[1] O documento discute os conceitos de privação, saciação e operações estabelecedoras no behaviorismo. [2] Explora a diferença entre operações estabelecedoras e discriminação e analisa os conceitos de "necessidade", "instinto" e "impulso" sob a perspectiva da análise experimental do comportamento. [3] Aborda como as operações estabelecedoras podem ser usadas para entender e tratar problemas de comportamento.
1.
Fundamentos Teóricos em Psicologia II - Comportamentalismo
Aula 8
Operações estabelecedoras
P R O F. D R . C A I O M A X I M I N O
C M A X I M I N O @ U N I F E S S PA . E D U. B R
2. Objetivos
1. Conceituar privação e saciação
2. Contextualizar historicamente o conceito de operação
estabelecedora
3. Diferenciar operação estabelecedora e discriminação
4. Analisar os conceitos de “necessidade”, “instinto” e “impulso” sob
a ótica da AEC
5. Discorrer sobre o tempo como variável nas operações
estabelecedoras
3. Saber e querer
• “É comum falarmos na diferença entre o ‘saber’ e o ‘querer’ quando nos referimos a
aprendizagem e motivação, respectivamente” (Miguel, 2000)
•Na AEC, os problemas da motivação costumam ser explicados a partir da função reforçadora dos
estímulos
• “O problema do ‘querer’ (não querer fazer algo) muitas vezes tem suas raízes na falta de reforçamento
disponível para que o comportamento ocorra” (Miguel, 2000)
•Dado que o reforço é arbitrário, como podemos usar esse conceito para explicar a motivação?
• “Muitas vezes o problema não está na falta de consequências para o comportamento, mas na ineficácia
de tais consequências” (Miguel, 2000)
•“(...) a probabilidade de beber toma-se muito alta sob severa privação de água e muito baixa sob
saciação excessiva(... ). O significado biológico da mudança na probabilidade é óbvio (...). Em
sentido evolucionário, isso “explica” por que a privação fortalece todos os comportamentos
condicionados e incondicionados relacionados com a ingestão de água”. (CCH, pp. 155-156)
4. Impulsos
•Em CCH, Skinner usará o termo Drive (“impulso”) para
identificar operações de privação e saciação
•Skinner (1938): cada impulso possui suas próprias
operações definidoras; no caso da “fome” (como impulso),
a operação definidora seria a privação de alimento
•Essas operações são necessárias para explicar a
manutenção do comportamento, porque só o histórico de
reforçamento não é capaz de fazê-lo.
5. Necessidades e impulsos
“Tradicionalmente um organismo bebe porque precisa de
água, dá um passeio porque precisa de exercicio, respira
mais rapida e profundamente porque carece de ar, e come
vorazmente porque tem muita fome. Necessidades,
impulsos, desejos e apetites são bons exemplos das
causas interiores (...)” (CCH, p. 157)
“Necessidades e desejos tendem a ser entendidos mais
como psíquicos ou mentais, enquanto apetites e impulsos
tendem a ser concebidos mais como fisiológicos. Mas são
termos usados livremente quando nenhuma dessas
dimensões foi observada” (idem)
6. Necessidades e impulsos como variáveis
intervenientes
•CCH, p. 157: dizemos que alguém “está sedento” quando não bebeu água
durante vários dias, e afirmamos que provavelmente irá beber quando tiver
oportunidade explicação disposicional, estado interno inferido a partir da
operação
•“Por outro lado, a operação é inferida do próprio comportamento – quando
observamos alguém bebendo grandes quantidades de água e afirmamos sem
hesitar que está com muita sede” (pp. 157-158) inferência a partir do
comportamento, estado interno atribuído à história de privação
•Em ambos os casos, o estado inferido é desnecessário para explicar o
comportamento (MESMO QUANDO INFERIMOS UM ESTADO FISIOLÓGICO [p.
159])
7. Privação e saciação
•Se, em 1938, Skinner qualifica os impulsos por suas
próprias operações definidoras, em CCH a ideia de que as
operações de privação e saciação são suficientes para
explicar todo o comportamento motivado está
amadurecida
•Privação: Redução na disponibilidade de um reforçador.
•Saciação: Apresentação continuada ou disponibilidade de
um reforçador que reduz sua efetividade
8. O que não é um impulso
•“Impulso não é um estímulo” o comportamento associado à operação de privação continua mesmo quando a
privação se encerra, e não é necessariamente motivado pelo estado extremo
• A operação distingue-se dos efeitos discriminativos e eliciadores do S
• Crítica à etologia (estímulo-sinal) e à psicanálise (pulsão)
•“Impulso não é um estado fisiológico” “Na medida em que, da história de privação inferirmos o estado ou o
gerarmos criando essa história, o estado não terá valor algum ao nos dispensar desta história.” (CCH, p. 159)
• Crítica da fisiologia da motivação (Cannon)
•“Impulso não é um estado psíquico” Eventos privados são de difícil acesso, e, se a privação afetar o
comportamento, esses eventos não são úteis para a previsão
• Crítica ao neobehaviorismo (Hull/Tolman)
•“Impulso não é simplesmente um estado de frequência” Fazer referência somente à alta frequência ou
probabilidade do comportamento sem referir-se à história é falho, dado que outras variáveis (p. ex., esquema de
reforçamento) podem aumentar a probabilidade sem mexer na privação
9. Questões básicas em relação aos impulsos
•A literatura motivacional levanta diversas perguntas
sobre os impulsos:
•Quantos são?
•Qual a força relativa deles?
•Saciar um impulso reduz outro?
•Todos os impulsos podem ser reduzidos a um específico?
•Redução inter-teórica – i.e., recolocar as questões
em termos de privação e saciação (CCH, pp. 163-170)
10. Quantos são os impulsos?
•Duas traduções possíveis:
•“Quando inferimos impulsos partindo de histórias de privação,
podemos perguntar de quantos modos um organismo pode ser
privado” (CCH, p. 163)
•Outra tradução possível é “quantas espécies de comportamento
variam em freqüência independentemente uns dos outros? Com
esta base podemos distinguir entre comer, beber, comportamento
sexual, e assim por diante, do mesmo modo que entre subdivisões
de cada um desses campos” (CCH, p. 164)
11. Os impulsos são respostas condicionadas?
•As operações estabelecedoras sempre estão relacionadas com o
reforço operante; “para um organismo faminto o alimento é tanto
reforçador quanto saciador” (CCH, p. 164)
•Essa relação é especialmente importante no caso dos reforçadores
condicionados e das respostas encadeadas, nos quais as respostas
são evocadas por um processo de privação e saciação do reforçador
primário
•Os reforçadores generalizados (p. ex., dinheiro) são “eficazes sob
inúmeras privações, alguma das quais estará provavelmente
presente em um dado momento qualquer” (CCH, p. 166)
12. Os impulsos se inter-relacionam?
•A afirmação freudiana de que toda atividade “é de natureza
essencialmente sexual” pode ser traduzida em termos de OEs:
“a probabilidade de um ato, do qual se afirma ser sexual em
sua natureza, muda com a privação ou saciação sexual? Se
mudar, o ato pode ser encarado como sexual, mesmo que
topograficamente não se assemelhe ao comportamento
obviamente sexual” (CCH, p. 169).
•Crítica semelhante ao “impulso de dominação” (Bassett,
Adler, MacDougall, Allport); além disso, via de regra privar
alguém de dominação automaticamente o priva de outros
reforçadores, o que sugere que é um reforçador condicionado
14. Comportamento evocado
•O estímulo antecedente pode ter função
•eliciadora, quando sua apresentação produz
fidedignamente uma resposta
•discriminativa, quando sua apresentação está
correlacionada com um reforço
•reforçadora, quando aumentam a probabilidade de uma
resposta por associação com outro reforçador
•evocadora, quando estabelece o valor reforçador da
consequência
15. Exemplo (Michael, 1982)
•Uma pessoa está propensa a tomar um refrigerante e ao
localizar uma máquina de venda automática, procura na bolsa
por uma moeda
• A máquina é um SD, porque estabelece a ocasião na qual é possível
obter o refrigerante
• Mas, EM RELAÇÃO À MOEDA, a máquina é um evento estabelecedor:
ela torna a moeda importante!
•Por isso, Skinner diz que “impulso não é um estímulo” (sensu
etologia), dado que
• não produz fidedignamente a resposta (i.e., não a elicia)
• não sinaliza consequência
16. O conceito de operação estabelecedora
•Michael (1982): “Nossa forma de falar sobre o controle de
estímulos operante parece incluir mas falha em distinguir
entre duas formas bastante diferente de controle” (p. 149)
•Eventos como os de privação/saciação e estimulação
aversiva possuem características em comum
1. Alteram momentaneamente a efetividade reforçadora de
outros eventos
2. Alteram a frequência de ocorrência de todo o
comportamento que foi reforçador por esses eventos
17. Efeitos da privação
• Keller e Schoenfeld (1950): (1) mudança momentânea de um grupo de R (evocação) e (2)
tornar o reforçamento possível (estabelecimento da consequência como reforçadora)
• Efeito estabelecedor ou de abolição: Uma OE estabelece a efetividade reforçadora atual de
algum S, objeto, ou evento
• A PRIVAÇÃO DE ÁGUA AUMENTA (E A INGESTA DE ÁGUA DIMINUI) O VALOR REFORÇADOR DA ÁGUA
• UM AUMENTO DE DOR CAUSA UM AUMENTO DE (E UMA DIMINUIÇÃO DA DOR DIMINUI) A EFETIVIDADE
REFORÇADORA DA REDUÇÃO DA DOR
• Efeito evocativo ou ablativo: Uma EO evoca qualquer comportamento que foi reforçado pelo
mesmo S cuja efetividade reforçadora é alterada
• A PRIVAÇÃO DE ÁGUA AUMENTA A FREQUÊNCIA ATUAL DE QUALQUER COMPORTAMENTO REFORÇADO POR
ALIMENTO
• UM AUMENTO DA DOR CAUSA UM AUMENTO NA FREQUÊNCIA ATUAL DE QUALQUER COMPORTAMENTO REFORÇADO
PELA REDUÇÃO DA DOR
18. Michael (1993)
Efeito estabelecedor de reforçamento: Alteração
momentânea da efetividade reforçadora/punidora de um
S
Efeito evocativo/supressivo da OE: Alteração imediata de
comportamentos que, no passado, produziram o S+
Efeito evocativo/supressivo do SD: Alteração da
efetividade de todos os SDs correlacionados com S+
Efeito sobre o reforço/punição condicionado: Alteração
da efetividade reforçadora/punidora de qualquer
consequência condicionada
19. Exemplo: Cadeia comportamental
•“(...) não dizemos que há impulsos especiais associados com as
primeiras respostas da seqüência pois não há operações paralelas
de privação. Termos tradicionais, como ‘desejo’, ‘vontade’, e assim
por diante, reconhecem os passos subsidiários. Por exemplo,
poderíamos dizer que um homem primeiro quer um táxi, depois
quer que o motorista o leve à Lapa, então quer achar um
determinado restaurante, depois quer abrir a porta, e ainda quer
uma mesa, o cardápio, um filé. Mas como não há um processo de
saciação e privação envolvido neste caso, exceto no último item,
não há razão para se pensar em impulsos correspondentes.” (CCH,
p. 165-166)
20. Estímulos estabelecedores (SE)
•Existem algumas situações nas quais a mudança de S estabelece
outra condição como reforçadora sem alterar a efetividade do
reforçador primário relevante
•Ex.: Um rato em uma caixa de Skinner pressiona uma barra na
presença de um SD (luz) e recebe água como consequência; a
ausência da luz (S) sinaliza EXT
• A privação de água funciona como OE (altera valor reforçador da água)
• A luz funciona como SD, que passa a ocasionar R
• A luz funcionaria também como SE, dado que altera o valor da R como
uma forma de reforçamento condicionado (a presença da barra é
condição necessária para respostas de olhar ou aproximar-se da barra)
21. Operações estabelecedoras condicionadas
•CCH: Muitos dos exemplos que, na literatura motivacional, remetem a
impulsos específicos podem ser explicados por reforçadores condicionados e
sua relação com as OEs
•Michael (1988): Divisão entre operações estabelecedoras incondicionadas
(OEIs) e operações estabelecedoras condicionadas (OECs)
•OEIs: Envolvem operações que têm efeitos de estabelecimento sobre os
reforçadores, independente de qualquer aprendizagem (p. ex., privação,
estimulação aversiva, ingestão de sal, mudança de temperatura, &c)
•OECs: Inclui OEs cujo efeito de estabelecimento do reforçador é aprendido
22. Um exemplo
•Um eletricista precisa, para desparafusar um
parafuso, de uma chave-de-fenda
•A visão do parafuso evocaria o comportamento
verbal de solicitar a chave de fenda a um ajudante
•Isso é um SD ou uma OEC?
23. OEs na análise aplicada do comportamento
•Smith e Iwata (1997): Para o diagnóstico e tratamento de transtornos, é
preciso estabelecer (além das respostas e das consequências que as
mantém) as condições que estabelecem a forma de reforçamento que
mantém o comportamento
•Durand e Crimmins (1988), O’Reilly (1999) – comportamentos-problema
mantido por atenção têm maior probabilidade de ocorrer em ambientes
pobres em contatos sociais
•Cameron, Ainsleigh e Bird (1992) – reduziram comportamentos agressivos
mantidos por reforçamento negativo através da manipulação da tarefa que
supostamente evocava tais comportamentos (sabonete em barra vs
sabonete líquido)