O documento discute a motivação e desmotivação no aprendizado de línguas. A motivação pode ser ativada por fatores internos como o desejo de se relacionar com outros, e externos como um ambiente autêntico de aprendizagem. A desmotivação ocorre quando não há necessidade para aprender, como em salas de aula sem cultura estrangeira. Manter a motivação é mais importante do que motivá-la, evitando fatores desmotivadores.
1. MOTIVAÇÃO E DESMOTIVAÇÃO
NO APRENDIZADO DE LÍNGUAS
Prof. Dr. Richard Schütz
www.sk.com.br
Referência:
SCHÜTZ, Ricardo. "Motivação e Desmotivação no Aprendizado de Línguas" English
Made in Brazil <http://www.sk.com.br/sk-motiv.html>. Online. 10 de novembro de 2003.
MOTIVAÇÃO
A motivação pode ser definida como o conjunto de fatores
circunstanciais e dinâmicos que determina a conduta de um indivíduo.
A motivação é uma força interior propulsora, de importância decisiva no
desenvolvimento do ser humano. Assim como na aprendizagem em geral, o ato
de se aprender línguas é ativo e não passivo. Não se trata de se submeter a um
tratamento, mas sim de construir uma habilidade. Não é o professor que ensina
nem o método que funciona; é o aluno que aprende. Por isso, a motivação do
aprendiz no aprendizado de línguas é um elemento chave.
A motivação pode ser ativada tanto por fatores internos como
externos.
A origem da motivação é sempre o desejo de se satisfazer
necessidades. O ser humano é um animal social por natureza e, como tal, tem
uma necessidade absoluta de se relacionar com os outros de seu ambiente.
Essa tendência integrativa da pessoa é o principal fator interno ativador da
motivação para muitos de seus atos. Por exemplo, se estivermos em um
ambiente caracterizado pela presença de uma língua estrangeira, naturalmente
teremos uma forte e imediata motivação para assimilarmos essa ferramenta que
nos permite interagir no ambiente, dele participar e nele atuar. Aprender uma
língua fora do ambiente de sua cultura seria como aprender a nadar fora d'água.
As características dos ambientes que freqüentamos representam
fatores externos. Por exemplo, se o ambiente em que o aprendizado da língua
deve ocorrer for autêntico e proporcionar atividades voltadas aos interesses do
aprendiz, o grau de motivação será alto. Entretanto, se o ambiente carecer de
2. autenticidade, de elementos da cultura estrangeira, como por exemplo uma sala
de aula com um número excessivo de alunos e um professor de proficiência
limitada, onde a L2 dificilmente se impõe sobre a L1, e se as atividades nesse
ambiente forem ditadas por um plano didático predeterminado em vez de
centradas na pessoa e nos interesses do aprendiz, o grau de motivação será
baixo.
Outra necessidade que buscamos satisfazer (principalmente crianças,
adolescentes e jovens adultos) é a necessidade de se explorar o desconhecido.
Esta característica do ser humano também demonstra a importância do
ambiente de aprendizado da língua estar autenticado pela marca e presença da
cultura estrangeira.
Na criação de ambientes especificamente para o ensino e o
aprendizado de uma língua, mapas, fotografias, filmes e música podem ajudar,
mas nada substitui a pessoa estrangeira. O falante nativo é a personificação da
língua e da cultura estrangeira, e por isso forte fator estimulador da motivação. O
contato intercultural mostra ao aprendiz a funcionalidade da língua e leva-o a se
identificar com a cultura estrangeira e a desejar integrar-se a ela, produzindo,
como conseqüência, o desejo de imitar, de pensar e falar igual.
Além de poder ser ativada por fatores internos e externos, a motivação
pode ser classificada em direta e indireta.
Motivação direta seria aquela que nos impulsiona diretamente ao objeto
que satisfaz uma necessidade nossa. Por exemplo: você admira e se identifica
com uma cultura estrangeira e investe todos seus esforços no aprendizado da
respectiva língua.
Motivação indireta ou instrumental é aquela que nos impulsiona em
direção a um objetivo intermediário, por exemplo, aprender inglês, que, por sua
vez, possibilitará a satisfação de uma necessidade maior. Esta é provavelmente
a forma mais freqüente de motivação no aprendizado de línguas. Veja os
exemplos abaixo:
1 Exemplo 1: Você tem um forte desejo de conhecer a técnica da
fotografia e dispõe de excelente literatura sobre o assunto, em
3. inglês. Embora você não entenda textos em inglês, vai aplicar todo
seu esforço para decifrar a língua e assim obter as informações ali
contidas.
2 Exemplo 2: Se um jovem norte-americano se apaixona por uma
jovem de origem hispânica, que vive numa das muitas comunidades
hispânicas nos EUA, ele poderá investir esforços no aprendizado do
espanhol para conquistar a simpatia da jovem e de sua família.
3 Exemplo 3: Uma pessoa ambiciosa, extremamente motivada em
direção ao sucesso em sua carreira profissional, embora sem
talento nem motivação para línguas, poderá investir exaustivos
esforços em seu aprendizado, o qual indiretamente, possibilitará a
realização de um objetivo (satisfação de uma necessidade) maior.
4 Exemplo 4: Você busca o aprendizado da língua estrangeira
porque reconhece nela uma ferramenta indispensável tanto em sua
carreira acadêmica como profissional, ou simplesmente porque quer
ser ouvido e reconhece no inglês um poderoso meio de expressão
neste mundo globalizado.
É interessante observar que freqüentemente uma motivação indireta
acaba dando origem à motivação direta. Ou seja, a pessoa inicialmente
impulsionada em seu ato por um objetivo indireto maior, acaba "tomando gosto",
descobrindo valores antes desconhecidos, destruindo imagens estereotipadas,
encontrando no "sacrifício" intermediário um objeto de motivação direta. Isto
ocorre na medida em que a experiência de aprendizado da língua é
complementada com o aprendizado da respectiva cultura, passando ambos a
fazer parte da coleção de experiências de vida da pessoa.
DESMOTIVAÇÃO
Se a motivação se origina no desejo de se satisfazer uma necessidade,
não havendo necessidade, não haverá motivação. Pelo contrário, a reação
normal da pessoa, quando compelida a uma atividade não resultante de um
desejo de satisfazer uma necessidade, é a desmotivação.
4. Um ambiente de sala de aula voltada ao ensino formal de uma língua
estrangeira, sem a presença de autênticos representantes dessa língua e de sua
cultura, é um exemplo de ambiente que não evidencia necessidade, não produz
motivação e não estimula o aprendizado. O que se encontra atualmente no
ensino de inglês, são inúmeros fatores desmotivadores: salas de aula com
muitos alunos, professores com proficiência limitada, cobrança através de
exames de avaliação com questões truculentas que nada avaliam, repetição oral
mecânica, etc. Esses fatores desmotivadores podem ser observados tanto na
rede de escolas de ensino médio, onde o ensino de inglês ficou encalhado no
método de tradução e gramática do início do século, como nos cursos
particulares de línguas, que ficaram encalhados no método audiolingüístico dos
anos 60. Nem um nem outro mostra resultados imediatos motivadores nem
permite que o aluno alcance a proficiência desejada, gerando inevitavelmente
uma certa frustração que, em maior ou menor grau, destrói a motivação.
Também aquele aprendiz que não se identifica com a cultura
estrangeira, - ou que às vezes até a despreza, - normalmente por falta de maior
informação a respeito da mesma ou por informações estereotipadas que o
professor não soube corrigir, estará desmotivado a aprender sua língua.
O problema da desmotivação é freqüentemente observado em salas de
aula que enfatizam language learning. Por outro lado, em programas que
enfatizam language acquisition, observa-se facilmente a ocorrência natural de
motivação para o aprendizado de línguas, independente de idade. A pessoa que
tiver oportunidade de ter contato com a língua estrangeira em situações reais de
comunicação, em ambientes autênticos dessa língua e de sua cultura, onde a
língua está presente como meio de interação e não ausente, ministrada em
doses pequenas e amargada pela repetição mecânica descontextualizada, ou
pela dissecação gramatical, vai certamente alcançar fluência.
O caso do Jonas, narrado em nosso Fórum de Discussões em 24 de
abril de 2003, é bastante ilustrativo:
"Fiz vários cursos no Brasil, inclusive todos os níveis (12 books). Mas
quando vim para cá (EUA) pra morar e trabalhar percebi como não era fluente
5. em inglês, principalmente na parte oral. A minha motivação meio que baixou um
pouco; eu me sentia frustrado. Como trabalho com informática, praticamente
não conversava com meus co-workers. Mas com o tempo fui fazendo amizades
e hoje acho que desenvolvi bastante”.
Depois de 12 livros, cumprindo diligentemente a receita prescrita pelo
curso, reprimindo a desmotivação com força de vontade, o aluno descobre ao
chegar no ambiente de língua e cultura inglesa que não havia alcançado o
objetivo principal. A desmotivação que ele sentiu foi uma espécie de efeito
retardado, que outros, com menos força de vontade, não conseguem reprimir
por tanto tempo e desistem antes do Livro 12. Só a partir do momento em que
ele constrói um círculo de convívio humano, num ambiente autêntico, com
situações reais de comunicação, é que reencontra motivação e finalmente
alcança seu objetivo.
Isto nos leva à conclusão de que, em vez de nos preocuparmos em
motivar nossos alunos, talvez devêssemos nos esforçar mais para não
desmotivá-los. Se não pudermos despertar neles a motivação natural para o
aprendizado de línguas, subjacente em todos, pelo menos cuidemos para não
destruí-la e sim preservá-la para quando encontrarem a oportunidade certa.