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ESTRUTURA ORGANIZACIONAL E
REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA: UMA
CONTRIBUiÇÃO PARA A GEOGRAFIA
DAS CORPORAÇÕES
GISELA AaUINO PIRES DO Rlo*
Organizational Structure and Productive Restructuring: An
Exploratory Essay on the Geography of Corporations
The article discusses the links be-
tween the organizational and the spa-
tial structures of the corporate sys-
tem. Such links are said to be rein-
forced by locational and administra-
tive hierarchies and suggest the ex-
istence of geographical specializa-
tions. The corporate system may give
rise to very complex spatial and or-
ganizational structures. This struc-
turet complexity is always in a state
of change and can be depicted in a
series of topological presuppositions
which embody regions, flows and
networks.
Introdução
o foco central deste trabalho refere-se à compreensão das interdepen-
dências entre estrutura organizacional, estratégias de crescimento de grupos
industriais e criação de subespaços especializados por força do processo de
reestrururação produtiva comandado por esses atores. Trata-se de um tema
amplo, cujas possibilidades de se mobilizar conceitos de origem diversa são
enormes; ele remete à perspectivas teóricas distintas que tentam fornecer
elementos de respostas para as múltiplas trajetórias espaciais empreendidas
pelos grandes grupos industriais. Face às transformações econômicas cada
vez mais complexas, o marco teórico para a interpretação da atuação de
grupos industriais que passam a orientar a especialização produtiva de deter-
minadas áreas tem privilegiado um conjunto de características que dizem
respeito à natureza das estruturas organizacionais, às estratégias do grupo
industrial e à atuação desses grupos como indutores de transformações pro-
dutivas.
A grade de leitura proposta não se pretende exaustiva; ela permite, no
entanto, discutir três elementos característicos dos grupos: níveis distintos de
. Professora do Departamento de Geografia da UFRJ.
52 Revista TERRITÓRIO, ano 111,n!.!5, jul./dez. 1998
controle e decisão, organização (global) integrada e estratégias institucio-
nais. Esses elementos implicam considerar o grupo industrial como sistema
articulado cuja projeção espacial traduz-se pela criação de subespaços
especializados. As unidades elementares que compõem o grupo remetem à
sua estrutura locacional. Tal estrutura não está isolada do contexto espacial:
ela se enraíza pelas especificidades territoriais tais como a disponibilidade
dos recursos existentes (potenciais e efetivos), a disponibilidade de infra-es-
trutura material em rede, a capacidade de exploração de sinergias (locais e
extra-regionais), a disponibilidade de "infra-estrutura social" e a tecnologia
disponível.
Nesse sentido, o terreno apresenta-se bastante movediço, pois diver-
sas classificações são passíveis de serem esboçadas. Separar as diferentes
contribuições utilizando-se categorias mais ou menos "estáveis", embora ape-
nas satisfatório, parece-nos mais adequado às restrições impostas pela apre-
sentação sistemática e pelo caráter exploratório deste trabalho. Assim, apre-
sentamos na primeira seção a ruptura entre a teoria clássica da localização
industrial. base incontornável da literatura em Geografia Econômica, e as ino-
vações conceituais que tentam explicar as interações entre a estrutura
organizacional e a formação de subespaços. Na segunda seção discutiremos
três das principais abordagens que analisam as articulações estratégica e
espacial do grupo industrial. Essa discussão fornecerá elementos importan-
tes para, na terceira seção, a elaboração de uma proposta de sistematização
para a análise de um subespaço sob o impacto direto da ação de grupos
industriais. Por trás dessa discussão encontra-se, na verdade, o debate so-
bre as diversas formas sob as quais o processo de reestruturação produtiva
pode se manifestar. Esse processo, de extrema complexidade e de múltiplas
dimensões, assume configurações específicas resultantes, de um lado, do
modo de valorização dos recursos aí disponíveis e, de outro, dos "recursos
construídos" que reforçam as articulações entre a escala local e as escalas
extra-regionais.
1. A noção de grupo: ruptura com a lógica da firma individual
A extensa bibliografia sobre as grandes corporações como atores de
primeira linha na intensificação da divisão técnica e social do trabalho e, por
conseguinte, da especialização produtiva de determinadas regiões tem sido
orientada para a identificação de estratégias, organização espacial e compor-
tamento desses atores que, nas palavras de HAMILTON (1986), podem se
constituir, em alguns casos espectros e, em outros, pontas-de-Iança da inter-
nacionalização do capital. De qualquer modo, a busca de um esquema geral
que explique a aparente estabilidade desses atores bem como sua dinâmica
global reúne-se em torno de três vertentes principais: comércio internacional,
economia industrial e geografia das corporações.
Estrutura organizacional e reestruturação produtiva 53
Antes de avançar na apresentação das três vertentes que congregam
a maior parte das contribuições sobre as estratégias espaciais das grandes
corporações e a indução de especializações produtivas por força daquelas,
uma consideração se impõe. É interessante lembrar que essas abordagens
apresentam uma evolução paralela no que diz respeito à herança neoclássica
e à eclosão de estudos com propósitos estruturados, consagrados explicita-
mente à análise das grandes corporações. De uma maneira geral, a herança
neoclássica atribuía às iniciativas individuais o papel de fonte decisiva na
implementação de estratégias de localização; tais decisões eram, portanto,
estritamente do domínio do empresário-proprietário. Simplificação em micro-
escala do conjunto da economia, a firma era considerada através da corres-
pondência entre unidade fabril/ unidade gerencial/ única atividade.
De modo semelhante, a teoria da localização industrial privilegiou, du-
rante muito tempo, a firma individual, monoproduto. Há razões suficientes
para rejeitarmos hoje as hipóteses que sustentam tal perspectiva, sem negli-
genciar, contudo, a importância das contribuições pioneiras de Weber, l.ôsch,
Isard, Greenhut, Lefeber, Ponsard, entre outros. Todavia, tais esforços de in-
terpretação e formulação de uma teoria geral da localização não podem ser
transportados para a realidade atual. Entre as inúmeras restrições a tais es-
forços está o fato de que apenas duas questões nortearam a teoria geral da
localização industrial: a) a determinação da melhor localização para uma cer-
ta atividade e, b) a escolha da melhor atividade para um dado local. A respos-
ta a essas questões circunscreveu os problemas de localização à utilização
da firma como categoria operacional encerrada nela mesma. Trata-se, evi-
dentemente, de abordagens com reduzido horizonte geográfico.
Sem negar a importância das bases conceituais lançadas no século
XIX, é necessário reconhecer que, nas décadas de sessenta e setenta do
atual século, estudos direcionados à análise das estratégias das corporações
ganharam substância em sua fundamentação teórica. Evidentemente, a ra-
zão principal encontra na transformação do próprio objeto que deixa de ser a
firma neoclássica para tornar-se a corporação. Sem dúvida, o número e a
disparidade dos trabalhos que tratam do tema atribuem diferentes contornos
a um objeto cada vez mais complexo. O alargamento dos espaços de inter-
venção da grande corporação, o grau de concentração, o tamanho, a
multilocalização e diversificação setorial introduziram modificações importantes
no contexto internacional e regional.
A noção de grupo deve ser assinalada como uma das principais inova-
ções dos trabalhos que vêm explorando essa linha de investigação'. O grupo,
ao contrário da firma monoproduto, caracteriza-se pela "pulverização" da ló-
1 Sem entrar na pluraridade de acepções, deve-se, contudo, ressaltar que a noção
de grupo se consolida e se dissemina a partir do reconhecimento, no início deste
século, de que um novo modo de estruturação e organização de redes de empresas,
cada vez mais complexo, estava emergindo.
54 Revista TERRITÓRIO, ano 111, n? 5, jul./dez. 1998
gica normativa própria à concepção da firma neoclássica. Hipoteticamente, o
grupo possui uma configuração complexa, pois requer uma estrutura gerencial
centralizada (holding) para definir as estratégias de conjunto, organização
por "áreas" de negócios, pressupondo, naturalmente, atividades técnico-pro-
dutivas seqüenciais (integração vertical), atividades divergentes (diversifica-
ção horizontal) e múltiplas unidades fabris (complexa estrutura locacional
decorrente da imbricação de padrões locacionais por empresa/atividade as-
sociada a efeitos de sinergia a partir de redes próprias) (DUPUY e GILLY,
1995).
O grupo constitui, assim, um modo de organização suficiententemente
amplo e articulado cuja escala de operação, ações e práticas de gestão per-
mitem identificar o processo de reestruturação produtiva. É importante salien-
tar, no entanto, que o termo reestruturação produtiva comporta um conjunto
de transformações extremamente amplo, assumindo, em muitos casos, um
caráter genérico aplicável a diversos níveis de análise. Reestruturação pro-
dutiva engloba, assim, as microdecisões de eficiência técnico-produtiva (so-
bretudo aquelas que se traduzem pela redução do efetivo de assalariados em
vários setores da economia e, particularmente, no setor industrial), as dife-
rentes formas de flexibilização da produção, a diversidade de estratégias de
sistemas produtivos localizados, os diferentes contextos locais e regionais
que permitem a alocação de investimentos com vistas à exploração dos re-
cursos construídos (aquisições, fusões, seletividade espacial dos investimen-
tos, etc.), as novas regulamentações e tantos outros elementos considerados
passíveis de viabilizarem a competitividade mundial. Essa noção transcende,
portanto, as práticas utilizadas pela grandes corporações, sem, no entanto,
excluí-Ias como atores desse processo. Desse ponto de vista, o processo de
reestruturação produtiva consiste num processo diferenciado no tempo e no
espaço conferindo, pela intermediação de articulações horizontais e verticais,
um caráter mundial aos lugares; em outros termos, cada lugar torna-se mun-
dial pelo interesse que desperta nos grupos constitutivos do oligopólio mundi-
al (DURAND eta/., 1992).
2. O grupo como agente da especialização produtiva:
articulação estratégica e espacial
Após a apresentação concisa sobre a emergência e consolidação da
noção de grupo, necessária para a reconstituição do eixo estruturador so-
bre o papel das grandes corporações, segue-se a apresentação das três
vertentes mencionadas anteriormente. Alguns elementos comuns que sub-
sidiaram a construção das diferentes abordagens sobre o tema têm sido
objeto de uma releitura, principalmente no que tange às interdependências
entre a estrutura organizacional do grupo e a especialização produtiva de
determinadas regiões.
Estrutura organizacional e reestruturação produtiva 55
A primeira delas, o comércio internacional, tende a mostrar a corres-
pondência entre fluxo internacional, transferência de tecnologia e investimen-
tos diretos no exterior, articulados às vantagens comparativas nacionais, como
suporte teórico para a compreensão da organização do grupo. DUNNING
(1988) associa ao quadro de dotação de fatores de produção à capaciadade
das empresas em explorá-los, caracaterizando por essa via vantagens espe-
cíficas à empresa e vantagens de localização. Considerar os fluxos comer-
ciais, mesmo que intrafirma, como medida da concentração e centralização
por ele operada, implica tratar a concorrência entre oligopólios como modo
de coordenação das relações econômicas que se articulam em estruturas
espaciais configurando, por seu intermédio, uma concentração da atividade
econômica em determinadas áreas.
Para os autores implicados na análise das trocas internacionais, essa
releitura significa uma redescoberta da Geografia Econômica, principalmente
da teoria da localização. Um tal interesse está ligado à necessidade de se
compreender a expressão espacial de conceitos como economia de escala,
economias externas que configuram vantagens competitivas espacialmente
localizadas (PIRES DO RIO, 1995) e condicionam o desempenho dos gru-
pos. Nesse sentido, é bastante elucidativo o trabalho de KRUGMAN (1996)
no qual o autor inclui um capítulo intitulado Geography Lost and Found. Nes-
se capítulo. ele explora, de forma sucinta, a noção de economias externas
locais como motivação primeira para a formação de clusters de produtos em
uma localização particular, explicando, desse modo, como as vantagens com-
petitivas se acumulam no tempo e no espaço. O interesse de Krugman a esse
respeito já havia se manifestado em trabalho anterior, quando o autor exami-
nou o fenômeno da concentração geográfica na direção e intensidade das
trocas comerciais.
Por essa via, as estruturas locacionais e as economias externas, sobre
as quais as decisões estratégicas globais e de gestão diversificada se apói-
am, constituem o cimento para modelos econômicos de concentração geo-
gráfica e especialização produtiva. Tal perspectiva é adotada por KRUGMAN
(1990), que parte do pressuposto de que as economias de escala estão na
origem da concentração das atividades industriais e, por conseguinte, as es-
truturas locacionais obedecem à uma lógica circular determinada pela explo-
ração de economias de escala e de economias externas. Assim, os fenôme-
nos de concentração das atividades econômicas e das atividades industriais
tendem a se perenizar em uma localização dada. O autor ilustra este ponto
recorrendo a um modelo estilizado de concorrência entre duas unidades polí-
tico-administrativas independentes. Essa representação permite compreen-
der os fluxos comerciais como indicadores da intensificação das trocas entre
essas unidades. De imediato, as trocas comerciais se traduzem por fluxos de
produtos, tecnologia e capital entre dois pontos necessariamente eqüidistantes,
mas somente um deles poderá se beneficiar das externalidades herdadas do
passado. O processo de concentração da produção pela ação de economias
56 Revista TERRITÓRIO, ano 111,nl! 5, julJdez. 1998
de escala e de aglomeração está, portanto, na origem da diferenciação de
áreas.
Essa formulação traz à tona um certo paradoxo: por um lado, as estra-
tégias globais dos agentes econômicos e, particularmente, dos grupos indus-
triais parecem escolher pontos isolados do espaço para realizarem todas as
funções requeridas pelas empresas que integram o grupo; por outro lado, as
estratégias institucionais territoriais que atuam no sentido de criar e/ou
perenizar determinadas especializações produtivas são praticamente excluí-
das. As relações entre grupo e demais atores das áreas de implantação de
unidades técnico-produtivas de um grupo são geralmente assimétricas, don-
de a identificação, por parte de alguns atores, de uma dualidade organizacional
para caracterizar relações de proximidade intragrupo e extragrupo (DUPUY e
GILLY, 1995); essas, por sua vez, deixam de ser exclusivamente topográficas
para tornarem-se relacionais. Tal deslocamento do foco tem implicações con-
sideráveis no tocante à instrumentalização conceitual. As relações de pro-
ximidade passam a ser regidas por uma lógica de dependência estratégica
das regiões vis-à-vis o grupo e uma lógica de inserção por parte da unidade
produtiva/gerencial na dinâmica espacial de uma determinada área, princi-
palmente pelas relações não-mercantis de cooperação-conflito com outros
atores sociais, dimensão ausente no trabalho de Krugman.
As outras duas abordagens, a economia industnaf e geografia das
corporações", podem ser identificadas como constitutivas do essencial das
contribuições teóricas que alimentam o estudo das corporações. Essas duas
perspectivas teóricas distintas comportam, todavia, pontos de contato que
permitiram expandir a análise sobre o grupo industrial. A rigor, o diálogo entre
essas duas perspectivas é abordado a partir da prática concreta dos princi-
pais grupos industriais. Ao contrário dos estudos voltados para o comércio
internacional, cuja tônica nas relações de troca privilegia um recorte espacial
baseado nos limites políticos administrativos internacionais, tanto a econo-
mia industrial quanto a geografia das corporações entendem o grupo como
organização que possui práticas e estratégias próprias, ressaltando, portan-
to, a dimensão ativa do grupo. À geografia da corporação interessa compre-
ender a espacial idade dessa dimensão.
2 Trata-se aqui de uma generalização. A economia da industrial comporta, evidente-
mente, uma pluralidade de correntes que são, grosso modo, tributárias das aborda-
gens estruturalista, behaviorista, organizacional e sistêmica. Foge ao escopo deste
trabalho o aprofundamento dessas abordagens. Um quadro sintético sobre esse
campo é fornecido por ANGELlER (1997).
3 Geografia das Corporações constitui uma linha de investigação desenvolvida prin-
cipalmente pelos geógrafos anglo-saxões. Sob essa denominação encontramos ba-
sicamente os trabalhos de Geografia Econômica que se interessam pela análise do
contexto e das trajetórias espaciais das empresas multinacionais, considerando es-
tas como forma institucional e como manifestação particular do capital.
Estrutura organizacional e reestruturação produtiva 57
A partir dessas características emergiram importantes inovações teóri-
co-conceituais. Essas inovações constituem, no quadro esboçado, desdo-
bramentos da linha cognitiva empreendida por CHANDLER (1962) e HYMER
(1978), pela vertente da economia industrial; por outro lado, a abordagem
analítica sobre as conseqüências espaciais da reestruturação produtiva e as
respostas fornecidas pelas empresas constitui o elemento central da geogra-
fia das corporações, principalmente a partir dos trabalhos de McNee, consi-
derado o fundador dessa corrente.
O trabalho de CHANDLER (1962) constitui a referência fundamental
para a análise da trajetória e da estrutura das empresas" . A importância de
suas contribuições está na ênfase por ele atribuída às formas de organiza-
ção, permitindo melhor compreender as condições de formação e de transfor-
mação da empresa. Esse aspecto foi particularmente relevante para as aná-
lises geográficas que recuperaram os temas como inovação organizacional
do sistema Industrial, a caracterização da empresa como instituição fundada
em uma estrutura hierárquica e a tipologia das formas de organização da
empresa".
A análise histórica das empresas descreve, em geral, uma situação de
decisões seqüenciais constituídas no domínio da alta direção que caracteri-
zam três escolhas estratégicas: especialização, integração e diversificação.
A cada momento os vetores de crescimento a médio e longo prazos são acom-
panhados por mudanças organizacionais mais ou menos amplas. Chandler
constatou, assim, que as empresas crescem inicialmente pela ampliação da
produção e pela extensão de sua área de atuação para, em seguida, privilegi-
arem as estratégias de integração vertical e, posteriormente, as estratégias
de diversificação. O mérito das proposições iniciais desse autor consiste no
tratamento da firma como instituição complexa composta por unidades funci-
onais integradas e unidades administrativas hierárquicas. A partir dessa pers-
pectiva, Chandler avança a idéia de que as formas de organização resultam
do aprofundamento da divisão do trabalho, antecipando, por essa via, as res-
postas das empresas às transformações nas condições de produção.
Inspirando-se nesse autor, HYMER (1978) privilegiou o princípio de
correspondência entre a centralização do controle dentro da empresa e a
centralização do controle na economia internacional para analisar a dinâmica
da expansão empresarial. Ele busca a explicação para as várias dimensões
da diversificação por meio das quais as empresas reforçam o processo de
4 A influência da obra de Chandler vai além do campo da economia industrial. A
extensão dessa influência não será aprofundada neste artigo pois tal empreitada
nos distanciaria em muito dos objetivos assinalados.
5 Na maioria dos trabalhos sobre localização industrial, essa tipologia é retomada
pelos geógrafos que acrescentam às duas formas idealizadas por Chandler, centra-
lizada (ou em U) e multidivisional (ou em M), a organização funcional e a divisional
(CHAPMAN e WALKER, 1991; HARRINGTON e WARF, 1995).
58 Revista TERRITÓRIO, ano 111,nº 5, jul./dez. 1998
centralização e de acumulação. Hymer considera esse princípio como o me-
canismo através do qual a empresa reforça seu controle sobre os canais de
comercialização e sobre os investimentos diretos em vários países. Igual-
mente a partir de Chandler, esse autor concebe uma empresa multidivisional
como sendo estruturada em três níveis de administração relacionados como
o processo de tomada de decisão e implementação das estratégias da
corporação. O nível 111corresponde à administração das operações diárias,
de curto prazo; o nível II se refere às atividades de coordenação do pessoal
do nível 111;finalmente, o nível I congrega as funções de definição das estraté-
gias e planejamento global do crescimento da corporação. Esses níveis cons-
tituem o ponto inicial para a análise da dimensão espacial da hierarquia da
corporação (HYMER, 1978).
Vale ressaltar que a ênfase atribuída por Hymer na segmentação espa-
cial dos níveis hierárquicos traduziam o controle institucional sobre a divisão
técnica e social do trabalho. Desse ponto de vista, esses níveis exerceriam
uma dupla função: assegurar a racionalidade do emprego de capital em esca-
la global e garantir um sistema de difusão dos produtos. Apesar da forte ins-
piração nos modelos de difusão de inovações a partir do nível mais elevado
da hierarquia urbana em direção aos níveis mais baixos, Hymer reconhece
que "os vínculos de comunicação podem ser ajustados em forma de retícula,
onde cada ponto esteja diretamente ligado a muitos outros pontos permitindo
tanto a comunicação horizontal como a vertical" (HYMER. 1978:54). Todavia,
o próprio autor faz um contraponto a essa afirmativa para reforçar a idéia de
hierarquia: "as empresas multinacionais centralizam o controle impondo um
sistema hierarquizado" (HYMER, 1978:54), A forma de retícula é
obstacularizada pela organização hierárquica que impõe assimetrias e limi-
tes à acumulação e à obtenção de informações direcionando e interferindo na
natureza dos fluxos de informação. Vista sob esse prisma, a dimensão espa-
cial da empresa é essencialmente hierárquica.
Na origem da "geografia da corporação", a importância atribuída à inte-
gração vertical possibilitou o desenvolvimento da noção de company region
difundida a partir dos trabalhos de Robert McNee no final dos anos cinqüenta.
Ao refletir sobre sua própria trajetória intelectual, McNEE (1986) ressalta que
tal noção foi, na época, a chave para a compreensão da estrutura nodal das
grandes empresas, particularmente no que diz respeito ao fluxo de autorida-
de (e decisão) entre o centro da corporação e suas partes constitutivas (fili-
ais, subsidiárias, etc.)". Nesse sentido, o sistema de operações da corporação
poderia ser observado em sua dimensão espacial por meio do movimento
dos fluxos de autoridade entre áreas geograficamente distintas nas quais se
localizavam unidades de produção pertencentes à mesma corporação, Ao
6 Sob esse aspecto. a aproximação entre Chandler e McNee torna-se quase obriga-
tória. Ambos concebem a estrutura organizacional como reflexo da coordenação
hierárquica das diversas operações efetuadas pela corporação.
Estrutura organizacional e reestruturação produtiva 59
associar tomada de decisão à estrutura nodal. McNee concebe cada organi-
zação como sistema coordenado hierarquicamente cujo rebatimento espacial
corresponderia à company region.
A partir desses trabalhos novas perspectivas foram abertas, principal-
mente no que diz respeito à constituição de grupos empresariais e às suas
formas de integração espacial. De um modo geral, a geografia das corporações
tornou-se a abordagem de referência para a investigação dessas questões.
Em uma síntese sobre o "estado da arte" TAYLOR e THRIFT (1986) assina-
lam a variedade de trabalhos, principalmente na literatura anglo-saxônica,
que examinam as principais contribuições sobre as grandes corporações e
os grupos empresariais. De um modo geral, essas contribuições privilegia-
ram ao longo do tempo questões como: a) o significado da atuação dessas
empresas no aprofundamento da divisão internacional do trabalho; b) a capa-
cidade da corporação em criar, por meio de suas estratégias, assimetrias na
escala nacional e regional; c) o contexto próprio à corporação e d) a relação
cidade-indústria com a subordinação da segunda pela primeira. Essa simples
demarcação de questões indica a preocupação com a dinâmica espacial da
corporação.
A complexidade crescente da produção industrial exigiu, porém, linhas
de investigação que deslocassem a ênfase, demasiado intensa, no equilíbrio
espacial para a compreensão das formas através das quais o controle
institucional se exerce sobre o território. Esse último aspecto é importante,
pois permite distinguir, tal como já o havia sugerido KAFKALAS (1985), inte-
gração funcional e integração territorial. A primeira implica ampliação do con-
trole do grupo sobre a divisão técnica e social do trabalho, ao passo que a
segunda retrata a expansão do controle sobre as atividades produtivas loca-
lizadas em uma região. Dito de outro modo, todas as grandes corporações
reagem à disponibilidade de recursos genéricos, menos decisivos no desem-
penho competitivo, e de recursos que dependem da densidade das inter-rela-
ções entre atores produtivos (VELTZ, 1993). A esses últimos devem ser acres-
centados os atores individuais não diretamente vinculados ao processo pro-
dutivo como governos municipais, organizações da sociedade civil que de-
sempenham um papel não negligenciável no processo de gestão do território,
liberando ou impondo resistências a decisões, ações e estratégias da corpo-
ração.
No Brasil, os traços diferenciadores da moderna abordagem da Geo-
grafia das Corporações encontram-se presentes nos trabalhos de CORRÊA
(1991 a; 1991 b; 1992). Corrêa recupera a noção de integração administrativa
de Hymer e de integração espacial de Kafkalas para avançar as noções de
integração territorial da gestão e de integração territorial da produção que
expressam os diferentes tempos do processo de gestão território. O sentido
inovador do tratamento analítico do autor aflora particularmente na caracteri-
zação do rebatimento espacial das funções de decisão e controle (CORRÊA,
1991a) e na compreensão da corporação como agente da gestão territorial
60 Revista TERRITÓRIO, ano 111,nO 5, jul./dez. 1998
pela capacidade de operar antecipações espaciais (CORRÊA, 1992). Corrêa
é, sem dúvida, quem mais contribuiu para o aprofundamento deste último
ponto. Fundamentalmente, através da noção de antecipação espacial e das
relações entre níveis de controle e hierarquia urbana, o autor coloca em evi-
dência o caráter estruturante das decisões estratégicas da corporação. Uma
característica essencial dessa perspectiva reside na insistência por parte desse
autor nas interações espaciais, rompendo, conseqüentemente, com as repre-
sentações tradicionais nas quais a localização das diversas unidades produ-
tivas funcionam como simples pontos de apoio para a corporação. Sobre este
último aspecto, CORRÊA (1991 b) examina a estrutura locacional da Compa-
nhia de Cigarros Souza Cruz indicando a criação de regiões fumicultoras como
produto da especialização produtiva induzida pelas estratégias de aprovisio-
namento em matéria-prima, cujo controle por parte da empresa é exercido
pela introdução da agricultura contratual. 7
Evidentemente, as considerações efetuadas até o presente deixam al-
guns pontos insuficientemente tratados. Se, por um lado, pouco pode ser ex-
traído das antigas concepções de proximidade topográfica como explicação
de localização ótima e de seu corolário - a contigüidade física como geradora
de sinergias técnico-produtivas; por outro, a estrutura locacional permanece
como elemento importante das relações íntra e extragrupo. Do exposto, emerge
uma questão no que diz respeito às possibilidades de se compreender as
interações espaciais por meio de uma decomposição da estrutura
organizacional e locacional da corporação.
3. Estrutura locacional e níveis de decisão:
uma proposta de sistematização
A compreensão das estruturas causais que condicionam a dinâmica
espacial de áreas que sofrem a atuação direta de grandes grupos industriais
suscita uma série de indagações sobre as formas através das quais o contro-
le daquelas é exercido por esse ator com reconhecida capacidade para reali-
zar investimentos espacialmente estruturantes. As práticas espaciais variam
conforme o ramo de atividade na qual as diversas empresas controladas pelo
grupo estão envolvidas. O grupo confere, no entanto, certa autonomia de ges-
tão administrativa a cada empresa ligada a um ramo especffico de atividade.
Sem aprofundar esse aspecto, deve-se salientar que essa autonomia de ges-
tão administrativa vem se tornando um elemento importante das novas for-
mas institucionais assumidas pelo grupo.
7 Em recente pesquisa de campo (janeiro de 1998), no médio Vale do rio Doce, tive-
mos a oportunidade de observar prática semelhante por parte da Companhia Vale
do Rio Doce, através de sua controlada CENIBRA, em relação aos produtores rurais
que fornecem madeira para a produção de celulose.
Estrutura organizacional e reestruturação produtiva 61
A organização geográfica do grupo é, desse modo, tributária da estru-
tura locacional; o que significa que as decisões locacionais não são isoladas
do contexto espacial. Esquematicamente, a organização geográfica pode ser
descrita por meio de "pressuposições topológicas", muito apropriadamente
examinadas por THRIFT e OLDS (1995). Como unidade de investigação, o
grupo requer a análise de três formas de organização espacial: região, rede e
fluxo. Tais pressuposições adquirem expressividade como elementos de des-
crição espacial pois indicam a coexistência de diferentes formas espaciais
que, ordenadas conjuntamente, reforçam os elos constitutivos da formação
de subespaços com acentuada especialização produtiva.
O esquema gráfico a seguir constitui uma representação dos níveis de
decisão, definidos por Chandler e retomados por Hymer, e sua projeção es-
pacial, articulando formas-funções que, no conjunto, revelam as expressões
topológicas região e fluxos, enquanto a rede é apenas sugerida pelos fluxos.
Todo o processo de representação implica um grau mais ou menos acentua-
do de abstração e, conseqüentemente, de redução das complexas interações
e interdependências entre os elementos da realidade. A projeção sobre o
plano evoca um espaço euclidiano no qual a lógica econômica assume im-
portância exacerbada, condicionando a localização das diferentes formas-
funções. O reconhecimento desta característica não invalida o esforço de
compreensão das interações entre os diversos elementos constitutivos da
estrutura espacial do grupo. Nunca é demais lembrar que esses esquemas
não podem ser tomados como fotografias da realidade, pois, se assim o fizer-
mos, recorreríamos no erro de isolar os mecanismos de articulação indepen-
dentemente de qualquer relação. O interesse desse tipo de representação
está no cunho didático para a apreensão da extensão do controle do grupo
sobre a especialização produtiva e dos fluxos que se estabelecem entre as
formas-funções na empresa considerada.
Região:
Os círculos concêntricos caracterizam, ainda que dentro das limitações
da representação bidimensional, a região como representação topológica. Sua
identicação é possível na exata medida que constituem seções espaciais for-
temente controladas pelo grupo através das unidades produtivas com menor
autonomia de decisão, mas diretamente ligadas ao processo produtivo. Esse
subespaço requer um grau relativo de homogeneidade, em função da exten-
são e do domínio espacial de um tipo específico de atividade econômica, e
uma coordenação de conjunto, submissa a um segmento "moderno" da ca-
deia produtiva. Trata-se, na realidade, de frações do espaço criadas por força
da divisão técnica e social do trabalho sob comando das ações e estratégias
empreendidas pela corporação.
Esse aspecto torna-se mais evidente na agroindústria cuja realização
pressupõe, pelas próprias exigências do processo produtivo: a) a mobilização
de recursos genéricos e específicos indispensáveis à produção; b) a modifi-
62 Revista TERRITÓRIO, ano 111,nº 5, jul./dez. 1998
ESTRUTURA DA EMPRESA E FLUXOS DE INFORMAÇÃO
NIVELI
NíVEL II
I
---1----
I
NíVEL 111
i.,;iiiI SEDE DA EMPRESA
[iJ COLIGADA I CONTROLADA
O UNIDADE PRODUTIVA
FLUXOS DE INFORMAÇÃO:
--+ FLUXOS DE ORDEM I
DECISÕES ESTRATÉGICAS
._+ FLUXOS TÉCNICO-PRODUTIVOS
cação do uso do solo pela formação de extensas áreas monocultoras; c) o
controle formal sobre o modo de produzir daqueles diretamente vinculados à
atividade econômica do grupo. Nesse caso, a coordenação de conjunto pode
ser mediada por um instrumento jurídico cujo pressuposto é o engajamento
voluntário por parte dos fornecedores de matéria-prima, tal como na introdu-
ção da agricultura contratual, citada anteriormente, Pressuposto de difícil acei-
tação quando se trata de atores com reconhecida dissimetria em suas res-
pectivas capacidades de negociação. O efeito mais evidente dessa armadura
institucional será a introdução de novos ritmos e formas de produção e a
modificação das relações sociais implicadas na produção do espaço.
Para o grupo interessa garantir a integração funcional e territorial de
modo a assegurar seu pleno desempenho estratégico. As práticas e ações
Estrutura organizacional e reestruturação produtiva 63
espaciais acabam por definir o nexo da especialização produtiva das áreas
sob seu interesse imediato. Especialização esta que encontra sua finalidade
econômica pelo peso que representa na organização e desempenho de um
ramo particular de atividade e do grupo em geral. Em última instância, o de-
sempenho estratégico sustenta-se, nas escalas local e regional, pelas praticas
e estratégias empreendidas pelas empresas controladas e pelas relações de
cooperação-conflito entre essas e os demais atores individuais envolvidos na
produção do espaço, num processo contínuo de gestão negociada.
Fluxos:
Em termos gerais, a unidade mais elementar do grupo corresponde à
unidade cuja informação produzida pode ser representada essencialmente
sob a forma de áreas bem delimitadas e para as quais são atribuídas funções
específicas. A localização em um mesmo ponto dos níveis 111e II pode repre-
sentar maior independência decisória e autonomia relativa na gestão admi-
nistrativa e das relações com os demais atores. Essa representação constitui
a estrutura de origem e suporte de um tipo específico de fluxo.
Assim, as formas fixas que integram a estrutura organizacional do gru-
po indicam uma organização regional cuja articulação local e extralocal assu-
me a expressão topológica de fluxos. Expressa-se, por intermédio desses
últimos, as interdependências entre estrutura locacional, especialização pro-
dutiva e níveis de decisão, na medida em que quaisquer alterações nesses
elementos têm implicações na criação, ampliação, direção e natureza dos
fluxos entre as diferentes unidades.
Nessa representação deve-se considerar a natureza das informações
que perco Iam pelas das unidades. Imprime-se o sentido de hierarquia e de
informação ordenada intragrupo. Em uma tal representação é possível distin-
guir as informações com reduzido grau de incerteza daquelas de elevado
grau de incerteza (COHENDET e LLERENA, 1990). As primeiras partem das
unidades produtivas que integram a cadeia produtiva na condição de unida-
des elementares, supridoras de matérias-primas e/ou de produtos semi- ela-
borados em direção à sede; são informações de curto prazo que dizem res-
peito às quantidades a serem produzidas, ao ritmo de produção, à realização
de investimentos, enfim, todo tipo de informação técnico-produtiva, ligada di-
retamente à produção. As informações com elevado grau de incerteza, para
as quais é necessário um sistema de organização, referem principalmente ao
"ambiente concorrencial" global sobre o qual o grupo, através do nível I, terá
que trabalhar para definir suas estratégias e práticas espaciais. Sua caracte-
rística mais evidente consiste na realização de alianças, ioint-ventures, parti-
cipações cruzadas cujo rebatimento espacial reflete interdependências entre
regiões e unidades produtivas pelo efeito de sinergias. As decisões estratégi-
cas são, portanto, tomadas na sede do grupo e requerem que o sistema de
organização funcione como uma sucessão lógica de ordens e controle da
informação.
64 Revista TERRITÓRIO, ano 111,nº 5, jul./dez. 1998
Redes:
As redes assumem importância particular como expressão topológica
pois estabelecem sincrônica e diacronicamente a interconexão entre lugares
como princípio da organização espacial. Nesse sentido, as redes requerem a
distinção de duas dimensões, tal como antecipou SANTOS (1996), como base
material e como dado social e político. Nesse sentido, as redes comportam
necessariamente descontinuidade e heterogeneidade como fundamento da
conexão de lugares. A rede emerge, assim, como a expressão topológica que
permite transgredir os limites mais ou menos estabelecidos da região e defi-
nir as relações entre unidades, atribuindo novas funções ou desqualificando
os lugares. Uma tal avaliação implica considerar a rede como infra-estrutura
implantada no espaço geográfico, um sistema de produção ou de consumo
ou um conjunto de lugares interconectados (DUPUY, 1991).
Como infra-estrutura, a rede possui um grau elevado de irreversibilidade,
objetos fixos cuja conexão técnica, econômica e estratégica fazem da circu-
lação a fonte geradora de valor (DUPUY, 1991). A dimensão material da rede
condiciona a intensidade dos fluxos e direciona-os segundo a dinâmica pro-
dutiva que especifica e caracteriza a interdependência entre as áreas distin-
tas. Deve-se lembrar que a noção de rede exprime, em parte, hierarquia pe-
las possibilidades de relação ofertadas a partir de nodal idades particulares;
estas mantêm maior número de relações com os demais lugares onde se
localizam as unidades do grupo. Uma tal hierarquia significa centralização
geográfica no nível I, nodal idade de ordem superior, e integração orgânica
entre os níveis 11 e 111. Decompor as estruturas de controle e decisão como
proximidade relacional coloca em evidência a conexão econômica. Esta co-
nexão é observada, por um lado, através da seletividade espacial dos inves-
timentos, e por outro lado, por meio do uso estratégico das informações, rela-
cionadas ao curto e longo prazos, das externalidades técnicas, financeiras e
não mercantis. Desse modo, a análise do grupo industrial requer o exame
detalhado dessas três pressuposições topológicas que permitem compreen-
der a natureza da organização produtiva do grupo e sua relação com a produ-
ção do espaço.
Considerações Finais
A análise da atuação de grupos industriais que orientam as estratégias
de especialização produtiva de determinadas regiões constituiu a motivação
primeira para as reflexões apresentadas neste trabalho. A partir dessa moti-
vação buscou-se estabelecer uma grade de leitura que contemplasse dife-
rentes perspectivas analíticas que, mesmo sem manter um diálogo perma-
nente, apresentam pontos de convergência. A aproximação entre os traba-
lhos fundadores da economia industrial e da geografia das corporações pare-
ce tão mais pertinente na medida em que observamos uma "redescoberta" da
Estrutu ra organizacional e reestrutu ração produtiva 65
geografia, e da geografia econômica em particular, pelos economistas inte-
ressados nos problemas da localização e na maneira pela qual esses proble-
mas os obriga a reconsiderar as relações entre atores econômicos e suas
estratégias respectivas.
O caráter exploratório desse artigo é evidente. Não obstante, procurou-
se sistematizar as principais contribuições teóricas que tentam identificar e
explicar a articulação entre estratégias espacialmente seletivas, níveis de
decisão e de controle e estrutura locacional, privilegiando a interação espaci-
al através de três expressões topológicas: região, fluxos e rede. Essas ex-
pressões traduzem diferentes formas de rebatimento no espaço das ações e
práticas empreendidadas pelo grupo; não sendo mutuamente exclusivas, for-
necem elementos de resposta no que diz repeito ao uso estratégico do territó-
rio pelo grupo, à variedade de níveis de decisão e escalas geográficas, e às
relações não mercantis de cooperação-conflito, conectando atores através
de arranjos institucionais diversos.
As mudanças tecnológicas, políticas e econômicas ocorridas nas duas
últimas décadas desencadearam um processo de reestruturação produtiva
cujos efeitos sociais e espaciais necessitam ser melhor compreendidos. A
geografia da corporação pode contribuir para o debate acerca das novas ba-
ses de desenvolvimento regional que começam a ser delineadas e que pres-
supõem interdependência econômica entre empresas, quer no âmbito produ-
tivo, quer no âmbito da gestão do território.
Bibliografia
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66
Revista TERRITÓRIO, ano 111,n!l 5, jul./dez. 1998
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Estrutura organizacional e formação de subespaços

  • 1. ESTRUTURA ORGANIZACIONAL E REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA: UMA CONTRIBUiÇÃO PARA A GEOGRAFIA DAS CORPORAÇÕES GISELA AaUINO PIRES DO Rlo* Organizational Structure and Productive Restructuring: An Exploratory Essay on the Geography of Corporations The article discusses the links be- tween the organizational and the spa- tial structures of the corporate sys- tem. Such links are said to be rein- forced by locational and administra- tive hierarchies and suggest the ex- istence of geographical specializa- tions. The corporate system may give rise to very complex spatial and or- ganizational structures. This struc- turet complexity is always in a state of change and can be depicted in a series of topological presuppositions which embody regions, flows and networks. Introdução o foco central deste trabalho refere-se à compreensão das interdepen- dências entre estrutura organizacional, estratégias de crescimento de grupos industriais e criação de subespaços especializados por força do processo de reestrururação produtiva comandado por esses atores. Trata-se de um tema amplo, cujas possibilidades de se mobilizar conceitos de origem diversa são enormes; ele remete à perspectivas teóricas distintas que tentam fornecer elementos de respostas para as múltiplas trajetórias espaciais empreendidas pelos grandes grupos industriais. Face às transformações econômicas cada vez mais complexas, o marco teórico para a interpretação da atuação de grupos industriais que passam a orientar a especialização produtiva de deter- minadas áreas tem privilegiado um conjunto de características que dizem respeito à natureza das estruturas organizacionais, às estratégias do grupo industrial e à atuação desses grupos como indutores de transformações pro- dutivas. A grade de leitura proposta não se pretende exaustiva; ela permite, no entanto, discutir três elementos característicos dos grupos: níveis distintos de . Professora do Departamento de Geografia da UFRJ.
  • 2. 52 Revista TERRITÓRIO, ano 111,n!.!5, jul./dez. 1998 controle e decisão, organização (global) integrada e estratégias institucio- nais. Esses elementos implicam considerar o grupo industrial como sistema articulado cuja projeção espacial traduz-se pela criação de subespaços especializados. As unidades elementares que compõem o grupo remetem à sua estrutura locacional. Tal estrutura não está isolada do contexto espacial: ela se enraíza pelas especificidades territoriais tais como a disponibilidade dos recursos existentes (potenciais e efetivos), a disponibilidade de infra-es- trutura material em rede, a capacidade de exploração de sinergias (locais e extra-regionais), a disponibilidade de "infra-estrutura social" e a tecnologia disponível. Nesse sentido, o terreno apresenta-se bastante movediço, pois diver- sas classificações são passíveis de serem esboçadas. Separar as diferentes contribuições utilizando-se categorias mais ou menos "estáveis", embora ape- nas satisfatório, parece-nos mais adequado às restrições impostas pela apre- sentação sistemática e pelo caráter exploratório deste trabalho. Assim, apre- sentamos na primeira seção a ruptura entre a teoria clássica da localização industrial. base incontornável da literatura em Geografia Econômica, e as ino- vações conceituais que tentam explicar as interações entre a estrutura organizacional e a formação de subespaços. Na segunda seção discutiremos três das principais abordagens que analisam as articulações estratégica e espacial do grupo industrial. Essa discussão fornecerá elementos importan- tes para, na terceira seção, a elaboração de uma proposta de sistematização para a análise de um subespaço sob o impacto direto da ação de grupos industriais. Por trás dessa discussão encontra-se, na verdade, o debate so- bre as diversas formas sob as quais o processo de reestruturação produtiva pode se manifestar. Esse processo, de extrema complexidade e de múltiplas dimensões, assume configurações específicas resultantes, de um lado, do modo de valorização dos recursos aí disponíveis e, de outro, dos "recursos construídos" que reforçam as articulações entre a escala local e as escalas extra-regionais. 1. A noção de grupo: ruptura com a lógica da firma individual A extensa bibliografia sobre as grandes corporações como atores de primeira linha na intensificação da divisão técnica e social do trabalho e, por conseguinte, da especialização produtiva de determinadas regiões tem sido orientada para a identificação de estratégias, organização espacial e compor- tamento desses atores que, nas palavras de HAMILTON (1986), podem se constituir, em alguns casos espectros e, em outros, pontas-de-Iança da inter- nacionalização do capital. De qualquer modo, a busca de um esquema geral que explique a aparente estabilidade desses atores bem como sua dinâmica global reúne-se em torno de três vertentes principais: comércio internacional, economia industrial e geografia das corporações.
  • 3. Estrutura organizacional e reestruturação produtiva 53 Antes de avançar na apresentação das três vertentes que congregam a maior parte das contribuições sobre as estratégias espaciais das grandes corporações e a indução de especializações produtivas por força daquelas, uma consideração se impõe. É interessante lembrar que essas abordagens apresentam uma evolução paralela no que diz respeito à herança neoclássica e à eclosão de estudos com propósitos estruturados, consagrados explicita- mente à análise das grandes corporações. De uma maneira geral, a herança neoclássica atribuía às iniciativas individuais o papel de fonte decisiva na implementação de estratégias de localização; tais decisões eram, portanto, estritamente do domínio do empresário-proprietário. Simplificação em micro- escala do conjunto da economia, a firma era considerada através da corres- pondência entre unidade fabril/ unidade gerencial/ única atividade. De modo semelhante, a teoria da localização industrial privilegiou, du- rante muito tempo, a firma individual, monoproduto. Há razões suficientes para rejeitarmos hoje as hipóteses que sustentam tal perspectiva, sem negli- genciar, contudo, a importância das contribuições pioneiras de Weber, l.ôsch, Isard, Greenhut, Lefeber, Ponsard, entre outros. Todavia, tais esforços de in- terpretação e formulação de uma teoria geral da localização não podem ser transportados para a realidade atual. Entre as inúmeras restrições a tais es- forços está o fato de que apenas duas questões nortearam a teoria geral da localização industrial: a) a determinação da melhor localização para uma cer- ta atividade e, b) a escolha da melhor atividade para um dado local. A respos- ta a essas questões circunscreveu os problemas de localização à utilização da firma como categoria operacional encerrada nela mesma. Trata-se, evi- dentemente, de abordagens com reduzido horizonte geográfico. Sem negar a importância das bases conceituais lançadas no século XIX, é necessário reconhecer que, nas décadas de sessenta e setenta do atual século, estudos direcionados à análise das estratégias das corporações ganharam substância em sua fundamentação teórica. Evidentemente, a ra- zão principal encontra na transformação do próprio objeto que deixa de ser a firma neoclássica para tornar-se a corporação. Sem dúvida, o número e a disparidade dos trabalhos que tratam do tema atribuem diferentes contornos a um objeto cada vez mais complexo. O alargamento dos espaços de inter- venção da grande corporação, o grau de concentração, o tamanho, a multilocalização e diversificação setorial introduziram modificações importantes no contexto internacional e regional. A noção de grupo deve ser assinalada como uma das principais inova- ções dos trabalhos que vêm explorando essa linha de investigação'. O grupo, ao contrário da firma monoproduto, caracteriza-se pela "pulverização" da ló- 1 Sem entrar na pluraridade de acepções, deve-se, contudo, ressaltar que a noção de grupo se consolida e se dissemina a partir do reconhecimento, no início deste século, de que um novo modo de estruturação e organização de redes de empresas, cada vez mais complexo, estava emergindo.
  • 4. 54 Revista TERRITÓRIO, ano 111, n? 5, jul./dez. 1998 gica normativa própria à concepção da firma neoclássica. Hipoteticamente, o grupo possui uma configuração complexa, pois requer uma estrutura gerencial centralizada (holding) para definir as estratégias de conjunto, organização por "áreas" de negócios, pressupondo, naturalmente, atividades técnico-pro- dutivas seqüenciais (integração vertical), atividades divergentes (diversifica- ção horizontal) e múltiplas unidades fabris (complexa estrutura locacional decorrente da imbricação de padrões locacionais por empresa/atividade as- sociada a efeitos de sinergia a partir de redes próprias) (DUPUY e GILLY, 1995). O grupo constitui, assim, um modo de organização suficiententemente amplo e articulado cuja escala de operação, ações e práticas de gestão per- mitem identificar o processo de reestruturação produtiva. É importante salien- tar, no entanto, que o termo reestruturação produtiva comporta um conjunto de transformações extremamente amplo, assumindo, em muitos casos, um caráter genérico aplicável a diversos níveis de análise. Reestruturação pro- dutiva engloba, assim, as microdecisões de eficiência técnico-produtiva (so- bretudo aquelas que se traduzem pela redução do efetivo de assalariados em vários setores da economia e, particularmente, no setor industrial), as dife- rentes formas de flexibilização da produção, a diversidade de estratégias de sistemas produtivos localizados, os diferentes contextos locais e regionais que permitem a alocação de investimentos com vistas à exploração dos re- cursos construídos (aquisições, fusões, seletividade espacial dos investimen- tos, etc.), as novas regulamentações e tantos outros elementos considerados passíveis de viabilizarem a competitividade mundial. Essa noção transcende, portanto, as práticas utilizadas pela grandes corporações, sem, no entanto, excluí-Ias como atores desse processo. Desse ponto de vista, o processo de reestruturação produtiva consiste num processo diferenciado no tempo e no espaço conferindo, pela intermediação de articulações horizontais e verticais, um caráter mundial aos lugares; em outros termos, cada lugar torna-se mun- dial pelo interesse que desperta nos grupos constitutivos do oligopólio mundi- al (DURAND eta/., 1992). 2. O grupo como agente da especialização produtiva: articulação estratégica e espacial Após a apresentação concisa sobre a emergência e consolidação da noção de grupo, necessária para a reconstituição do eixo estruturador so- bre o papel das grandes corporações, segue-se a apresentação das três vertentes mencionadas anteriormente. Alguns elementos comuns que sub- sidiaram a construção das diferentes abordagens sobre o tema têm sido objeto de uma releitura, principalmente no que tange às interdependências entre a estrutura organizacional do grupo e a especialização produtiva de determinadas regiões.
  • 5. Estrutura organizacional e reestruturação produtiva 55 A primeira delas, o comércio internacional, tende a mostrar a corres- pondência entre fluxo internacional, transferência de tecnologia e investimen- tos diretos no exterior, articulados às vantagens comparativas nacionais, como suporte teórico para a compreensão da organização do grupo. DUNNING (1988) associa ao quadro de dotação de fatores de produção à capaciadade das empresas em explorá-los, caracaterizando por essa via vantagens espe- cíficas à empresa e vantagens de localização. Considerar os fluxos comer- ciais, mesmo que intrafirma, como medida da concentração e centralização por ele operada, implica tratar a concorrência entre oligopólios como modo de coordenação das relações econômicas que se articulam em estruturas espaciais configurando, por seu intermédio, uma concentração da atividade econômica em determinadas áreas. Para os autores implicados na análise das trocas internacionais, essa releitura significa uma redescoberta da Geografia Econômica, principalmente da teoria da localização. Um tal interesse está ligado à necessidade de se compreender a expressão espacial de conceitos como economia de escala, economias externas que configuram vantagens competitivas espacialmente localizadas (PIRES DO RIO, 1995) e condicionam o desempenho dos gru- pos. Nesse sentido, é bastante elucidativo o trabalho de KRUGMAN (1996) no qual o autor inclui um capítulo intitulado Geography Lost and Found. Nes- se capítulo. ele explora, de forma sucinta, a noção de economias externas locais como motivação primeira para a formação de clusters de produtos em uma localização particular, explicando, desse modo, como as vantagens com- petitivas se acumulam no tempo e no espaço. O interesse de Krugman a esse respeito já havia se manifestado em trabalho anterior, quando o autor exami- nou o fenômeno da concentração geográfica na direção e intensidade das trocas comerciais. Por essa via, as estruturas locacionais e as economias externas, sobre as quais as decisões estratégicas globais e de gestão diversificada se apói- am, constituem o cimento para modelos econômicos de concentração geo- gráfica e especialização produtiva. Tal perspectiva é adotada por KRUGMAN (1990), que parte do pressuposto de que as economias de escala estão na origem da concentração das atividades industriais e, por conseguinte, as es- truturas locacionais obedecem à uma lógica circular determinada pela explo- ração de economias de escala e de economias externas. Assim, os fenôme- nos de concentração das atividades econômicas e das atividades industriais tendem a se perenizar em uma localização dada. O autor ilustra este ponto recorrendo a um modelo estilizado de concorrência entre duas unidades polí- tico-administrativas independentes. Essa representação permite compreen- der os fluxos comerciais como indicadores da intensificação das trocas entre essas unidades. De imediato, as trocas comerciais se traduzem por fluxos de produtos, tecnologia e capital entre dois pontos necessariamente eqüidistantes, mas somente um deles poderá se beneficiar das externalidades herdadas do passado. O processo de concentração da produção pela ação de economias
  • 6. 56 Revista TERRITÓRIO, ano 111,nl! 5, julJdez. 1998 de escala e de aglomeração está, portanto, na origem da diferenciação de áreas. Essa formulação traz à tona um certo paradoxo: por um lado, as estra- tégias globais dos agentes econômicos e, particularmente, dos grupos indus- triais parecem escolher pontos isolados do espaço para realizarem todas as funções requeridas pelas empresas que integram o grupo; por outro lado, as estratégias institucionais territoriais que atuam no sentido de criar e/ou perenizar determinadas especializações produtivas são praticamente excluí- das. As relações entre grupo e demais atores das áreas de implantação de unidades técnico-produtivas de um grupo são geralmente assimétricas, don- de a identificação, por parte de alguns atores, de uma dualidade organizacional para caracterizar relações de proximidade intragrupo e extragrupo (DUPUY e GILLY, 1995); essas, por sua vez, deixam de ser exclusivamente topográficas para tornarem-se relacionais. Tal deslocamento do foco tem implicações con- sideráveis no tocante à instrumentalização conceitual. As relações de pro- ximidade passam a ser regidas por uma lógica de dependência estratégica das regiões vis-à-vis o grupo e uma lógica de inserção por parte da unidade produtiva/gerencial na dinâmica espacial de uma determinada área, princi- palmente pelas relações não-mercantis de cooperação-conflito com outros atores sociais, dimensão ausente no trabalho de Krugman. As outras duas abordagens, a economia industnaf e geografia das corporações", podem ser identificadas como constitutivas do essencial das contribuições teóricas que alimentam o estudo das corporações. Essas duas perspectivas teóricas distintas comportam, todavia, pontos de contato que permitiram expandir a análise sobre o grupo industrial. A rigor, o diálogo entre essas duas perspectivas é abordado a partir da prática concreta dos princi- pais grupos industriais. Ao contrário dos estudos voltados para o comércio internacional, cuja tônica nas relações de troca privilegia um recorte espacial baseado nos limites políticos administrativos internacionais, tanto a econo- mia industrial quanto a geografia das corporações entendem o grupo como organização que possui práticas e estratégias próprias, ressaltando, portan- to, a dimensão ativa do grupo. À geografia da corporação interessa compre- ender a espacial idade dessa dimensão. 2 Trata-se aqui de uma generalização. A economia da industrial comporta, evidente- mente, uma pluralidade de correntes que são, grosso modo, tributárias das aborda- gens estruturalista, behaviorista, organizacional e sistêmica. Foge ao escopo deste trabalho o aprofundamento dessas abordagens. Um quadro sintético sobre esse campo é fornecido por ANGELlER (1997). 3 Geografia das Corporações constitui uma linha de investigação desenvolvida prin- cipalmente pelos geógrafos anglo-saxões. Sob essa denominação encontramos ba- sicamente os trabalhos de Geografia Econômica que se interessam pela análise do contexto e das trajetórias espaciais das empresas multinacionais, considerando es- tas como forma institucional e como manifestação particular do capital.
  • 7. Estrutura organizacional e reestruturação produtiva 57 A partir dessas características emergiram importantes inovações teóri- co-conceituais. Essas inovações constituem, no quadro esboçado, desdo- bramentos da linha cognitiva empreendida por CHANDLER (1962) e HYMER (1978), pela vertente da economia industrial; por outro lado, a abordagem analítica sobre as conseqüências espaciais da reestruturação produtiva e as respostas fornecidas pelas empresas constitui o elemento central da geogra- fia das corporações, principalmente a partir dos trabalhos de McNee, consi- derado o fundador dessa corrente. O trabalho de CHANDLER (1962) constitui a referência fundamental para a análise da trajetória e da estrutura das empresas" . A importância de suas contribuições está na ênfase por ele atribuída às formas de organiza- ção, permitindo melhor compreender as condições de formação e de transfor- mação da empresa. Esse aspecto foi particularmente relevante para as aná- lises geográficas que recuperaram os temas como inovação organizacional do sistema Industrial, a caracterização da empresa como instituição fundada em uma estrutura hierárquica e a tipologia das formas de organização da empresa". A análise histórica das empresas descreve, em geral, uma situação de decisões seqüenciais constituídas no domínio da alta direção que caracteri- zam três escolhas estratégicas: especialização, integração e diversificação. A cada momento os vetores de crescimento a médio e longo prazos são acom- panhados por mudanças organizacionais mais ou menos amplas. Chandler constatou, assim, que as empresas crescem inicialmente pela ampliação da produção e pela extensão de sua área de atuação para, em seguida, privilegi- arem as estratégias de integração vertical e, posteriormente, as estratégias de diversificação. O mérito das proposições iniciais desse autor consiste no tratamento da firma como instituição complexa composta por unidades funci- onais integradas e unidades administrativas hierárquicas. A partir dessa pers- pectiva, Chandler avança a idéia de que as formas de organização resultam do aprofundamento da divisão do trabalho, antecipando, por essa via, as res- postas das empresas às transformações nas condições de produção. Inspirando-se nesse autor, HYMER (1978) privilegiou o princípio de correspondência entre a centralização do controle dentro da empresa e a centralização do controle na economia internacional para analisar a dinâmica da expansão empresarial. Ele busca a explicação para as várias dimensões da diversificação por meio das quais as empresas reforçam o processo de 4 A influência da obra de Chandler vai além do campo da economia industrial. A extensão dessa influência não será aprofundada neste artigo pois tal empreitada nos distanciaria em muito dos objetivos assinalados. 5 Na maioria dos trabalhos sobre localização industrial, essa tipologia é retomada pelos geógrafos que acrescentam às duas formas idealizadas por Chandler, centra- lizada (ou em U) e multidivisional (ou em M), a organização funcional e a divisional (CHAPMAN e WALKER, 1991; HARRINGTON e WARF, 1995).
  • 8. 58 Revista TERRITÓRIO, ano 111,nº 5, jul./dez. 1998 centralização e de acumulação. Hymer considera esse princípio como o me- canismo através do qual a empresa reforça seu controle sobre os canais de comercialização e sobre os investimentos diretos em vários países. Igual- mente a partir de Chandler, esse autor concebe uma empresa multidivisional como sendo estruturada em três níveis de administração relacionados como o processo de tomada de decisão e implementação das estratégias da corporação. O nível 111corresponde à administração das operações diárias, de curto prazo; o nível II se refere às atividades de coordenação do pessoal do nível 111;finalmente, o nível I congrega as funções de definição das estraté- gias e planejamento global do crescimento da corporação. Esses níveis cons- tituem o ponto inicial para a análise da dimensão espacial da hierarquia da corporação (HYMER, 1978). Vale ressaltar que a ênfase atribuída por Hymer na segmentação espa- cial dos níveis hierárquicos traduziam o controle institucional sobre a divisão técnica e social do trabalho. Desse ponto de vista, esses níveis exerceriam uma dupla função: assegurar a racionalidade do emprego de capital em esca- la global e garantir um sistema de difusão dos produtos. Apesar da forte ins- piração nos modelos de difusão de inovações a partir do nível mais elevado da hierarquia urbana em direção aos níveis mais baixos, Hymer reconhece que "os vínculos de comunicação podem ser ajustados em forma de retícula, onde cada ponto esteja diretamente ligado a muitos outros pontos permitindo tanto a comunicação horizontal como a vertical" (HYMER. 1978:54). Todavia, o próprio autor faz um contraponto a essa afirmativa para reforçar a idéia de hierarquia: "as empresas multinacionais centralizam o controle impondo um sistema hierarquizado" (HYMER, 1978:54), A forma de retícula é obstacularizada pela organização hierárquica que impõe assimetrias e limi- tes à acumulação e à obtenção de informações direcionando e interferindo na natureza dos fluxos de informação. Vista sob esse prisma, a dimensão espa- cial da empresa é essencialmente hierárquica. Na origem da "geografia da corporação", a importância atribuída à inte- gração vertical possibilitou o desenvolvimento da noção de company region difundida a partir dos trabalhos de Robert McNee no final dos anos cinqüenta. Ao refletir sobre sua própria trajetória intelectual, McNEE (1986) ressalta que tal noção foi, na época, a chave para a compreensão da estrutura nodal das grandes empresas, particularmente no que diz respeito ao fluxo de autorida- de (e decisão) entre o centro da corporação e suas partes constitutivas (fili- ais, subsidiárias, etc.)". Nesse sentido, o sistema de operações da corporação poderia ser observado em sua dimensão espacial por meio do movimento dos fluxos de autoridade entre áreas geograficamente distintas nas quais se localizavam unidades de produção pertencentes à mesma corporação, Ao 6 Sob esse aspecto. a aproximação entre Chandler e McNee torna-se quase obriga- tória. Ambos concebem a estrutura organizacional como reflexo da coordenação hierárquica das diversas operações efetuadas pela corporação.
  • 9. Estrutura organizacional e reestruturação produtiva 59 associar tomada de decisão à estrutura nodal. McNee concebe cada organi- zação como sistema coordenado hierarquicamente cujo rebatimento espacial corresponderia à company region. A partir desses trabalhos novas perspectivas foram abertas, principal- mente no que diz respeito à constituição de grupos empresariais e às suas formas de integração espacial. De um modo geral, a geografia das corporações tornou-se a abordagem de referência para a investigação dessas questões. Em uma síntese sobre o "estado da arte" TAYLOR e THRIFT (1986) assina- lam a variedade de trabalhos, principalmente na literatura anglo-saxônica, que examinam as principais contribuições sobre as grandes corporações e os grupos empresariais. De um modo geral, essas contribuições privilegia- ram ao longo do tempo questões como: a) o significado da atuação dessas empresas no aprofundamento da divisão internacional do trabalho; b) a capa- cidade da corporação em criar, por meio de suas estratégias, assimetrias na escala nacional e regional; c) o contexto próprio à corporação e d) a relação cidade-indústria com a subordinação da segunda pela primeira. Essa simples demarcação de questões indica a preocupação com a dinâmica espacial da corporação. A complexidade crescente da produção industrial exigiu, porém, linhas de investigação que deslocassem a ênfase, demasiado intensa, no equilíbrio espacial para a compreensão das formas através das quais o controle institucional se exerce sobre o território. Esse último aspecto é importante, pois permite distinguir, tal como já o havia sugerido KAFKALAS (1985), inte- gração funcional e integração territorial. A primeira implica ampliação do con- trole do grupo sobre a divisão técnica e social do trabalho, ao passo que a segunda retrata a expansão do controle sobre as atividades produtivas loca- lizadas em uma região. Dito de outro modo, todas as grandes corporações reagem à disponibilidade de recursos genéricos, menos decisivos no desem- penho competitivo, e de recursos que dependem da densidade das inter-rela- ções entre atores produtivos (VELTZ, 1993). A esses últimos devem ser acres- centados os atores individuais não diretamente vinculados ao processo pro- dutivo como governos municipais, organizações da sociedade civil que de- sempenham um papel não negligenciável no processo de gestão do território, liberando ou impondo resistências a decisões, ações e estratégias da corpo- ração. No Brasil, os traços diferenciadores da moderna abordagem da Geo- grafia das Corporações encontram-se presentes nos trabalhos de CORRÊA (1991 a; 1991 b; 1992). Corrêa recupera a noção de integração administrativa de Hymer e de integração espacial de Kafkalas para avançar as noções de integração territorial da gestão e de integração territorial da produção que expressam os diferentes tempos do processo de gestão território. O sentido inovador do tratamento analítico do autor aflora particularmente na caracteri- zação do rebatimento espacial das funções de decisão e controle (CORRÊA, 1991a) e na compreensão da corporação como agente da gestão territorial
  • 10. 60 Revista TERRITÓRIO, ano 111,nO 5, jul./dez. 1998 pela capacidade de operar antecipações espaciais (CORRÊA, 1992). Corrêa é, sem dúvida, quem mais contribuiu para o aprofundamento deste último ponto. Fundamentalmente, através da noção de antecipação espacial e das relações entre níveis de controle e hierarquia urbana, o autor coloca em evi- dência o caráter estruturante das decisões estratégicas da corporação. Uma característica essencial dessa perspectiva reside na insistência por parte desse autor nas interações espaciais, rompendo, conseqüentemente, com as repre- sentações tradicionais nas quais a localização das diversas unidades produ- tivas funcionam como simples pontos de apoio para a corporação. Sobre este último aspecto, CORRÊA (1991 b) examina a estrutura locacional da Compa- nhia de Cigarros Souza Cruz indicando a criação de regiões fumicultoras como produto da especialização produtiva induzida pelas estratégias de aprovisio- namento em matéria-prima, cujo controle por parte da empresa é exercido pela introdução da agricultura contratual. 7 Evidentemente, as considerações efetuadas até o presente deixam al- guns pontos insuficientemente tratados. Se, por um lado, pouco pode ser ex- traído das antigas concepções de proximidade topográfica como explicação de localização ótima e de seu corolário - a contigüidade física como geradora de sinergias técnico-produtivas; por outro, a estrutura locacional permanece como elemento importante das relações íntra e extragrupo. Do exposto, emerge uma questão no que diz respeito às possibilidades de se compreender as interações espaciais por meio de uma decomposição da estrutura organizacional e locacional da corporação. 3. Estrutura locacional e níveis de decisão: uma proposta de sistematização A compreensão das estruturas causais que condicionam a dinâmica espacial de áreas que sofrem a atuação direta de grandes grupos industriais suscita uma série de indagações sobre as formas através das quais o contro- le daquelas é exercido por esse ator com reconhecida capacidade para reali- zar investimentos espacialmente estruturantes. As práticas espaciais variam conforme o ramo de atividade na qual as diversas empresas controladas pelo grupo estão envolvidas. O grupo confere, no entanto, certa autonomia de ges- tão administrativa a cada empresa ligada a um ramo especffico de atividade. Sem aprofundar esse aspecto, deve-se salientar que essa autonomia de ges- tão administrativa vem se tornando um elemento importante das novas for- mas institucionais assumidas pelo grupo. 7 Em recente pesquisa de campo (janeiro de 1998), no médio Vale do rio Doce, tive- mos a oportunidade de observar prática semelhante por parte da Companhia Vale do Rio Doce, através de sua controlada CENIBRA, em relação aos produtores rurais que fornecem madeira para a produção de celulose.
  • 11. Estrutura organizacional e reestruturação produtiva 61 A organização geográfica do grupo é, desse modo, tributária da estru- tura locacional; o que significa que as decisões locacionais não são isoladas do contexto espacial. Esquematicamente, a organização geográfica pode ser descrita por meio de "pressuposições topológicas", muito apropriadamente examinadas por THRIFT e OLDS (1995). Como unidade de investigação, o grupo requer a análise de três formas de organização espacial: região, rede e fluxo. Tais pressuposições adquirem expressividade como elementos de des- crição espacial pois indicam a coexistência de diferentes formas espaciais que, ordenadas conjuntamente, reforçam os elos constitutivos da formação de subespaços com acentuada especialização produtiva. O esquema gráfico a seguir constitui uma representação dos níveis de decisão, definidos por Chandler e retomados por Hymer, e sua projeção es- pacial, articulando formas-funções que, no conjunto, revelam as expressões topológicas região e fluxos, enquanto a rede é apenas sugerida pelos fluxos. Todo o processo de representação implica um grau mais ou menos acentua- do de abstração e, conseqüentemente, de redução das complexas interações e interdependências entre os elementos da realidade. A projeção sobre o plano evoca um espaço euclidiano no qual a lógica econômica assume im- portância exacerbada, condicionando a localização das diferentes formas- funções. O reconhecimento desta característica não invalida o esforço de compreensão das interações entre os diversos elementos constitutivos da estrutura espacial do grupo. Nunca é demais lembrar que esses esquemas não podem ser tomados como fotografias da realidade, pois, se assim o fizer- mos, recorreríamos no erro de isolar os mecanismos de articulação indepen- dentemente de qualquer relação. O interesse desse tipo de representação está no cunho didático para a apreensão da extensão do controle do grupo sobre a especialização produtiva e dos fluxos que se estabelecem entre as formas-funções na empresa considerada. Região: Os círculos concêntricos caracterizam, ainda que dentro das limitações da representação bidimensional, a região como representação topológica. Sua identicação é possível na exata medida que constituem seções espaciais for- temente controladas pelo grupo através das unidades produtivas com menor autonomia de decisão, mas diretamente ligadas ao processo produtivo. Esse subespaço requer um grau relativo de homogeneidade, em função da exten- são e do domínio espacial de um tipo específico de atividade econômica, e uma coordenação de conjunto, submissa a um segmento "moderno" da ca- deia produtiva. Trata-se, na realidade, de frações do espaço criadas por força da divisão técnica e social do trabalho sob comando das ações e estratégias empreendidas pela corporação. Esse aspecto torna-se mais evidente na agroindústria cuja realização pressupõe, pelas próprias exigências do processo produtivo: a) a mobilização de recursos genéricos e específicos indispensáveis à produção; b) a modifi-
  • 12. 62 Revista TERRITÓRIO, ano 111,nº 5, jul./dez. 1998 ESTRUTURA DA EMPRESA E FLUXOS DE INFORMAÇÃO NIVELI NíVEL II I ---1---- I NíVEL 111 i.,;iiiI SEDE DA EMPRESA [iJ COLIGADA I CONTROLADA O UNIDADE PRODUTIVA FLUXOS DE INFORMAÇÃO: --+ FLUXOS DE ORDEM I DECISÕES ESTRATÉGICAS ._+ FLUXOS TÉCNICO-PRODUTIVOS cação do uso do solo pela formação de extensas áreas monocultoras; c) o controle formal sobre o modo de produzir daqueles diretamente vinculados à atividade econômica do grupo. Nesse caso, a coordenação de conjunto pode ser mediada por um instrumento jurídico cujo pressuposto é o engajamento voluntário por parte dos fornecedores de matéria-prima, tal como na introdu- ção da agricultura contratual, citada anteriormente, Pressuposto de difícil acei- tação quando se trata de atores com reconhecida dissimetria em suas res- pectivas capacidades de negociação. O efeito mais evidente dessa armadura institucional será a introdução de novos ritmos e formas de produção e a modificação das relações sociais implicadas na produção do espaço. Para o grupo interessa garantir a integração funcional e territorial de modo a assegurar seu pleno desempenho estratégico. As práticas e ações
  • 13. Estrutura organizacional e reestruturação produtiva 63 espaciais acabam por definir o nexo da especialização produtiva das áreas sob seu interesse imediato. Especialização esta que encontra sua finalidade econômica pelo peso que representa na organização e desempenho de um ramo particular de atividade e do grupo em geral. Em última instância, o de- sempenho estratégico sustenta-se, nas escalas local e regional, pelas praticas e estratégias empreendidas pelas empresas controladas e pelas relações de cooperação-conflito entre essas e os demais atores individuais envolvidos na produção do espaço, num processo contínuo de gestão negociada. Fluxos: Em termos gerais, a unidade mais elementar do grupo corresponde à unidade cuja informação produzida pode ser representada essencialmente sob a forma de áreas bem delimitadas e para as quais são atribuídas funções específicas. A localização em um mesmo ponto dos níveis 111e II pode repre- sentar maior independência decisória e autonomia relativa na gestão admi- nistrativa e das relações com os demais atores. Essa representação constitui a estrutura de origem e suporte de um tipo específico de fluxo. Assim, as formas fixas que integram a estrutura organizacional do gru- po indicam uma organização regional cuja articulação local e extralocal assu- me a expressão topológica de fluxos. Expressa-se, por intermédio desses últimos, as interdependências entre estrutura locacional, especialização pro- dutiva e níveis de decisão, na medida em que quaisquer alterações nesses elementos têm implicações na criação, ampliação, direção e natureza dos fluxos entre as diferentes unidades. Nessa representação deve-se considerar a natureza das informações que perco Iam pelas das unidades. Imprime-se o sentido de hierarquia e de informação ordenada intragrupo. Em uma tal representação é possível distin- guir as informações com reduzido grau de incerteza daquelas de elevado grau de incerteza (COHENDET e LLERENA, 1990). As primeiras partem das unidades produtivas que integram a cadeia produtiva na condição de unida- des elementares, supridoras de matérias-primas e/ou de produtos semi- ela- borados em direção à sede; são informações de curto prazo que dizem res- peito às quantidades a serem produzidas, ao ritmo de produção, à realização de investimentos, enfim, todo tipo de informação técnico-produtiva, ligada di- retamente à produção. As informações com elevado grau de incerteza, para as quais é necessário um sistema de organização, referem principalmente ao "ambiente concorrencial" global sobre o qual o grupo, através do nível I, terá que trabalhar para definir suas estratégias e práticas espaciais. Sua caracte- rística mais evidente consiste na realização de alianças, ioint-ventures, parti- cipações cruzadas cujo rebatimento espacial reflete interdependências entre regiões e unidades produtivas pelo efeito de sinergias. As decisões estratégi- cas são, portanto, tomadas na sede do grupo e requerem que o sistema de organização funcione como uma sucessão lógica de ordens e controle da informação.
  • 14. 64 Revista TERRITÓRIO, ano 111,nº 5, jul./dez. 1998 Redes: As redes assumem importância particular como expressão topológica pois estabelecem sincrônica e diacronicamente a interconexão entre lugares como princípio da organização espacial. Nesse sentido, as redes requerem a distinção de duas dimensões, tal como antecipou SANTOS (1996), como base material e como dado social e político. Nesse sentido, as redes comportam necessariamente descontinuidade e heterogeneidade como fundamento da conexão de lugares. A rede emerge, assim, como a expressão topológica que permite transgredir os limites mais ou menos estabelecidos da região e defi- nir as relações entre unidades, atribuindo novas funções ou desqualificando os lugares. Uma tal avaliação implica considerar a rede como infra-estrutura implantada no espaço geográfico, um sistema de produção ou de consumo ou um conjunto de lugares interconectados (DUPUY, 1991). Como infra-estrutura, a rede possui um grau elevado de irreversibilidade, objetos fixos cuja conexão técnica, econômica e estratégica fazem da circu- lação a fonte geradora de valor (DUPUY, 1991). A dimensão material da rede condiciona a intensidade dos fluxos e direciona-os segundo a dinâmica pro- dutiva que especifica e caracteriza a interdependência entre as áreas distin- tas. Deve-se lembrar que a noção de rede exprime, em parte, hierarquia pe- las possibilidades de relação ofertadas a partir de nodal idades particulares; estas mantêm maior número de relações com os demais lugares onde se localizam as unidades do grupo. Uma tal hierarquia significa centralização geográfica no nível I, nodal idade de ordem superior, e integração orgânica entre os níveis 11 e 111. Decompor as estruturas de controle e decisão como proximidade relacional coloca em evidência a conexão econômica. Esta co- nexão é observada, por um lado, através da seletividade espacial dos inves- timentos, e por outro lado, por meio do uso estratégico das informações, rela- cionadas ao curto e longo prazos, das externalidades técnicas, financeiras e não mercantis. Desse modo, a análise do grupo industrial requer o exame detalhado dessas três pressuposições topológicas que permitem compreen- der a natureza da organização produtiva do grupo e sua relação com a produ- ção do espaço. Considerações Finais A análise da atuação de grupos industriais que orientam as estratégias de especialização produtiva de determinadas regiões constituiu a motivação primeira para as reflexões apresentadas neste trabalho. A partir dessa moti- vação buscou-se estabelecer uma grade de leitura que contemplasse dife- rentes perspectivas analíticas que, mesmo sem manter um diálogo perma- nente, apresentam pontos de convergência. A aproximação entre os traba- lhos fundadores da economia industrial e da geografia das corporações pare- ce tão mais pertinente na medida em que observamos uma "redescoberta" da
  • 15. Estrutu ra organizacional e reestrutu ração produtiva 65 geografia, e da geografia econômica em particular, pelos economistas inte- ressados nos problemas da localização e na maneira pela qual esses proble- mas os obriga a reconsiderar as relações entre atores econômicos e suas estratégias respectivas. O caráter exploratório desse artigo é evidente. Não obstante, procurou- se sistematizar as principais contribuições teóricas que tentam identificar e explicar a articulação entre estratégias espacialmente seletivas, níveis de decisão e de controle e estrutura locacional, privilegiando a interação espaci- al através de três expressões topológicas: região, fluxos e rede. Essas ex- pressões traduzem diferentes formas de rebatimento no espaço das ações e práticas empreendidadas pelo grupo; não sendo mutuamente exclusivas, for- necem elementos de resposta no que diz repeito ao uso estratégico do territó- rio pelo grupo, à variedade de níveis de decisão e escalas geográficas, e às relações não mercantis de cooperação-conflito, conectando atores através de arranjos institucionais diversos. As mudanças tecnológicas, políticas e econômicas ocorridas nas duas últimas décadas desencadearam um processo de reestruturação produtiva cujos efeitos sociais e espaciais necessitam ser melhor compreendidos. A geografia da corporação pode contribuir para o debate acerca das novas ba- ses de desenvolvimento regional que começam a ser delineadas e que pres- supõem interdependência econômica entre empresas, quer no âmbito produ- tivo, quer no âmbito da gestão do território. Bibliografia ANGELIER, Jean-Pierre (1997): Économie Industrielle. Grenoble: PUG. CHANDLER, Alfred D. (1962): Strategyand Structure. Cambridge: MIT Press. CHAPMAN,Keith e WALKER,David (1991): Industrialloca/ion. Oxford: Basil Blackwell. COHENDET, Patrick e LLERENA, Patrick (1990): "Nature de I'information, évaluation et organization de I'entreprise". Revue d'Économie Industrielle (51), pp. 141- 165. CORRÊA, Roberto Lobato (1991a): "Corporação e espaço: uma nota". Revista Bra- sileira de Geografia 53 (1): 137-145. ----- (1991b): "Corporação e organização espacial: um estudo de caso" Re- vista Brasileira de Geografia 53 (3): 33-66. ----- (1992): "Corporação, Práticas Espaciais e Gestão do Território" Revista Brasileira de Geografia 54 (3): 115-121. DIXON, C. J., DRAKAKIS-SMITH, D. e WATIS, H. D. (ed.) (1986): Multinational Corporations and the Third World. Londres: Croorn Helm. DUNNING, J. H. (1988), Explaning Intemational Production. Londres: Unwin Hyman.
  • 16. 66 Revista TERRITÓRIO, ano 111,n!l 5, jul./dez. 1998 DUPUY, Claude e GILLY Jean Pierre. (1995): "Les stratégies territoriales des grands groupes industriels" in: RALLET, A. e TORRE, A., Économie Industrielle et Économie Spatiale. Paris: Economica. DUPUY, Gabriel (1991): L'urbanisme des réseaux: théories et méthodes. Paris: Armand Colin. DURANO, Marie-Françoise et ai. (1993): Le monde, espaces et svstêmee, Paris: Presses de la londation Nationale des Sciences Politiques e Dalloz. HAMILTON. lan (1986): "Multinationals: spearhead or spectre?" in: OIXON, C. J., DRAKAKIS-SMITH, O. e WATTS, H. O. (ed.), Multinational Corporations and the Third World. Londres: Croom Helm. HARRINGTON, James W. e SARNEY, Wart (1995): Industrial Location: principies, practice and policy. Londres: Routledge. HYMER, Stephen (1978): Empresas Multinacionais: a internacionalização do capi- tal. Rio de Janeiro: Graal. KAFKALAS, Grigoris (1985): "Location 01 production and lorms 01spalial integration: theoretical consideralions and some examples Irom lhe non-Iuel minerais sector". International Journal of Urban and regional Research 9 (2), pp. 233-253. KRUGMAN, Paul (1991): Geography and Trade, Londres: MIT Press e Universidade de Leuven, Bélgica. _____________ (1996): Oevelopment, Geography and Economic Theory, Cambridge: MIT Press, 2.ª ed. MANNERS, Gerald (1986): "Multinationals and the sxploítation 01 non-renewable resourees" DIXON, C. J., DRAKAKIS-SMITH, D. e WATTS, H. D. (ed.), Multinational Corporations and the Third World. Londres: Croom Helm. MeNEE, Robert (1986): "One perspeclive on lhe enterprise perspective" In: TAYLOR, Miehael e THRIFT, Nigel (ed.) (1986), Multinationa/s and the restructuring of the world economy. Londres: Croom Helm. PIRES DO RIO, Gisela (1995): "Industry-space relalions, International Competitiveness and Environment: a geographical analysis 01 lhe aluminium industry" The European Geographer (9).Lisboa, pp. 140-151. PORTER, Michel E. (1990): Choix stratégique et concurrence. Paris: Eeonomica, 1990. SANTOS, Milton (1996): A natureza do espaço. São Paulo: HUCITEC. TAYLOR, Michael e THRIFT, Nigel (ed.) (1986): Multinationa/s and the restructuring of lhe world economy. Londres: Croom Helm. THRIFT, Nigel e OLOS, Kris (1996): Refiguring lhe economie in economic geography Progress in Human Geography 20 (3), pp. 311-337. VELTZ, Pierre (1993): "O'une géographie des coüts à une géogrphie de I'organisation: quelques thàses sur I'évolution des rapports entreprises territoires" Revue Économique 44 (4), pp. 671-684.