grupovai trabalhar,derraneiraa quenãohajaumaangústiaexcessiva,
porémumafaltatotaldeansiedadedeveserdiscriminadado quepodeestarsen-
do um conformismocom a tarefa,umaapatia.
. Ainda um outroelementoinerenteaoenquadreé o quepodemosdenominar"at-
mosferagrupal",a qualdependebasìcamentedaatitudeafetivaintemado coor-
denador,do seuestilopessoaldetrabalhare do empregode táticasdentrodeum
determinadoreferenciaÌtécnico.
. Osprincipaiselementosa seremlevadosemcontanaconfiguraçãodeum J?/Íilg
grupalsãoosseguintes:
- E um grupohomogêneo(umamesmacategoriade patologia,ou de idade,
sexo,graucultural,etc.)ou heterogêneo(comportavariaçõesno tipo e grau
de doença,no casode um gÍïpo terapêutico;no tipo e nível de formaçãoe
qualificaçãoprofissional,no casode um grupooperativode aprendizado.
etc.)?
- E um grupofechado(umavezcompostoo grupo,nãoentramaisninguém)ou
aberto(semprequehouvervaga,podemseradmitidosnovosmembros)?
- A combinaçãoé a deduraçãolimitada(emreláìçãoaotempoprevistoparaa
existênciadogrupooudapermanêncìamáximadecadaindivíduonessesru-
19. 36 . znamull,c osonro
po, comocomumenteocorrenasinstituições),ou eleserádeduraçãoilimita-
da (comopodeserno casodosgruposabertos)?
- Quantoao númerode participantes,poderávariar desdeum pequenogmpo
com trêsparticipantes- oudois,nocasodeumaterapiadecasal-, ou podese
tratardo grupodenominado"numeroso",quecomportadezenasdepessoas.
- Da mesmaforma, tambémabrigamuma amplagamade variações- confor-
me o tipo e a finalidadedo grupo- outrosaspectosrelevantesdo enquadre
grupal,comoé o casodonúmerodereuniõessemanais(oumensais),o tempo
deduraçãodecadareunião,e assimpor diante.
Manejo das resistências.O melhor instrumentotécnicoqueum coordenador
degrupopodepossuirparaenfrentarasresistênciasquesurgemno campogrupalé o
de ter uma idéiaclarada funçãoqueelasestãorepresentandoparaum determinado
momentodadinâmicadeseugrupo.Assim,umaprimeiraobservaçãoqueseimpõeé
a que diz respeitoà necessidadede o coordenadordiscriminar entreas resistências
inconscientesque de fato são obstrutivase que visam a impedir a livre evolução
exitosado grupo,e aquelasoutrasresistênciasque sãobenvindasao campo grupal,
porquantoestãodandoumaclaraamostragemde comoo sefde cadaum e detodos
aprendeua sedefenderna vida contrao risco de seremhumilhados,abandonados,
não-entendidos,etc.
Da mesmaforma,é útil queo coordenadorpossareconhecercontraquaisansi-
edadesemergentesno grupoumadeterminadaresistênciaseorganiza:é ela denatu-
rezaparanóide?(medoda situaçãonova,denão serreconhecidocomoum igual aos
outrose denãoseraceitopor esses,do riscodevir a passarvergonhae humilhações,
de vir a ser desmascarado,etc.), ou é de naturezadepressiva?(no caso de uma
grupoterapiapsicanalítica,é comumsurgiro medodeenfrentâro respectivoquinhão
deresponsabilidadeoudeeventuaisculpaseo medodeseconfrontarcom um mundo
intemo destruídoe sempossibilidadederepamções,o temordeter que renunciarao
mundodasilusões,etc.,),e assimpor diante.
Nosgruposoperativosemgeral(porexemplo,um grupodeensino-prendizagem),
um critério que o coordenadorpodeutilizar como sinalisadorda presençade resis-
tênciasé quandosucedemexcessivosatrasose faltas,aliadosa um decréscimoda
leiora dos textoscombinados,acompanhadospor uma discussãonão mais do que
moma,caracterizandoum clima de apatia.Um outro sinalpreocupante,porqueinvi-
sível na maioria das vezes,é quandoo grupo elegeos corredorescomo fórum de
debatede sentimentos,idéiase reivindicações.Da mesmaforma, o condutorde um
grupo operativodeveestaralertaparaa possibilidadede que os "supostosbásicos"
estejamemergindoe interferindono cumprimentoda finalidadedatarefado "grupo
de trabalho". Nestesúltimos casos,é recomendávelque o coordenadorda tarefa
operativasolicite ao grupo que façam uma pausana sua tarefa a fim de poderem
entendero queestásepassando.
Ainda emrelaçãoàsresistências,maisduasobservaçõessãonecessáriaseambas
dizem respeitoà pessoado coordenador,qualquerque sejaa naturezado grupo que
eleestáconduzindo.A primeiraé apossibiÌidadedequea resistênciado grupoesteja
representandouma natural,e até sadia,reaçãocontraaspossíveisinadequaçõesdo
cooordenadorna suaforma deconcebere conduziro grupo.A segunda,igualmente
importante,diz respeitoàpossívelformaçãodeum,inconsciente,"conluioresistencial"
entre o coordenadorc os demais,contra o desenvolvimentode certosaspectosda
tarefana qual estãotrabalhando.
20. coMo TRABALHAì!íoScov cnupos . 37
Manejo dos aspectostransferenciais. Da mesmaforma comofoi Íeferido em
relaçãoàs resistências,é necessáriofrisar que, diante do inevitável surgimentode
situaçõestransferenciais,um manejotécnicoadequadoconsisteem reconhecere dis-
criminá-las.Assim, cabeafirmar que o surgimentodeum movimentotransferencial
estámuito longede representarqueestejahavendoa instalaçãodeuma "neurosede
transferência",ou seja,é legítimo dizerqueno carnpogrupal,inclusiveno grupana-
lítïco, há transferênciaemtudo,masnemtudo é transferênciaa ser trabalhada.
No campogrupal,asmanifestaçõestransferenciaisadquiremuma compÌexida-
demaiordoqueno individual,porquantonelesurgemasassimdenominadas"transfe-
rênciascruzadas",queindicamapossibilidadedainstalaçãodequatroníveisdeiransfe-
rênciagrupal: de cadaindivíduo paracom os seuspares,de cadaum em relaçãoà
figura centraldo coordenadorde cadaum parao grupo como uma totalidade,e do
todo grupalem relaçãoaocoordenador.
Um aspectoqueestáadquirindouma crescenteimportânciatécnicaé o fato de
ossentimentostransferenciasnãorepresentaremexclusivamenteumamerarepetição
de antigasexperiênciasemocionaiscom figuras do passado;eles podem também
estarrefletindonovasexperiênciasqueestãosendovivenciadascom apessoareal do
coordenadore cadaum dosdemais.
Em relaçãoaossentimenÍoscontratransferenciais,o impoÍanteéqueo coordena-
dor saibaqueelessãodesurgimentoinevitável;queo segredodoêxitotécnicoconsiste
em nãopermitir queos sentimentosdespertadosinvadama suamente,de modo a se
tomarempatogênicos;pelocontrário,queelespossamseconstituircomo um instru-
mento de empatia;e que, finalmente,o coordenadorestejaatentopara o risco de,
inconscientemente,poderestarenvolvido em algum tipo de "conluio inconsciente"
com o grupo, o qual podeserdenaturezanarcisística,sado-masoquista,etc.
Manejo dosdcÍr'rrgs.Todosostécnicosquetrabalhamcom gruposreconhecem
que a tendênciaao acíing ("a açío") é de cursoparticularmentefreqüente,e que a
intensidadedelescresceráemumaproporçãogeométricacomahipótesedequeindiví-
duos de caracterologiapsicopáticatenhamsido incluídos na sua composição.Do
ponto de vista de ser utilizado como um instrumentotécnico, é necessárioque o
coordenadorreconheçaqueosacllngsrepresentamumadeterminadacondutaquese
processacomouma forma desubstituirsentimentosquenãoconseguemsemanifes-
tar no plano consciente.Isso costumaocorrer devido a uma das cinco condições
s€guintes:quandoosseltimentosre!reladosig:espqndelrygos, fantasiase ansie-
dadesqueestãoreprimidase quenãosãorecoÈladas(como Freudensinou),ou que
nãosãopensadas(segundoBion), ou quenãosãocomunicadaspelaverbalização,ou
quenãoconseguemficar contidasdentrodopróprio indivíduoe,finalmente,o impor-
tanteaspectodequeoacting podeestarfuncionandocomoum recursodecomunica-
çãomuito primitivo.
As atuaçõesadquiremum extensolequedemanifestações;no entanto,o quede
fato mais importaé a necessidadede o coordenadordo gruposaberdiscriminarcom
segurançaquandosetratade actingsbenignos(como é o casodasconversaspré e
pós-reuniões,encontrossociaisentre os participantes,às vezesacompanhadosdos
respectivoscônjuges,ou o exercíciodealgumaaçãotransgressora,masque,no fun-
do, pode estarsignificandouma saudáveltentativade quebraralgunstabuse este-
reotipiasobsessivas)e dequandoseÍaÌz deactingsmalignos,comosão,por exem-
plo, osdenaturezapsicopática.Háumaformadeatuaçãoque,emborasejadeapareci-
mentocomum,apresentaumarepercussãodeletéria,devendo,por isso,serbemtraba-
lhadapelocoordenador:é aqueserefereàdivulgação,parafora dogrupo,dealguma
22. ou de famflia, consistebasicamenteem "ensinar" os participantesa usaremasfun-
çõesde sabereJcrtdr o outro(é diferentede simplesmente"ouvir"), decadaum yer
o outro(édiferentede"olhar"), depoderpensarno queestáescutandoenasexperiên-
ciasemocionaispelasquaiselesestãopassando,e assimpor dianle.
Papéis.Convémenfatizarqueumadascaracteísticasmaisrelevantesqueper-
meiamo campogrupalé a transparênciado desempenhodepapéispor paíe decada
um dos componentes.A importânciadessefenômenogrupalconsisteno fato de que
o indivíduo tambémestáexecutandoessesmesmospapéisnasdiversasáreasde sua
vida- como a familiar, profirssional,social,etc.
Eum deverdocoordenadordogrupoestaratentoàpossibilidadedeestarocorren-
doumafixidez eumaestereotipiadepapéispatológicosexercidossemprepelasmes-
maspessoas,como seestivessemprogramadasparaassimagiremao longo de toda
vida. O melhorexemplodecomoa atribuiçãoe a assunçãodepapéispoderepresen-
tar um recurso técnico por excelência é o que pode ser confirmado pelos
grupoterapeutasdefamíli4 quetãobemconhecemo fenômenodo "pacienteidentifica-
do" (a família elegealguémparaservircomo depositárioda doençaocultadetodos
osdemais)e outrosaspectosequivalentes.
Vínculos. Cadavezmais,os técnicosda áreadapsicologiaestãovalorizandoa
configuraçãoqueadquiremasligaçõesvincularesentreaspessoas.Indo muito além
do exclusivoconflito do vínculodoamor contrao doódia, na atualidade,considera-
semais importantea observaçãoatentadecomo semanifestamasdiferentesformas
deamar,deagrediÍe asinteraçõesentreambas.Além disso,Bion introduziuo impor-
tantíssimovínculodo conhecimento,quepossibilitaum melhormanejotécnicocom
os problemasligados às diversasformas de "negação"que explicam a gênesede
muitosquadrosdepsicopatolgia,assimcomotambémfavoreceaotécnicoumamaior
clarezanacompreensãodacirculaçãodasverdades,falsidadese mentirasno campo
grupal.Particularmente,tenhopropostoaexistênciadeum quartovínculo,o doreco-
nhecimento,atravésdo qual é possívelaocoordenadorpercebero quantocadaindi-
víduonecessita,deformavital, serreconhecidopelosdemaisdogrupocomoalguém
que,defato, pertenceaogrupo (éo fenômenogrupalconhecidocomo "pertencência"),
e tambémaludeà necessidadedequecadarmreconheçaao outro comoalguémque
temo direitodeserdiferentee emancipadodele.
Tendo por baseessesquatro vínculos,e as inúmerascombinaçõese arranjos
possíveisentreeles,a compreensãoe o manejodosmesmostomam-seum excelente
recursotécnicono tratode casais,famílias,gruposou instituições.
Término. Termoquedesignaduaspossibilidades:umaéadequeo grupotermi
ne,ou por umadissoluçãodele,ou paracumprir umacombinaçãopÉvia, como é no
casodosgrupos"fechados";a segundaeventualidadeé a dequedeterminadapessoa
encerrea sua participação,emborao grupo continue,como é no casodos grupos
"abertos".Saberterminar algo,qu.epodeserumatarcfa,um tratamento,um casamento,
etc., representâum significativo crescimentomental. Daí considerarmosque deve
haverpor partedo coordenadorde qualquergrupouma fundamentaçãotécnicaque
possibiliteuma definiçãode critériosde término e um manejoadequadoparacada
situaçãoem particular,semprelevandoem contaa possibilidadedo risco de que os
resultadosalcançadospodemter sidoenganadores.Issovale especialmentepaÍa os
gruposde frnalidadeterâpêutica,emborana atualidadeo grupoterapeutapossacon-
tar com claroscritériosdeum verdadeirocrescimentopsíquico.
coMoTRABALHAMoScov cnuPos . 39
23. 40 . zn.lgwaN E..t.tt
Atributos deum coordenadordegrupo.DecidiincorporaÍestetópicocomo
integrantedafundamentaçãotécnica,porquemepareceimpossíveldissociarumade-
quadomanejotécnicoemqualquermodalidadedegrupo,semquehajaumasimultâ-
neaatitudeintemanapessoarealdoprofissional.
Assim,alémdosnecessárioscrnliecimentos(provindosdemuitoestudoeleitu-
ras),dehabilidades(treinoe supervisáo),asatitudes(ümtratamentodebasepsica-
nalíticaajudamuito)sãoindispensáveis,e elassãotecidascomalgunsatributose
funçõescomoasmencionadasaseguir:
. Gostareacreditaremgrupos.
. Sercontinente(capacidadedeconterasangústiase necessidadesdosoutros,e
tambémassuaspróprias).
. Empatia(pder colocar-senolugaÍdooutroeassimmanterumasintoniaafetiva).
. Discrìminação(paranãoficar perdidono cipoaldascruzadasidentificações
projetivase introjetivas).
. NovomodelodeidentiJìcaçõo(contribuiparaaimportantefunçãodedesidentifi-
caçãoedessignificaçãodeexperiênciaspassadas,abrindoespaçoparaneo-identifi-
caçõeseneo-significações).
o Comunìcação(tantocomoemissoÍou receptor, coma linguagemverbalou a
não-verbal,comapreservaçãodeumestilopróprio,ecomoumaformademode-
lo paraosdemaisdognrpo).
. Sq verdadeiro(se o coordenadornão tiver amor às verdadese Dreferirnão
enfrentá-las,nãopoderáservircomoum modeloparao seugrupo,e o melhor
serátrocardeprofissão).
. Sensodehumor(umcoordenadorpodeserfirmesemserrígido,flexívelsemser
frouxo,bomsemseÍbonzinhoe,damesmaforma,podedescontrair,rir, brincar,
semperdero seupapeleamanutençãodosnecessárioslimites).
. Integraçãoesíntese(ê acapacidadedeextrairodenominadorcomumdasmensa-
gensemitidaspelosdiversoscomponentesdogrupoedeintegrá-lasemumtodo
coerenteeunificado,semartificialismosforçados).
Ao longoda leituradoscapítulosdapráticaclínicadosdiversosautoresdeste
livro,nassuasentrelinhas,o leitorpoderáidentificartodosessesatributos,e outros
mais,comoconstituintesbásicosdafi:ndamentaçãotécnica.
24. AtributosDesejáveispara
um CoordenadordeGrupo
DAVIDE,ZIMERMAN
Ao longode virtualmentetodososcapítulosdestelivro, de umaformaou de outra,
sempreháum destaqueà pessoado coordenadordo grupono temaqueestásendo
especificamenteabordado,comosendoum fatordefundamentalimportâncianaevo-
luçãodo respectivogrupo, sejaele de que naturezâfor. Creio que bastaessarazão
parajustificar a inclusãodeum capítuloqueabordedeforma maisdireta,abrangente
e enfáticaas condiçõesnecessárias,ou pelo menosdesejáveis,paraa pessoaque
coordenagrupos.De certaforma,portanto,estecapítuloé umasíntesedeaspectosjá
suficientementedestacadosnestelivro, tantodemodoexplícitoquantoimplícito.
Inicialmente,éútil escÌarecerqueo termo"coordenador"estáaquisendoempre-
gadono sentidomaisamplodotermo,desdeassituaçõesqueseformamnaturalmen-
te, semmaioresformalismos(como podeser,por exemplo,uma atendentecom um
_erupodebebêsdeumacreche,ou com criancinhasdeumaescolinhamatemal;um
grupodeauto-ajuda,noqualsempresurgemliderançasnaturaisquefuncionamcomo
coordenadores;um professoruniversitárioemumasaladeaula,um empresáriocom
a suaequipedetrabalho,etc.),passandoporgruposespecialmenteorganizadospara
aÌgumatarefa,atéasituaçãomaissofisticadaecomplexadeum grupoterapeutacoorde-
nandoum grupopsicanaÌítico.
Valeressaltarque,indo muito alémdo importantepapeldefigura transferencial
quequalquercondutordegruposemprerepresenta,aênfasedopresentetextoincidirá
deforma maisparticularnapessoareal do coordenador,com o seujeito verdadeiro
deser,e,por conseguinte,comosâtributoshumanosqueeìepossui,ou lhefaltam.
Fazendoa necessáriaressalvade que cadasituaçãogrupal específicatambém
eriee atributosigualmenteespeciaisparaapessoadocoordenador,consideroperfeita-
m:nte legítimo ressaltarqueaessámciadascondiçõesintemasdevesera mesmaem
:ada um deles.Uma segundaressalvaé a de que a discriminaçãoem separadodos
Civersosatributosa seguirmencionadospodedarumafalsaimpressãodequeestamos
:resando uma enormidadede requisitosparaum coordenadorde grupo, quaseque
:..ntìgurandoumacondiçãode "super-homem".Serealmentefor essaa impressão
i:irada. peçoaoleitorquereleve,poistudosepassadeformasimultânea,conjunta
: :atural.e aquantidadedeitensdescritosnãoé maisdoqueum esquemadepropósi-
:-.didático.
Destarte,seguindoumaordemmaisdelembrançado quede importância,vale
::ite.ar os seguintesatributoscomoum conjuntode condiçõesdesejáveise, para
j i:r. !ituacòes.imorescindíveis:
26. COMO'IRAEALHAMOSCOVCRUPOS
'
43
mento do espaçointerior e exterior de cadaum deles,atravésda aquisiçãode um
sensode liberdadedetodos,desdequeessaliberdadenãoinvadaa dosoutros.
Da mesmaforma,faltacoma éticao coordenadordegrupoquenãomantémum
mínimo de sigilo daquilo que lhe foi dadoem confiança,ou pelasinúmerasoutras
formasde faltar com o respeitoparacom os outros.
. Respeito.Esteatributotem um significadomuito mais amplo e profundo do
que o usualmenteempregado.Respeitovem de re (de novo) + specíore(olhar), ou
seja,é a capacidadedeum coordenadorde grupovoltar a olharparaaspessoascom
asquaiseleestáemíntima interaçãocom outrosoÌhos,com outrasperspectivas,sem
a miopia repetitivados rótulose papéisque,desdecriancinha,foramJhesincutidos.
Igualmente,faz partedesteatributoanecessidadedequehajaumanecessâriadistân-
cia ótima entreelee osdemais,umatolerânciapelasfalhase limitaçõespresentesem
algumaspessoasdo grupo,assimcomoumacompreensáoe paciênciapelaseventu-
ais inibiçõese pelo ritmo peculiardecadaum.
Tudoissoestábaseadono importantefato dequeaimagemqueumamãeou pai
(o terapeuta,no casodeuma grupoterapia)tem dospotenciaisdos seusfilhos (paci-
entes)e da família como um todo (equivaleao grupo) setoma parteimportanteda
imagemquecadaindivíduo virá a ter de si próprio.
. Paciência.Habitualmente,o significadodestapalavraestáassociadoa uma
idéiadepassividade.deresignação,eo queaquiestamosvalorizandocomoum impor-
tanteatributodeum coordenadordegrupoéfrontalmenteopostoaisso.Paciênciadeve
serentendidacomouma atitudedtiva,comoum tempodeesperanecessi4rioparaque
uma determinadapessoado gruporeduzaa suapossívelansiedadeparanóideinicial,
adquiraumaconfiançabasalnosoutros,permita-sedarunspassosrumo a um terreno
desconhecido,e assimpor diante.Assim concebida,a capacidadede paciênciafaz
partedeum atributomaiscontingente,qual seja,o defuncionarcomoum continente.
. Continente. Cadavez mais, na literaturapsicológicaem geral, a expressão
"continente"(éoriginaldeBion) ampliao seuespaçodeutilizaçãoe o reconhecimento
pelaimportânciadeseusignificado.Esseatributoaludeoriginariamenteaumacapa-
cidadequeuma mãedevepossuirparapoderacolhere conteÍ asnecessidadese an-
gústiasdo seufilho, ao mesmotempo que as vai compreendendo,desintoxicando,
emprestandoum sentido,um significadoe especialmenteum nome, para só então
devolvêJasà criançanadosee no ritmo adequadosàscapacidadesdesta.
A capacidadedo coordenadorde grupo em funcionar como um continenteé
impoÍante por trêsrazões:
l. Permitequeelepossacor,rteraspossíveisfu quepodememergirno
campogrupalprovindasdecadaum edetodoseque,por vezes,sãocolocadasde
forma maciçae volumosadentrode suapessoa.
3.
Possibilitaqueelecontenhaassuasprópriasangústias,comoé o caso,por exem-
plo, denãosabero queestásepassandonadinâmicado grupo,ou aexistênciade
dúvidas,de sentimentosdespertados,etc. Essacondiçãode reconhecere conter
as emoçõesnegativascostumaserdenominadacapacidadenegativae seráme-
lhor descritano tópico qnesegueabaixo.
Fazpartedacapacidadedecontinenteda mãe(ou do coordenadordeum grupo)
a assim denominada,por Bion, função alfa, que serádescritaum pouco maìs
adiante,em "Funçãodeegoauxiliar".
2.
28. colro 1R^BÀLH^Ì!ÍoscoM cRUPos . 45
çõesprojetivascruzadasem todasas direçõesdo campo grupal, o qual exige uma
claradiscriminaçãode"queméquem",sobo riscodogrupocairemumaconfusãode
papéise deresponsabilidades.Acreditoqueosterapeutasquetrabalhamcomcasais
e famfliaspodemtestemunhare concordarcomestaúltimacolocaçào.
. Comunicação, Paraatestara importânciada funçãode comunicar- tânto no
conteúdoquantonaforma damensagememitida- cabea afirmativadequea lingua-
gem dos educadoresdeterminao sentidoe as significaçõesdas palavrase gerc as
estruturasda mente.
O atributodeum coordenadorde grupoem sabercomunicaradequadamenteé
pârticularmenteimportanteno casode uma grupoterapiapsicanalítica,pela respon-
sabilidadeque representao conteúdode suaatividadeinterpretativa,o seuestilo de
comunicá-lae, sobretudo,seeleestásintonizadono mesmocanalde comunicação
dospacientes(por exemplo,nãoadiantaformular interpretaçõesem termosde com-
plexidadesimbólicaparapacientesregressivosque aindapermanecemnuma etapa
depensamentoconcreto,e assimpor diante).Em relaçío aoestiLo,deveserdadoum
destaqueaoqueé de naturezanarcisista,tal como seguelogo adiante.
Um aspectoparcialdacomunicaçãoéo quediz respeitoàatividadeinterpretativa,
e comoessaestáintimamenteligadaaousodasverdades,comoantesfoi ressaltado,
torna-senecessárioestabeleceruma importanteconexãoentrea formulaçãode uma
verdadepenosade serescutadae a manutençãoda verdade.Tomareiemprestadade
Bion uma sentençaque sintetizatudo o que estoupretendendodestacar:anlor sent
verdadenão é maisdo auenaixão,no entanlo,verdadesemamor é crueldade.
É igualmenteimpo.tont"qu. ,r .oordenrdordegrupoqualquervalorizeo fato
de que a comunicaçãonão é unicamenteverbal, porquantotanto ele como o seu
grupoestãocontinuamentesecomunicandoatravésdasmaissutisformasde lingua-
gemnão-verbaì.
. Tfaços caracterológicos.TantomeÌhortrabalharáum coordenadorde grupo
quantomelhoreleconhecerasipróprio,osseusvalores,idiosincrasiasecaracterologia
predominante.Dessaforma, se eÌe for exageradamenteobsessivo(emboracom a
ressalvadequeumaestruturaobsessiva,nãoexcessiva,é muitoútil, poisdetermina
seriedadee organização),vaiacontecerqueo coordenadorteráumaabsolutaintolerân-
cia a qualqueratraso,falta e coisasdo gênero,criandoum clima desufoco,ou geran-
doumadependênciasubmissa.Igualmente,umacaracterologiafóbicado coordena-
dor pode determinarque ele evite entrar em contatocom determinadassituações
angustiantes,e assimpor diante.
No entanto,valedestacaraquelestraçoscaracterológicosquesãopredominan-
tementede natnÍezànarcisìsta.Nestescasos,o maior prejuízoé queo coordenador_-
estarámaisvoltadoparao seubem-estardoqueparao dosdemais.A necessidadede
receberaplausospodesertãoimperiosa,queháo riscodequeseestabeÌeçamconluios
inconscientes,com o de uma recíprocafascinaçãonarcisista,por exemplo, onde o
valormáximoé o deum adoraro outro,semquenenhumamudançaverdadeiraocor-
ra.Uma outrapossibilidadenocivaé a dequeo coordenadorsejatãobrilhanteque
eÌedeslumbra("des"+ "lumbre",ou seja,ofuscaporque"tira a luz") àspessoasdo
grupo, como seguidamenteaconÍeceentreplofessorese alunos,mas tambóin pode
aconlecercomgrupoterapeu(ase seuspacientes.
Nesteúltimo caso,o dogmáticodiscursointerpretativopodeestarmais a servi-
ço deumafetichização,istoé,damanutençãodo ilusório,de seduzire dominar,do
29. 46 . zMsrÌ,r,aNa osoRro
quepropriamentea umacomunicação,a uma resposta,ou a aberturaparareflexões.
A retóricapodesubstituira produçãoconceitual.
Um outroinconvenientequedecorredeum coordenadorexcessivamentenarci-
sistaéqueeletemasensaçãodequetemapropriedadeprivadasobreos
..seuspacien-
tes", do futuro dos quaisele crê ter a possee o direito de determinaro valoi deles.
Nestescasos,é comumqueesteterapeutatrabalhemaissobreosnúcleosconflitivos
e os aspectosregressivos,descartandoos aspectosmais madurose as capacidades
sadiasdo ego.
Da mesmaforma,um grupoterapeutaassimpodesertentadoa fazerexibiçãode
umaculturaerudita,defazerfrasesdeefeitoque,maisdo queum simplesbrilho que
lhe é tãonecessário,o queelebasicamentevisa,no planoinconsciente,é manteruma
largadiferençaentreelee osdemaisdo grupo.
. Modelo de identiÍicação. Todososgrupos,mesmoosquenãosãoespecifica-
mente de naturezaterapêutica,de uma forma ou outra, exercemuma função
psicoterápica.Isso,entreoutrasrazões,deve-seao modelo exercidopela figurado
coordenadordogrupo,pelamaneiracomoeleenfrentaasdificuldades,pensaosproble-
mas, estabelecelimites, discrimina os distintos aspectosdas diferentessituações,
manejacom as verdades,usao verbo,sintetiza,integrae dá coesãoao grupo. Òom
outraspalavras,o grupotambémpropiciauma oportunidadeparaqueos paÍicipan-
tes introjetema figura do coordenadore, dessaforma, identifiquem-secom murtas
característicase capacidadesdele.
Nos casos de grupoterapia psicanalítica, vale acrescentarque a atividade
interpretativa_dogrupoterapeutatambémdevevisarafazerdesidentificações,ou seja,
desfazerasidentificaçõespatógenasquepodemestarocupandoum largo espaçona
mentedos pacientes,e preencheresseespaçomental formado com neo-idànifica-
çõer,entreasquaispontifica asqueprocedemdo modelodapessoareal do grupote-
rapeuta.
. Empatia.Todos osatributosantesdiscriminadosexigemumacondiçãobásica
para que adquiramvalidade,qual sejaa de que existauma sintonia emocional do
coordenadorcom osparticipantesdo grupo.
Tal como designaa etimologiadestapalavra[asraízesgregassão:em (dentro
de) + parhos(sofrimento)],empatiarefere-seaoatributodo coordenadordeum qru-
podepodersecolocarno lugardecadaumdogrupoeentrardentrodo .,climagrupãt".
Issoé muito diferentede simpatia (que se forma a partir do prefixo sfiz, que quer
dizerao lado de e nãodentrode).
A empatiaestámuito conectadaà capacidadede sepoderfazerum aproveita-
mentoútil dossentimentoscontratransferenciaisqueestejamsendodespertadosden-
tro do coordenadordo grupo,porém,pâratanto,é necessárioqueeletenhacondições
dedistinguirentreossentimentosqueprovêmdosparticipantesdaquelesqueperten-
cem unicamentea ele mesmo.
. Síntes€e integração. A funçãode síntesede um coordenadorde grupo não
deveserconfundidacom a habilidadede fazer resumos.A conceituaçãode síntese
aludeà capacidadede seextrairum denominadorcomumdentreasinúmerascomu-
nicaçõesprovindasdaspessoasdo grupoe que,por vezes,aparentamsertotalmente
diferentesentresi, unificandoecentralizando-asnatarefaprioritária do grupo,quan-
do estefor operativo,ou noemergentedasansiedadesinconscienles,no casodegru-
po voltadoao,r2s{g/rt.Por outroÍado,é a "capacidadesintéticado ego" do grupotera-
30. peutaquelhepossibilitasimbolizarsignificaçõesopostase aparentementecontraditó-
rias entresi.
Assim, tambémé útil estabeleceruma diferençaconceitual entre sintetizar e
junto.r: a sínteseconsisteem fazerumatotalidade,enquantojrínÍcrconsisteem fazer
umanova ligação,isto é, em ligar deoutro modo os mesmoselementospsíquicos.
Afunçáo deintegraçõo,poÍ savez, designaumacapacidadedeo coordenador
juntar aspectosde cadaum e detodos,queestãodissociadose projetadosem outros
(dentroou forado grupo),assimcomotambémaquelesaspectosqueestãoconfusos,
ou,pelo_menos,poucoclaros,porqueaindanãoforamsuficientementebemdiscrimi-
nados.E particularmenteimportantea integraçãodosopostos,como,por exemplo,a
concomitânciadesentimentose atitudesagressivascom asamorosasquesejamcons-
trutivase repaÍadoras,etc.
Paraque um coordenadorde grupo possaexerceradequadamenteas funções
antesreferidas,muito particularmentenasgrupoterapiasdirigidasaoinsight, impõe-
se a necessidadede que seuestadomental estejavoltado para a posiçãode que o
crescimentopsíquicodosindivíduosedogrupoconsisteemaprendercomasexperiên-
ciasemocionaisque acontecemnasinter-relaçõesgrupais.Assim, ele devecomun-
garcom o grupoqueo queé realmentevaliosonavidaé teraliberdadeparafantasiar,
desejar,a sentir,pensar,dizer,sofrer,gozare estarjunÍo com os outros.
Portanto,um importantecritério de crescimentomental,emborapossaparecer
paradoxal,é aqueleque,aocontráriodevalorizarsobremaneiraqueo indivíduo este-
ja em condiçõesde haver-sesozinho,a terapiagrupaldevevisar que,diantedeuma
dificuldademaior,o sujeitopossareconhecera suapartefrágil, permita-seangustiar-
see chorare que sesintacapazde solicitare aceitaruma ajudados outros.
Vale enfatizarque a enumeraçãodos atributosque foram referidosao longo
destecapítulonãopretendeserexaustiva.Os mencionadosatributoscomportamou-
trasvariantes,permitiriam muitas outrasconsiderações,foram descritosem terÍnos
ideaisenãodevemserlevadosaopédaletra,comosefosseumaexigênciaintimidadora
ouu,maconstrangedoracamisadeforça.Antes,a descriçãoem itensseparadosvisaa
dar uma amostragemda importânciada pessoado coordenadorde qualquertipo de
_crupo.
A expressão"qualquertipo degrupo" implica umaabrangênciatal, quealguém
poderiaobjetarqueosatributosqueforamarroladosnãoconstituemnenhumaorigina-
lidadeespecífica,porquantotambémdevemvalerparamil outrassituaçõesquenão
rêmum enquadregrupalformalizado.A respostaque me ocoÍÌe dar aoshipotéticos
contestadoresé queelesestãocom a razão.Assim,em umafamíÌia nuclearé à dupla
parentalquecabea funçãodecoordenara dinâmicado grupofamiliar. Em uma sala
de aula,é o professorquemexecutaessafunção.Num grupode teatro,essepapelé
do diretor do grupo.Numa empresa,cabeàschefiase diversassubchefías,e assim
ç'ordiante.
Numa visualizaçãomacro-sociológica- umanação,por exemplo-, asmesmas
:onsideraçõesvalemparaa pirâmidequegovemaosdestinosdo país,desdeacúpula
Jo presidentecoordenandoo seu primeiro escalãode auxiliaresdiretos, cada um
Jessesexercendoa funçãodecoordenarosrespectivossubescalões,em uma escala-
ü progressiva,passandopelos organismossindicaisem direçãoàs bases.Se não
hyer verdade,respeito,coerência,empatia,etc.,porpartedascúpulasdiretivas(como
.r dos paisem uma família, a de um coordenadornum gÍupo, etc.), é virtualmente
::no quea mesmacondutaacontecerápor partedos respectivosgrupos.
O que importadestacaré o fato de que o modelodasliderançasé o maior res-
se.rri;ír'elpelosvalorese característicasdeum grupo,sejaele de quetipo for.
CoMoTRABALHAMOS COll CIUPOS r 47
31. A FamíIiacomoGrupo
Primordial
LUIZCÀRLOSOSORIO
EM BUSCADE UM CONCEITO OPERATIVODE FAMILIA
Família nãoéum conceitounívoco.Pode-sedizerquea família nãoéumaexpressão
passívelde conceituação,mastão somentededescrições,ou seja,é possíveldescre-
ver asváriasestruturasou modalidadesassumidaspela família atravésdos tempos,
masnãodefini-la ou encontraralgumelementocomumatodasasformascom quese
apresentaesteagrupamenlohumano.
Mesmo sea considerarmosapenasnum dado momentoevolutivo do processo
civilizatório temosdificuldadesem integraro proteimorfismode suasconfigurações
numapautaconceìtual.O queteráem comumnos diasatuais,por exemplo,uma
famflia deuma metrópolenorte-americanacom a deum vilarejo rural daChina?Ou
a de um kibbutz israelensecom a de um latifundiário australiano?Que similitude
encontrarentrea deum retirantenordestinoe a de um lapãoda Escandinávia?Ou a
deum porto-riquenhoquevive numguetonova-iorquinocom adeum bem-sucedido
empresáriosuíço?Ou, ainda,comoequipararadeum sicilianomafiosocom adeum
muçulmanopaquistanense?Ou adeum bérberenorte-africanocomadeum decadente
lordeinglês?
Sãotantasasvariáveisambientais,socrars,econômicas,culturais,políticasou
religiosasquedeterminamasdistintascomposiçõesdasfamíliasatéhoje,queo sim-
pÌescogitar abarcá-lasnum enunciadointegradorjá nos paralisao ânimo e tolhe o
propósito.Não obstante,comonãopodemosprescindirdeuma definição,aindaque
precáriae limitada,quenosfacilite acomunicaçãoe nosajudeadiscriminaro funda-
mentaldo perfunctório,vamosàprocuradeum conceitoquepossaseroperativopara
asfinalidadesdestecapítu1o,valendo-nosparatantodascontribuiçõesdeoutrosautores
quesedebruçaramsobreaingentetarefadeencontrarumanoçãodefamíliasuficiente-
menteabrangenteparaservir-nosdeparâmetroaqui e agora.
Dizer que a família é a unidadebásicada interaçãosocial talvez sejaa forma
nais _genéricae sintéticade enunciá-la;mas,obviamente,não bastaparasituá-la
:u1moagrupamentohumanonocontextohistórico-evolutivodoprocessocivilizatório.
Escardóobserva-nosque"a palavra/amílía nío designauma instituiçãopadrão,
:-:ree invariável.Atravésdostempos,a famíia adotaforïnase mecanlsmossumamente
::..ersos,e naatualidadecoexistemno gênerohumanotiposdefamfliaconstituídosso-
::: princípiosmoraise psicológicosdiferentese aindacontraditóriose ilconciliáveis".
33. coMorR^BALHAMoscov cnupos . 51
Consideraremos,ainda,quea família podeseapresentar,grossomodo,sobtrês
formatosbásicos:a nuclear(conjugal),a extensa(consangüínea)e a abrangente.
Porfamília nuclearentenda-seaconstituídapelotripépai-mãe-filhos;por famí-
lia extensaa que secomponhatambémpor outrosmembrosque tenhamquaisquer
laçosdeparentesco,e aabrangenteaqueincluamesmoosnão-parentesquecoabitem.
Convencionaremosquedoravantesemprequenosreferirmosàfamflia, a menos
queseparticularizea modalidadedeagrupamentofamiliar considerada,o estaremos
fazendotendoem menteseuformatonuclear,prevalentenamodemacivilizaçãooci-
dental,quebalizao cotidianoexistencialdaquelesa quemsedestinaestelivro.
{S ORIGENSDA FAMÍLIA
A família é umainstituiçãocujasorigensremontamaosancestraisdaespéciehuma-
nae confundem-secom a própriatrajetóriafilogenética.
A organizaçãofamiliar nãoéexclusivadohomem;vamosencontrá-laem outras
espéciesanimais,quer entreos vertebrados,quer,mesmosobformasrudimentares,
entreos invertebrados.
Assim comonaespéciehumana,encontram-sedistintasformasde organização
familiar entreosanimais.Há famíliasnasquais,apóso acasalamento,aprole fica aos
cuidadosde um só dos genitores,geralmente,a fêmea;mas tambémpoderáser o
machoquem seencarregadoscuidadoscom osdescendentes,como em certasespé-
ciesdepeixes.Algumasespéciesentreasavesvivem em família durantea épocada
reproduçãoe em bandosduranteasdemaisépocasdo ano.Os paispodempermane-
cerjunto aosfilhotespelavidatoda,masessesgeralmenÍedeixamospaisantesque
nasçamoutrasninhadas.Há tambémentreos animaisfamílias ampliadas(ou exten-
sas),ondeosjovens ajudama criar os irmãos.As abelhasoperárias,que sãofilhas
estéreisdasabelhasrainhas,constituementresi umafratria ou comunidadede irmãs
com funçõesdemútuoscuidados,proteçãoe alimentação.
Essabrevereferênciaaoscomportamentosfamiliares de certosanimaistem o
propósitode enfatizaro caráteruniversaldos agrupamentosfamiliarese chamara
atençãoparasuâonipresençanãosóaolongodaevoluçãodaespéciehumana,mâsna
de outrosseresdo reino animal.
Curiosamente,a origemetimológicadapalavrafamília nosremeteaovocábulo
latinofamulus, qrl'esignifica"servo" ou "escravo",sugerindoqueprimitivamentese
consideravaa família como sendoo conjuntodeescravosou criadosdeuma mesma
pessoa.Parece-me,contudo,que essaraiz etimológica aludeà naturezapossessiva
dasrelaçõesfamiliaresentreospovosprimitivos, ondea mulherdeviaobedecerseu
maridocomo seseuamoe senhorfosse,e os filhos pertenciama seuspais,a quem
deviamsuasvidase conseqüentementeessessejulgavamcom direito absolutosobre
elas.A noçãodeposseeaquestãodopoderestão,portanto,intrinsecamente,vinculadas
à origem e à evoluçãodo grupofamiliar, conforme veremosmais adianteao tratar-
mosdosmitos familiares.
Há váriasteoriassobrea origemdafamília: umasa fundamentamem suasfun-
çõesbiológicas;outras,em suasfunçõespsicossociais.Foram formuladasas mais
diÏersas hipóteses,tendocomoponto de partidaquestõesatinentesà parentalidade,
ou seja,aospapéispatemoe matemocomoestruturadoresdo grupofamiÌiar.
O vérticeevolutivo - queconsideraque a família, tal qual os seresque a com-
poem,necessitapassarporetapassucessivasnocursodeseudesenvolvimento- tem
sido a pedrade toquena fundamentaçãodasdiversasteoriasque tentamexplicar a
34. 52 . zmsnve" * oso*to
origemeaestruhlraçãodogrupofamiliarcomoo encontrâmosaolongodoprocesso
civilizatórioenasdistintasculturas.
Asfamíliasoriginalmenteseorganizavamsobaformamatriarcal,aoqueparece
pelodesconhecimentodopapeldopainareprodução.Essaexplicação,contudo,não
éconsensualentreosantropólogos.Noentanto,éo quenospareceocorreremcertas
sociedadesditasmatrilinearesaindaencontradasemnossosdias- taiscomoosmela-
nésiosestudadosporMalinovski-, ondeaautoridadepatemarecaisobreafigurado
tio matemo(aúnculo),que,entreoutrasatribuições,temade"concederamão"das
sobrinhasaoseventuaispretendentesacomelassecasarem.Essa"transferência"ao
tio matemodosdireitose devereshabirualmenteatribuídosaopaiprovém,aoque
tudoindica,do referidodesconhecimentodo papeldo homemna reproduçãoem
temposidos.Esseshábitosmilenaresdosmelanésioscomrelaçãoaopapelavuncular
teriamsubsistidomesmoapósarevelaçãodafunçãoreprodutorapatema.
O matriarcado,segundooutrasfontes,seriaumadecorrêncianaturalda vida
nômadedospovosprimitivos,pois,enquantooshomens- desconhecendoaindaas
técnicasprópriasao cultivoda terra- tinhamquesairà procurade alimento,as
mulheresficavamnosacampamentoscomosfilhos,quecresciampraticamentesoba
influênciaexclusivadasmães,aquemcabiaaindafomecerummínimodeestabilida-
desocialaestesnúcleosfamiliaresincipientes.
Comodecorrênciadessapreponderânciadafiguramaterna,emcertassocieda-
desmatriarcaisasmulherestinhamo direitodepropriedadee certasprerrogativas
poÍticas,comoentreosiroquesescanadensesestudadosporMorgannoséculopassado.
Entreeles,asmulherespossuíamasterrascultiváveiseashabitações,podendovetar
aeleiçãodeumchefe,emboranãoocuparumcargonoconselhosupremo.
Paraosevolucionistas,odesenvolvimentodaagriculturaeoconseqüenteadvento
dosedentarismoforamosresponsáveispelainstalaçãoprogressivadopatriarcado.
Em fins do séculopassadoe princípiosdestehouveum verdadeiroboomde
estudosantropológicossobrepopulaçõesprimitivas,sustentandoa emergênciade
múltiplastesessobreo comportamentodosgruposfamiliares.No entanto,é algo
temeráriotirar-seconclusõessobrea origemdafamfliaa partirdaobservaçãodas
tribosprimitivas,poisanoçãodeevoluçãoculturallinearnãoómaisaceitaentreos
antropólogos.Issoquerdizerqueospovosditosprimitivosquenossãocontemporâ-
neosnãonecessariamenteestãoreproduzindoformasdeagrupamentofamiliaren-
contradasnopassadoremoto.Aindaassim,aconstataçãodequecertospadrõessão
reiteradamenteencontradosemtemposelugaresdiversospermitequesetomecomo
válidasmuitasdasafirmaçõesfeitascombasenessesestudos.
Ao discutir-sea origemdafamília,umaperguntainicialqueinsistentemente
nosocorreé seainstituiçãofamiliaréuniversal.
Em 1949,o antropólogonorte-americanoG.P.Murdockpublicouseuestudo
transculturalsobreparentesco,confirmandoahipótesedauniversalidadedafamília.
ParaMurdocknãoapenasafamíliaemgeral,masafamflianuclear,emparticulaÍ,é
universal,concluindoquenenhumaculturaousociedadepodeencontrarum substi-
tuto adequadoparaafamílianuclear.
A famflianuclear,segundoesseautor,apresentaquatrofunçõeselementares:a
sexual,a reprodutiva,a econômicae a educativa.Essasfunçõesseriamrequisitos
paraasobrevivênciadequalquersociedade.E baseando-senessefatoqueMurdock
afirmaserafamílianuclearuniversal.
Háquempossaobjetarcomaobservaçãodequetemosemnossostemposestrutu-
rassociaisquenãoincluema famflia,como,porexemplo,oskibbutzdeIsrael.No
entanto,comoobservaSpiro,estasociedadeessencialmentevoltadaparaacriança,
35. COIIIOTRABALHAMOSCOMCRUPOS
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emborado ponto de vista estruturalpareçaconstituir-senuma exceçãoà idéia da
universalidadedafamília,serveparaconfirmáìa dopontodevistafuncionalepsicoló-
gïco.Nokibbutz,acomunidadeinteirapassaaserumagrandefamíliaextensa.Somente
numa sociedadefamilial como o kibbutz,afirma Spiro, seriapossívelnão haver a
família nucleardesempenhandosuasfunçõesindispensáveis.
A questãodaorigemdafamflia conduz-nosnaturalmenteàdiscussãodasques-
tõesrelativasao pârentesco,as relaçõesentre o tabu do incestoe a exogami4 e a
instituiçãodo casamento.
L.H. Morgan,advogadonoÍte-americanoquenasegundametadedoséculopassa-
do se interessouvivamentepela observaçãoda vida dos aborígenesque viviam na
fronteira dos EUA e Canadá,tomou-seo fundador da modema antropologiacom
seusestudospioneiros sobreas relaçõesde parentesco.Embora seu enfoque
evolucionistapossasercontestadopelosavançosulterioresdainvestigaçãoantropoló-
gica, suatipologia familiar perÌnanececomo ponto de referênciaparao estudodas
estruturasfamiliarese dasteoriassociológicassobrea família.
SegundoMorganhaviaoriginariamenteumapromiscuidadeabsoluta,semqual-
quer interdiçãopara o intercursosexualentre os sereshumanos.Este teria sido o
peíodo da família consangüínea,estruturadaa partir dos acasalamentosdentro de
um mesmogrupo.
A seguir,pelo surgimentoda interdiçãodo relacionamentosexualentrepais e
filhos e posteriormenteentre irmãos,atravésdo tabu do incesto,surgiu a famflia
punaluana,ondeos membrosde um grupo casamcom os de outro grupo, mas não
entresi. Assim, os homensdeum determinadogruposãoconsideradosaptosa casar
somentecom asmulheresdeum outro determinadogrupo,e essesdoisgruposintei
ros casamentre si. Essaestruturafamiliar é tambémconhecidacomo família por
grupo.
Na famflia sindesmáticaou de casal,o casamentoocorre entre casaisque se
constituemrespeitandoo tabudo incesto,massemcondicionarsualigaçãoà obriga-
toriedadedo casamentointergrupos.Essasfamílias,encontradasentreos primitivos
povos nômades,caracterizam-sepela coabitaçãode vários casaissob a autoridade
matriarcal,responsávelpelacoesãòcomunalatiavésdaeconomiadomésticacompar-
tida.
A repartiçãode tarefasadvindasdo desenvolvimentoda agriculturateria dado
origemàfamília patriarcal,fundadasobreaautoridadeabsolutado patriarcaou "che-
fe defamília", queem geralvivia num regimepoligâmico,com asmulhereshabitual-
menteisoladasou confinadasem determinadoslocais(gineceus,haréns).
Finalmente,temosa família monogâmica,paradigmáticadacivilizaçãodo oci-
dente,cujasorigenssevinculamaodesenvolvimentodaidéiadepropriedadeaolon-
go do processocivilizatório. A fìdelidadeconjugalcomocondiçãoparao reconheci-
mentode filhos legítimose a transmissãohereditáriada propriedade,bem como o
estabelecimentoda coabitaçãoexclusivademarcandoo território da parentalidade
sãoos elementosemblemáticosdestaque,aindahoje,é o tipo de família prevalente
no mundo ocidental.
Engels,o colaboradordeMarx naelaboraçãodasbasesprogramáticasdo movi-
mento comunista,apoiando-senas idéias de Morgan, sustentousua tesede que a
famflia monogâmicateria sido a primeira famflia fundadanão mais com baseem
condiçõesnaturais,massociais,jáqueamonogamiaparaelenãoseriaumadecorrência
doamorsexuale,sim,dotriunfodapropriedadeindividualsobreo primitivo comunis-
mo espontâneo.A monogamiaé visualizadasoba óticado materialismohistórico
nãocomo umaforma maisevoluídadeestruturafamiliar.porémcomo a suieicãode
36. 54 . ,*u*"on soso^,o
um sexoao outro a serviçodo podereconômico.Como a inclinaçãonaturaldo ho-
mem seriaa liberdadede intercâmbiosexual,a monogamiateria sido responsável
pelo incrementodaprostituiçãoepelafalênciadessesistemafamiliar nosdiasatuais.
Sobreas relaçõesde parentesco,podemosconsiderá-lassob duas apresenta-
ções:a consangüinidadeem linha direta,que ocoÍTeentre pessoasque sejamuma
descendentediretada outra,e a consangüinidadeem linha colateral,que sedá entre
pessoasquedescendemdeantepassadoscomuns,masnãodescendemuma daoutra.
Enquantoessasrelaçõesdeparentescoseriamasdeterminadaspelanatureza,aquelas
baseadasno casamentoseriamasestabelecidaspeÌasconvençõessociais.Marido e
mulher sãoparentesem funçãodo contratosocialqueos uniu.
As relaçõesde parentescotidas como primárias ou fundantesdas estruturas
familiaresseriamasseguintes:maridoe mulher,paise filhos,e irmãos.
Lévi-Strauss,antropólogocontemporâneoformadonaescolasociológicafrance-
sa,aplicoua perspectivaestruturalistaà antropologia,descrevendoo quechama"as
estÍuturaselementaresdo parentesco".Partindoda noçãode que a estruturaé um
sistemadeleisqueregeastransformaçõespossíveisnum dadoconjunto,LévlStrauss
procurou estabeÌeceras relaçõesconstantesna estruturafamiliar que determinam
nãosósuaaparênciafenomênicaem determinadoinstantehistórico,comosuaspos-
síveismodificaçõesao longodostempos.
Tomandocomopontodepartidaateoriada"troca ritual dodom" deMauss(um
de seusmestresna escolasociológicafrancesaacimamencionada)e bebendonas
fontesda psicanálisee da lingüística,ramosdo conhecimentoapenasemergentesna
épocade seusprimeiros estudos,Lévi-Straussprocuroudeterminarque elementos
subjazemaos padrõesrelacionaisque configuram a família desdesuasfundações
mais arcaicas.
Cadaelementodoadoimplica a obrigaçãode suarestituiçãopelo receptor,diz-
nos a aludida teoria de Mauss.Assim, na famflia estruturalmentemais simples (e
supostamenteanterioraoconhecimentodo papeldopai nareprodução),aotio mater-
no (avunculus)catseriaa funçãode "doar" mulheresà geraçãoseguinte.Ao atribuir-
setal funçãoaotio matemoestava-sesimultaneamentecriandoa interdiçãodo inces-
to, pois a sobrinhasó poderiaserdoadapelo tio a quemnão pertencesseao círculo
endogâmico(pai,irmãos).
A proibiçãodo incestoentãoinstaladaé a regrada reciprocidadepor excelên-
cia, pois a trocarecíprocade mulheresasseguraa circulaçãocontínuadasesposase
filhas queo grupopossui.Com o tabudo incesto,afamília marcaapassagemdo fato
naturaldaconsangüinidadeaofato cultural daafinidadee a relaçãoawncular é, por
assimdizer,o elementoaxial a partir do qual sedesenvolverátodaa estruhrrasocial
do parentesco.
O tabudo incestoe a exogamiaquelhe é conseqüenteestariam,segundoLévi-
Strauss,nasraízesda sociedadehumana.A exogamia,ou seja,o casamentofora do
grupofamiliar primordial,funda-sena"troca", queé a basedetodasasmodalidades
dainstituiçãomatrimonial.O laçodeafinidadecomumafamília diferenteassegurao
domíniodo socialsobreo biológico,docultural sobreo natural(por issoa afirmação
deLévi-Straussdequecom o tabudo incestoafamília marcaa passagemdanatureza
à cultura).
A exogamia,comoa linguagem,teriaa mesmafunçãofundamental:a comuni-
caçãocom os outros.E dessacomunicaçãoa possibilidadede que surjaum novo
nível de integraçãono relacionamentohumano.A partir dessepropósito, é que a
exogamiadáorigem à instituiçãomatrimonial.