O documento trata de uma ação popular movida contra o Distrito Federal e a Administradora Regional do Gama por obras realizadas em uma área destinada a se tornar um parque urbano. A sentença julgou procedente o pedido autoral, entendendo que as obras configuraram lesão ambiental e invalidade dos atos administrativos que as permitiram, em desacordo com a proteção constitucional do meio ambiente.
Peg do gama. Parque Ecológico do Gama, DF. Sentença ação popular
1. 06/02/2019
Número: 0713435-81.2017.8.07.0018
Classe: AÇÃO POPULAR
Órgão julgador: Vara de Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário do DF
Última distribuição : 04/12/2017
Valor da causa: R$ 5.000,00
Assuntos: Antecipação de Tutela / Tutela Específica, Multa Cominatória / Astreintes, Unidade de
Conservação da Natureza
Segredo de justiça? NÃO
Justiça gratuita? NÃO
Pedido de liminar ou antecipação de tutela? SIM
Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios
PJe - Processo Judicial Eletrônico
Partes Advogados
EDER ALVES DE SOUZA BRANT (AUTOR)
JUAN RICTHELLY VIEIRA DA SILVA (ADVOGADO)
JULIA SOLANGE SOARES DE OLIVEIRA (ADVOGADO)
DISTRITO FEDERAL (RÉU)
MARIA ANTONIA RODRIGUES MAGALHÃES (ADM REG DO
GAMA) (RÉU)
Outros participantes
MINISTERIO PUBLICO DO DISTRITO FEDERAL E DOS
TERRITORIOS (FISCAL DA LEI)
INSTITUTO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS
HIDRICOS DO DISTRITO FEDERAL - IBRAM
(INTERESSADO)
Documentos
Id. Data da
Assinatura
Documento Tipo
28496904 06/02/2019
14:37
Sentença Sentença
2. Num. 28496904 - Pág. 1
Poder Judiciário da União
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS
TERRITÓRIOS
VMADUFDF
Vara de Meio Ambiente, Desenvolvimento Urbano e Fundiário do DF
Número do processo: 0713435-81.2017.8.07.0018
Classe judicial: AÇÃO POPULAR (66)
AUTOR: EDER ALVES DE SOUZA BRANT
RÉU: DISTRITO FEDERAL, MARIA ANTONIA RODRIGUES MAGALHÃES (ADM REG DO
GAMA)
SENTENÇA
Cuida-se de ação popular movida por Eder Alves de Souza Brant em face do Distrito Federal e
Administradora Regional do Gama. Alegou o autor que o Decreto n. 11190/88 criou o Parque Urbano e
Vivencial do Gama (PUVG), a ser instalado nas antigas quadras 1 e 2 do Setor Norte do Gama, uma área
de cerrado caracterizada como campo de murundu; que a Lei Distrital 1959/98 reiterou a criação do
mesmo PUVG, mas foi posteriormente declarada inconstitucional por vício de iniciativa, sem, contudo,
desconstituir o Decreto 11190/88; que a área do parque vem sendo reiteradamente degradada, com a
conivência da Administração Regional; que os empreendimentos resultaram em desmatamento e
asfaltamento do parque, para atender a interesses de autoescolas; que em 2017, o Distrito Federal
recategorizou a unidade de conservação, agora sob o nome de Parque Ecológico do Gama (PEG); que a
administradora regional vem dando apoio às invasões no interior do parque; que em 27/11/17, foi
publicada no DODF a construção de uma sala de apoio institucional e banheiros para autoescolas, na área
do parque; que o plano de manejo da área encontra-se em fase de elaboração, e poderá resultar na
necessidade de remoção das construções que vêm sendo empreendidas rapidamente; que a Portaria 80/17
da Secretaria de Estado do Meio Ambiente instituiu o Grupo de Trabalho Parque do Gama (GTPC),
integrado por moradores e órgãos de governo; que a Administração Regional do Gama não consultou o
GTPG sobre as obras, embora tenha se reunido com pessoas e entidades invasoras da unidade de
conservação. Pediu liminar para embargar a continuidade da obra no interior do parque, bem como a
demolição do que houver sido construído e, como tutela definitiva, a cominação de proibição da execução
de obras públicas ou privadas no interior do PEG em desconformidade com a legislação, enquanto não
houver plano de manejo definido e oitiva do do Grupo de Trabalho dos Parques do Gama, e a
determinação de realocação das atividades de autoescola para outra área.
Em decisão inaugural, a demanda foi recebida como ação popular, sendo deferida a tutela de
urgência, para embargar a obra (ID 11823972).
No pronunciamento do ID 12062379, o MP oficiou pela procedência do pedido autoral.
Em contestação, o Distrito Federal suscitou preliminarmente a necessidade de inclusão do Administrador
Regional do Gama no polo passivo, a ausência de demonstração específica do ato ilegal e lesivo ao
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patrimônio público. No mérito, alegou que a Administração Regional do Gama justificou a elaboração de
projeto básico para a contratação de empresa para a construção de banheiros públicos e sala de apoio
institucional no parque; que o IBRAM afirmou que a obra seria feita não estaria contida na área de
criação do Parque Ecológico do Gama; que será necessário recriar o parque, em razão da
inconstitucionalidade da Lei n. 1959/98; que não houve recategorização do parque, porque será necessário
recriar a área como unidade de conservação; que o IBRAM vem realizando estudos para o plano de
manejo da futura unidade de conservação a ser criada, o que implicará na reavaliação, em conjunto com a
comunidade, da poligonal a ser respeitada; que o autor não fez prova de qualquer ato ilegal ou abusivo da
Administração; que as obras discutidas não prejudicam os atributos da futura unidade de conservação; que
a construção de banheiros e uma pequena sala de apoio institucional para examinadores do DETRAN não
carece de EIA/RIMA, e nem é ato ilegal ou lesivo ao patrimônio público; que o juiz não pode substituir o
administrador na escolha do local de reunião das autoescolas com alunos. Pediu a extinção do processo ou
o julgamento de improcedência do pedido autoral.
Na decisão de ID 12658544, determinou-se a reinclusão de Maria Antonia Rodrigues Magalhães ao polo
passivo da relação processual.
Em agravo, foi deferido o efeito suspensivo à decisão liminar, permitindo-se o prosseguimento da obra
questionada.
A ré Maria Antonia não apresentou resposta (certidão no ID 14555097).
O MPDFT realizou estudo técnico do caso, apresentando relatório no ID 23686751. Ratificou a
manifestação favorável ao acolhimento da demanda.
É o relatório. Decido.
A preliminar de ausência de pressuposto processual aborda, na realidade, o mérito da causa. De fato, a
verificação de ato administrativo ilegal e lesivo é típico mérito, aferível num juízo de ponderação de fatos
e pretensões jurídicas, e não de mero pressuposto processual. Logo, não conheço da preliminar em
questão, abordando as características do ato administrativo impugnado como razões de mérito, a seguir.
Os fatos que emergem dos autos indicam que a parte ré executou pavimentação e ergueu uma pequena
construção destinada a servir de banheiro e sala de apoio institucional para alunos e instrutores de
autoescolas, em imóvel integrante do patrimônio da Terracap, com vocação para o acolhimento de uma
unidade de conservação que só não foi até agora implementada em razão da proverbial incompetência
administrativa reinante no Distrito Federal.
A defesa baseia sua linha argumentativa em favor da pretensa legitimidade da alteração da área
ecologicamente sensível na tese de que o Parque do Gama não tem ainda suas poligonais oficiais
definidas. Investigue-se o porquê de um parque que é amplamente reconhecido pela comunidade local
como tal (ainda que a despeito da flagrante negligência do poder público) não existir formalmente e
encontra-se uma história recorrente: leis de gestão da cidade costumam ser invalidadas pelos mais
diversos motivos, que vão de vícios de origem, passando por inconstitucionalidades materiais,
decorrências de ineficiência ou simplesmente má-fé.
De fato, como aponta o relatório técnico produzido pelo MP, desde 1985 o losango destinado ao Parque
do Gama foi reconhecido como impróprio para construções por sua característica brejosa e de fraca
resistência para edificações. É exatamente a característica “brejosa” da região que a torna ecologicamente
sensível, o que vai de encontro ao que o autor indica como propriedades naturais do parque que exigem
especial atenção e proteção.
Assim, expediu-se o Decreto n. 11.190/88, que criou o Parque Urbano do Gama. Em que pese a
indefinição sobre suas poligonais, não há dúvidas de que o parque urbano tem existência jurídica, o que já
atrai, de per si, a tutela jurídica ambiental.
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Ressalva o réu que, como não há a definição da poligonal do parque, não se pode afirmar que a obra
discutida nos autos tenha incidido na unidade de conservação.
O raciocínio da defesa subverte por completo o princípio da precaução, que é basilar no direito ambiental.
Com efeito, se há a certeza de que uma determinada região tem especial sensibilidade ambiental, a ponto
de justificar a instituição de um parque, vivencial ou ecológico, a dúvida sobre se uma determinada
porção de terra na mesma região destinada ao parque insere-se ou não na proteção ambiental não se
resolve pela remoção da proteção ambiental, mas exatamente pelo contrário: na dúvida, deve-se presumir
que o imóvel encontra-se, sim, sob proteção jurídica, e não o contrário: !IN DUBIO, PRO NATURA
A ausência de elaboração de EIA/RIMA antes da agressão ao parque só incrementa a constatação da lesão
ambiental. De fato, dado que o art. 225, IV, da Carta, exige a elaboração do estudo e relatório de impacto
a qualquer obra potencialmente causadora de significativa degradação ambiental, a mera ausência desta
providência já representa, de per si, lesão ambiental. Nem se diga que uma edificação erguida em uma
área ecologicamente sensível não represente significativa degradação ambiental – sendo área non
, qualquer obra, por menor que seja, em área ecologicamente sensível, representa significativaaedificandi
degradação ambiental, a exigir estudos que induzam ao menos alternativas de compensação ambiental ao
dano que será causado.
Não é demais lembrar que o interesse jurídico de preservação ambiental qualifica-se como difuso,
pertencente inclusive às gerações futuras, donde decorre que não pode o gestor da coisa pública priorizar
interesses particulares em detrimento do interesse ambiental, sob pena de violar interesses mais amplos,
ocasionando inclusive conflitos intergeracionais.
O art. 225 da Constituição institui rigoroso sistema de proteção ao bem jurídico ambiental, incumbindo o
dever de preservação especialmente ao poder público, a quem são dirigidas as cominações dos diversos
parágrafos do dispositivo. Daí se afirmar que outro dos princípios basilares do direito ambiental é o
princípio de proibição de proteção insuficiente: o poder público, em todos os seus níveis e esferas, é
incumbido de mover todos os esforços possíveis na proteção ambiental, sendo vedada a conduta omissiva
ou mesmo ineficiente frente à degradação ambiental.
É evidente que a decisão de se destinar parte de uma unidade de conservação (que só tem suas poligonais
indefinidas pela inércia do próprio estado) para construção de unidade de apoio a autoescolas é uma
completa subversão da proteção ambiental imposta constitucionalmente ao estado, pois importa em
desfalcar uma unidade de conservação, mediante impermeabilização de terreno relevante exatamente pelo
aspecto brejoso, para a finalidade de se ampliar atividade relacionada a veículos automotores.
Numa república, nenhum gestor tem poder absoluto. Mesmo o poder discricionário tem limites, ou seja,
as escolhas por conveniência e oportunidade devem ser exercidas sempre dentro de opções conforme o
ordenamento jurídico. Dentre as opções evidentemente vedadas pela ordem constitucional, não pode
haver dúvidas de que incluem-se as que importem em degradação ambiental, como a desastrosa opção
questionada nesta demanda.
Do exposto, restam perfeitamente caracterizados os requisitos da ação popular: o ato administrativo nulo e
lesivo, senão vejamos.
A Lei 4717/64 (Lei da Ação Popular – LAP) define como nulos os atos administrativos com defeito de
competência, forma, objeto, motivo ou finalidade. Entende-se que há inexistência de motivos quando “a
matéria de fato ou de direito, em que se fundamenta o ato, é materialmente inexistente ou juridicamente
inadequada ao resultado obtido” (LAP, 2º, par. único, “d”).
Ora, a alteração na composição ambiental de uma unidade de conservação, para a alocação de
equipamento destinado a autoescola é evidentemente incompatível com a proteção jurídica do bem
ambiental, malferindo flagrantemente o comando constitucional conservacionista, vale dizer, a invocação
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da demanda oriunda de um setor econômico, ainda que respaldada em 500 assinaturas em
abaixo-assinado, é matéria de fato juridicamente inadequada como suporte para a degradação ambiental
resultante da obra impugnada na demanda.
Logo, é inequívoca a invalidade dos atos administrativos que permitiram a degradação ambiental
denunciada neste feito.
A lesividade é mais que evidente, posto que não é necessário formação técnica muito refinada para
reconhecer que a pavimentação do solo e construção de uma edificação são atos incompatíveis com a
conservação dos aspectos naturais de uma unidade de conservação. Não é demais lembrar que a
lesividade que justifica o controle de legalidade do ato administrativo pela via da ação popular não é a
mera lesão financeira contra o erário, mas a lesão a todo e qualquer interesse jurídico relevante, como
sublinha a previsão constitucional: “qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a
anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade
administrativa, e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovadaao meio ambiente
má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência” (CF, 5º, LXXIII).
As considerações acima coadunam-se com o excelente estudo do caso contido no r. pronunciamento
ministerial do ID 12062379, que são a seguir transcritos e adotados como razões de decidir (a propósito,
louve-se a laboriosa cooperação do órgão ministerial que, bem desempenhando sua função institucional
de fiscal e representante dos interesses jurídicos da sociedade civil organizada, prestou relevante auxílio
na compreensão do caso, pelo subsídio prestado por sua assessoria técnica):
“É salutar destacar que, de acordo com o art. 23, III, VI e VII, da Constituição Federal, é competência
comum (executiva) da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal proteger o meio
ambiente, as paisagens naturais, combater a poluição e preservar as florestas, a fauna e a flora. Nesse
aspecto, reza o art. 225, §1º, I, II e III, da Carta Magna o seguinte:
Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e
essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá-lo para as presentes e futuras gerações. § 1º - Para assegurar a efetividade desse direito,
incumbe ao Poder Público: (…) III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços
territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão
permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos
; (Grifo nosso).atributos que justifiquem sua proteção
A Lei Orgânica do Distrito Federal reforçou as obrigações do Poder Público local em relação à criação,
implantação e conservação de espaços especialmente protegidos em seus artigos 279 e 295.
Nos termos do art. 295 do referido diploma legal, os Parques Ecológicos do Distrito Federal são espaços
territoriais especialmente protegidos.
Com efeito, a Lei Complementar Distrital nº 265/1999 disciplina a definição e objetivos das unidades de
conservação caracterizadas como parques ecológicos nos arts. 4º e 5º, abaixo reproduzidos:
Art. 4º Os Parques Ecológicos devem possuir áreas de preservação permanente, nascentes, olhos d'água,
veredas, matas ciliares, campos de murunduns ou manchas representativas de qualquer fitofisionomia do
cerrado que abranjam, no mínimo, trinta por cento da área total da unidade.
Art. 5º São objetivos dos Parques Ecológicos:
I – conservar amostras dos ecossistemas naturais;
II – proteger paisagens naturais de beleza cênica notável, bem como atributos excepcionais de natureza
geológica, geomorfológica, espeleológica e histórica;
III – proteger e recuperar recursos hídricos, edáficos e genéticos;
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IV – promover a recuperação de áreas degradadas e a sua revegetação com espécies nativas;
V – incentivar atividades de pesquisa, estudos e monitoramento ambiental;
VI – estimular o desenvolvimento da educação ambiental e das atividades de recreação e lazer em contato
harmônico com a natureza.
Por sua vez, a Lei Complementar Distrital nº 827, de 22 de julho de 2010, instituiu o Sistema Distrital de
Unidades de Conservação da Natureza – SDUC, e assim dispõe:
Art. 18. O Parque Ecológico tem como objetivo conservar amostras dos ecossistemas naturais, da
vegetação exótica e paisagens de grande beleza cênica; propiciar a recuperação dos recursos hídricos,
edáficos e genéticos; recuperar áreas degradadas, promovendo sua revegetação com espécies nativas;
incentivar atividades de pesquisa e monitoramento ambiental e estimular a educação ambiental e as
atividades de lazer e recreação em contato harmônico com a natureza.
§ 1º O Parque Ecológico é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus
limites serão desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei.
§ 2º O Parque Ecológico deve possuir, no mínimo, em trinta por cento da área total da unidade, áreas de
preservação permanente, veredas, campos de murundus ou mancha representativa de qualquer
fitofisionomia do Cerrado.
§ 3º A visitação pública é permitida e incentivada e está sujeita às normas e restrições estabelecidas no
plano de manejo da unidade, às normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua supervisão e
administração e àquelas previstas em regulamento.
§ 4º A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável pela administração da
unidade e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas, bem como àquelas previstas em
regulamento.
A Corte Especial deixa indene de dúvidas o espectro de proteção legal conferido às unidades de
conservação. A respeito, confira-se o entendimento do E. STJ, exarado no Resp 1071741/SP, Relator
Ministro Herman Benjamin:
AMBIENTAL. UNIDADE DE CONSERVAÇÃO DE PROTEÇÃO INTEGRAL (LEI 9.985/00).
OCUPAÇÃO E CONSTRUÇÃO ILEGAL POR PARTICULAR NO PARQUE ESTADUAL DE
JACUPIRANGA. TURBAÇÃO E ESBULHO DE BEM PÚBLICO. DEVER-PODER DE CONTROLE
E FISCALIZAÇÃO AMBIENTAL DO ESTADO. OMISSÃO. ART. 70, § 1º, DA LEI 9.605/1998.
DESFORÇO IMEDIATO. ART. 1.210, § 1º, DO CÓDIGO CIVIL. ARTIGOS 2º, I E V, 3º, IV, 6º E 14, §
1º, DA LEI 6.938/1981 (LEI DA POLÍTICA NACIONAL DO MEIO AMBIENTE). CONCEITO DE
POLUIDOR. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO DE NATUREZA SOLIDÁRIA, OBJETIVA,
ILIMITADA E DE EXECUÇÃO SUBSIDIÁRIA. LITISCONSÓRCIO FACULTATIVO. (…) 2. Na sua
missão de proteger o meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações,
como patrono que é da preservação e restauração dos processos ecológicos essenciais, incumbe ao Estado
“definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem
especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada
qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção”
(Constituição Federal, art. 225, § 1º, III). 3. A criação de Unidades de Conservação não é um fim em si
mesmo, vinculada que se encontra a claros objetivos constitucionais e legais de proteção da Natureza. Por
isso, em nada resolve, freia ou mitiga a crise da biodiversidade – diretamente associada à insustentável e
veloz destruição de habitat natural –, se não vier acompanhada do compromisso estatal de, sincera e
eficazmente, zelar pela sua integridade físico-ecológica e providenciar os meios para sua gestão técnica,
transparente e democrática. A ser diferente, nada além de um “sistema de áreas protegidas de papel ou de
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fachada” existirá, espaços de ninguém, onde a omissão das autoridades é compreendida pelos
degradadores de plantão como autorização implícita para o desmatamento, a exploração predatória e a
ocupação ilícita.
O Parque, objeto desta ação, encontra-se em uma área de cerrado, coberta de vegetação
predominantemente por vegetação que caracteriza como um campo de murundus.
Ademais, foram instaurados, no âmbito deste Órgão Ministerial, o Procedimento Administrativo (PA) nº
08190.043956/15-13 tratando de possíveis invasões no Parque Vivencial Urbano do Gama e a Notícia de
Fato (NF) n° 08190.188500/17-52 com o teor mencionado na presente ação pela parte autora, consoante
ID 11793971.
Os peritos do Instituto de Criminalística da Polícia Civil do Distrito Federal, pelo Laudo de Exame de
Local de Danos ao Ambiente n° L-0008762/01, que foi juntado ao PA mencionado, informou que além de
trechos de buritis, sobre solo hidromórfico, quais são elementos caracterizadores de vereda, próximo aos
buritis, “constataram reserva natural, onde aflorava o lençol freático (nascente).
Pela análise do PJe , verifica-se que o autor tem razão, haja vista a nova obra de banheiros e sala de apoio
institucional, referente a publicação no DODF, dia 27 de novembro de 2017 (ID 11794553), encontra-se
na área do Parque, estacionamento, que somente beneficiará as atividades das autoescolas da cidade.
Após quase 2 (dois) anos de trâmite com o expediente administrativo, mencionado posteriormente, a
Agência de Fiscalização do Distrito Federal (AGEFIS), elaborou o relatório de caracterização de
ocupação ilegal nº Z-860.893 REL. Entretanto, não há data estabelecida para a desconstituição dessas
ocupações irregulares, dentre elas, o estacionamento irregular, que as autoescolas da cidade usam para a
realização de suas atividades”.
Sobre a responsabilidade da administradora regional Maria Antonia Rodrigues Magalhães, é indubitável
que a edificação em comento só se realizou em razão de sua insistência, mesmo diante dos
questionamentos de cidadãos e mesmo da liminar deferida ao início deste procedimento. Não há qualquer
elemento que afaste sua responsabilidade direta pela degradação ambiental. Recordando-se que o
interesse ambiental tem suporte jurídico, e todo aquele que causa danos a direitos alheios é obrigado a
reparar, emerge a responsabilidade pessoal da administradora na recomposição do dano ambiental, de
modo solidário com o ente público.
Em face do exposto, julgo procedente o pedido, para declarar a nulidade dos atos administrativos que
importaram na execução da obra de pavimentação e edificação de sala de apoio institucional a autoescolas
na região do Parque do Gama.
Dado que os réus Distrito Federal e a administradora regional Maria Antonia Rodrigues Magalhães
insistiram em resistir ao embargo judicial, prosseguindo na edificação ilegal, têm a obrigação solidária de
recompor o estado de fato anterior do imóvel, mediante a demolição e remoção dos entulhos da obra
causadora do dano ambiental, de modo a restaurar a composição física natural, no prazo de 30 dias desde
a publicação desta sentença, sob pena de multa diária no valor de R$ 2.000,00, limitada ao valor global de
R$ 2.000.000,00.
Comino aos réus a proibição de executar ou autorizar obras públicas ou particulares na área a ser
destinada ao Parque do Gama, enquanto não houver plano de manejo e adequada consulta pública prévia,
sob pena de multa no valor de R$ 50.000,00 por cada ato de violação à presente cominação, sem prejuízo
da responsabilidade criminal e/ou por improbidade administrativa respectiva.
Sem custas e sem honorários.
Brasília, 6 de fevereiro de 2019 14:32:33.
CARLOS FREDERICO MAROJA DE MEDEIROS