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ARTIGO: FINANCIAMENTO DE PARTIDOS POLÍTICOS NAS ELEIÇÕES DE 2008 E 2012: ANÁLISE DAS EMPRESAS DOADORAS
ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016
1
FINANCIAMENTO DE PARTIDOS POLÍTICOS NAS ELEIÇÕES
DE 2008 E 2012:
ANÁLISE DAS EMPRESAS DOADORAS
FINANCING POLITICAL PARTIES IN THE 2008 AND 2012 ELECTIONS: AN ANALYSIS OF DONOR COMPANIES
LA FINANCIACIÓN DE LOS PARTIDOS POLÍTICOS EN LAS ELECCIONES DE 2008 Y 2012: ANÁLISIS DE LAS EMPRESAS
DONANTES
Resumo: A motivação deste trabalho foi a observação do processo eleitoral sob o ponto de vista do usuário externo das informações
contábeis. Para tanto, buscou-se investigar como se dá a divulgação de dados sobre o processo eleitoral pelas empresas listadas
na BM&FBovespa, que fizeram doações a partidos políticos nas eleições municipais de 2008 e 2012. Por meio do sistema de Divul-
gação Externa, foram obtidas as Informações Anuais e os Demonstrativos Financeiros Padronizados de 11 empresas selecionadas,
analisando-se os dados referentes ao controle sobre outras entidades, além da DR, DFC, Nota Explicativa e Relatório da Administração
das empresas em busca de referência a doações efetuadas a partidos políticos. Concluiu-se que apenas uma das 11 empresas sele-
cionadas evidenciou a realização de doações a partidos políticos por meio dos demonstrativos e apenas no ano de 2008, não sendo
possível identificar os valores doados nem os critérios adotados para escolha dos partidos contemplados.
Palavras-chave: evidenciação; partidos políticos; informação contábil; eleições; transparência.
Jardson Edson Guedes da Silva Almeida - jardson_guedes@yahoo.com.br
Professor do Centro Universitário Tiradentes, Assistente I, Maceió, AL, Brasil.
Luiz Antônio Félix Júnior - juniorfelixx@hotmail.com
Faculdade Internacional da Paraíba, Escola de Negócios, João Pessoa, PB, Brasil.
Umbelina Cravo Teixeira Lagioia - umbelinalagioia@gmail.com
Universidade Federal de Pernambuco, Doutora no Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, Recife, PE, Brasil.
Juliana Araújo - juhliana.araujo@gmail.com
Doutoranda em Administração pela Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE, Brasil.
João Gabriel Nascimento Araújo - j_gabriel90@hotmail.com
Doutorando em Ciências Contábeis pela Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE, Brasil.
Artigo submetido no dia 15-04-2015 e aprovado em 19-01-2016.
DOI: http://dx.doi.org/10.12660/cgpc.v21n68.48758
Esta obra está submetida a uma licença Creative Commons
ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016
Jardson Edson Guedes da Silva Almeida, Luiz Antônio Félix Júnior, Umbelina Cravo Teixeira Lagioia, Juliana Araújo, João Gabriel Nascimento Araújo
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Abstract
The motivation of this study was to observe the electoral process from the point of view of the external
user of accounting information.Therefore,we sought to investigate how information about the electoral
process is disclosed by the companies involved in companies listed on the BM & FBOVESPA and that
made donations to political parties in the municipal elections of 2008 and 2012.Annual Information and
the Standardized Financial Statements of eleven selected companies were obtained from the External
Disclosure system and an analysis was made of the data for controlling companies, in addition to
the DR, DFC, Explanatory Note and Management Report of the companies, in a search for reference
to donations made to political parties. The conclusion was that only one of the eleven companies
selected produced evidence of making donations to political parties by way of their statements and
only in 2008; it was impossible to identify what amounts were donated or the criteria used in selecting
the parties that benefited.
Keywords: disclosure; political parties; accounting information; elections; transparency.
Resumen
La motivación de este estudio fue la observación del proceso electoral desde el punto de vista del
usuario externo de la información contable. Por lo tanto, tratamos de investigar cómo se obtuvo la
difusión de información sobre el proceso electoral por las empresas que participan en empresas que
cotizan en el mercado BM&FBOVESPA que hicieron donaciones a los partidos políticos en las elec-
ciones municipales de 2008 y 2012.A través del Sistema de difusión externa de la Información Anual y
los Estados Financieros Estandarizados de once empresas seleccionadas,analizamos los datos para
el control de las empresas distintas de la DR,DFC,Note y el informe de gestión de las empresas que
buscan referencia a las donaciones a los partidos políticos. Se concluyó que sólo una de las once
empresas seleccionadas destacó la realización de donaciones a los partidos políticos a través de
los estados contables y sólo en 2008,no siendo posible identificar que donó los valores o los criterios
utilizados para seleccionar las partes cubiertas.
Palabras clave: divulgación; partidos políticas; información contable; elecciones; transparencia.
1 INTRODUÇÃO
A receita dos partidos políticos tem sua ori-
gem em doações e contribuições de recur-
sos financeiros de pessoas físicas e jurídi-
cas, além das cotas do Fundo Especial de
Assistência aos Partidos Políticos (Fundo
Partidário), constituído por multas e penali-
dades eleitorais, recursos financeiros legais,
doações espontâneas privadas e dotações
orçamentárias públicas. De acordo com os
artigos 32 e 33 da Lei dos partidos políti-
cos, em suas prestações de contas à Jus-
tiça Eleitoral, os partidos devem apresentar
a discriminação e a destinação dos valores
recebidos do Fundo Partidário, além do va-
lor e da origem das contribuições e doações
recebidas.
A divulgação das pessoas físicas e jurídicas
que realizaram essas doações é um grande
instrumento de controle social do processo
eleitoral, trazendo a possibilidade de acom-
panhamento pela população da movimenta-
ção financeira dos partidos políticos. Porém,
esse é apenas um lado da questão, visto que
por si só a divulgação das empresas que con-
tribuíram para as campanhas não é suficien-
te para garantir a transparência do processo
eleitoral. Para isso é preciso observar essa
questão sob outro ponto de vista e analisar
as informações das empresas que partici-
pam do processo eleitoral como doadoras de
recursos a candidatos ou a partidos políticos.
Nem todas as empresas sofrem a imposi-
ção legal de divulgação de informações ao
público, entretanto as companhias de ca-
pital aberto que negociam suas ações na
BM&FBovespa devem cumprir algumas exi-
gências no que diz respeito à divulgação de
informações econômico-financeiras e ad-
ministrativas sobre a entidade. Essas infor-
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mações ficam disponíveis na internet para
acesso tanto pelos acionistas como pela po-
pulação em geral interessada.
Schultz, Marques e Hofer (2010) comen-
tam que os maiores níveis de evidenciação
compulsória são registrados junto às com-
panhias de capital aberto, com o objetivo de
proteger interesses dos usuários externos
(acionistas, associados, fornecedores, cre-
dores, bancos, governo, sociedade etc.) e
dar estabilidade e transparência ao mercado
de capitais como um todo. Nas demais em-
presas, existem diferentes níveis de eviden-
ciação compulsória, geralmente bem mais
modestos e, até mesmo, a desobrigação da
publicação de informações a respeito da en-
tidade.
Pereira (2008) comenta que a teoria contábil
contemporânea se preocupa com as ques-
tões sobre a quantidade e a qualidade das
informações fornecidas aos usuários exter-
nos à entidade empresarial. A motivação
deste trabalho surge a partir desse ponto,
com o propósito de observar o processo
eleitoral sob o ponto de vista do usuário ex-
terno das informações contábeis e investi-
gar de que maneira se dá a divulgação de
informações relativas ao processo eleitoral
por parte das empresas nele envolvido.
Por esse motivo, o estudo objetivou analisar
se as empresas listadas na BM&FBovespa
que fizeram doações a partidos políticos nas
eleições de 2008 e 2012 evidenciaram esse
fato em seus demonstrativos financeiros.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 Segmentos especiais de listagem na
BM&FBovespa
A abordagem de Governança Corporativa
no Brasil está intimamente ligada ao merca-
do de capitais. Lagioia (2007, p. 107) define
Governança Corporativa como “conjunto de
regras, normas, e práticas de conduta de-
finidas pela BM&FBovespa e destinadas a
oferecer maior transparência aos investido-
res e melhor preço/custo de captação para
as empresas.” A BM&FBovespa (2005) defi-
ne que as práticas diferenciadas de gover-
nança corporativa formam “um conjunto de
normas de conduta para empresas, admi-
nistradores e controladores, considerados
importantes para a valorização das ações e
outros ativos emitidos pelas companhias”.
Em 2000, foram criados os segmentos de
governança corporativa para determinar
às empresas já listadas na BM&FBovespa
uma série de práticas e comportamentos
relevantes a serem contemplados por seus
gestores. Diante do elevado rigor e da ex-
pectativa do não atendimento por muitas
empresas quanto ao segmento Novo Mer-
cado, a BM&FBovespa decidiu pela cria-
ção de dois novos níveis de governança
corporativa: o nível 1 e o nível 2, os quais
distinguem as empresas de acordo com o
grau de compromisso assumido com a prá-
tica de boa governança. O Novo Mercado
foi criado para constituir-se no segmento
da BM&FBovespa, destinado às empresas
que se comprometem com práticas e regras
societárias mais rígidas do que as exigidas
pela legislação brasileira. Aderindo ao Novo
Mercado, as organizações deveriam expan-
dir os direitos dos acionistas e divulgar suas
informações de maneira ordenada e mais
transparente aos usuários, otimizando a li-
quidez e a valorização das ações.
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As empresas contempladas no nível 1 se
comprometem, principalmente, com a re-
alização de melhorias na prestação de in-
formações ao mercado e com a dispersão
acionária. O principal ponto a ser observado
por elas se refere à qualidade e à quantida-
de das informações de suas responsabili-
dades quanto às Demonstrações Contábeis
Trimestrais, às Demonstrações Financeiras
Padronizadas e aos Informes Anuais. Tais
relatórios já eram obrigatórios às empresas
antes do surgimento dos níveis diferencia-
dos de governança, assim, a mudança está
na profundidade da evidência de tais infor-
mações. Isso pode explicar o porquê de
algumas empresas terem aderido ao Nível
1 no primeiro mês de existência, junho de
2001.
Outra vertente a ser analisada nas normas
iniciais, em relação ao primeiro estágio de
transição para o Novo Mercado, refere-se
ao percentual de ações emitidas que deve-
ria permanecer em circulação, que era de,
no mínimo, 25%.Tal percentual nem sempre
era possível de ser atendido de imediato, o
que provocou a reformulação do critério e o
percentual passou a ser contemplado como
meta a ser atingida em um prazo negociado
entre a BM&FBovespa e a própria empresa.
No nível 2, além da aceitação das obriga-
ções contidas no nível 1, a empresa e seus
gestores devem utilizar um conjunto bem
mais amplo de práticas de governança e de
direitos adicionais para os acionistas mino-
ritários, uma vez que, além de cumprirem
as exigências do Nível I, precisam divulgar
suas informações contábeis anuais segun-
do os padrões estabelecidos pelo Interna-
tional Accounting Standards Board (IASB)
ou pelo Financial Accounting Standards Bo-
ard (FASB). Ademais, há a exigência de ex-
tensão das mesmas condições obtidas pelos
gestores quando da venda da companhia
para todos os acionistas detentores de ações
ordinárias e de, no mínimo, 70% desse valor
para os detentores de ações preferenciais.
A criação do Novo Mercado marcou uma
nova fase do mercado de capitais no Brasil,
onde o setor privado assumiu a liderança
na condução das reformas. Essa iniciativa
foi bem recebida por investidores, empre-
sas, órgãos reguladores e governo e mar-
cou também uma mudança de postura da
BM&FBovespa, que, como o contrato de
adesão é administrado por ela, passa a ser a
guardiã das práticas de governança corpora-
tiva. Isso sugere a adoção da prática da au-
torregulação e que a promoção do mercado
de capitais pode ser feita sem as amarras do
Estado. Deve-se notar que o Novo Mercado
não requer um sistema operacional diferen-
ciado do mercado tradicional. Ele funciona
como um selo de qualidade, cujo valor reside
nas obrigações contratuais assumidas pela
empresa e de acordo como a BM&FBovespa
administra tais contratos.As companhias que
aderirem ao Novo Mercado devem seguir re-
gulamentações mais rígidas que as do Nível
2, porém, tendo como principal diferença o
fato de ficarem restritas à emissão de ações
ordinárias.
Inserida nesse contexto e para resolver os
conflitos que surgirem entre acionistas e
companhias que aderirem ao Nível 2 ou ao
Novo Mercado, a BM&FBovespa criou a Câ-
mara de Arbitragem, objetivando determi-
nar a solução adequada de cada caso com
tempestividade, propiciando melhor eficiên-
cia na resolução de controvérsias, já que os
processos tendem a ser concluídos mais ra-
pidamente, pois são tratados na esfera pri-
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vada, por intermédio de árbitros. A seguir,
apresenta-se de forma simplificada uma
comparação entre os segmentos especiais
de listagem na BM&FBovespa.
A entrada em um desses segmentos significa
para a empresa ingressante, a conquista de
uma melhora de imagem para com a socie-
dade e com o mercado, uma vez que passa
a ser de conhecimento público a aderência
de um exigente conjunto de regras societá-
rias, conhecidas como “práticas diferencia-
das de governança corporativa”. Inicialmen-
te, a definição de governança corporativa
era utilizada pelo prisma da transparência
das práticas contábeis de empresa de capi-
tal aberto. Atualmente, é vista como aspecto
basilar para o sucesso das organizações.
2.2 Relatório da administração
Para Hendriksen e Van Breda (1999), a divul-
gação de informações financeiras tradicio-
nalmente visa dar suporte à tomada de deci-
sões dos investidores sobre a melhor forma
de alocação de seus recursos. Entre as vá-
rias formas de divulgação de informações,
Iudícibus (2010) relaciona as seguintes: a)
forma e apresentação das demonstrações
contábeis; b) informações entre parênteses;
c) notas explicativas; d) quadro e demons-
trativos suplementares; e) comentários do
auditor; f) relatório da administração.
Conforme explicam Iudícibus, Martins e Gel-
bcke (2010), no Brasil, existe um conjunto
de documentos apreciados pela Assembleia
Geral que representam a “prestação de con-
tas” das sociedades anônimas por ações. E
Tabela 1. Segmentos especiais de listagem na BM&FBovespa
Nível 1 Nível 2 Novo Mercado
Característica es-
sencial
Transparência.
Transparência e mais poder
aos minoritários
Transparência e poder igual para todos os
acionistas
Características das
ações emitidas
Permite a exis-
tência de ações
ordinárias e ações
preferenciais
Permite a existência de
ações ordinárias e ações
preferenciais com direitos
adicionais
Permite apenas a existência de ações ordi-
nárias
Conselho de admi-
nistração
Mínimo de três
membros confor-
me legislação
Mínimo de cinco membros, sendo pelo menos um independente
Demonstrações
financeiras anuais
em Padrão Interna-
cional
Facultativo US GAAP ou IFRS
Adoção da câmara
de arbitragem do
mercado
Facultativo Obrigatório
Percentual mínimo
de ações em circu-
lação
No mínimo 25% de free float
Fonte: Elaboração do autor com base nas informações da BM&FBovespa
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entre eles está o Relatório da Administra-
ção. Esse conjunto de documentos é de pu-
blicação obrigatória segundo o art. 133 da
Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976,
alterado pela Lei n. 10.303/01.
Yuthas, Rogers e Dillard (2002) conside-
ram que o texto contido nos relatórios da
administração é amplamente lido por uma
variedade de stakeholders e analistas. Dis-
torções significativas feitas pelos gestores
podem trazer malefícios a longo prazo se
for descoberto que essas distorções infor-
macionais teriam afetado a percepção dos
demonstrativos financeiros.
A prática de realizar relatos sobre opera-
ções da companhia é realizada desde a dé-
cada de 1960 nos Estados Unidos, por meio
do ínterim e do segment reporting. O relató-
rio de administração surgiu com várias em-
presas que, por atuarem em diferentes seg-
mentos econômicos, passaram a evidenciar
voluntariamente essas informações com as
demonstrações financeiras anuais.
Em 1970, esse relatório foi regulamentado
pela SEC e passou a integrar os relatórios
financeiros anuais das companhias. Apesar
dos benefícios, como a apresentação de
“dados escondidos” pelas demonstrações
financeiras, Delaney et al. (1996) apresen-
tam alguns argumentos usados nos Esta-
dos Unidos contra a publicação das ope-
rações da empresa, como a evidenciação
de informações aos concorrentes, sindica-
tos e governo, que podem trazer danos à
empresa, e essa divulgação desencoraja a
administração a tomar decisões com risco
razoável em virtude da obrigação de repor-
tar resultados desfavoráveis.
No Brasil, o art. 133 da Lei n. 6.404, de 15
de dezembro de 1976, alterado pela Lei n.
10.303/01, determina também que os ad-
ministradores divulguem até um mês antes
da assembleia geral ordinária o Relatório da
Administração contendo informações sobre
“os negócios sociais e os principais fatos
administrativos do exercício findo”. No entan-
to, uma regulamentação mais clara sobre o
conteúdo do RAd só ocorreu em 1987 com
o Parecer de Orientação n. 15/87 da Comis-
são de Valores Mobiliários (CVM). Em 3 de
outubro de 2005, a CVM, por meio da Deli-
beração n. 488, aprovou o Pronunciamento
Ibracon NPC n. 27, que comenta sobre o con-
teúdo mínimo dos relatórios.
Outro ponto que deve ser observado na con-
fecção dos relatórios diz respeito ao conte-
údo, não sendo válida a simples apresenta-
ção de percentuais que podem ser obtidos
por qualquer leitor das demonstrações con-
tábeis, visto que a informação relevante diz
respeito ao comentário ou apreciação dos
fatores endógenos e exógenos que influen-
ciaram as variações incorridas.
O relatório da administração, como peça
integrante das demonstrações financeiras,
deverá complementar as peças contábeis
e as notas explicativas, observada a devida
coerência com a situação nelas espelhada,
formando um quadro completo das posturas
e do desempenho da administração na ges-
tão e alocação dos recursos que estão a elas
confiados.A seguir, apresenta-se uma tabela
que contempla tais informações.
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Tabela 2. Informações obrigatórias contidas no relatório da administração
Elemento Descrições
Descrição dos negócios, produtos e servi-
ços
	 Ramo da atividade da companhia
	 Principais produtos
	 Áreas de atuação
	 Dados físicos sobre vendas
	 Informações sobre o segmento de atuação
Comentários sobre a conjuntura econômica
geral
	 Variáveis econômicas
	 Variáveis legais e fiscais
	 Variáveis governamentais
	 Variáveis políticas
	 Variáveis ambientais
	 Variáveis sociais
	 Outros fatores exógenos
Recursos Humanos
	 Quantidade de empregados
	 Divisão geográfica da mão de obra
	 Nível educacional
	 Investimentos em treinamento
Investimentos
	 Inversões de recursos em imobilizado
	 Aplicações no diferido
	 Outras inversões para futura imobilização
Pesquisa e desenvolvimento 	 Atual estágio dos projetos, recursos alocados e montantes aplicados
Novos produtos e serviços
	 Novos produtos e serviços colocados no mercado
	 Expectativas relativas a esses produtos e serviços
Proteção ao meio ambiente
	 Inversões em projetos de proteção ecológica
	 Objetivos das inversões e valores envolvidos
Reformulação administrativa ou societária
	 Mudanças efetuadas
	 Reorganizações societárias
	 Programas de racionalização
Investimentos em controladas e coligadas
	 Objetivos pretendidos com as inversões ou alienações realizadas nas controladas
ou coligadas
Direitos dos acionistas e dados do mercado
	 Políticas relativas à distribuição de dividendos
	 Desdobramentos e grupamentos de ações
	 Valor patrimonial por ação
	 Volume negociado no período
	 Cotação das ações em bolsa de valores
Perspectivas e planos para o exercício em
curso e futuros
	 Expectativas quanto aos exercícios correntes e futuros com base em premissas e
fundamentos explicitamente colocados
Empresas investidoras 	 Informações anteriormente recomendadas relativas a empresas investidas
Fonte: Adaptado de Iudicibus, Martins e Gelbcke apud Pereira (2008, p. 33)
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Para Hendriksen e Van Breda (1999) é muito
forte a tendência de que as companhias di-
vulgarão toda a informação necessária para
o bom funcionamento do mercado. Embora
não exista um consenso sobre quais seriam
as informações de natureza voluntária em
relatórios anuais das companhias. A seguir,
apresenta-se um quadro contemplando tais
informações.
Tabela 3. Informações voluntárias contidas no relatório da administração
Elemento Descrições
Informações gerais e não financei-
ras
	Principais mercados e market share
	Estratégia (metas e objetivos)
	Ambiente de negócios e fatores críticos de acesso
	Eventos importantes no ano
	Estrutura organizacional
	Relatório social ou demonstração do valor adicionado
	Eficiência operacional
Informações financeiras adiciona-
das
	Unidades vendidas
	Retorno sobre o patrimônio
	Retorno sobre o ativo
	Ebitda
	Demonstração do fluxo de caixa
Análise de tendências e discussão e
análise gerencial
	Tendência da receita ao longo dos últimos anos
	Vendas por região e/ou unidade de negócio
	Tendência do lucro operacional ao longo dos últimos anos
	Investimento por região e/ou unidade de negócio
	Tendência de comportamento das ações e retorno total para o acionista
	Discussão sobre mudanças no lucro operacional
Risco, criação de valor e projeções
	Uso e implementação de gestão de risco
	Exposição ao risco cambial
	Medidas quantitativas de criação de valor para o acionista
	Compensação gerencial
	Perspectivas de novos projetos
	Projeções de lucro, vendas e crescimento
Fonte: Adaptado de Lanzana apud Pereira (2008, p. 35)
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3. METODOLOGIA
Objetivando analisar se as empresas lista-
das na BM&FBovespa que fizeram doações
a partidos políticos nas eleições municipais
de 2008 e 2012 evidenciaram esse fato em
seus demonstrativos financeiros, o estudo
utilizou-se de uma metodologia que seguiu
uma estratégia exploratória e descritiva, ten-
do em vista que o propósito desta pesquisa
foi explorar uma realidade não conhecida.
A base inicial de dados foi composta pelos
processos de prestação de contas anuais
dos diretórios nacionais de cada partido po-
lítico submetidos ao Tribunal Superior Eleito-
ral (TSE), disponíveis em <www.tse.jus.br>,
referentes aos anos de 2008 e 2012, ou seja,
apenas de eleições municipais, não levando
em consideração os dados corresponden-
tes às eleições de 2010. Em cada processo
consta uma listagem constituída dos valores
recebidos por doação e os respectivos doa-
dores, estando esses valores apresentados
em ordem cronológica por dia do ano. Para
se definir as empresas a serem pesquisa-
das em relação às informações referentes
ao ano de 2008, realizou-se uma separação
entre pessoas físicas e jurídicas, por meio
de uma reorganização dos dados de manei-
ra a descobrir quanto cada uma delas doou
aos partidos políticos. Obteve-se então uma
planilha com mais de 300 linhas, contendo
os nomes de cerca de 230 empresas.
Buscou-seentãoaveriguarquaisdessasem-
presas estavam listadas na BM&FBovespa,
além de informações a respeito do controle
de cada uma, pois uma empresa não listada
poderia ser controlada por outra que esti-
vesse na lista. Foram excluídas da base de
dados as empresas que não estavam elen-
cadas na BM&FBovespa, além daquelas
que não eram controladas por alguma em-
presa que fosse listada.
Estabeleceu-se então um recorte pelo crité-
rio do valor total das doações, com intuito de
obter as doações mais significativas. Foram
excluídas da base de dados as empresas
que realizaram doações menores que R$
1.000.000,00 (um milhão de reais). Dessa
forma obteve-se a planilha final, composta
de 11 empresas. Para análise dos valores
correspondentes às doações corresponden-
tes às eleições de 2012, foram considera-
das apenas as 11 empresas pesquisadas
em 2008, conforme o critério antes exposto,
a saber: Andrade Gutierrez Participações
S/A, Banco Bradesco S/A, Banco Santan-
der (Brasil) S/A, Camargo Correia Cimen-
tos S/A, Companhia Siderúrgica Nacional,
Contax Participações S/A, Gerdau S/A, JBS
S/A, JHSF Participações, Suzano Papel e
Celulose S/A e Vale S/A.
Por meio do sistema de Divulgação Externa
(DivExt) da BM&FBovespa, foram obtidas
as Informações Anuais (IAN) e os Demons-
trativos Financeiros Padronizados (DFP) re-
ferentes aos anos de 2008 e 2012 das 11
empresas selecionadas, analisando-se os
dados das IAN referentes ao controle so-
bre outras empresas e, quanto aos DFP, as
Demonstrações do Resultado do Exercício,
as Demonstrações do Fluxo de Caixa, as
Notas Explicativas e os Relatórios da Admi-
nistração em busca de alusões a doações
efetuadas a partidos políticos.
4. ANÁLISE DE RESULTADOS
O valor total de doações recebidas pelos
partidos políticos nas eleições do ano de
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Jardson Edson Guedes da Silva Almeida, Luiz Antônio Félix Júnior, Umbelina Cravo Teixeira Lagioia, Juliana Araújo, João Gabriel Nascimento Araújo
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2008 foi R$ 143.651.817,00, dos quais R$
52.935.660,00 (36,85%) foram doados pe-
las empresas listadas na BM&FBovespa,
que foram selecionadas para as análises
deste estudo, enquanto R$ 90.716.157,00
(63,15%) foram doados pelas demais em-
presas.
Já em relação ao ano de 2012, as doações
de pessoas jurídicas aos partidos políticos
brasileiros totalizaram R$ 451.356.543,94;
valor bastante superior àqueles arrecadados
quatro anos antes. Desse montante, as 11
empresas pesquisadas foram responsáveis
pela transferência de R$ 113.825.000,00, o
que representa 25,21% do total. Esse valor
corresponde a mais que o dobro das doa-
ções feitas por elas nas eleições municipais
anteriores.
A seguir são apresentados os valores das
doações efetuadas pelas 11 empresas aos
partidos políticos. Os valores explicitados
são o resultado da soma das doações efe-
tuadas pelas empresas selecionadas e por
suas controladas. Para melhor visualização
dos dados, nesta tabela não foi considera-
do o destino das doações efetuadas, sendo
expostos apenas os valores doados em sua
totalidade.
Tabela 4. Empresas e respectivas doações aos partidos políticos
Empresas 2008 2012 Total
Andrade Gutierrez
Participações S/A
13.475.000,00
56.785.000,00 70.260.000,00
Banco Bradesco
S/A
9.050.000,00
2.575.000,00 11.625.000,00
Banco Santander
(Brasil) S/A
4.730.000,00
4.550.000,00 9.280.000,00
Camargo Correa
Cimento S/A
2.500.000,00
13.340.000,00 15.840.000,00
Companhia Side-
rúrgica Nacional
1.535.660,00
- 1.535.660,00
Contax Participa-
ções S/A
5.500.000,00
5.840.000,00 11.340.000,00
Gerdau S/A 3.400.000,00 1.180.000,00 4.580.000,00
JBS S/A 1.500.000,00 11.660.000,00 13.160.000,00
JHSF Participa-
ções
1.200.000,00
1.400.000,00 2.600.000,00
Suzano Papel e
Celulose S/A
2.515.000,00
675.000,00 3.190.000,00
Vale S/A 7.530.000,00 15.820.000,00 23.350.000,00
Total 52.935.660,00 113.825.000,00 166.760.660,00
Fonte: Elaboração própria com base nos dados do site do TSE
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Nas Eleições Municipais de 2008, das 11
empresas selecionadas para este trabalho
de pesquisa, três fizeram doações a apenas
um partido político: Camargo Correa Cimen-
tos S/A, JBS S/A e JHSF Incorporações. As
demais distribuíram suas doações a mais
de um partido. Observou-se ainda que todas
as oito empresas que diversificaram suas
doações ofereceram quantias ao DEM e ao
PT. Apenas a JBS S/A e a Camargo Correa
Cimentos S/A não doaram valores ao DEM,
assim como apenas a JHSF Incorporações
S/A e a Camargo Correa Cimentos S/A não
fizeram doações ao PT.
Dos oito partidos políticos contemplados
com doações das empresas selecionadas,
o PT foi o partido que recebeu mais doa-
ções, somando R$ 24.300.000,00. Por ou-
tro lado, o PTB foi o partido que arrecadou
menos doações, totalizando R$ 750.000,00.
Percebeu-se certa centralização das quan-
tias doadas, pois a soma dos recebimentos
pelos cinco partidos com menores doações
não alcança o montante adquirido pelo ter-
ceiro partido com maiores valores doados.
Em se tratando de valores doados em 2012,
os partidos que menos receberam recursos
foram o PEN e o PPL, com R$ 50.000,00
e 100.000,00 respectivamente. O partido
que mais recebeu doações de empresas
listadas na Bolsa foi o PMDB, somando R$
33.390.000,00.
Os dados percentuais da distribuição dos
valores recebidos por partido político podem
ser visualizados nos Gráfico 1 e Gráfico 2:
Gráfico 1. Distribuição percentual das doações entre os partidos políticos em 2008
Fonte: Elaboração própria com base nos dados do site do TSE
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Gráfico 2. Distribuição percentual das doações entre os partidos políticos em 2012
Fonte: Elaboração própria com base nos dados do site do TSE
A seguir, são apresentados os dados em de-
talhe sobre as doações, além do resultado
das análises dos demonstrativos financeiros
de cada empresa selecionada neste estudo.
Todas as doações da Andrade Gutierrez
Participações S/A foram realizadas por
meio de sua controlada Construtora Andra-
de Gutierrez S/A, que também foi respon-
sável pela maior soma doada a um partido
político no ano de 2008, destinada ao PT,
no valor de R$ 5.850.000,00. Além disso, foi
a empresa que teve a maior soma doada,
em comparação com as demais, totalizando
o valor de R$ 13.475.000,00. Relativamen-
te ao ano de 2012, a empresa continuou
sendo a que proporcionou o maior volume
de doações, atingindo R$ 56.785.000,00.
O Partido que mais recebeu recursos vin-
dos da referida empresa foi o PMDB (R$
15.875.000,00). A companhia não faz parte
de nenhum segmento especial de listagem
na BM&FBovespa. Na análise das demons-
trações contábeis inseridas nos DFP publi-
cados pela empresa, além do relatório da
administração, não foi encontrada nenhuma
referência a doações realizadas a partidos
políticos em nenhum dos anos.
O Banco Bradesco S/A fez doações, no ano
de 2008, por meio das controladas Banco Al-
vorada S/A, responsável por 57% delas, e
Alvorada Cartões Crédito e Financiamentos
S/A, por 43%, um total de R$ 9.050.000,00.
A companhia faz parte do Nível Diferencia-
do de Governança Corporativa – Nível 1 na
BM&FBovespa. Na análise das demonstra-
ções contábeis inseridas nos DFP publica-
dos pela empresa, além do relatório da ad-
ministração, não foi encontrada nenhuma
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referência a doações realizadas a partidos
políticos. No ano de 2012 o Banco foi res-
ponsável pela doação de R$ 2.575.000,00
aos partidos políticos. As maiores doações
foram realizadas ao DEM (R$ 1.450.000,00)
e ao PMDB (R$ 625.000,00).
O Banco Santander S/A doou um to-
tal de R$ 4.730.000,00 em 2008 e R$
4.550.000,00 em 2012. A companhia faz
parte do Nível Diferenciado de Governança
Corporativa – Nível 2 na BM&FBovespa. Na
análise das demonstrações contábeis in-
seridas nos DFP publicados pela empresa,
além do relatório da administração, não foi
encontrada nenhuma referência a doações
realizadas a partidos políticos.
As doações da Cia Siderúrgica Nacional
somaram R$ 1.535.660,00 em 2008, dos
quais R$ 1.235.660,00 foram doados pela
sua controlada Galvasud S/A. A companhia
não faz parte de nenhum segmento espe-
cial de listagem na BM&FBovespa. Na aná-
lise das demonstrações contábeis inseridas
nos DFP publicados pela empresa, além do
relatório da administração, não foi encontra-
da nenhuma referência a doações realiza-
das a partidos políticos.
A Contax Participações foi a empresa que
fez doações à maior quantidade de parti-
dos políticos nas eleições de 2008, num
total de oito. Todas as doações foram fei-
tas por meio de sua controlada TNL Con-
tax S/A. Em 2012 as doações somaram R$
5.840.000,00, divididos para apenas por
quatro partidos: DEM, PMDB, PSB e PSD.
Quem mais recebeu recursos foi o PSD (R$
2.130.000,00). A companhia não faz parte
de nenhum segmento especial de listagem
na BM&FBovespa. Na análise das demons-
trações contábeis inseridas nos DFP publi-
cados pela empresa, além do relatório da
administração, não foi encontrada nenhuma
referência a doações realizadas a partidos
políticos.
Dos R$ 3.440.000,00 doados pela Gerdau
S/A em 2008, R$ 2.440.000,00 foram por
meio de suas controladas Gerdau Comer-
cial de Aços S/A e Gerdau Aços Longos S/A.
Entre as empresas pesquisadas e conforme
os dados correspondentes às doações em
2012, a Gerdau é a que provavelmente tenha
estabelecido algum critério para doações a
partidos políticos, haja vista os valores se-
rem equivalentes, R$ 100.000,00 (PMDB e
PT), R$ 150.000,00 (PP), R$ 200.000,00
(DEM e PCdoB), muito embora o PSDB te-
nha recebido R$ 430.000,00. A companhia
faz parte do Nível Diferenciado de Governan-
ça Corporativa – Nível 1 na BM&FBovespa.
Na análise das demonstrações contábeis in-
seridas nos DFP publicados pela empresa,
além do relatório da administração, não foi
encontrada nenhuma referência a doações
realizadas a partidos políticos.
As doações da Vale S/A somaram R$
7.530.000,00 em 2008. Todas as doações
foram feitas por meio de suas controladas:
Minerações Brasileiras Reunidas MBR S/A,
Vale Manganês S/A e Rio Doce Manganês
S/A. A companhia faz parte do Nível Dife-
renciado de Governança Corporativa – Nível
1 na BM&FBovespa. Em 2012, as doações
totalizaram R$ 15.820.000,00. Na análise
das demonstrações contábeis inseridas nos
DFP publicados pela empresa, além do re-
latório da administração, não foi encontrada
nenhuma referência a doações realizadas a
partidos políticos.
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Jardson Edson Guedes da Silva Almeida, Luiz Antônio Félix Júnior, Umbelina Cravo Teixeira Lagioia, Juliana Araújo, João Gabriel Nascimento Araújo
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A JHSF Incorporações S/A doou R$
1.200.000,00 ao DEM, a JBS S/A, R$
1.500.000,00 ao PT e a Camargo Correa
Cimentos S/A, R$ 2.500.000,00 ao PSDB,
em 2008. A Suzano Papel e Celulose S/A
doou R$ 2.515.000,00 a dois partidos, com
uma notável discrepância nos valores doa-
dos a cada um. As doações realizadas por
essas empresas durante o ano de 2012 são:
JHSF Incorporações S/A (R$ 1.400.000,00),
JBS S/A (R$ 11.660.000,00), Camargo Cor-
rea Cimentos S/A (R$ 13.340.000,00) e Su-
zano Papel e Celulose S/A (R$ 675.000,00).
A JHSF S/A e a JBS S/A fazem parte do
segmento especial de listagem Novo Mer-
cado, a Camargo Correa Cimentos S/A não
integra nenhum segmento especial de lista-
gem e a Suzano Papel e Celulose S/A se faz
parte do Nível Diferenciado de Governança
Corporativa – Nível 1 na BM&FBovespa. Na
análise das demonstrações contábeis inse-
ridas nos DFP publicados pelas empresas
JHSF S/A, JBS S/A e Camargo Correa Ci-
mentos S/A, além dos respectivos relatórios
da administração, não foi encontrada nenhu-
ma referência a doações realizadas a parti-
dos políticos.
A Suzano Papel e Celulose S/A foi a única
empresa entre as selecionadas neste estudo
que apresentou algum tipo de evidenciação
referente à doação realizada a partidos po-
líticos. No seu relatório da administração do
ano de 2008 (e apenas neste ano), ela pu-
blicou o trecho reproduzido no quadro a se-
guir. Apesar de se destacar das demais enti-
dades, a informação publicada pela Suzano
é insuficiente, pois não discrimina a quais
partidos as doações foram feitas e nem são
expostos quais foram os critérios adotados
para a determinação dos valores doados e
dos destinatários.
Quadro 1. Trecho retirado do relatório da administração da Suzano Papel e Celulose
S/A – 2008
Fonte: Divulgação Externa – BM&FBovespa
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Os resultados encontrados neste estudo
confirmam o que outros autores observaram
ao analisar os níveis de evidenciação da in-
formação no ambiente empresarial. Dantas,
Zendersky e Niyama (2004) comentam que
as empresas limitam-se a evidenciar o que
é exigido pela legislação ou normas dos ór-
gãos reguladores e relutam em aumentar o
nível de evidenciação com o intuito de pro-
teger informações de natureza estratégica.
Dias Filho e Nakagawa (2001) mostram que
mais importante do que fornecer um eleva-
do número de informação é informar o que é
necessário e de forma compreensível, pos-
sibilitando melhores resultados no processo
decisório.
A falta de esclarecimentos a respeito das
doações efetuadas para financiamento de
campanhas eleitorais cria um ambiente de
assimetria informacional no relacionamento
entre a empresa e seus usuários externos,
uma vez que os gastos não podem ser vi-
sualizados nos demonstrativos publicados
pelas companhias. Essa assimetria se mos-
tra presente pelo fato de que não é possível
identificar as pessoas responsáveis pela de-
cisão de realizar as doações aos partidos e
os valores a serem doados, nem tampouco
saber os parâmetros adotados para a entre-
ga dos recursos. Pela leitura dos DFP, não
é possível visualizar a relação que há entre
as empresas selecionadas neste estudo e
os partidos políticos, nem a motivação para
elas contribuírem voluntariamente para o fi-
nanciamento das campanhas eleitorais de
determinado partido em detrimento de ou-
tro.
Como explicar, no ano de 2008, a decisão
da Suzano Papel e Celulose S/A de doar R$
2.500.000,00 ao PT e R$ 15.000,00 ao DEM?
Ou a da Vale S/A de doar R$ 5.750.000,00
ao PT e R$ 50.000,00 ao PTB? Ou a da Ger-
dau, que doou R$ 1.000.000,00 ao PSDB,
ao PR e ao PT? Como explicar que a Contax
Participações S/A fez doações a oito parti-
dos diferentes e a JHSF Incorporações S/A
a apenas um? Por que a JBS S/A só fez do-
ações ao PT e a Camargo Correa Cimentos
S/A somente ao PSDB? Os usuários exter-
nos das empresas selecionadas para este
estudo que fizeram esses questionamentos
ao ler os DFP ficarão sem resposta.
Durante o ano de 2012, a falta de critério
nas doações, bem como a não apresenta-
ção de informações nos relatórios específi-
cos das referidas empresas permanecem,
assim como ocorrido em 2008. O Brades-
co, por exemplo, fez doações que variaram
de R$ 75.000,00 (PSDB) a R$ 1.450.000,00
(DEM). O PT recebeu apenas 2.000.000,00;
valor muito baixo se comparado aos R$
24.300.000,00 no ano de 2008.
Uma possível explicação para a ausência
de evidenciação dessas informações pode-
ria recair sobre o princípio da materialidade
na elaboração dos demonstrativos. Porém,
é possível perceber que esse aspecto se
rende à conveniência e oportunidade de
divulgar determinado fato, a depender dos
possíveis benefícios que a divulgação trará
à empresa. Isso fica claro ao se observar um
trecho do relatório da administração do Ban-
co Bradesco S/A:
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Distribuindo-se uniformemente os R$
74.000.000,00 investidos em áreas rema-
nescentes da Mata Atlântica no período de
20 anos citado, tem-se uma média de R$
3.700.000,00 investidos por ano, bem abai-
xo dos R$ 9.050.000,00 doados durante o
ano de 2008, aos quais não foi feita nenhu-
ma referência no relatório.
Ao tratar da temática da produção e utiliza-
ção de informações, Kam (1986) apud Lima
et al. (2010) ensina que a informação é rele-
vante para uma decisão se ela pode reduzir
a incerteza sobre as variáveis inseridas no
processo decisório. A falta de divulgação de
informações que respondam a alguns dos
questionamentos propostos anteriormente
fragiliza a relevância e a confiabilidade das
peças contábeis produzidas e publicadas
aos usuários externos das empresas sele-
cionadas, o que aumenta as incertezas so-
bre as variáveis envolvidas no processo de
tomada de decisão.
A evidenciação não é uma convenção ou
princípio contábil. Ela está relacionada ao
objetivo da contabilidade de garantir infor-
mações de acordo com as necessidades
dos usuários de forma que as demonstra-
ções não se tornem enganosas (Iudícibus,
2010).
A ciência contábil, por sua natureza social,
está sujeita a inexatidões provocadas pelo
aspecto comportamental e a níveis de subje-
tividade inerentes ao processo de construção
dos demonstrativos. O que deve ser obser-
vado com cautela no momento da manipula-
ção das informações é o limite entre a discri-
cionariedade e a arbitrariedade de quem as
detém. A influência de convicções políticas
e a possível intenção de troca de interesses
escusos camuflados sob o princípio da ma-
terialidade – ou outra justificativa qualquer –
na construção das demonstrações deturpam
a essência e a finalidade da ciência, que é
produzir informações relevantes e, acima de
tudo, verdadeiras.
5. CONCLUSÃO
Em resposta ao objetivo proposto, conclui-se
que apenas uma das 11 empresas selecio-
nadas neste estudo evidenciou a realização
de doações a partidos políticos na publica-
ção dos Demonstrativos Financeiros Padro-
nizados (DFP), somente no ano de 2008.
Ainda assim, não foi possível identificar os
valores doados nem os parâmetros e crité-
rios adotados por ela para escolha dos par-
Quadro 2. Trecho retirado do relatório da administração do Banco Bradesco S/A – 2008
Fonte: Divulgação Externa – BM&FBovespa
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tidos contemplados, gerando um ambiente
de assimetria informacional para os usuá-
rios externos da entidade.
Os usuários externos à entidade têm nas in-
formações contábeis um arcabouço teórico
que os guiará no conhecimento da situação
econômica, financeira e administrativa em
que a empresa se encontra. A maior dispo-
nibilidade de informações diminui o grau de
incerteza desses usuários a respeito dos
resultados futuros da empresa, o que os
auxiliará no processo de tomada de deci-
são. Para que seu objetivo seja alcançado,
a contabilidade deve ser capaz de produzir
informações relevantes sobre a entidade,
visto que a comunicação delas se torna inó-
cua se não houver utilidade para quem as
recebe.
Nesse ambiente, a contabilidade deve atu-
ar como o elo entre o meio corporativo e a
sociedade, funcionando como agente de re-
dução da assimetria informacional existente
entre as vontades dos administradores e as
necessidades dos usuários da informação
(Lopes e Martins, 2005).
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ARTIGO: Democracia Deliberativa: uma Análise do Decreto nº 8.243
ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016
19
Democracia Deliberativa:
uma Análise do Decreto nº 8.243
Deliberative Democracy: An Analysis of Executive Order No. 8243
Democracia Deliberativa: Un análisis del Decreto n° 8.243
Resumo: O propósito deste artigo é identificar aproximações entre elementos da teoria da democracia deliberativa e o Decreto n. 8.243
da Presidência da República do Brasil, de maio de 2014, que institui a Política Nacional de Participação Social (PNPS) e o Sistema
Nacional de Participação Social (SNPS). Diversos autores consideram a democracia deliberativa adequada à contemporaneidade de
valorizar e criar condições de uma participação direta do cidadão na definição de políticas públicas e de práticas de administração
pública. Considerando os objetivos e as diretrizes de fortalecer e articular mecanismos e instâncias democráticas de diálogo e criar
condições de atuação conjunta entre administração pública federal e sociedade civil, observaram-se nesse Decreto diversos elemen-
tos democrático-deliberativos importantes para a consolidação da democracia brasileira. Observou-se também a coerência entre o
Decreto e as perspectivas democráticas previstas na Constituição Federal de 1988, que prevê que o cidadão pode exercer seu poder
democrático diretamente ou por meio de representantes eleitos.
Palavras-chave: democracia deliberativa, participação social, política nacional de participação social.
Jorge Sundermann - jsundermann@hotmail.com
Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil
José Roberto Pereira - jrobertopereira2013@gmail.com
Professor da Universidade Federal de Lavras, Lavras, MG, Brasil.
Claudemir Francisco Alves - Claudemir_alves@uol.com.br
Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Departamento de Filosofia, Belo Horizonte, MG, Brasil.
Mozar José de Brito - mozarjdb@ufla.br
Professor da Universidade Federal de Lavras, Departamento de Administração e Economia, Lavras, MG, Brasil.
Artigo submetido no dia 10-07-2015 e aprovado em 28-02-2016.
DOI: http://dx.doi.org/10.12660/cgpc.v21n68.52967
Esta obra está submetida a uma licença Creative Commons
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Jorge Sundermann - José Roberto Pereira - Claudemir Francisco Alves - Mozar José de Brito
20
Abstract
This article seeks to identify similarities between elements of the theory of deliberative democracy
and Executive Order No. 8243 of the President’s Office of the Republic of Brazil, dated May 2014,
which would institute a National Social Participation Policy and the National Social Participation Sys-
tem. Several authors consider deliberative democracy to be appropriate to contemporaneity and a
way of promoting and creating conditions for direct citizen participation in defining public policy and
administration practices. Considering the objectives and guidelines for strengthening and promoting
mechanisms and channels for democratic dialogue and creating conditions for joint action between
the federal government and civil society,many important democratic-deliberative elements for the con-
solidation of Brazilian democracy have been observed in the Executive Order.There is a coherence
between the Executive Order and the democratic prospects provided for in the Federal Constitution of
1988, which establishes that citizens can exercise their democratic power directly or through elected
representatives.
Keywords: Deliberative Democracy, Social Participation, Direct Participation, National Social Participa-
tion Policy, Public Administration.
Resumen
Este artículo intenta identificar las aproximaciones entre los elementos de la teoría de la Democracia
Deliberativa y el decreto n° 8.243 de la Presidencia de la República de Brasil, de mayo de 2014, en
que instituiría la Política Nacional de Participación Social y el Sistema Nacional de Participación.
Diversos autores consideran la democracia deliberativa adecuada para la contemporaneidad y una
forma de valorizar y crear condiciones de una participación directa del ciudadano en definición de
políticas y prácticas de administración pública. Considerando los objetos y directrices de fortalecer
y articular mecanismos e instancias democráticas del diálogo y crear condiciones de actuación con-
junta entre administración pública federal y la sociedad civil, se observaron en el Decreto diversos
elementos importantes para la consolidación de la democracia brasileña. Se observó la coherencia
entre el Decreto y perspectiva democrática prevista en la Constitución Federal de 1988, que prevé
que el ciudadano puede ejercer su poder democrático directamente o por medio de representantes
electos.
Palabras clave: Democracia deliberativa, participación social, participación directa, Política Nacional
de Participación Social,Administración pública.
Introdução
Ao tratarem da organização de socieda-
des contemporâneas, Marques (2009b),
Bohman (2009), Cohen (2009) e Johnson
(2011) consideram a democracia delibera-
tiva adequada à contemporaneidade. A de-
liberação é entendida como um processo
oriundo de debates, conversações cívicas e
discussões políticas. Podem acontecer em
ambientes formais ou informais e resultam
em contribuições para a criação de espaços
públicos que atendam às demandas ou aos
interesses dos cidadãos (Marques, 2009b).
No entanto, a perspectiva de espaços pú-
blicos instituídos ou que buscam instituir a
participação efetiva dos cidadãos na cons-
trução social, embora teoricamente adequa-
da para a contemporaneidade, apresenta
desafios significativos para sua implementa-
ção efetiva.
Em 23 de maio de 2014, a Presidência da
República do Brasil, publicou o Decreto n.
8.243, instituindo a Política Nacional de Parti-
cipação Social (PNPS) e o Sistema Nacional
de Participação Social (SNPS), visando, prin-
cipalmente, garantir instâncias democráticas
de participação na definição das políticas e
na administração pública federal. O objetivo
da PNPS é “fortalecer e articular os mecanis-
mos e as instâncias democráticas de diálogo
e a atuação conjunta entre a administração
pública federal e a sociedade civil” (Brasil,
2014).
À primeira vista, o Decreto n. 8.243 parece
direcionado a ser um instrumento formal e
prático de implementação de processos que
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contribuam para a estruturação de uma so-
ciedade em que a deliberação democrática
se torne reconhecida. Tal decreto tem sido
visto também como um elemento de defi-
nição de cidadania, por propiciar, supos-
tamente, maior participação dos cidadãos
nas ações da administração pública federal.
Essa forma de interpretação, porém, tem se
tornado objeto de uma intensa polêmica –
cujos contornos políticos são tanto pragmá-
ticos como ideológicos – que levou à recusa
do Decreto na votação realizada na Câmara
dos Deputados em outubro de 2014.
Frente ao intenso debate que se instalou em
torno da legitimidade e da pertinência do re-
ferido decreto presidencial, surge o questio-
namento: “A política de participação social,
definida no Decreto n. 8.243, da Presidência
da República do Brasil, constitui de fato uma
política de democracia deliberativa?”.
Ao refletir sobre essa questão, considera-
-se fundamental conhecer e compreender
o alcance de políticas públicas que visam à
estruturação de uma sociedade democráti-
ca. Devem-se avaliar também as perspec-
tivas que ações governamentais apresen-
tam para o fomento da participação social.
Igualmente, é preciso que se tenha em con-
ta também o papel que o despertar do en-
gajamento social – que o senso comum e
mesmo algumas análises críticas supõem
estar ocorrendo na história recente do País
– desempenha na definição do presente e
do futuro da sociedade.
Uma consistente avaliação do Decreto –
com sua concepção de Estado, de política
e de participação social – não pode pres-
cindir da avaliação da atual conjuntura so-
cial e política. Tem sido praticamente um
consenso entre os analistas a constatação
de que o Congresso Nacional, que saiu das
urnas eleitorais em 2014, tem um perfil con-
servador. No contexto das discussões deste
artigo, entende-se por conservador aquele
parlamentar ao qual interessa manter inalte-
rados os mecanismos da democracia repre-
sentativa. São conservadoras por se mos-
trarem pouco permeáveis a medidas que
demandariam deles uma transigência maior
e uma abertura a formas participativas de
deliberação. Parlamentares que exercem
seu poder de representação dessa forma
tendem a ser refratários a qualquer medida
que implica alteração no status quo das re-
lações de poder no espaço legislativo e em
suas relações com a sociedade.
Sem ignorar este fator conjuntural, o obje-
tivo geral perseguido neste trabalho é ana-
lisar o Decreto n. 8.243 da Presidência da
República do Brasil à luz da teoria da de-
mocracia deliberativa.
Busca-se identificar a natureza do decreto e
suas possíveis contribuições ao confrontá-
-lo com uma perspectiva teórica e prática
de consolidação da participação social nas
políticas e nas decisões gerenciais da admi-
nistração pública brasileira.
Este estudo se inicia por esta introdução,
que apresenta a proposta de estudo e os re-
sultados pretendidos. A segunda seção traz
a conceituação de democracia deliberativa,
seus principais elementos teóricos e as di-
ficuldades de sua implementação. A tercei-
ra parte trata dos elementos principais do
Decreto n. 8.243. Faz-se em seguida uma
contraposição entre a teoria da democracia
deliberativa e o decreto em questão. Por fim,
nas considerações finais, apresenta-se uma
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análise sobre as possíveis contribuições
desse decreto para a institucionalização de
uma sociedade mais democrática e delibe-
rativa no Brasil.
Democracia deliberativa
A reflexão que se pretende fazer aqui exige
que se compreenda o que é a democracia
deliberativa. Com esse intuito, apresentam-
-se, nesta seção, os elementos teóricos
principais e alguns questionamentos e per-
cepções sobre as possibilidades e os limi-
tes da democracia deliberativa.
Avritzer (2009) reconhece que há uma di-
versidade de abordagens quando se fala
em democracia deliberativa, podendo ser
divididas em duas fases.A primeira compre-
endeu os anos de 1990 e teve como foco
principal a discussão sobre o conceito de
“deliberação”. A segunda, dos anos subse-
quentes, concentrou-se na factibilidade em-
pírica da democracia deliberativa.
Marques (2009b) considera que a temática
da deliberação pública é fundamental para
quem quer compreender as contribuições
de uma esfera de discussão pública am-
pliada na “construção de um sistema de-
mocrático marcado pela aproximação entre
instâncias formais do governo e espaços
informais de discussão entre os cidadãos”
(Marques, 2009b, p. 11). Destaca ainda que
diversos trabalhos acadêmicos (Coelho &
Nobre, 2004; Costa, 2002; Avritzer & Navar-
ro, 2003; Dagnino, 2002) investigaram em-
piricamente processos deliberativos e mos-
traram que “a deliberação não se resume a
um processo pontual e elitista de elabora-
ção de decisões” (Marques, 2009b, p. 11).
Com a ampliação dos processos comunica-
cionais, podem-se observar a demanda e a
reivindicação, cada vez maior, por partici-
pação social nas decisões dos governos e
pela garantia de direitos. Essa participação
e esse reconhecimento podem ter maior efe-
tividade e resultados por meio de processos
de deliberação democrática, que exigem ele-
mentos básicos para que aconteçam de for-
ma efetiva, com reconhecimento de minorias
e grupos menos privilegiados.
Na perspectiva de Dryzek (2000), houve uma
virada teórica e prática, no interior da teoria
democrática, caracterizada pela incorpora-
ção, pelos principais pensadores da demo-
cracia, do conceito de deliberação. Avritzer
(2009) afirma que se observa um consenso
parcial, na perspectiva teórica, sobre demo-
cracia deliberativa como ela é compreendida
por James Fishkin, Joshua Cohen e James
Bohman, e que o elemento prático da virada
deliberativa pode ser observado em institui-
ções políticas de democracias contemporâ-
neas (Avritzer, 2002; Fung & Wright, 2003;
Santos, 2002; Fishkin, 1995).
Segundo Marques (2009b), as democracias
modernas contribuíram para a expansão do
exercício da deliberação para diversos tipos
de comunidade que consideram todas as
pessoas como politicamente iguais, não im-
portando a cultura, o credo, o status ou outros
elementos que poderiam ser diferenciadores.
Bohman (2009) destaca que as democracias
constitucionais modernas geraram espaços
para diferentes tipos de deliberação pública,
uma vez que direitos como liberdade de fala,
expressão, associação e investigação, por
elas assegurados, criam condições para a
deliberação bem-sucedida. Considera tam-
bém que, para que possa acontecer na cole-
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tividade, a deliberação deve ser baseada no
diálogo entre as pessoas. Ao mesmo tempo
chama a atenção para a importância de se
definir o que torna uma deliberação pública,
seu alcance e as condições para ser bem-
-sucedida (Bohman, 1996, 2009).
Quanto à definição do termo:
a deliberação pode ser compreendida
como uma atividade discursiva capaz de
conectar esferas comunicativas formais
e informais, nas quais diferentes atores e
discursos estabelecem um diálogo, que
tem por principal objetivo a avaliação e a
compreensão de um problema coletivo ou
de uma questão geral (Marques, 2009b, p.
13).
Embora diferentes definições de deliberação
pública possam ser apresentadas, destaca-
-se seu “processo dialógico de troca de ra-
zões com o propósito de solucionar situa-
ções problemáticas” (Bohman, 2009, p. 36).
Tal processo dialógico deve considerar a
cooperação e a participação dos indivíduos
que têm vínculos com a questão em pauta.
Marques (2009b) destaca a importância das
reflexões de Jürgen Habermas para a defini-
ção de deliberação pública. Habermas bus-
ca definir princípios de interação que asse-
gurem a legitimidade de normas e garantam
alternativas capazes de regular os conflitos
oriundos do pluralismo social, representado
por membros que apresentam diferentes ne-
cessidades, demandas e identidades. Mar-
ques (2009b, p. 12) chama a atenção para o
fato de que “a teoria deliberativa haberma-
siana encontrou grande aceitação entre os
principais teóricos deliberativos” e credita
essa aceitação ao fato de ela considerar que
a deliberação deveria oferecer uma comu-
nicação legitimadora das políticas públicas,
articulando “discurso institucional e a con-
versação cívica entre os cidadãos”.
A criação das normas e políticas públicas
por meio do procedimento proposto por Jür-
gen Habermas não realiza qualquer restri-
ção ao conteúdo normativo. Nesse sentido,
pode-se dizer que sua teoria é formal e,
portanto, universal. Isso não significa, então,
que a moral seja descartada, pois ela será
introduzida pelos dutos do próprio procedi-
mento. A justiça substancial, em última aná-
lise, é a imposição da visão de mundo de um
grupo em relação à coletividade, por isso o
procedimento descarta a predefinição dos
conteúdos e investe em pressupostos de
validade do discurso, permitindo que todos
os atingidos pelo resultado das deliberações
normativas também sejam responsáveis por
sua elaboração.
Marques (2009b) destaca as contribuições
que essa compreensão sobre o processo
político pode oferecer para que a democra-
cia aconteça, uma vez que indica possibili-
dades de procedimentos que permitam ar-
gumentações cooperativas e/ou conflitivas
entre os cidadãos. Acentua ainda a impor-
tância da capacidade de diálogo entre os
cidadãos, incorporando de forma positiva
as suas diferenças com vistas a clarear um
problema e/ou sua solução. A deliberação
deve permitir aos indivíduos a possibilidade
de apresentar ao próximo os seus pontos
de vista, suas percepções e interpretações,
obtendo deles, em um processo de diálogo
respeitoso, a validação das questões apre-
sentadas.
A questão das premissas da formação de
uma teoria procedimental que conferem le-
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gitimidade à atuação estatal e ao sistema
jurídico parte de uma ideia de reconstrução1
de um modelo de democracia normativa.
Essa teoria confia no fato de que a “força
legitimadora estaria ancorada nas próprias
premissas e condições formais de justifi-
cação” (Diniz, 2006, p.163), apresentando-
-se como a única aposta possível após a
derrocada de visões de mundo regidas por
cosmovisões metafísicas (Ferreira, 2015,
p.103).
Refletindo sobre o tema, Figueiredo afirma
que:
as inquietações que atingiram Habermas
residem no fato de ele ter percebido como
várias indagações sobre os vínculos so-
ciais estão no direito. Sob a influência da
teoria do discurso, assim é que uma filo-
sofia do direito procedimental passa a ser
estrutura de fundamentação e legitima-
ção do direito. Ela será também recons-
trutiva do direito existente no sentido de
que este venha a superar os estágios de
validade assentado no jusnaturalismo e
no positivismo (Figueiredo, 2014, p. 278).
A modernidade caracteriza-se, em relação
à legitimidade, de modo a transferir o poder
legítimo para um nível reflexivo de justifica-
ção. Impõe-se, assim, uma carga de racio-
nalidade para um mundo marcado por sua
falta. Por isso, Habermas considera que:
o interesse é comum, porque o consenso
livre de constrangimento permite apenas
o que todos podem querer; é livre de de-
cepção, porque até a interpretação das
necessidades, na qual cada indivíduo
precisa estar apto para reconhecer o que
ele quer, torna-se o objeto de formação
discursiva da vontade. A vontade, formada
discursivamente, pode ser chamada racio-
nal, porque as propriedades formais do dis-
curso e da situação deliberativa garantem
suficientemente que um consenso só pode
surgir através de interesses generalizáveis,
interpretados apropriadamente, pelo que
quero dizer necessidades que podem ser
participadas comunicativamente (Haber-
mas, 2002, p.137).
A legitimidade floresce, nesse sentido, da
transposição de um consenso racional for-
mado no mundo da vida para o sistema jurídi-
co sob o manto de uma norma. Dessa forma,
um sistema que não se pode fundamentar
apenas em uma imposição (facticidade) exi-
ge que o DNA de suas normas jurídicas seja
oriundo de um procedimento democrático
para que se possa falar em validade (legi-
timidade). A vontade exercida pelos partici-
pantes do procedimento não pode ser vicia-
da. Logo, é necessário que se estabeleçam,
como pressupostos de validade, condições
que reduzam a influência dos imperativos
sistêmicos da burocracia e da economia.
Desde já, pode-se verificar que o projeto de
dotar o Estado e o direito de legitimidade se
insere em uma perspectiva contrafática.
Habermas é ciente de que esses influxos sis-
têmicos ocorrem e, em momento algum de
sua produção acadêmica, adotou uma postu-
ra que negasse esses fatos. Contudo, como
discípulo de uma teoria crítica marxista, não
se contentou com o modo como as coisas
estão dispostas, por isso prescreveu várias
recomendações para que se possa vivenciar
um procedimento realmente democrático.
Por esse motivo, o filósofo alemão não es-
taria negligenciando nenhuma possibilidade
que a racionalidade humana permite. Assim,
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sem o intuito de descrever a realidade, Ha-
bermas dirá que, para o bom funcionamento
do procedimento, a racionalidade comunica-
tiva não poderá ser cerceada por uma racio-
nalidade instrumental. Isso quer dizer que,
por meio da racionalidade comunicativa,
podem-se estabelecer formas de contenção
às investidas sistêmicas no mundo da vida
para que elas não sejam capazes de detur-
par a formação legítima do consenso.
Avritzer (2009, pp. 7-8) afirma que, na de-
mocracia deliberativa, podem-se observar
quatro elementos principais: 1) “superação
de uma concepção agregativa de democra-
cia centrada no voto”; 2) identificação da ra-
cionalidade política com mudança e justifi-
cação de preferências; 3) pressuposição de
“princípio de inclusão” na democracia deli-
berativa; 4) procura por instituições capazes
de efetivar as “preferências dos indivíduos
por formas amplas de discussão”. Avritzer
(2009, p. 8) destaca que, para ele, o quarto
elemento apresentado é “o centro do câno-
ne democrático deliberativo”.
Considerando a construção teórica da de-
mocracia deliberativa, Avritzer (2009) afir-
ma que os principais teóricos da temática
são James Bohman, Joshua Cohen, Sheyla
Benhabib e Maeve Cooke, os quais se des-
tacam no “processo de construção da teo-
ria por meio de um amplo debate teórico”
(Avritzer, 2009, p. 8). Quanto à contribuição
teórica de cada um desses autores, pode-se
observá-la pelos textos organizados e tra-
duzidos por Ângela Cristina Salgueiro Mar-
ques no livro A deliberação pública e suas
dimensões sociais, políticas e comunicati-
vas. Esses textos são a base do referencial
aqui trabalhado e dos elementos considera-
dos como necessários para que a perspec-
tiva deliberativa democrática possa aconte-
cer em determinada sociedade.
Avritzer (2009) afirma que, para Bohman, a
democracia deliberativa não deve ser defi-
nida como procedimental, mas como um
conjunto de acordos cooperativos eminente-
mente pragmáticos. Bohman (2009) desta-
ca que há diversas razões para defender a
perspectiva deliberativa. Mesmos argumen-
tos que aparentemente indicam problemas
da deliberação costumam apresentar como
contraposição benefícios que a justificam.
Reconhece que a deliberação nem sempre
levará à melhor decisão, pois decisões não
públicas podem ser melhores do que de-
cisões públicas. No entanto, a deliberação
pública costuma melhorar a qualidade da
justificação e da produção de decisões por
submeter-se à maior amplitude de opiniões
e possibilidades de alternativas: “defendo
que a melhor defesa para a deliberação pú-
blica é que ela parece ser o melhor meio de
aperfeiçoar a qualidade epistêmica das jus-
tificações para decisões políticas” (Bohman,
2009, p. 35). Destaca que deliberações em
fóruns públicos abertos costumam aperfei-
çoar a qualidade das razões.
Bohman (2009) considera importante a
perspectiva procedimental da deliberação,
citando as contribuições de Joshua Cohen e
Robert Dahl, com suas listas sistemáticas de
condições procedimentais. No entanto, con-
sidera que elas, embora importantes, não
são suficientes para elucidar o motivo de as
decisões falharem em ser democraticamen-
te legitimadas, talvez porque as regras e as
condições devessem surgir no meio da deli-
beração, entre aqueles que deliberam. Para
Bohman (2009), a legitimidade democrática
e o sucesso nas atividades deliberativas
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têm sua base no diálogo: “uma abordagem
dialógica da deliberação captura melhor o
processo de reinterpretação das normas e
procedimentos à luz de novas experiências
e situações problemáticas” (Bohman, 2009,
p. 64). A deliberação pública é compreendi-
da, dessa forma, como um diálogo que tem
como objetivo a solução de um problema ou
resolução de um conflito. Conclui sua análi-
se afirmando que “talvez o principal desafio
da democracia deliberativa seja solucionar
os crescentes conflitos comuns sem abrir
mão da igualdade política dos cidadãos, da
não tirania dos resultados e da publicidade
do diálogo” (Bohman, 2009, p. 81).
Em Cohen (2009), pode-se observar uma
caracterização da democracia deliberativa
de modo procedimentalista, como uma as-
sociação democrática na qual os membros
partilham seus princípios definidores e tam-
bém os objetivos do grupo, considerando a
pluralidade que o constitui.
As perspectivas de Bohman (2009) e Cohen
(2009) apontam para uma democracia de-
liberativa em que o debate e a cooperação
operam considerando a pluralidade, carac-
terística da condição humana e da agrega-
ção dos seus indivíduos.
Benhabib (2009) destaca a importância da
capacitação do sujeito para a participação
dos processos democrático-deliberativos:
o engajamento na deliberação demanda
que todos os participantes sejam capazes
de formular questões próprias e passíveis
de serem compreendidas e aceitas; de
iniciar debates e interpretar suas necessi-
dades de maneira reflexiva, expondo seus
interesses sob uma perspectiva generali-
zante (Benhabib, 1996, p. 70.).
Avritzer (2009) destaca a diferença principal
entre a abordagem de Bohman e Cohen e
a abordagem de Benhabib. Enquanto os pri-
meiros não consideram importante a ideia
de consenso procedimental, mas valorizam
a cooperação e a associação democrática,
Benhabib considera o consenso racional
mais importante.
Marques (2009b) considera que a legitimi-
dade do processo de deliberação exige um
acordo, entre os envolvidos, sobre as regras
e princípios normativos que definirão a na-
tureza do vínculo entre os participantes e
como serão feitas as trocas argumentativas.
Apresenta como princípios a serem obser-
vados: a) igualdade, b) publicidade, c) reci-
procidade, d) reflexividade, e) accountability
(prestação de contas), f) autonomia, g) au-
sência de coerção, h) respeito mútuo.
Considerando a complexidade ou amplitude
dos princípios a serem observados para a
constituição da democracia deliberativa, há
questionamentos sobre a exequibilidade, ou
a possibilidade da realização empírica, da
deliberação. Quanto a isso, diversos autores
se dedicaram a indicar a possibilidade de re-
alização prática da deliberação. Para Avritzer
(2009), questões empíricas no que se refere
à facticidade da democracia deliberativa são
tratadas por autores como Amy Gutmann e
Dennis Thompson, Jane Mansbridge e Si-
mone Chambers. Apresentaremos aqui as
contribuições de estudos de Gutmann e
Thompson (2009) e de Genevieve Fuji John-
son (2011), que mostram resultados práticos
obtidos em processos de democracia delibe-
rativa.
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Gutmann e Thompson (2009, p. 177) distin-
guem os principais enfoques que teóricos
tomam na perspectiva de definir “termos
justos de cooperação política em uma so-
ciedade democrática”. Avritzer (2009) desta-
ca a contribuição desses autores quanto à
inserção de elementos não procedimentais
ou substantivos na compreensão da demo-
cracia, destacando a introdução da recipro-
cidade, como capacidade mútua de acesso
a determinados bens públicos, no “cânone
deliberativo”.
Como afirmam Gutmann eThompson (2009,
p. 181), “a reciprocidade assegura que os ci-
dadãos devem uns aos outros justificativas
para as leis e as políticas públicas que os
vinculam mutuamente e que eles coletiva-
mente elaboraram”. Nesse sentido, é rele-
vante a explicação fornecida por Habermas:
o entrelaçamento dos processos jurídicos
com argumentações que se regulam a si
mesmas, apoiando-se nos princípios da
generalização e da adequação, explica a
curiosa ambivalência da pretensão de va-
lidade do direito positivo. É preciso distin-
guir entre a validade do direito, garantida
através de decisões competentes, e a vali-
dade social do direito aceito ou implantan-
do de fato. No entanto, no próprio sentido
complexo da validade do direito, manifes-
ta-se uma ambivalência que o direito mo-
derno adquire devido à sua dupla base
da validade, que repousa no princípio da
fundamentação e no da normatização. (...)
Ao passo que a pretensão de validade do
direito positivo não consegue fugir da con-
tingência que cerca a sua gênese, nem da
facticidade da ameaça de sanção. Mesmo
assim, as normas jurídicas positivadas,
emitidas conforme o processo, pretendem
legitimidade. Pois o modo de validade do
direito aponta não somente para a expec-
tativa política de submissão à decisão e à
coerção, mas também para a expectativa
moral do reconhecimento racionalmente
motivado de uma pretensão de validade
normativa, a qual só pode ser resgatada
através de argumentação. E os casos li-
mites do direito da legítima defesa e da
desobediência civil, por exemplo, revelam
que tais argumentações podem romper a
própria forma jurídica que as institucionali-
za (Habermas, 2003, pp. 246-247).
A perspectiva da reciprocidade pode ajudar
na definição de acordos políticos com base
em princípios justificáveis a outros que com-
partilham o objetivo de chegar a um enten-
dimento. Para os autores, as decisões de-
mocráticas exigem uma justificação mútua,
“providenciar razões que constituem uma
justificação pelo fato de impor leis vinculató-
rias a outras pessoas” (Gutmann & Thomp-
son, 2009, p. 181). Essa justificação mútua
somente é possível tomando como referên-
cia valores substantivos. Para os autores,
o princípio da reciprocidade indica que há
outros princípios que também precisam ser
observados para que se obtenha um con-
teúdo de democracia deliberativa, quais se-
jam: publicidade, accountability, liberdade
básica, oportunidade básica, oportunidade
justa.
Alguns teóricos, denominados por Gutmann
e Thompson (2009) como procedimentalis-
tas puros, focam nos procedimentos, con-
siderando-os como as leis são feitas e as
condições para que os procedimentos acon-
teçam de forma justa. No entanto, os auto-
res apontam a necessidade de considera-
ção, além dos procedimentos, de princípios
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substantivos como a liberdade individual ou
igual oportunidade, entre outros, para que
se obtenha um processo democrático justo.
Para indicar a importância de incluir princí-
pios procedimentais e substantivos na teo-
ria democrática e deliberativa, Gutmann e
Thompson (2009) fazem uso de um caso
envolvendo deliberação sobre cuidados com
a saúde no Reino Unido. Em 1999, o gover-
no britânico criou um corpo deliberativo (Na-
tional Institute for Health and Clinical Excel-
lence – NICE), com especialistas e leigos,
para definir acessos a tratamentos e diretri-
zes clínicas a serem utilizados pelo Serviço
Nacional de Saúde (National Health Service
– NHS), pois não havia fundos para todas
as necessidades da saúde.Tomando o caso
como exemplo, os autores apontam que os
procedimentos somente não justificam a ne-
gação do NICE ao financiamento para uma
nova droga antigripal (Anamivir). O fato de a
decisão ter sido deliberativa também não é
suficiente para considerá-la justificável.
A reciprocidade permite aos cidadãos o
acesso às justificativas que levaram à ne-
gação de uma política que pode afetar seu
bem-estar. Os elementos que levaram à de-
cisão do NICE foram expostos e ficou cla-
ro que a questão não era econômica, pois
havia necessidade de mais pesquisas para
comprovar a relevância e a eficácia do me-
dicamento e que resultados positivos pode-
riam, no futuro, alterar a decisão tomada.
Justificar a decisão pela observância dos
procedimentos não seria suficiente nesse
tipo de demanda, sendo necessária uma
justificativa substantiva.
Outra questão significativa apontada pelos
autores é o status provisório, moral e poli-
ticamente, dos princípios substantivos na
democracia deliberativa. Considerar a pro-
visoriedade é considerar a possibilidade de
mudar uma decisão em outro momento. É
aceitar uma perspectiva que, em determina-
do momento, será rejeitada, ou vice-versa.As
razões políticas e/ou morais podem ter suas
razões modificadas pela razão comunicativa.
No caso citado pelos autores, pode-se notar
a clareza do grupo quanto à provisoriedade
da decisão: “o NICE também recomendou
que julgamentos adicionais fossem condu-
zidos e dados posteriores fossem obtidos,
para que sua decisão pudesse ser retomada
na próxima temporada” (Gutmann & Thomp-
son, 2009, p. 195). Ao concluir as relações
observadas entre os princípios da democra-
cia deliberativa e o NICE, os autores desta-
cam que, no debate sobre o NICE, na Casa
dos Comuns – instituição parlamentar que,
no Reino Unido, corresponde aproximada-
mente à Câmara dos Deputados no legisla-
tivo federal brasileiro –, críticos e defensores
dele usaram tanto princípios procedimentais,
quanto substantivos para apresentar suas
posições.
Avritzer (2009, p. 9) destaca a importância
das observações de Gutmann e Thompson
indicando que eles aproximam “a democra-
cia deliberativa da democracia real, ao co-
locarem a questão das oportunidades justas
no campo das discussões democráticas e
conectá-la com processos legislativos”.
Quanto à factibilidade da democracia delibe-
rativa, Johnson (2011) apresenta três casos
práticos – Gestão dos Resíduos Nucleares
Canadenses (NWMO), Habitação Social em
Toronto (TCHC) e Nova Scotia Política Ener-
gética (NSP) –, que mostram elementos im-
portantes para que a perspectiva teórica se
efetive no dia a dia das organizações. John-
Democracia Deliberativa: uma Análise do Decreto nº 8.243
ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016
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son destaca fatores pertinentes a cada con-
texto político que comprometem o alcance
dos objetivos da democracia deliberativa:
princípios normativos, pressão pública, re-
quisitos políticos, interesse estratégico, in-
teresse econômico. Esses fatores tendem a
dar suporte à motivação das elites de dividir
o poder de tomada de decisão com aqueles
diretamente afetados por suas políticas. Os
princípios normativos se referem às gran-
des finalidades sociais e éticas que uma
organização espera alcançar na prestação
de seus serviços e gestão de seus bens. A
pressão pública refere-se às exigências de
mudança que um público afetado coloca
para uma organização. Requisitos políticos
são aqueles colocados à organização pelo
seu regime regulatório global. Interesses
estratégicos caracterizam imperativos orga-
nizacionais considerados importantes para
garantir programas eficazes e a perenidade
da organização. Finalmente, interesses eco-
nômicos se referem às condições necessá-
rias para a manutenção ou melhora dos re-
sultados financeiros da organização.
Os resultados dos três casos apresenta-
dos por Johnson (2011) são interessantes e
ajudam a esclarecer que elementos menos
altruístas podem encorajar a adesão à de-
mocracia deliberativa, pois a deliberação é
uma forma de as organizações compreen-
derem e obterem maior aceitação em suas
relações com o ambiente onde se inserem.
Segundo Johnson (2011), os processos
consultivos da TCHC, NSP e NWMO são
impressionantes em termos de seus proje-
tos de tomadas de decisão com base em
princípios democráticos deliberativos. Ele
observou que em cada caso há fatores con-
textuais que podem facilitar ou complicar as
inclinações das elites e, portanto, as possi-
bilidades, para a realização do empodera-
mento democrático deliberativo. O fator que
mais chama atenção e diferencia os casos
apresentados é o “interesse econômico”. Ao
contrário do caso do TCHC, os interesses
econômicos do NSP e do NWMO não fo-
ram congruentes com o aumento do empo-
deramento de seus públicos afetados. Seus
interesses econômicos poderiam ter sido
comprometidos pelo aumento da autonomia
democrática. O descompasso no fator “inte-
resses econômicos” talvez justifique em par-
te que o empoderamento dos participantes
nos processos de consulta foi reduzido nas
duas últimas organizações. Johnson (2011)
conclui que isso é potencialmente proble-
mático para as perspectivas de realização
dos objetivos teóricos da democracia deli-
berativa em processos de políticas públicas
estabelecidas em contextos de hierarquias
de poder estabelecidas e interesses econô-
micos dominantes.
Elementos da política deliberativa no âm-
bito do Decreto n. 8.243
Em 23 de maio de 2014, a Presidência da
República do Brasil, pelo Decreto n. 8.243,
instituiu a Política Nacional de Participação
Social (PNPS) e o Sistema Nacional de Par-
ticipação Social (SNPS), com o objetivo de
“fortalecer e articular os mecanismos e as
instâncias democráticas de diálogo e a atu-
ação conjunta entre a administração pública
federal e a sociedade civil” (Brasil, 2014).
O Decreto destaca que os objetivos e as di-
retrizes da PNPS devem ser considerados
na formulação, na execução, no monitora-
mento e na avaliação de programas e polí-
ticas públicas, como também no aprimora-
mento da gestão pública.
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O Decreto define como sociedade civil “o ci-
dadão, os coletivos, os movimentos sociais
institucionalizados ou não institucionaliza-
dos, suas redes e suas organizações” (Bra-
sil, 2014). Além da conceituação de socie-
dade civil, são definidas as compreensões
para conselho de políticas públicas, comis-
são de políticas públicas, conferência nacio-
nal, ouvidoria pública federal, mesa de diálo-
go, fórum interconselhos, audiência pública,
consulta pública e ambiente virtual de par-
ticipação social. O decreto destaca que ele
não implica na descontinuação ou alteração
de nenhuma das instâncias apresentadas:
“as definições previstas neste Decreto não
implicam na descontinuação ou alteração
de conselhos, comissões e demais instân-
cias de participação social já instituídas no
âmbito do governo federal” (Brasil, 2014).
Quanto às diretrizes gerais da PNPS, são
apresentadas no art 3o:
I – reconhecimento da participação so-
cial como direito do cidadão e expres-
são de sua autonomia;
II – complementariedade, transversali-
dade e integração entre mecanismos e
instâncias da democracia representati-
va, participativa e direta;
III – solidariedade, cooperação e res-
peito à diversidade de etnia, raça;
IV – direito à informação, à transparên-
cia e ao controle social nas ações pú-
blicas, com uso de linguagem simples
e objetiva;
V – valorização da educação para a ci-
dadania ativa;
VI – autonomia, livre funcionamento e
independência das organizações da
sociedade civil;
VII – ampliação dos mecanismos de
controle social (Brasil, 2014).
Entre os objetivos da PNPS, podem-se ob-
servar, no art. 4o:
I – consolidar a participação social
como método de governo;
II – promover a articulação das instân-
cias e dos mecanismos de participação
social;
III – aprimorar a relação do governo fe-
deral com a sociedade civil;
IV – promover e consolidar a adoção
de mecanismos de participação social
nas políticas e programas de governo
federal;
V – desenvolver mecanismos de parti-
cipação social nas etapas do ciclo de
planejamento e orçamento;
VIII – incentivar e promover ações e
programas de apoio institucional, for-
mação e qualificação em participação
social para agentes públicos e socieda-
de civil;
IX – incentivar a participação social nos
entes federados (Brasil, 2014).
O Decreto determina ainda que os órgãos
e entidades da administração pública fede-
ral direta e indireta considerem, ao formular
e gerir programas e políticas públicas, as
diversas instâncias de participação social e
que apresentem relatórios anuais da imple-
mentação da PNPS, cabendo à Secretaria
Geral da Presidência da República publicar
anualmente avaliação da implementação da
PNPS.
O Art. 7º define que o SNPS será coordena-
do pela Secretaria Geral da Presidência da
República e integrado por: 1) conselho de
políticas públicas, 2) comissão de políticas
públicas, 3) conferência nacional e 4) ouvi-
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doria federal, “sem prejuízo da integração
de outras formas de diálogo entre a admi-
nistração pública federal e a sociedade civil”
(Brasil, 2014). Além disso, o Decreto define
outras atribuições da Secretaria Geral da
Presidência da República quanto à orien-
tação, à implementação, ao suporte, à ava-
liação e ao fortalecimento da PNPS e do
SNPS, bem como ao suporte que ela terá
para realizar todas essas atribuições.
Entre as diretrizes mínimas a serem obser-
vadas “na constituição de novos conselhos
de política e na reorganização dos já cons-
tituídos”, podem-se destacar a “garantia da
diversidade entre os representantes da so-
ciedade civil” e a “publicidade” dos atos, as
quais compõem as diretrizes das comissões
de políticas públicas e das conferências na-
cionais (Brasil, 2014). É importante observar
que “a participação dos membros no con-
selho é considerada prestação de serviço
público relevante” e, por essa razão, ela não
é remunerada.
As ouvidorias devem observar as diretrizes
da Ouvidoria-Geral da União e da Controla-
doria Geral da União, que já foram definidas
no Decreto n. 8.109, de setembro de 2013, e
não são redefinidas neste momento.
Segundo o Decreto, as mesas de diálogo vi-
sam ao “aperfeiçoamento das condições e
relações de trabalho”, por isso deveriam pre-
ferencialmente envolver representantes dos
empregados, dos empregadores e do go-
verno e ter prazo de funcionamento definido.
O documento em questão também define
diretrizes mínimas de funcionamento dos
fóruns interconselhos, das audiências públi-
cas, das consultas públicas e dos ambien-
tes virtuais de participação social.
Institui-se, ainda, a Mesa de Monitoramento
das Demandas Sociais, “instância colegiada
interministerial responsável pela coordena-
ção e encaminhamento de pautas dos mo-
vimentos sociais e pelo monitoramento de
suas respostas” (Brasil, 2014).
Deve-se destacar que as instâncias de par-
ticipação social de que trata o Decreto já
fazem parte da vida política do País e algu-
mas são utilizadas pela quase totalidade dos
municípios brasileiros. Em suma, o Decreto
organiza e estabelece diretrizes de funcio-
namento de instâncias já existentes de parti-
cipação social no Governo Federal. Estimula
a observação dos objetivos e das diretrizes
da PNPS na formulação, na execução, no
monitoramento e na avaliação de programas
e políticas públicas.Aumentando as possibi-
lidades de participação da sociedade com
plataformas virtuais na internet, é possível
que a manifestação dos cidadãos sobre po-
líticas públicas se torne mais efetiva.
Embora muitas vozes, representando prin-
cipalmente instâncias políticas, tenham ex-
pressado certa surpresa com o Decreto,
deve-se observar que ele institucionaliza
práticas políticas que foram assumidas pelo
governo Lula com a Medida Provisória 103.
Se considerado tal fato, pode-se afirmar que
ele não constitui uma novidade nas estrutu-
ras existentes no Poder Executivo. Já, nessa
Medida Provisória, previam-se a articulação
com as entidades da sociedade civil e a cria-
ção e implementação de instrumentos de
consulta e participação popular que pudes-
sem influenciar na elaboração da agenda da
Presidência da República. Além disso, pela
Constituição de 1988, artigo 84, é compe-
tência privativa do Presidente da República
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32
dispor sobre a “organização e funcionamen-
to da administração federal” (Brasil, 2005), o
que deve ser feito mediante decreto. Dessa
forma, embora pudesse haver alguma sur-
presa quanto ao Decreto, não se pode dizer
que ele seja incoerente com as ações ante-
riores do atual governo e do anterior, nem
que seja um ato indevido ou autoritário por
ser feito por decreto, pois é esse o procedi-
mento definido pela Constituição Brasileira
de 1988.
Manifestações contrárias e a favor do De-
creto podem ser observadas na mídia e são
coerentes com uma perspectiva deliberativa,
uma vez que “diferentes atores e discursos
estabelecem um diálogo, que tem por prin-
cipal objetivo a avaliação e a compreensão
de um problema coletivo ou de uma questão
geral” (Marques, 2009, p. 13). Nessa pers-
pectiva, observa-se o manifesto da UNE fa-
vorável ao Decreto:
A União Nacional dos Estudantes acredita
que mais participação popular não é sinô-
nimo de ditadura, como alguns tentam ro-
tular, mas sim de efetiva democracia e vai
ao encontro do desejo dos brasileiros/as
em participar mais da vida política e deci-
sões do país (UNE, 2014).
Enquanto algumas manifestações, princi-
palmente por parte de membros da classe
política, buscam associar o Decreto a uma
perspectiva ditatorial, outras querem mostrar
que ele tem sua base em uma proposta de
consolidação democrática.
O interessante é observar que algumas rea-
ções posteriores à publicação do Decreto n.
8.243 encontram fundamento no caso NICE
descrito por Gutmann e Thompson (2009)
neste estudo. Nesse caso, a instância de
onde partiu a maioria das críticas também foi
o Legislativo. No entanto, observamos uma
diferença significativa. No caso do Brasil, an-
tes de um debate amplo sobre a pertinência
ou não da institucionalização das instâncias
de participação, há membros do legislativo
que pretendem votar, “em regime de urgên-
cia, um decreto legislativo que anule os efei-
tos do decreto presidencial” (Partidos, 2014).
Referindo-se ao Decreto n. 8.243, o Senador
Álvaro Dias, em vídeo disponível no Youtube,
afirma: “ao assinar este decreto, a presidente
da República decreta a falência do poder le-
gislativo federal e o sucateamento total e ab-
soluto do Congresso Nacional” (Dias, 2014).
Embora também taxado como “afronta ao Le-
gislativo”(Dias, 2014), na realidade, o Decreto
trata da participação direta, que está prevista
no art. 1o, parágrafo único, da Constituição
Federal de 1988, onde se lê que “todo o po-
der emana do povo, que o exerce por meio
de representantes eleitos ou diretamente nos
termos desta Constituição” (Brasil, 2005). Ou
seja, devem-se distinguir os processos pe-
los quais o cidadão pode exercer seu poder.
Segundo a Constituição de 1988, o cidadão
pode exercê-lo através da delegação a po-
líticos eleitos determinadas deliberações ou
atuando diretamente em defesa dos seus
interesses, incluindo aí diversas formas de
organização. Quanto ao processo de delega-
ção, o Decreto não altera nada, não fazendo
nenhuma menção que implique mudanças.
Avritzer (2009, p. 7) afirma que, na demo-
cracia deliberativa, podem-se observar qua-
tro elementos principais, sendo o primeiro a
“superação de uma concepção agregativa de
democracia centrada no voto”. Perspectivas
além da democracia representativa, a princí-
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  • 2. ARTIGO: FINANCIAMENTO DE PARTIDOS POLÍTICOS NAS ELEIÇÕES DE 2008 E 2012: ANÁLISE DAS EMPRESAS DOADORAS ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 1 FINANCIAMENTO DE PARTIDOS POLÍTICOS NAS ELEIÇÕES DE 2008 E 2012: ANÁLISE DAS EMPRESAS DOADORAS FINANCING POLITICAL PARTIES IN THE 2008 AND 2012 ELECTIONS: AN ANALYSIS OF DONOR COMPANIES LA FINANCIACIÓN DE LOS PARTIDOS POLÍTICOS EN LAS ELECCIONES DE 2008 Y 2012: ANÁLISIS DE LAS EMPRESAS DONANTES Resumo: A motivação deste trabalho foi a observação do processo eleitoral sob o ponto de vista do usuário externo das informações contábeis. Para tanto, buscou-se investigar como se dá a divulgação de dados sobre o processo eleitoral pelas empresas listadas na BM&FBovespa, que fizeram doações a partidos políticos nas eleições municipais de 2008 e 2012. Por meio do sistema de Divul- gação Externa, foram obtidas as Informações Anuais e os Demonstrativos Financeiros Padronizados de 11 empresas selecionadas, analisando-se os dados referentes ao controle sobre outras entidades, além da DR, DFC, Nota Explicativa e Relatório da Administração das empresas em busca de referência a doações efetuadas a partidos políticos. Concluiu-se que apenas uma das 11 empresas sele- cionadas evidenciou a realização de doações a partidos políticos por meio dos demonstrativos e apenas no ano de 2008, não sendo possível identificar os valores doados nem os critérios adotados para escolha dos partidos contemplados. Palavras-chave: evidenciação; partidos políticos; informação contábil; eleições; transparência. Jardson Edson Guedes da Silva Almeida - jardson_guedes@yahoo.com.br Professor do Centro Universitário Tiradentes, Assistente I, Maceió, AL, Brasil. Luiz Antônio Félix Júnior - juniorfelixx@hotmail.com Faculdade Internacional da Paraíba, Escola de Negócios, João Pessoa, PB, Brasil. Umbelina Cravo Teixeira Lagioia - umbelinalagioia@gmail.com Universidade Federal de Pernambuco, Doutora no Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis, Recife, PE, Brasil. Juliana Araújo - juhliana.araujo@gmail.com Doutoranda em Administração pela Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE, Brasil. João Gabriel Nascimento Araújo - j_gabriel90@hotmail.com Doutorando em Ciências Contábeis pela Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE, Brasil. Artigo submetido no dia 15-04-2015 e aprovado em 19-01-2016. DOI: http://dx.doi.org/10.12660/cgpc.v21n68.48758 Esta obra está submetida a uma licença Creative Commons
  • 3. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jardson Edson Guedes da Silva Almeida, Luiz Antônio Félix Júnior, Umbelina Cravo Teixeira Lagioia, Juliana Araújo, João Gabriel Nascimento Araújo 2 Abstract The motivation of this study was to observe the electoral process from the point of view of the external user of accounting information.Therefore,we sought to investigate how information about the electoral process is disclosed by the companies involved in companies listed on the BM & FBOVESPA and that made donations to political parties in the municipal elections of 2008 and 2012.Annual Information and the Standardized Financial Statements of eleven selected companies were obtained from the External Disclosure system and an analysis was made of the data for controlling companies, in addition to the DR, DFC, Explanatory Note and Management Report of the companies, in a search for reference to donations made to political parties. The conclusion was that only one of the eleven companies selected produced evidence of making donations to political parties by way of their statements and only in 2008; it was impossible to identify what amounts were donated or the criteria used in selecting the parties that benefited. Keywords: disclosure; political parties; accounting information; elections; transparency. Resumen La motivación de este estudio fue la observación del proceso electoral desde el punto de vista del usuario externo de la información contable. Por lo tanto, tratamos de investigar cómo se obtuvo la difusión de información sobre el proceso electoral por las empresas que participan en empresas que cotizan en el mercado BM&FBOVESPA que hicieron donaciones a los partidos políticos en las elec- ciones municipales de 2008 y 2012.A través del Sistema de difusión externa de la Información Anual y los Estados Financieros Estandarizados de once empresas seleccionadas,analizamos los datos para el control de las empresas distintas de la DR,DFC,Note y el informe de gestión de las empresas que buscan referencia a las donaciones a los partidos políticos. Se concluyó que sólo una de las once empresas seleccionadas destacó la realización de donaciones a los partidos políticos a través de los estados contables y sólo en 2008,no siendo posible identificar que donó los valores o los criterios utilizados para seleccionar las partes cubiertas. Palabras clave: divulgación; partidos políticas; información contable; elecciones; transparencia. 1 INTRODUÇÃO A receita dos partidos políticos tem sua ori- gem em doações e contribuições de recur- sos financeiros de pessoas físicas e jurídi- cas, além das cotas do Fundo Especial de Assistência aos Partidos Políticos (Fundo Partidário), constituído por multas e penali- dades eleitorais, recursos financeiros legais, doações espontâneas privadas e dotações orçamentárias públicas. De acordo com os artigos 32 e 33 da Lei dos partidos políti- cos, em suas prestações de contas à Jus- tiça Eleitoral, os partidos devem apresentar a discriminação e a destinação dos valores recebidos do Fundo Partidário, além do va- lor e da origem das contribuições e doações recebidas. A divulgação das pessoas físicas e jurídicas que realizaram essas doações é um grande instrumento de controle social do processo eleitoral, trazendo a possibilidade de acom- panhamento pela população da movimenta- ção financeira dos partidos políticos. Porém, esse é apenas um lado da questão, visto que por si só a divulgação das empresas que con- tribuíram para as campanhas não é suficien- te para garantir a transparência do processo eleitoral. Para isso é preciso observar essa questão sob outro ponto de vista e analisar as informações das empresas que partici- pam do processo eleitoral como doadoras de recursos a candidatos ou a partidos políticos. Nem todas as empresas sofrem a imposi- ção legal de divulgação de informações ao público, entretanto as companhias de ca- pital aberto que negociam suas ações na BM&FBovespa devem cumprir algumas exi- gências no que diz respeito à divulgação de informações econômico-financeiras e ad- ministrativas sobre a entidade. Essas infor-
  • 4. FINANCIAMENTO DE PARTIDOS POLÍTICOS NAS ELEIÇÕES DE 2008 E 2012: ANÁLISE DAS EMPRESAS DOADORAS ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 3 mações ficam disponíveis na internet para acesso tanto pelos acionistas como pela po- pulação em geral interessada. Schultz, Marques e Hofer (2010) comen- tam que os maiores níveis de evidenciação compulsória são registrados junto às com- panhias de capital aberto, com o objetivo de proteger interesses dos usuários externos (acionistas, associados, fornecedores, cre- dores, bancos, governo, sociedade etc.) e dar estabilidade e transparência ao mercado de capitais como um todo. Nas demais em- presas, existem diferentes níveis de eviden- ciação compulsória, geralmente bem mais modestos e, até mesmo, a desobrigação da publicação de informações a respeito da en- tidade. Pereira (2008) comenta que a teoria contábil contemporânea se preocupa com as ques- tões sobre a quantidade e a qualidade das informações fornecidas aos usuários exter- nos à entidade empresarial. A motivação deste trabalho surge a partir desse ponto, com o propósito de observar o processo eleitoral sob o ponto de vista do usuário ex- terno das informações contábeis e investi- gar de que maneira se dá a divulgação de informações relativas ao processo eleitoral por parte das empresas nele envolvido. Por esse motivo, o estudo objetivou analisar se as empresas listadas na BM&FBovespa que fizeram doações a partidos políticos nas eleições de 2008 e 2012 evidenciaram esse fato em seus demonstrativos financeiros. 2. REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 Segmentos especiais de listagem na BM&FBovespa A abordagem de Governança Corporativa no Brasil está intimamente ligada ao merca- do de capitais. Lagioia (2007, p. 107) define Governança Corporativa como “conjunto de regras, normas, e práticas de conduta de- finidas pela BM&FBovespa e destinadas a oferecer maior transparência aos investido- res e melhor preço/custo de captação para as empresas.” A BM&FBovespa (2005) defi- ne que as práticas diferenciadas de gover- nança corporativa formam “um conjunto de normas de conduta para empresas, admi- nistradores e controladores, considerados importantes para a valorização das ações e outros ativos emitidos pelas companhias”. Em 2000, foram criados os segmentos de governança corporativa para determinar às empresas já listadas na BM&FBovespa uma série de práticas e comportamentos relevantes a serem contemplados por seus gestores. Diante do elevado rigor e da ex- pectativa do não atendimento por muitas empresas quanto ao segmento Novo Mer- cado, a BM&FBovespa decidiu pela cria- ção de dois novos níveis de governança corporativa: o nível 1 e o nível 2, os quais distinguem as empresas de acordo com o grau de compromisso assumido com a prá- tica de boa governança. O Novo Mercado foi criado para constituir-se no segmento da BM&FBovespa, destinado às empresas que se comprometem com práticas e regras societárias mais rígidas do que as exigidas pela legislação brasileira. Aderindo ao Novo Mercado, as organizações deveriam expan- dir os direitos dos acionistas e divulgar suas informações de maneira ordenada e mais transparente aos usuários, otimizando a li- quidez e a valorização das ações.
  • 5. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jardson Edson Guedes da Silva Almeida, Luiz Antônio Félix Júnior, Umbelina Cravo Teixeira Lagioia, Juliana Araújo, João Gabriel Nascimento Araújo 4 As empresas contempladas no nível 1 se comprometem, principalmente, com a re- alização de melhorias na prestação de in- formações ao mercado e com a dispersão acionária. O principal ponto a ser observado por elas se refere à qualidade e à quantida- de das informações de suas responsabili- dades quanto às Demonstrações Contábeis Trimestrais, às Demonstrações Financeiras Padronizadas e aos Informes Anuais. Tais relatórios já eram obrigatórios às empresas antes do surgimento dos níveis diferencia- dos de governança, assim, a mudança está na profundidade da evidência de tais infor- mações. Isso pode explicar o porquê de algumas empresas terem aderido ao Nível 1 no primeiro mês de existência, junho de 2001. Outra vertente a ser analisada nas normas iniciais, em relação ao primeiro estágio de transição para o Novo Mercado, refere-se ao percentual de ações emitidas que deve- ria permanecer em circulação, que era de, no mínimo, 25%.Tal percentual nem sempre era possível de ser atendido de imediato, o que provocou a reformulação do critério e o percentual passou a ser contemplado como meta a ser atingida em um prazo negociado entre a BM&FBovespa e a própria empresa. No nível 2, além da aceitação das obriga- ções contidas no nível 1, a empresa e seus gestores devem utilizar um conjunto bem mais amplo de práticas de governança e de direitos adicionais para os acionistas mino- ritários, uma vez que, além de cumprirem as exigências do Nível I, precisam divulgar suas informações contábeis anuais segun- do os padrões estabelecidos pelo Interna- tional Accounting Standards Board (IASB) ou pelo Financial Accounting Standards Bo- ard (FASB). Ademais, há a exigência de ex- tensão das mesmas condições obtidas pelos gestores quando da venda da companhia para todos os acionistas detentores de ações ordinárias e de, no mínimo, 70% desse valor para os detentores de ações preferenciais. A criação do Novo Mercado marcou uma nova fase do mercado de capitais no Brasil, onde o setor privado assumiu a liderança na condução das reformas. Essa iniciativa foi bem recebida por investidores, empre- sas, órgãos reguladores e governo e mar- cou também uma mudança de postura da BM&FBovespa, que, como o contrato de adesão é administrado por ela, passa a ser a guardiã das práticas de governança corpora- tiva. Isso sugere a adoção da prática da au- torregulação e que a promoção do mercado de capitais pode ser feita sem as amarras do Estado. Deve-se notar que o Novo Mercado não requer um sistema operacional diferen- ciado do mercado tradicional. Ele funciona como um selo de qualidade, cujo valor reside nas obrigações contratuais assumidas pela empresa e de acordo como a BM&FBovespa administra tais contratos.As companhias que aderirem ao Novo Mercado devem seguir re- gulamentações mais rígidas que as do Nível 2, porém, tendo como principal diferença o fato de ficarem restritas à emissão de ações ordinárias. Inserida nesse contexto e para resolver os conflitos que surgirem entre acionistas e companhias que aderirem ao Nível 2 ou ao Novo Mercado, a BM&FBovespa criou a Câ- mara de Arbitragem, objetivando determi- nar a solução adequada de cada caso com tempestividade, propiciando melhor eficiên- cia na resolução de controvérsias, já que os processos tendem a ser concluídos mais ra- pidamente, pois são tratados na esfera pri-
  • 6. FINANCIAMENTO DE PARTIDOS POLÍTICOS NAS ELEIÇÕES DE 2008 E 2012: ANÁLISE DAS EMPRESAS DOADORAS ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 5 vada, por intermédio de árbitros. A seguir, apresenta-se de forma simplificada uma comparação entre os segmentos especiais de listagem na BM&FBovespa. A entrada em um desses segmentos significa para a empresa ingressante, a conquista de uma melhora de imagem para com a socie- dade e com o mercado, uma vez que passa a ser de conhecimento público a aderência de um exigente conjunto de regras societá- rias, conhecidas como “práticas diferencia- das de governança corporativa”. Inicialmen- te, a definição de governança corporativa era utilizada pelo prisma da transparência das práticas contábeis de empresa de capi- tal aberto. Atualmente, é vista como aspecto basilar para o sucesso das organizações. 2.2 Relatório da administração Para Hendriksen e Van Breda (1999), a divul- gação de informações financeiras tradicio- nalmente visa dar suporte à tomada de deci- sões dos investidores sobre a melhor forma de alocação de seus recursos. Entre as vá- rias formas de divulgação de informações, Iudícibus (2010) relaciona as seguintes: a) forma e apresentação das demonstrações contábeis; b) informações entre parênteses; c) notas explicativas; d) quadro e demons- trativos suplementares; e) comentários do auditor; f) relatório da administração. Conforme explicam Iudícibus, Martins e Gel- bcke (2010), no Brasil, existe um conjunto de documentos apreciados pela Assembleia Geral que representam a “prestação de con- tas” das sociedades anônimas por ações. E Tabela 1. Segmentos especiais de listagem na BM&FBovespa Nível 1 Nível 2 Novo Mercado Característica es- sencial Transparência. Transparência e mais poder aos minoritários Transparência e poder igual para todos os acionistas Características das ações emitidas Permite a exis- tência de ações ordinárias e ações preferenciais Permite a existência de ações ordinárias e ações preferenciais com direitos adicionais Permite apenas a existência de ações ordi- nárias Conselho de admi- nistração Mínimo de três membros confor- me legislação Mínimo de cinco membros, sendo pelo menos um independente Demonstrações financeiras anuais em Padrão Interna- cional Facultativo US GAAP ou IFRS Adoção da câmara de arbitragem do mercado Facultativo Obrigatório Percentual mínimo de ações em circu- lação No mínimo 25% de free float Fonte: Elaboração do autor com base nas informações da BM&FBovespa
  • 7. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jardson Edson Guedes da Silva Almeida, Luiz Antônio Félix Júnior, Umbelina Cravo Teixeira Lagioia, Juliana Araújo, João Gabriel Nascimento Araújo 6 entre eles está o Relatório da Administra- ção. Esse conjunto de documentos é de pu- blicação obrigatória segundo o art. 133 da Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976, alterado pela Lei n. 10.303/01. Yuthas, Rogers e Dillard (2002) conside- ram que o texto contido nos relatórios da administração é amplamente lido por uma variedade de stakeholders e analistas. Dis- torções significativas feitas pelos gestores podem trazer malefícios a longo prazo se for descoberto que essas distorções infor- macionais teriam afetado a percepção dos demonstrativos financeiros. A prática de realizar relatos sobre opera- ções da companhia é realizada desde a dé- cada de 1960 nos Estados Unidos, por meio do ínterim e do segment reporting. O relató- rio de administração surgiu com várias em- presas que, por atuarem em diferentes seg- mentos econômicos, passaram a evidenciar voluntariamente essas informações com as demonstrações financeiras anuais. Em 1970, esse relatório foi regulamentado pela SEC e passou a integrar os relatórios financeiros anuais das companhias. Apesar dos benefícios, como a apresentação de “dados escondidos” pelas demonstrações financeiras, Delaney et al. (1996) apresen- tam alguns argumentos usados nos Esta- dos Unidos contra a publicação das ope- rações da empresa, como a evidenciação de informações aos concorrentes, sindica- tos e governo, que podem trazer danos à empresa, e essa divulgação desencoraja a administração a tomar decisões com risco razoável em virtude da obrigação de repor- tar resultados desfavoráveis. No Brasil, o art. 133 da Lei n. 6.404, de 15 de dezembro de 1976, alterado pela Lei n. 10.303/01, determina também que os ad- ministradores divulguem até um mês antes da assembleia geral ordinária o Relatório da Administração contendo informações sobre “os negócios sociais e os principais fatos administrativos do exercício findo”. No entan- to, uma regulamentação mais clara sobre o conteúdo do RAd só ocorreu em 1987 com o Parecer de Orientação n. 15/87 da Comis- são de Valores Mobiliários (CVM). Em 3 de outubro de 2005, a CVM, por meio da Deli- beração n. 488, aprovou o Pronunciamento Ibracon NPC n. 27, que comenta sobre o con- teúdo mínimo dos relatórios. Outro ponto que deve ser observado na con- fecção dos relatórios diz respeito ao conte- údo, não sendo válida a simples apresenta- ção de percentuais que podem ser obtidos por qualquer leitor das demonstrações con- tábeis, visto que a informação relevante diz respeito ao comentário ou apreciação dos fatores endógenos e exógenos que influen- ciaram as variações incorridas. O relatório da administração, como peça integrante das demonstrações financeiras, deverá complementar as peças contábeis e as notas explicativas, observada a devida coerência com a situação nelas espelhada, formando um quadro completo das posturas e do desempenho da administração na ges- tão e alocação dos recursos que estão a elas confiados.A seguir, apresenta-se uma tabela que contempla tais informações.
  • 8. FINANCIAMENTO DE PARTIDOS POLÍTICOS NAS ELEIÇÕES DE 2008 E 2012: ANÁLISE DAS EMPRESAS DOADORAS ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 7 Tabela 2. Informações obrigatórias contidas no relatório da administração Elemento Descrições Descrição dos negócios, produtos e servi- ços  Ramo da atividade da companhia  Principais produtos  Áreas de atuação  Dados físicos sobre vendas  Informações sobre o segmento de atuação Comentários sobre a conjuntura econômica geral  Variáveis econômicas  Variáveis legais e fiscais  Variáveis governamentais  Variáveis políticas  Variáveis ambientais  Variáveis sociais  Outros fatores exógenos Recursos Humanos  Quantidade de empregados  Divisão geográfica da mão de obra  Nível educacional  Investimentos em treinamento Investimentos  Inversões de recursos em imobilizado  Aplicações no diferido  Outras inversões para futura imobilização Pesquisa e desenvolvimento  Atual estágio dos projetos, recursos alocados e montantes aplicados Novos produtos e serviços  Novos produtos e serviços colocados no mercado  Expectativas relativas a esses produtos e serviços Proteção ao meio ambiente  Inversões em projetos de proteção ecológica  Objetivos das inversões e valores envolvidos Reformulação administrativa ou societária  Mudanças efetuadas  Reorganizações societárias  Programas de racionalização Investimentos em controladas e coligadas  Objetivos pretendidos com as inversões ou alienações realizadas nas controladas ou coligadas Direitos dos acionistas e dados do mercado  Políticas relativas à distribuição de dividendos  Desdobramentos e grupamentos de ações  Valor patrimonial por ação  Volume negociado no período  Cotação das ações em bolsa de valores Perspectivas e planos para o exercício em curso e futuros  Expectativas quanto aos exercícios correntes e futuros com base em premissas e fundamentos explicitamente colocados Empresas investidoras  Informações anteriormente recomendadas relativas a empresas investidas Fonte: Adaptado de Iudicibus, Martins e Gelbcke apud Pereira (2008, p. 33)
  • 9. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jardson Edson Guedes da Silva Almeida, Luiz Antônio Félix Júnior, Umbelina Cravo Teixeira Lagioia, Juliana Araújo, João Gabriel Nascimento Araújo 8 Para Hendriksen e Van Breda (1999) é muito forte a tendência de que as companhias di- vulgarão toda a informação necessária para o bom funcionamento do mercado. Embora não exista um consenso sobre quais seriam as informações de natureza voluntária em relatórios anuais das companhias. A seguir, apresenta-se um quadro contemplando tais informações. Tabela 3. Informações voluntárias contidas no relatório da administração Elemento Descrições Informações gerais e não financei- ras  Principais mercados e market share  Estratégia (metas e objetivos)  Ambiente de negócios e fatores críticos de acesso  Eventos importantes no ano  Estrutura organizacional  Relatório social ou demonstração do valor adicionado  Eficiência operacional Informações financeiras adiciona- das  Unidades vendidas  Retorno sobre o patrimônio  Retorno sobre o ativo  Ebitda  Demonstração do fluxo de caixa Análise de tendências e discussão e análise gerencial  Tendência da receita ao longo dos últimos anos  Vendas por região e/ou unidade de negócio  Tendência do lucro operacional ao longo dos últimos anos  Investimento por região e/ou unidade de negócio  Tendência de comportamento das ações e retorno total para o acionista  Discussão sobre mudanças no lucro operacional Risco, criação de valor e projeções  Uso e implementação de gestão de risco  Exposição ao risco cambial  Medidas quantitativas de criação de valor para o acionista  Compensação gerencial  Perspectivas de novos projetos  Projeções de lucro, vendas e crescimento Fonte: Adaptado de Lanzana apud Pereira (2008, p. 35)
  • 10. FINANCIAMENTO DE PARTIDOS POLÍTICOS NAS ELEIÇÕES DE 2008 E 2012: ANÁLISE DAS EMPRESAS DOADORAS ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 9 3. METODOLOGIA Objetivando analisar se as empresas lista- das na BM&FBovespa que fizeram doações a partidos políticos nas eleições municipais de 2008 e 2012 evidenciaram esse fato em seus demonstrativos financeiros, o estudo utilizou-se de uma metodologia que seguiu uma estratégia exploratória e descritiva, ten- do em vista que o propósito desta pesquisa foi explorar uma realidade não conhecida. A base inicial de dados foi composta pelos processos de prestação de contas anuais dos diretórios nacionais de cada partido po- lítico submetidos ao Tribunal Superior Eleito- ral (TSE), disponíveis em <www.tse.jus.br>, referentes aos anos de 2008 e 2012, ou seja, apenas de eleições municipais, não levando em consideração os dados corresponden- tes às eleições de 2010. Em cada processo consta uma listagem constituída dos valores recebidos por doação e os respectivos doa- dores, estando esses valores apresentados em ordem cronológica por dia do ano. Para se definir as empresas a serem pesquisa- das em relação às informações referentes ao ano de 2008, realizou-se uma separação entre pessoas físicas e jurídicas, por meio de uma reorganização dos dados de manei- ra a descobrir quanto cada uma delas doou aos partidos políticos. Obteve-se então uma planilha com mais de 300 linhas, contendo os nomes de cerca de 230 empresas. Buscou-seentãoaveriguarquaisdessasem- presas estavam listadas na BM&FBovespa, além de informações a respeito do controle de cada uma, pois uma empresa não listada poderia ser controlada por outra que esti- vesse na lista. Foram excluídas da base de dados as empresas que não estavam elen- cadas na BM&FBovespa, além daquelas que não eram controladas por alguma em- presa que fosse listada. Estabeleceu-se então um recorte pelo crité- rio do valor total das doações, com intuito de obter as doações mais significativas. Foram excluídas da base de dados as empresas que realizaram doações menores que R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais). Dessa forma obteve-se a planilha final, composta de 11 empresas. Para análise dos valores correspondentes às doações corresponden- tes às eleições de 2012, foram considera- das apenas as 11 empresas pesquisadas em 2008, conforme o critério antes exposto, a saber: Andrade Gutierrez Participações S/A, Banco Bradesco S/A, Banco Santan- der (Brasil) S/A, Camargo Correia Cimen- tos S/A, Companhia Siderúrgica Nacional, Contax Participações S/A, Gerdau S/A, JBS S/A, JHSF Participações, Suzano Papel e Celulose S/A e Vale S/A. Por meio do sistema de Divulgação Externa (DivExt) da BM&FBovespa, foram obtidas as Informações Anuais (IAN) e os Demons- trativos Financeiros Padronizados (DFP) re- ferentes aos anos de 2008 e 2012 das 11 empresas selecionadas, analisando-se os dados das IAN referentes ao controle so- bre outras empresas e, quanto aos DFP, as Demonstrações do Resultado do Exercício, as Demonstrações do Fluxo de Caixa, as Notas Explicativas e os Relatórios da Admi- nistração em busca de alusões a doações efetuadas a partidos políticos. 4. ANÁLISE DE RESULTADOS O valor total de doações recebidas pelos partidos políticos nas eleições do ano de
  • 11. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jardson Edson Guedes da Silva Almeida, Luiz Antônio Félix Júnior, Umbelina Cravo Teixeira Lagioia, Juliana Araújo, João Gabriel Nascimento Araújo 10 2008 foi R$ 143.651.817,00, dos quais R$ 52.935.660,00 (36,85%) foram doados pe- las empresas listadas na BM&FBovespa, que foram selecionadas para as análises deste estudo, enquanto R$ 90.716.157,00 (63,15%) foram doados pelas demais em- presas. Já em relação ao ano de 2012, as doações de pessoas jurídicas aos partidos políticos brasileiros totalizaram R$ 451.356.543,94; valor bastante superior àqueles arrecadados quatro anos antes. Desse montante, as 11 empresas pesquisadas foram responsáveis pela transferência de R$ 113.825.000,00, o que representa 25,21% do total. Esse valor corresponde a mais que o dobro das doa- ções feitas por elas nas eleições municipais anteriores. A seguir são apresentados os valores das doações efetuadas pelas 11 empresas aos partidos políticos. Os valores explicitados são o resultado da soma das doações efe- tuadas pelas empresas selecionadas e por suas controladas. Para melhor visualização dos dados, nesta tabela não foi considera- do o destino das doações efetuadas, sendo expostos apenas os valores doados em sua totalidade. Tabela 4. Empresas e respectivas doações aos partidos políticos Empresas 2008 2012 Total Andrade Gutierrez Participações S/A 13.475.000,00 56.785.000,00 70.260.000,00 Banco Bradesco S/A 9.050.000,00 2.575.000,00 11.625.000,00 Banco Santander (Brasil) S/A 4.730.000,00 4.550.000,00 9.280.000,00 Camargo Correa Cimento S/A 2.500.000,00 13.340.000,00 15.840.000,00 Companhia Side- rúrgica Nacional 1.535.660,00 - 1.535.660,00 Contax Participa- ções S/A 5.500.000,00 5.840.000,00 11.340.000,00 Gerdau S/A 3.400.000,00 1.180.000,00 4.580.000,00 JBS S/A 1.500.000,00 11.660.000,00 13.160.000,00 JHSF Participa- ções 1.200.000,00 1.400.000,00 2.600.000,00 Suzano Papel e Celulose S/A 2.515.000,00 675.000,00 3.190.000,00 Vale S/A 7.530.000,00 15.820.000,00 23.350.000,00 Total 52.935.660,00 113.825.000,00 166.760.660,00 Fonte: Elaboração própria com base nos dados do site do TSE
  • 12. FINANCIAMENTO DE PARTIDOS POLÍTICOS NAS ELEIÇÕES DE 2008 E 2012: ANÁLISE DAS EMPRESAS DOADORAS ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 11 Nas Eleições Municipais de 2008, das 11 empresas selecionadas para este trabalho de pesquisa, três fizeram doações a apenas um partido político: Camargo Correa Cimen- tos S/A, JBS S/A e JHSF Incorporações. As demais distribuíram suas doações a mais de um partido. Observou-se ainda que todas as oito empresas que diversificaram suas doações ofereceram quantias ao DEM e ao PT. Apenas a JBS S/A e a Camargo Correa Cimentos S/A não doaram valores ao DEM, assim como apenas a JHSF Incorporações S/A e a Camargo Correa Cimentos S/A não fizeram doações ao PT. Dos oito partidos políticos contemplados com doações das empresas selecionadas, o PT foi o partido que recebeu mais doa- ções, somando R$ 24.300.000,00. Por ou- tro lado, o PTB foi o partido que arrecadou menos doações, totalizando R$ 750.000,00. Percebeu-se certa centralização das quan- tias doadas, pois a soma dos recebimentos pelos cinco partidos com menores doações não alcança o montante adquirido pelo ter- ceiro partido com maiores valores doados. Em se tratando de valores doados em 2012, os partidos que menos receberam recursos foram o PEN e o PPL, com R$ 50.000,00 e 100.000,00 respectivamente. O partido que mais recebeu doações de empresas listadas na Bolsa foi o PMDB, somando R$ 33.390.000,00. Os dados percentuais da distribuição dos valores recebidos por partido político podem ser visualizados nos Gráfico 1 e Gráfico 2: Gráfico 1. Distribuição percentual das doações entre os partidos políticos em 2008 Fonte: Elaboração própria com base nos dados do site do TSE
  • 13. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jardson Edson Guedes da Silva Almeida, Luiz Antônio Félix Júnior, Umbelina Cravo Teixeira Lagioia, Juliana Araújo, João Gabriel Nascimento Araújo 12 Gráfico 2. Distribuição percentual das doações entre os partidos políticos em 2012 Fonte: Elaboração própria com base nos dados do site do TSE A seguir, são apresentados os dados em de- talhe sobre as doações, além do resultado das análises dos demonstrativos financeiros de cada empresa selecionada neste estudo. Todas as doações da Andrade Gutierrez Participações S/A foram realizadas por meio de sua controlada Construtora Andra- de Gutierrez S/A, que também foi respon- sável pela maior soma doada a um partido político no ano de 2008, destinada ao PT, no valor de R$ 5.850.000,00. Além disso, foi a empresa que teve a maior soma doada, em comparação com as demais, totalizando o valor de R$ 13.475.000,00. Relativamen- te ao ano de 2012, a empresa continuou sendo a que proporcionou o maior volume de doações, atingindo R$ 56.785.000,00. O Partido que mais recebeu recursos vin- dos da referida empresa foi o PMDB (R$ 15.875.000,00). A companhia não faz parte de nenhum segmento especial de listagem na BM&FBovespa. Na análise das demons- trações contábeis inseridas nos DFP publi- cados pela empresa, além do relatório da administração, não foi encontrada nenhuma referência a doações realizadas a partidos políticos em nenhum dos anos. O Banco Bradesco S/A fez doações, no ano de 2008, por meio das controladas Banco Al- vorada S/A, responsável por 57% delas, e Alvorada Cartões Crédito e Financiamentos S/A, por 43%, um total de R$ 9.050.000,00. A companhia faz parte do Nível Diferencia- do de Governança Corporativa – Nível 1 na BM&FBovespa. Na análise das demonstra- ções contábeis inseridas nos DFP publica- dos pela empresa, além do relatório da ad- ministração, não foi encontrada nenhuma
  • 14. FINANCIAMENTO DE PARTIDOS POLÍTICOS NAS ELEIÇÕES DE 2008 E 2012: ANÁLISE DAS EMPRESAS DOADORAS ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 13 referência a doações realizadas a partidos políticos. No ano de 2012 o Banco foi res- ponsável pela doação de R$ 2.575.000,00 aos partidos políticos. As maiores doações foram realizadas ao DEM (R$ 1.450.000,00) e ao PMDB (R$ 625.000,00). O Banco Santander S/A doou um to- tal de R$ 4.730.000,00 em 2008 e R$ 4.550.000,00 em 2012. A companhia faz parte do Nível Diferenciado de Governança Corporativa – Nível 2 na BM&FBovespa. Na análise das demonstrações contábeis in- seridas nos DFP publicados pela empresa, além do relatório da administração, não foi encontrada nenhuma referência a doações realizadas a partidos políticos. As doações da Cia Siderúrgica Nacional somaram R$ 1.535.660,00 em 2008, dos quais R$ 1.235.660,00 foram doados pela sua controlada Galvasud S/A. A companhia não faz parte de nenhum segmento espe- cial de listagem na BM&FBovespa. Na aná- lise das demonstrações contábeis inseridas nos DFP publicados pela empresa, além do relatório da administração, não foi encontra- da nenhuma referência a doações realiza- das a partidos políticos. A Contax Participações foi a empresa que fez doações à maior quantidade de parti- dos políticos nas eleições de 2008, num total de oito. Todas as doações foram fei- tas por meio de sua controlada TNL Con- tax S/A. Em 2012 as doações somaram R$ 5.840.000,00, divididos para apenas por quatro partidos: DEM, PMDB, PSB e PSD. Quem mais recebeu recursos foi o PSD (R$ 2.130.000,00). A companhia não faz parte de nenhum segmento especial de listagem na BM&FBovespa. Na análise das demons- trações contábeis inseridas nos DFP publi- cados pela empresa, além do relatório da administração, não foi encontrada nenhuma referência a doações realizadas a partidos políticos. Dos R$ 3.440.000,00 doados pela Gerdau S/A em 2008, R$ 2.440.000,00 foram por meio de suas controladas Gerdau Comer- cial de Aços S/A e Gerdau Aços Longos S/A. Entre as empresas pesquisadas e conforme os dados correspondentes às doações em 2012, a Gerdau é a que provavelmente tenha estabelecido algum critério para doações a partidos políticos, haja vista os valores se- rem equivalentes, R$ 100.000,00 (PMDB e PT), R$ 150.000,00 (PP), R$ 200.000,00 (DEM e PCdoB), muito embora o PSDB te- nha recebido R$ 430.000,00. A companhia faz parte do Nível Diferenciado de Governan- ça Corporativa – Nível 1 na BM&FBovespa. Na análise das demonstrações contábeis in- seridas nos DFP publicados pela empresa, além do relatório da administração, não foi encontrada nenhuma referência a doações realizadas a partidos políticos. As doações da Vale S/A somaram R$ 7.530.000,00 em 2008. Todas as doações foram feitas por meio de suas controladas: Minerações Brasileiras Reunidas MBR S/A, Vale Manganês S/A e Rio Doce Manganês S/A. A companhia faz parte do Nível Dife- renciado de Governança Corporativa – Nível 1 na BM&FBovespa. Em 2012, as doações totalizaram R$ 15.820.000,00. Na análise das demonstrações contábeis inseridas nos DFP publicados pela empresa, além do re- latório da administração, não foi encontrada nenhuma referência a doações realizadas a partidos políticos.
  • 15. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jardson Edson Guedes da Silva Almeida, Luiz Antônio Félix Júnior, Umbelina Cravo Teixeira Lagioia, Juliana Araújo, João Gabriel Nascimento Araújo 14 A JHSF Incorporações S/A doou R$ 1.200.000,00 ao DEM, a JBS S/A, R$ 1.500.000,00 ao PT e a Camargo Correa Cimentos S/A, R$ 2.500.000,00 ao PSDB, em 2008. A Suzano Papel e Celulose S/A doou R$ 2.515.000,00 a dois partidos, com uma notável discrepância nos valores doa- dos a cada um. As doações realizadas por essas empresas durante o ano de 2012 são: JHSF Incorporações S/A (R$ 1.400.000,00), JBS S/A (R$ 11.660.000,00), Camargo Cor- rea Cimentos S/A (R$ 13.340.000,00) e Su- zano Papel e Celulose S/A (R$ 675.000,00). A JHSF S/A e a JBS S/A fazem parte do segmento especial de listagem Novo Mer- cado, a Camargo Correa Cimentos S/A não integra nenhum segmento especial de lista- gem e a Suzano Papel e Celulose S/A se faz parte do Nível Diferenciado de Governança Corporativa – Nível 1 na BM&FBovespa. Na análise das demonstrações contábeis inse- ridas nos DFP publicados pelas empresas JHSF S/A, JBS S/A e Camargo Correa Ci- mentos S/A, além dos respectivos relatórios da administração, não foi encontrada nenhu- ma referência a doações realizadas a parti- dos políticos. A Suzano Papel e Celulose S/A foi a única empresa entre as selecionadas neste estudo que apresentou algum tipo de evidenciação referente à doação realizada a partidos po- líticos. No seu relatório da administração do ano de 2008 (e apenas neste ano), ela pu- blicou o trecho reproduzido no quadro a se- guir. Apesar de se destacar das demais enti- dades, a informação publicada pela Suzano é insuficiente, pois não discrimina a quais partidos as doações foram feitas e nem são expostos quais foram os critérios adotados para a determinação dos valores doados e dos destinatários. Quadro 1. Trecho retirado do relatório da administração da Suzano Papel e Celulose S/A – 2008 Fonte: Divulgação Externa – BM&FBovespa
  • 16. FINANCIAMENTO DE PARTIDOS POLÍTICOS NAS ELEIÇÕES DE 2008 E 2012: ANÁLISE DAS EMPRESAS DOADORAS ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 15 Os resultados encontrados neste estudo confirmam o que outros autores observaram ao analisar os níveis de evidenciação da in- formação no ambiente empresarial. Dantas, Zendersky e Niyama (2004) comentam que as empresas limitam-se a evidenciar o que é exigido pela legislação ou normas dos ór- gãos reguladores e relutam em aumentar o nível de evidenciação com o intuito de pro- teger informações de natureza estratégica. Dias Filho e Nakagawa (2001) mostram que mais importante do que fornecer um eleva- do número de informação é informar o que é necessário e de forma compreensível, pos- sibilitando melhores resultados no processo decisório. A falta de esclarecimentos a respeito das doações efetuadas para financiamento de campanhas eleitorais cria um ambiente de assimetria informacional no relacionamento entre a empresa e seus usuários externos, uma vez que os gastos não podem ser vi- sualizados nos demonstrativos publicados pelas companhias. Essa assimetria se mos- tra presente pelo fato de que não é possível identificar as pessoas responsáveis pela de- cisão de realizar as doações aos partidos e os valores a serem doados, nem tampouco saber os parâmetros adotados para a entre- ga dos recursos. Pela leitura dos DFP, não é possível visualizar a relação que há entre as empresas selecionadas neste estudo e os partidos políticos, nem a motivação para elas contribuírem voluntariamente para o fi- nanciamento das campanhas eleitorais de determinado partido em detrimento de ou- tro. Como explicar, no ano de 2008, a decisão da Suzano Papel e Celulose S/A de doar R$ 2.500.000,00 ao PT e R$ 15.000,00 ao DEM? Ou a da Vale S/A de doar R$ 5.750.000,00 ao PT e R$ 50.000,00 ao PTB? Ou a da Ger- dau, que doou R$ 1.000.000,00 ao PSDB, ao PR e ao PT? Como explicar que a Contax Participações S/A fez doações a oito parti- dos diferentes e a JHSF Incorporações S/A a apenas um? Por que a JBS S/A só fez do- ações ao PT e a Camargo Correa Cimentos S/A somente ao PSDB? Os usuários exter- nos das empresas selecionadas para este estudo que fizeram esses questionamentos ao ler os DFP ficarão sem resposta. Durante o ano de 2012, a falta de critério nas doações, bem como a não apresenta- ção de informações nos relatórios específi- cos das referidas empresas permanecem, assim como ocorrido em 2008. O Brades- co, por exemplo, fez doações que variaram de R$ 75.000,00 (PSDB) a R$ 1.450.000,00 (DEM). O PT recebeu apenas 2.000.000,00; valor muito baixo se comparado aos R$ 24.300.000,00 no ano de 2008. Uma possível explicação para a ausência de evidenciação dessas informações pode- ria recair sobre o princípio da materialidade na elaboração dos demonstrativos. Porém, é possível perceber que esse aspecto se rende à conveniência e oportunidade de divulgar determinado fato, a depender dos possíveis benefícios que a divulgação trará à empresa. Isso fica claro ao se observar um trecho do relatório da administração do Ban- co Bradesco S/A:
  • 17. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jardson Edson Guedes da Silva Almeida, Luiz Antônio Félix Júnior, Umbelina Cravo Teixeira Lagioia, Juliana Araújo, João Gabriel Nascimento Araújo 16 Distribuindo-se uniformemente os R$ 74.000.000,00 investidos em áreas rema- nescentes da Mata Atlântica no período de 20 anos citado, tem-se uma média de R$ 3.700.000,00 investidos por ano, bem abai- xo dos R$ 9.050.000,00 doados durante o ano de 2008, aos quais não foi feita nenhu- ma referência no relatório. Ao tratar da temática da produção e utiliza- ção de informações, Kam (1986) apud Lima et al. (2010) ensina que a informação é rele- vante para uma decisão se ela pode reduzir a incerteza sobre as variáveis inseridas no processo decisório. A falta de divulgação de informações que respondam a alguns dos questionamentos propostos anteriormente fragiliza a relevância e a confiabilidade das peças contábeis produzidas e publicadas aos usuários externos das empresas sele- cionadas, o que aumenta as incertezas so- bre as variáveis envolvidas no processo de tomada de decisão. A evidenciação não é uma convenção ou princípio contábil. Ela está relacionada ao objetivo da contabilidade de garantir infor- mações de acordo com as necessidades dos usuários de forma que as demonstra- ções não se tornem enganosas (Iudícibus, 2010). A ciência contábil, por sua natureza social, está sujeita a inexatidões provocadas pelo aspecto comportamental e a níveis de subje- tividade inerentes ao processo de construção dos demonstrativos. O que deve ser obser- vado com cautela no momento da manipula- ção das informações é o limite entre a discri- cionariedade e a arbitrariedade de quem as detém. A influência de convicções políticas e a possível intenção de troca de interesses escusos camuflados sob o princípio da ma- terialidade – ou outra justificativa qualquer – na construção das demonstrações deturpam a essência e a finalidade da ciência, que é produzir informações relevantes e, acima de tudo, verdadeiras. 5. CONCLUSÃO Em resposta ao objetivo proposto, conclui-se que apenas uma das 11 empresas selecio- nadas neste estudo evidenciou a realização de doações a partidos políticos na publica- ção dos Demonstrativos Financeiros Padro- nizados (DFP), somente no ano de 2008. Ainda assim, não foi possível identificar os valores doados nem os parâmetros e crité- rios adotados por ela para escolha dos par- Quadro 2. Trecho retirado do relatório da administração do Banco Bradesco S/A – 2008 Fonte: Divulgação Externa – BM&FBovespa
  • 18. FINANCIAMENTO DE PARTIDOS POLÍTICOS NAS ELEIÇÕES DE 2008 E 2012: ANÁLISE DAS EMPRESAS DOADORAS ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 17 tidos contemplados, gerando um ambiente de assimetria informacional para os usuá- rios externos da entidade. Os usuários externos à entidade têm nas in- formações contábeis um arcabouço teórico que os guiará no conhecimento da situação econômica, financeira e administrativa em que a empresa se encontra. A maior dispo- nibilidade de informações diminui o grau de incerteza desses usuários a respeito dos resultados futuros da empresa, o que os auxiliará no processo de tomada de deci- são. Para que seu objetivo seja alcançado, a contabilidade deve ser capaz de produzir informações relevantes sobre a entidade, visto que a comunicação delas se torna inó- cua se não houver utilidade para quem as recebe. Nesse ambiente, a contabilidade deve atu- ar como o elo entre o meio corporativo e a sociedade, funcionando como agente de re- dução da assimetria informacional existente entre as vontades dos administradores e as necessidades dos usuários da informação (Lopes e Martins, 2005). REFERÊNCIAS Dantas, J. A., Zendersky, H. C., & Niyama, J. K. (2004).A dualidade entre os benefícios do disclosure e a relutância das organiza- ções em aumentar o grau de evidenciação. In: XXVIII EnANPAD, 2004, Curitiba. Recu- perado em 10 nov., 2013, de www.anpad. org.br Delaney, P. R., Adler, J. R., Epstein, B. J., & Foran, M. F. (1996). Interpretation and ap- plication of generally accepted accounting principles. New York: John Wiley & Sons. Dias Filho, J. M., & Nakagawa, M. (2001). Análise do processo da comunicação con- tábil: uma contribuição para a solução de problemas semânticos utilizando conceitos da teoria da comunicação. Revista Contabi- lidade & Finanças. São Paulo, v. 15, n. 26, pp. 42-57, Mai./Ago. Recuperado de 14 out., 2013, de www.eac.fea.usp.br/eac/revista_ busca.asp Hendriksen, E., & Van Breda, M. (1999). Teo- ria da contabilidade. São Paulo: Atlas. Instituto Brasileiro de Governança Corpo- rativa (IBGC). (2013). Código das melhores práticas de Governança Corporativa. Recu- perado de 8 nov., 2013, de www.ibgc.org.br/ Secao.aspx?CodSecao=18 Iudícibus, S. (2010). Teoria da Contabilidade. 8a ed. São Paulo: Atlas. Iudícibus, S., Martins, E., & Gelbcke, E. (2010). Manual de contabilidade das socie- dades por ações (Aplicável às demais socie- dades). 7a ed. São Paulo: Atlas. Kam, V. (1986). Accounting Theory. 2nd ed. Wiley Inc. Lagioia, U. C. T. (2007). Fundamentos de Mercado de Capitais. São Paulo: Atlas. Lanzana, A. P. (2004). Relação entre dis- closure e governança corporativa das em- presas brasileiras. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Pau- lo. Lima, F. B., Lagioia, U. C. T., Nascimento, S.
  • 19. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jardson Edson Guedes da Silva Almeida, Luiz Antônio Félix Júnior, Umbelina Cravo Teixeira Lagioia, Juliana Araújo, João Gabriel Nascimento Araújo 18 G .A. S., Lima, R. Q., & Vasconcelos, A. L. F. S. (2010). Um estudo sobre a utilização da contabilidade gerencial pelas empresas per- tencentes ao polo de confecção do agreste Pernambucano. Registro Contábil, v. 1, n. 1. Lopes, A., & Martins, E. (2005). Teoria da contabilidade: uma nova abordagem. São Paulo: Atlas. Pereira, D. M. V. G. (2008). Um estudo sobre a relação entre o lucro contábil e o disclo- sure das companhias abertas do setor de materiais básicos: evidências empíricas no mercado brasileiro de capitais. Dissertação (Mestrado em Ciências Contábeis) – Univer- sidade Federal de Pernambuco. Recife. Schultz, C. A., Marques, T. O., & Hofer, E. (2010). Análise do nível de disclosure volun- tário de informações ambientais, econômi- cas e sociais em cooperativas do setor agro- pecuário. Congresso USP de Contabilidade e Controladoria. Yuthas, K., Rogers, R., & Dillard, J. F. (2002). Communicative Action and Corporate Annual Reports. Journal of Business Ethics, v. 41, pp. 141-157.
  • 20. ARTIGO: Democracia Deliberativa: uma Análise do Decreto nº 8.243 ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 19 Democracia Deliberativa: uma Análise do Decreto nº 8.243 Deliberative Democracy: An Analysis of Executive Order No. 8243 Democracia Deliberativa: Un análisis del Decreto n° 8.243 Resumo: O propósito deste artigo é identificar aproximações entre elementos da teoria da democracia deliberativa e o Decreto n. 8.243 da Presidência da República do Brasil, de maio de 2014, que institui a Política Nacional de Participação Social (PNPS) e o Sistema Nacional de Participação Social (SNPS). Diversos autores consideram a democracia deliberativa adequada à contemporaneidade de valorizar e criar condições de uma participação direta do cidadão na definição de políticas públicas e de práticas de administração pública. Considerando os objetivos e as diretrizes de fortalecer e articular mecanismos e instâncias democráticas de diálogo e criar condições de atuação conjunta entre administração pública federal e sociedade civil, observaram-se nesse Decreto diversos elemen- tos democrático-deliberativos importantes para a consolidação da democracia brasileira. Observou-se também a coerência entre o Decreto e as perspectivas democráticas previstas na Constituição Federal de 1988, que prevê que o cidadão pode exercer seu poder democrático diretamente ou por meio de representantes eleitos. Palavras-chave: democracia deliberativa, participação social, política nacional de participação social. Jorge Sundermann - jsundermann@hotmail.com Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil José Roberto Pereira - jrobertopereira2013@gmail.com Professor da Universidade Federal de Lavras, Lavras, MG, Brasil. Claudemir Francisco Alves - Claudemir_alves@uol.com.br Professor da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Departamento de Filosofia, Belo Horizonte, MG, Brasil. Mozar José de Brito - mozarjdb@ufla.br Professor da Universidade Federal de Lavras, Departamento de Administração e Economia, Lavras, MG, Brasil. Artigo submetido no dia 10-07-2015 e aprovado em 28-02-2016. DOI: http://dx.doi.org/10.12660/cgpc.v21n68.52967 Esta obra está submetida a uma licença Creative Commons
  • 21. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jorge Sundermann - José Roberto Pereira - Claudemir Francisco Alves - Mozar José de Brito 20 Abstract This article seeks to identify similarities between elements of the theory of deliberative democracy and Executive Order No. 8243 of the President’s Office of the Republic of Brazil, dated May 2014, which would institute a National Social Participation Policy and the National Social Participation Sys- tem. Several authors consider deliberative democracy to be appropriate to contemporaneity and a way of promoting and creating conditions for direct citizen participation in defining public policy and administration practices. Considering the objectives and guidelines for strengthening and promoting mechanisms and channels for democratic dialogue and creating conditions for joint action between the federal government and civil society,many important democratic-deliberative elements for the con- solidation of Brazilian democracy have been observed in the Executive Order.There is a coherence between the Executive Order and the democratic prospects provided for in the Federal Constitution of 1988, which establishes that citizens can exercise their democratic power directly or through elected representatives. Keywords: Deliberative Democracy, Social Participation, Direct Participation, National Social Participa- tion Policy, Public Administration. Resumen Este artículo intenta identificar las aproximaciones entre los elementos de la teoría de la Democracia Deliberativa y el decreto n° 8.243 de la Presidencia de la República de Brasil, de mayo de 2014, en que instituiría la Política Nacional de Participación Social y el Sistema Nacional de Participación. Diversos autores consideran la democracia deliberativa adecuada para la contemporaneidad y una forma de valorizar y crear condiciones de una participación directa del ciudadano en definición de políticas y prácticas de administración pública. Considerando los objetos y directrices de fortalecer y articular mecanismos e instancias democráticas del diálogo y crear condiciones de actuación con- junta entre administración pública federal y la sociedad civil, se observaron en el Decreto diversos elementos importantes para la consolidación de la democracia brasileña. Se observó la coherencia entre el Decreto y perspectiva democrática prevista en la Constitución Federal de 1988, que prevé que el ciudadano puede ejercer su poder democrático directamente o por medio de representantes electos. Palabras clave: Democracia deliberativa, participación social, participación directa, Política Nacional de Participación Social,Administración pública. Introdução Ao tratarem da organização de socieda- des contemporâneas, Marques (2009b), Bohman (2009), Cohen (2009) e Johnson (2011) consideram a democracia delibera- tiva adequada à contemporaneidade. A de- liberação é entendida como um processo oriundo de debates, conversações cívicas e discussões políticas. Podem acontecer em ambientes formais ou informais e resultam em contribuições para a criação de espaços públicos que atendam às demandas ou aos interesses dos cidadãos (Marques, 2009b). No entanto, a perspectiva de espaços pú- blicos instituídos ou que buscam instituir a participação efetiva dos cidadãos na cons- trução social, embora teoricamente adequa- da para a contemporaneidade, apresenta desafios significativos para sua implementa- ção efetiva. Em 23 de maio de 2014, a Presidência da República do Brasil, publicou o Decreto n. 8.243, instituindo a Política Nacional de Parti- cipação Social (PNPS) e o Sistema Nacional de Participação Social (SNPS), visando, prin- cipalmente, garantir instâncias democráticas de participação na definição das políticas e na administração pública federal. O objetivo da PNPS é “fortalecer e articular os mecanis- mos e as instâncias democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil” (Brasil, 2014). À primeira vista, o Decreto n. 8.243 parece direcionado a ser um instrumento formal e prático de implementação de processos que
  • 22. Democracia Deliberativa: uma Análise do Decreto nº 8.243 ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 21 contribuam para a estruturação de uma so- ciedade em que a deliberação democrática se torne reconhecida. Tal decreto tem sido visto também como um elemento de defi- nição de cidadania, por propiciar, supos- tamente, maior participação dos cidadãos nas ações da administração pública federal. Essa forma de interpretação, porém, tem se tornado objeto de uma intensa polêmica – cujos contornos políticos são tanto pragmá- ticos como ideológicos – que levou à recusa do Decreto na votação realizada na Câmara dos Deputados em outubro de 2014. Frente ao intenso debate que se instalou em torno da legitimidade e da pertinência do re- ferido decreto presidencial, surge o questio- namento: “A política de participação social, definida no Decreto n. 8.243, da Presidência da República do Brasil, constitui de fato uma política de democracia deliberativa?”. Ao refletir sobre essa questão, considera- -se fundamental conhecer e compreender o alcance de políticas públicas que visam à estruturação de uma sociedade democráti- ca. Devem-se avaliar também as perspec- tivas que ações governamentais apresen- tam para o fomento da participação social. Igualmente, é preciso que se tenha em con- ta também o papel que o despertar do en- gajamento social – que o senso comum e mesmo algumas análises críticas supõem estar ocorrendo na história recente do País – desempenha na definição do presente e do futuro da sociedade. Uma consistente avaliação do Decreto – com sua concepção de Estado, de política e de participação social – não pode pres- cindir da avaliação da atual conjuntura so- cial e política. Tem sido praticamente um consenso entre os analistas a constatação de que o Congresso Nacional, que saiu das urnas eleitorais em 2014, tem um perfil con- servador. No contexto das discussões deste artigo, entende-se por conservador aquele parlamentar ao qual interessa manter inalte- rados os mecanismos da democracia repre- sentativa. São conservadoras por se mos- trarem pouco permeáveis a medidas que demandariam deles uma transigência maior e uma abertura a formas participativas de deliberação. Parlamentares que exercem seu poder de representação dessa forma tendem a ser refratários a qualquer medida que implica alteração no status quo das re- lações de poder no espaço legislativo e em suas relações com a sociedade. Sem ignorar este fator conjuntural, o obje- tivo geral perseguido neste trabalho é ana- lisar o Decreto n. 8.243 da Presidência da República do Brasil à luz da teoria da de- mocracia deliberativa. Busca-se identificar a natureza do decreto e suas possíveis contribuições ao confrontá- -lo com uma perspectiva teórica e prática de consolidação da participação social nas políticas e nas decisões gerenciais da admi- nistração pública brasileira. Este estudo se inicia por esta introdução, que apresenta a proposta de estudo e os re- sultados pretendidos. A segunda seção traz a conceituação de democracia deliberativa, seus principais elementos teóricos e as di- ficuldades de sua implementação. A tercei- ra parte trata dos elementos principais do Decreto n. 8.243. Faz-se em seguida uma contraposição entre a teoria da democracia deliberativa e o decreto em questão. Por fim, nas considerações finais, apresenta-se uma
  • 23. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jorge Sundermann - José Roberto Pereira - Claudemir Francisco Alves - Mozar José de Brito 22 análise sobre as possíveis contribuições desse decreto para a institucionalização de uma sociedade mais democrática e delibe- rativa no Brasil. Democracia deliberativa A reflexão que se pretende fazer aqui exige que se compreenda o que é a democracia deliberativa. Com esse intuito, apresentam- -se, nesta seção, os elementos teóricos principais e alguns questionamentos e per- cepções sobre as possibilidades e os limi- tes da democracia deliberativa. Avritzer (2009) reconhece que há uma di- versidade de abordagens quando se fala em democracia deliberativa, podendo ser divididas em duas fases.A primeira compre- endeu os anos de 1990 e teve como foco principal a discussão sobre o conceito de “deliberação”. A segunda, dos anos subse- quentes, concentrou-se na factibilidade em- pírica da democracia deliberativa. Marques (2009b) considera que a temática da deliberação pública é fundamental para quem quer compreender as contribuições de uma esfera de discussão pública am- pliada na “construção de um sistema de- mocrático marcado pela aproximação entre instâncias formais do governo e espaços informais de discussão entre os cidadãos” (Marques, 2009b, p. 11). Destaca ainda que diversos trabalhos acadêmicos (Coelho & Nobre, 2004; Costa, 2002; Avritzer & Navar- ro, 2003; Dagnino, 2002) investigaram em- piricamente processos deliberativos e mos- traram que “a deliberação não se resume a um processo pontual e elitista de elabora- ção de decisões” (Marques, 2009b, p. 11). Com a ampliação dos processos comunica- cionais, podem-se observar a demanda e a reivindicação, cada vez maior, por partici- pação social nas decisões dos governos e pela garantia de direitos. Essa participação e esse reconhecimento podem ter maior efe- tividade e resultados por meio de processos de deliberação democrática, que exigem ele- mentos básicos para que aconteçam de for- ma efetiva, com reconhecimento de minorias e grupos menos privilegiados. Na perspectiva de Dryzek (2000), houve uma virada teórica e prática, no interior da teoria democrática, caracterizada pela incorpora- ção, pelos principais pensadores da demo- cracia, do conceito de deliberação. Avritzer (2009) afirma que se observa um consenso parcial, na perspectiva teórica, sobre demo- cracia deliberativa como ela é compreendida por James Fishkin, Joshua Cohen e James Bohman, e que o elemento prático da virada deliberativa pode ser observado em institui- ções políticas de democracias contemporâ- neas (Avritzer, 2002; Fung & Wright, 2003; Santos, 2002; Fishkin, 1995). Segundo Marques (2009b), as democracias modernas contribuíram para a expansão do exercício da deliberação para diversos tipos de comunidade que consideram todas as pessoas como politicamente iguais, não im- portando a cultura, o credo, o status ou outros elementos que poderiam ser diferenciadores. Bohman (2009) destaca que as democracias constitucionais modernas geraram espaços para diferentes tipos de deliberação pública, uma vez que direitos como liberdade de fala, expressão, associação e investigação, por elas assegurados, criam condições para a deliberação bem-sucedida. Considera tam- bém que, para que possa acontecer na cole-
  • 24. Democracia Deliberativa: uma Análise do Decreto nº 8.243 ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 23 tividade, a deliberação deve ser baseada no diálogo entre as pessoas. Ao mesmo tempo chama a atenção para a importância de se definir o que torna uma deliberação pública, seu alcance e as condições para ser bem- -sucedida (Bohman, 1996, 2009). Quanto à definição do termo: a deliberação pode ser compreendida como uma atividade discursiva capaz de conectar esferas comunicativas formais e informais, nas quais diferentes atores e discursos estabelecem um diálogo, que tem por principal objetivo a avaliação e a compreensão de um problema coletivo ou de uma questão geral (Marques, 2009b, p. 13). Embora diferentes definições de deliberação pública possam ser apresentadas, destaca- -se seu “processo dialógico de troca de ra- zões com o propósito de solucionar situa- ções problemáticas” (Bohman, 2009, p. 36). Tal processo dialógico deve considerar a cooperação e a participação dos indivíduos que têm vínculos com a questão em pauta. Marques (2009b) destaca a importância das reflexões de Jürgen Habermas para a defini- ção de deliberação pública. Habermas bus- ca definir princípios de interação que asse- gurem a legitimidade de normas e garantam alternativas capazes de regular os conflitos oriundos do pluralismo social, representado por membros que apresentam diferentes ne- cessidades, demandas e identidades. Mar- ques (2009b, p. 12) chama a atenção para o fato de que “a teoria deliberativa haberma- siana encontrou grande aceitação entre os principais teóricos deliberativos” e credita essa aceitação ao fato de ela considerar que a deliberação deveria oferecer uma comu- nicação legitimadora das políticas públicas, articulando “discurso institucional e a con- versação cívica entre os cidadãos”. A criação das normas e políticas públicas por meio do procedimento proposto por Jür- gen Habermas não realiza qualquer restri- ção ao conteúdo normativo. Nesse sentido, pode-se dizer que sua teoria é formal e, portanto, universal. Isso não significa, então, que a moral seja descartada, pois ela será introduzida pelos dutos do próprio procedi- mento. A justiça substancial, em última aná- lise, é a imposição da visão de mundo de um grupo em relação à coletividade, por isso o procedimento descarta a predefinição dos conteúdos e investe em pressupostos de validade do discurso, permitindo que todos os atingidos pelo resultado das deliberações normativas também sejam responsáveis por sua elaboração. Marques (2009b) destaca as contribuições que essa compreensão sobre o processo político pode oferecer para que a democra- cia aconteça, uma vez que indica possibili- dades de procedimentos que permitam ar- gumentações cooperativas e/ou conflitivas entre os cidadãos. Acentua ainda a impor- tância da capacidade de diálogo entre os cidadãos, incorporando de forma positiva as suas diferenças com vistas a clarear um problema e/ou sua solução. A deliberação deve permitir aos indivíduos a possibilidade de apresentar ao próximo os seus pontos de vista, suas percepções e interpretações, obtendo deles, em um processo de diálogo respeitoso, a validação das questões apre- sentadas. A questão das premissas da formação de uma teoria procedimental que conferem le-
  • 25. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jorge Sundermann - José Roberto Pereira - Claudemir Francisco Alves - Mozar José de Brito 24 gitimidade à atuação estatal e ao sistema jurídico parte de uma ideia de reconstrução1 de um modelo de democracia normativa. Essa teoria confia no fato de que a “força legitimadora estaria ancorada nas próprias premissas e condições formais de justifi- cação” (Diniz, 2006, p.163), apresentando- -se como a única aposta possível após a derrocada de visões de mundo regidas por cosmovisões metafísicas (Ferreira, 2015, p.103). Refletindo sobre o tema, Figueiredo afirma que: as inquietações que atingiram Habermas residem no fato de ele ter percebido como várias indagações sobre os vínculos so- ciais estão no direito. Sob a influência da teoria do discurso, assim é que uma filo- sofia do direito procedimental passa a ser estrutura de fundamentação e legitima- ção do direito. Ela será também recons- trutiva do direito existente no sentido de que este venha a superar os estágios de validade assentado no jusnaturalismo e no positivismo (Figueiredo, 2014, p. 278). A modernidade caracteriza-se, em relação à legitimidade, de modo a transferir o poder legítimo para um nível reflexivo de justifica- ção. Impõe-se, assim, uma carga de racio- nalidade para um mundo marcado por sua falta. Por isso, Habermas considera que: o interesse é comum, porque o consenso livre de constrangimento permite apenas o que todos podem querer; é livre de de- cepção, porque até a interpretação das necessidades, na qual cada indivíduo precisa estar apto para reconhecer o que ele quer, torna-se o objeto de formação discursiva da vontade. A vontade, formada discursivamente, pode ser chamada racio- nal, porque as propriedades formais do dis- curso e da situação deliberativa garantem suficientemente que um consenso só pode surgir através de interesses generalizáveis, interpretados apropriadamente, pelo que quero dizer necessidades que podem ser participadas comunicativamente (Haber- mas, 2002, p.137). A legitimidade floresce, nesse sentido, da transposição de um consenso racional for- mado no mundo da vida para o sistema jurídi- co sob o manto de uma norma. Dessa forma, um sistema que não se pode fundamentar apenas em uma imposição (facticidade) exi- ge que o DNA de suas normas jurídicas seja oriundo de um procedimento democrático para que se possa falar em validade (legi- timidade). A vontade exercida pelos partici- pantes do procedimento não pode ser vicia- da. Logo, é necessário que se estabeleçam, como pressupostos de validade, condições que reduzam a influência dos imperativos sistêmicos da burocracia e da economia. Desde já, pode-se verificar que o projeto de dotar o Estado e o direito de legitimidade se insere em uma perspectiva contrafática. Habermas é ciente de que esses influxos sis- têmicos ocorrem e, em momento algum de sua produção acadêmica, adotou uma postu- ra que negasse esses fatos. Contudo, como discípulo de uma teoria crítica marxista, não se contentou com o modo como as coisas estão dispostas, por isso prescreveu várias recomendações para que se possa vivenciar um procedimento realmente democrático. Por esse motivo, o filósofo alemão não es- taria negligenciando nenhuma possibilidade que a racionalidade humana permite. Assim,
  • 26. Democracia Deliberativa: uma Análise do Decreto nº 8.243 ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 25 sem o intuito de descrever a realidade, Ha- bermas dirá que, para o bom funcionamento do procedimento, a racionalidade comunica- tiva não poderá ser cerceada por uma racio- nalidade instrumental. Isso quer dizer que, por meio da racionalidade comunicativa, podem-se estabelecer formas de contenção às investidas sistêmicas no mundo da vida para que elas não sejam capazes de detur- par a formação legítima do consenso. Avritzer (2009, pp. 7-8) afirma que, na de- mocracia deliberativa, podem-se observar quatro elementos principais: 1) “superação de uma concepção agregativa de democra- cia centrada no voto”; 2) identificação da ra- cionalidade política com mudança e justifi- cação de preferências; 3) pressuposição de “princípio de inclusão” na democracia deli- berativa; 4) procura por instituições capazes de efetivar as “preferências dos indivíduos por formas amplas de discussão”. Avritzer (2009, p. 8) destaca que, para ele, o quarto elemento apresentado é “o centro do câno- ne democrático deliberativo”. Considerando a construção teórica da de- mocracia deliberativa, Avritzer (2009) afir- ma que os principais teóricos da temática são James Bohman, Joshua Cohen, Sheyla Benhabib e Maeve Cooke, os quais se des- tacam no “processo de construção da teo- ria por meio de um amplo debate teórico” (Avritzer, 2009, p. 8). Quanto à contribuição teórica de cada um desses autores, pode-se observá-la pelos textos organizados e tra- duzidos por Ângela Cristina Salgueiro Mar- ques no livro A deliberação pública e suas dimensões sociais, políticas e comunicati- vas. Esses textos são a base do referencial aqui trabalhado e dos elementos considera- dos como necessários para que a perspec- tiva deliberativa democrática possa aconte- cer em determinada sociedade. Avritzer (2009) afirma que, para Bohman, a democracia deliberativa não deve ser defi- nida como procedimental, mas como um conjunto de acordos cooperativos eminente- mente pragmáticos. Bohman (2009) desta- ca que há diversas razões para defender a perspectiva deliberativa. Mesmos argumen- tos que aparentemente indicam problemas da deliberação costumam apresentar como contraposição benefícios que a justificam. Reconhece que a deliberação nem sempre levará à melhor decisão, pois decisões não públicas podem ser melhores do que de- cisões públicas. No entanto, a deliberação pública costuma melhorar a qualidade da justificação e da produção de decisões por submeter-se à maior amplitude de opiniões e possibilidades de alternativas: “defendo que a melhor defesa para a deliberação pú- blica é que ela parece ser o melhor meio de aperfeiçoar a qualidade epistêmica das jus- tificações para decisões políticas” (Bohman, 2009, p. 35). Destaca que deliberações em fóruns públicos abertos costumam aperfei- çoar a qualidade das razões. Bohman (2009) considera importante a perspectiva procedimental da deliberação, citando as contribuições de Joshua Cohen e Robert Dahl, com suas listas sistemáticas de condições procedimentais. No entanto, con- sidera que elas, embora importantes, não são suficientes para elucidar o motivo de as decisões falharem em ser democraticamen- te legitimadas, talvez porque as regras e as condições devessem surgir no meio da deli- beração, entre aqueles que deliberam. Para Bohman (2009), a legitimidade democrática e o sucesso nas atividades deliberativas
  • 27. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jorge Sundermann - José Roberto Pereira - Claudemir Francisco Alves - Mozar José de Brito 26 têm sua base no diálogo: “uma abordagem dialógica da deliberação captura melhor o processo de reinterpretação das normas e procedimentos à luz de novas experiências e situações problemáticas” (Bohman, 2009, p. 64). A deliberação pública é compreendi- da, dessa forma, como um diálogo que tem como objetivo a solução de um problema ou resolução de um conflito. Conclui sua análi- se afirmando que “talvez o principal desafio da democracia deliberativa seja solucionar os crescentes conflitos comuns sem abrir mão da igualdade política dos cidadãos, da não tirania dos resultados e da publicidade do diálogo” (Bohman, 2009, p. 81). Em Cohen (2009), pode-se observar uma caracterização da democracia deliberativa de modo procedimentalista, como uma as- sociação democrática na qual os membros partilham seus princípios definidores e tam- bém os objetivos do grupo, considerando a pluralidade que o constitui. As perspectivas de Bohman (2009) e Cohen (2009) apontam para uma democracia de- liberativa em que o debate e a cooperação operam considerando a pluralidade, carac- terística da condição humana e da agrega- ção dos seus indivíduos. Benhabib (2009) destaca a importância da capacitação do sujeito para a participação dos processos democrático-deliberativos: o engajamento na deliberação demanda que todos os participantes sejam capazes de formular questões próprias e passíveis de serem compreendidas e aceitas; de iniciar debates e interpretar suas necessi- dades de maneira reflexiva, expondo seus interesses sob uma perspectiva generali- zante (Benhabib, 1996, p. 70.). Avritzer (2009) destaca a diferença principal entre a abordagem de Bohman e Cohen e a abordagem de Benhabib. Enquanto os pri- meiros não consideram importante a ideia de consenso procedimental, mas valorizam a cooperação e a associação democrática, Benhabib considera o consenso racional mais importante. Marques (2009b) considera que a legitimi- dade do processo de deliberação exige um acordo, entre os envolvidos, sobre as regras e princípios normativos que definirão a na- tureza do vínculo entre os participantes e como serão feitas as trocas argumentativas. Apresenta como princípios a serem obser- vados: a) igualdade, b) publicidade, c) reci- procidade, d) reflexividade, e) accountability (prestação de contas), f) autonomia, g) au- sência de coerção, h) respeito mútuo. Considerando a complexidade ou amplitude dos princípios a serem observados para a constituição da democracia deliberativa, há questionamentos sobre a exequibilidade, ou a possibilidade da realização empírica, da deliberação. Quanto a isso, diversos autores se dedicaram a indicar a possibilidade de re- alização prática da deliberação. Para Avritzer (2009), questões empíricas no que se refere à facticidade da democracia deliberativa são tratadas por autores como Amy Gutmann e Dennis Thompson, Jane Mansbridge e Si- mone Chambers. Apresentaremos aqui as contribuições de estudos de Gutmann e Thompson (2009) e de Genevieve Fuji John- son (2011), que mostram resultados práticos obtidos em processos de democracia delibe- rativa.
  • 28. Democracia Deliberativa: uma Análise do Decreto nº 8.243 ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 27 Gutmann e Thompson (2009, p. 177) distin- guem os principais enfoques que teóricos tomam na perspectiva de definir “termos justos de cooperação política em uma so- ciedade democrática”. Avritzer (2009) desta- ca a contribuição desses autores quanto à inserção de elementos não procedimentais ou substantivos na compreensão da demo- cracia, destacando a introdução da recipro- cidade, como capacidade mútua de acesso a determinados bens públicos, no “cânone deliberativo”. Como afirmam Gutmann eThompson (2009, p. 181), “a reciprocidade assegura que os ci- dadãos devem uns aos outros justificativas para as leis e as políticas públicas que os vinculam mutuamente e que eles coletiva- mente elaboraram”. Nesse sentido, é rele- vante a explicação fornecida por Habermas: o entrelaçamento dos processos jurídicos com argumentações que se regulam a si mesmas, apoiando-se nos princípios da generalização e da adequação, explica a curiosa ambivalência da pretensão de va- lidade do direito positivo. É preciso distin- guir entre a validade do direito, garantida através de decisões competentes, e a vali- dade social do direito aceito ou implantan- do de fato. No entanto, no próprio sentido complexo da validade do direito, manifes- ta-se uma ambivalência que o direito mo- derno adquire devido à sua dupla base da validade, que repousa no princípio da fundamentação e no da normatização. (...) Ao passo que a pretensão de validade do direito positivo não consegue fugir da con- tingência que cerca a sua gênese, nem da facticidade da ameaça de sanção. Mesmo assim, as normas jurídicas positivadas, emitidas conforme o processo, pretendem legitimidade. Pois o modo de validade do direito aponta não somente para a expec- tativa política de submissão à decisão e à coerção, mas também para a expectativa moral do reconhecimento racionalmente motivado de uma pretensão de validade normativa, a qual só pode ser resgatada através de argumentação. E os casos li- mites do direito da legítima defesa e da desobediência civil, por exemplo, revelam que tais argumentações podem romper a própria forma jurídica que as institucionali- za (Habermas, 2003, pp. 246-247). A perspectiva da reciprocidade pode ajudar na definição de acordos políticos com base em princípios justificáveis a outros que com- partilham o objetivo de chegar a um enten- dimento. Para os autores, as decisões de- mocráticas exigem uma justificação mútua, “providenciar razões que constituem uma justificação pelo fato de impor leis vinculató- rias a outras pessoas” (Gutmann & Thomp- son, 2009, p. 181). Essa justificação mútua somente é possível tomando como referên- cia valores substantivos. Para os autores, o princípio da reciprocidade indica que há outros princípios que também precisam ser observados para que se obtenha um con- teúdo de democracia deliberativa, quais se- jam: publicidade, accountability, liberdade básica, oportunidade básica, oportunidade justa. Alguns teóricos, denominados por Gutmann e Thompson (2009) como procedimentalis- tas puros, focam nos procedimentos, con- siderando-os como as leis são feitas e as condições para que os procedimentos acon- teçam de forma justa. No entanto, os auto- res apontam a necessidade de considera- ção, além dos procedimentos, de princípios
  • 29. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jorge Sundermann - José Roberto Pereira - Claudemir Francisco Alves - Mozar José de Brito 28 substantivos como a liberdade individual ou igual oportunidade, entre outros, para que se obtenha um processo democrático justo. Para indicar a importância de incluir princí- pios procedimentais e substantivos na teo- ria democrática e deliberativa, Gutmann e Thompson (2009) fazem uso de um caso envolvendo deliberação sobre cuidados com a saúde no Reino Unido. Em 1999, o gover- no britânico criou um corpo deliberativo (Na- tional Institute for Health and Clinical Excel- lence – NICE), com especialistas e leigos, para definir acessos a tratamentos e diretri- zes clínicas a serem utilizados pelo Serviço Nacional de Saúde (National Health Service – NHS), pois não havia fundos para todas as necessidades da saúde.Tomando o caso como exemplo, os autores apontam que os procedimentos somente não justificam a ne- gação do NICE ao financiamento para uma nova droga antigripal (Anamivir). O fato de a decisão ter sido deliberativa também não é suficiente para considerá-la justificável. A reciprocidade permite aos cidadãos o acesso às justificativas que levaram à ne- gação de uma política que pode afetar seu bem-estar. Os elementos que levaram à de- cisão do NICE foram expostos e ficou cla- ro que a questão não era econômica, pois havia necessidade de mais pesquisas para comprovar a relevância e a eficácia do me- dicamento e que resultados positivos pode- riam, no futuro, alterar a decisão tomada. Justificar a decisão pela observância dos procedimentos não seria suficiente nesse tipo de demanda, sendo necessária uma justificativa substantiva. Outra questão significativa apontada pelos autores é o status provisório, moral e poli- ticamente, dos princípios substantivos na democracia deliberativa. Considerar a pro- visoriedade é considerar a possibilidade de mudar uma decisão em outro momento. É aceitar uma perspectiva que, em determina- do momento, será rejeitada, ou vice-versa.As razões políticas e/ou morais podem ter suas razões modificadas pela razão comunicativa. No caso citado pelos autores, pode-se notar a clareza do grupo quanto à provisoriedade da decisão: “o NICE também recomendou que julgamentos adicionais fossem condu- zidos e dados posteriores fossem obtidos, para que sua decisão pudesse ser retomada na próxima temporada” (Gutmann & Thomp- son, 2009, p. 195). Ao concluir as relações observadas entre os princípios da democra- cia deliberativa e o NICE, os autores desta- cam que, no debate sobre o NICE, na Casa dos Comuns – instituição parlamentar que, no Reino Unido, corresponde aproximada- mente à Câmara dos Deputados no legisla- tivo federal brasileiro –, críticos e defensores dele usaram tanto princípios procedimentais, quanto substantivos para apresentar suas posições. Avritzer (2009, p. 9) destaca a importância das observações de Gutmann e Thompson indicando que eles aproximam “a democra- cia deliberativa da democracia real, ao co- locarem a questão das oportunidades justas no campo das discussões democráticas e conectá-la com processos legislativos”. Quanto à factibilidade da democracia delibe- rativa, Johnson (2011) apresenta três casos práticos – Gestão dos Resíduos Nucleares Canadenses (NWMO), Habitação Social em Toronto (TCHC) e Nova Scotia Política Ener- gética (NSP) –, que mostram elementos im- portantes para que a perspectiva teórica se efetive no dia a dia das organizações. John-
  • 30. Democracia Deliberativa: uma Análise do Decreto nº 8.243 ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 29 son destaca fatores pertinentes a cada con- texto político que comprometem o alcance dos objetivos da democracia deliberativa: princípios normativos, pressão pública, re- quisitos políticos, interesse estratégico, in- teresse econômico. Esses fatores tendem a dar suporte à motivação das elites de dividir o poder de tomada de decisão com aqueles diretamente afetados por suas políticas. Os princípios normativos se referem às gran- des finalidades sociais e éticas que uma organização espera alcançar na prestação de seus serviços e gestão de seus bens. A pressão pública refere-se às exigências de mudança que um público afetado coloca para uma organização. Requisitos políticos são aqueles colocados à organização pelo seu regime regulatório global. Interesses estratégicos caracterizam imperativos orga- nizacionais considerados importantes para garantir programas eficazes e a perenidade da organização. Finalmente, interesses eco- nômicos se referem às condições necessá- rias para a manutenção ou melhora dos re- sultados financeiros da organização. Os resultados dos três casos apresenta- dos por Johnson (2011) são interessantes e ajudam a esclarecer que elementos menos altruístas podem encorajar a adesão à de- mocracia deliberativa, pois a deliberação é uma forma de as organizações compreen- derem e obterem maior aceitação em suas relações com o ambiente onde se inserem. Segundo Johnson (2011), os processos consultivos da TCHC, NSP e NWMO são impressionantes em termos de seus proje- tos de tomadas de decisão com base em princípios democráticos deliberativos. Ele observou que em cada caso há fatores con- textuais que podem facilitar ou complicar as inclinações das elites e, portanto, as possi- bilidades, para a realização do empodera- mento democrático deliberativo. O fator que mais chama atenção e diferencia os casos apresentados é o “interesse econômico”. Ao contrário do caso do TCHC, os interesses econômicos do NSP e do NWMO não fo- ram congruentes com o aumento do empo- deramento de seus públicos afetados. Seus interesses econômicos poderiam ter sido comprometidos pelo aumento da autonomia democrática. O descompasso no fator “inte- resses econômicos” talvez justifique em par- te que o empoderamento dos participantes nos processos de consulta foi reduzido nas duas últimas organizações. Johnson (2011) conclui que isso é potencialmente proble- mático para as perspectivas de realização dos objetivos teóricos da democracia deli- berativa em processos de políticas públicas estabelecidas em contextos de hierarquias de poder estabelecidas e interesses econô- micos dominantes. Elementos da política deliberativa no âm- bito do Decreto n. 8.243 Em 23 de maio de 2014, a Presidência da República do Brasil, pelo Decreto n. 8.243, instituiu a Política Nacional de Participação Social (PNPS) e o Sistema Nacional de Par- ticipação Social (SNPS), com o objetivo de “fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias democráticas de diálogo e a atu- ação conjunta entre a administração pública federal e a sociedade civil” (Brasil, 2014). O Decreto destaca que os objetivos e as di- retrizes da PNPS devem ser considerados na formulação, na execução, no monitora- mento e na avaliação de programas e polí- ticas públicas, como também no aprimora- mento da gestão pública.
  • 31. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jorge Sundermann - José Roberto Pereira - Claudemir Francisco Alves - Mozar José de Brito 30 O Decreto define como sociedade civil “o ci- dadão, os coletivos, os movimentos sociais institucionalizados ou não institucionaliza- dos, suas redes e suas organizações” (Bra- sil, 2014). Além da conceituação de socie- dade civil, são definidas as compreensões para conselho de políticas públicas, comis- são de políticas públicas, conferência nacio- nal, ouvidoria pública federal, mesa de diálo- go, fórum interconselhos, audiência pública, consulta pública e ambiente virtual de par- ticipação social. O decreto destaca que ele não implica na descontinuação ou alteração de nenhuma das instâncias apresentadas: “as definições previstas neste Decreto não implicam na descontinuação ou alteração de conselhos, comissões e demais instân- cias de participação social já instituídas no âmbito do governo federal” (Brasil, 2014). Quanto às diretrizes gerais da PNPS, são apresentadas no art 3o: I – reconhecimento da participação so- cial como direito do cidadão e expres- são de sua autonomia; II – complementariedade, transversali- dade e integração entre mecanismos e instâncias da democracia representati- va, participativa e direta; III – solidariedade, cooperação e res- peito à diversidade de etnia, raça; IV – direito à informação, à transparên- cia e ao controle social nas ações pú- blicas, com uso de linguagem simples e objetiva; V – valorização da educação para a ci- dadania ativa; VI – autonomia, livre funcionamento e independência das organizações da sociedade civil; VII – ampliação dos mecanismos de controle social (Brasil, 2014). Entre os objetivos da PNPS, podem-se ob- servar, no art. 4o: I – consolidar a participação social como método de governo; II – promover a articulação das instân- cias e dos mecanismos de participação social; III – aprimorar a relação do governo fe- deral com a sociedade civil; IV – promover e consolidar a adoção de mecanismos de participação social nas políticas e programas de governo federal; V – desenvolver mecanismos de parti- cipação social nas etapas do ciclo de planejamento e orçamento; VIII – incentivar e promover ações e programas de apoio institucional, for- mação e qualificação em participação social para agentes públicos e socieda- de civil; IX – incentivar a participação social nos entes federados (Brasil, 2014). O Decreto determina ainda que os órgãos e entidades da administração pública fede- ral direta e indireta considerem, ao formular e gerir programas e políticas públicas, as diversas instâncias de participação social e que apresentem relatórios anuais da imple- mentação da PNPS, cabendo à Secretaria Geral da Presidência da República publicar anualmente avaliação da implementação da PNPS. O Art. 7º define que o SNPS será coordena- do pela Secretaria Geral da Presidência da República e integrado por: 1) conselho de políticas públicas, 2) comissão de políticas públicas, 3) conferência nacional e 4) ouvi-
  • 32. Democracia Deliberativa: uma Análise do Decreto nº 8.243 ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 31 doria federal, “sem prejuízo da integração de outras formas de diálogo entre a admi- nistração pública federal e a sociedade civil” (Brasil, 2014). Além disso, o Decreto define outras atribuições da Secretaria Geral da Presidência da República quanto à orien- tação, à implementação, ao suporte, à ava- liação e ao fortalecimento da PNPS e do SNPS, bem como ao suporte que ela terá para realizar todas essas atribuições. Entre as diretrizes mínimas a serem obser- vadas “na constituição de novos conselhos de política e na reorganização dos já cons- tituídos”, podem-se destacar a “garantia da diversidade entre os representantes da so- ciedade civil” e a “publicidade” dos atos, as quais compõem as diretrizes das comissões de políticas públicas e das conferências na- cionais (Brasil, 2014). É importante observar que “a participação dos membros no con- selho é considerada prestação de serviço público relevante” e, por essa razão, ela não é remunerada. As ouvidorias devem observar as diretrizes da Ouvidoria-Geral da União e da Controla- doria Geral da União, que já foram definidas no Decreto n. 8.109, de setembro de 2013, e não são redefinidas neste momento. Segundo o Decreto, as mesas de diálogo vi- sam ao “aperfeiçoamento das condições e relações de trabalho”, por isso deveriam pre- ferencialmente envolver representantes dos empregados, dos empregadores e do go- verno e ter prazo de funcionamento definido. O documento em questão também define diretrizes mínimas de funcionamento dos fóruns interconselhos, das audiências públi- cas, das consultas públicas e dos ambien- tes virtuais de participação social. Institui-se, ainda, a Mesa de Monitoramento das Demandas Sociais, “instância colegiada interministerial responsável pela coordena- ção e encaminhamento de pautas dos mo- vimentos sociais e pelo monitoramento de suas respostas” (Brasil, 2014). Deve-se destacar que as instâncias de par- ticipação social de que trata o Decreto já fazem parte da vida política do País e algu- mas são utilizadas pela quase totalidade dos municípios brasileiros. Em suma, o Decreto organiza e estabelece diretrizes de funcio- namento de instâncias já existentes de parti- cipação social no Governo Federal. Estimula a observação dos objetivos e das diretrizes da PNPS na formulação, na execução, no monitoramento e na avaliação de programas e políticas públicas.Aumentando as possibi- lidades de participação da sociedade com plataformas virtuais na internet, é possível que a manifestação dos cidadãos sobre po- líticas públicas se torne mais efetiva. Embora muitas vozes, representando prin- cipalmente instâncias políticas, tenham ex- pressado certa surpresa com o Decreto, deve-se observar que ele institucionaliza práticas políticas que foram assumidas pelo governo Lula com a Medida Provisória 103. Se considerado tal fato, pode-se afirmar que ele não constitui uma novidade nas estrutu- ras existentes no Poder Executivo. Já, nessa Medida Provisória, previam-se a articulação com as entidades da sociedade civil e a cria- ção e implementação de instrumentos de consulta e participação popular que pudes- sem influenciar na elaboração da agenda da Presidência da República. Além disso, pela Constituição de 1988, artigo 84, é compe- tência privativa do Presidente da República
  • 33. ISSN 2236-5710 Cadernos Gestão Pública e Cidadania, São Paulo, v. 21, n. 68, Jan./Abr. 2016 Jorge Sundermann - José Roberto Pereira - Claudemir Francisco Alves - Mozar José de Brito 32 dispor sobre a “organização e funcionamen- to da administração federal” (Brasil, 2005), o que deve ser feito mediante decreto. Dessa forma, embora pudesse haver alguma sur- presa quanto ao Decreto, não se pode dizer que ele seja incoerente com as ações ante- riores do atual governo e do anterior, nem que seja um ato indevido ou autoritário por ser feito por decreto, pois é esse o procedi- mento definido pela Constituição Brasileira de 1988. Manifestações contrárias e a favor do De- creto podem ser observadas na mídia e são coerentes com uma perspectiva deliberativa, uma vez que “diferentes atores e discursos estabelecem um diálogo, que tem por prin- cipal objetivo a avaliação e a compreensão de um problema coletivo ou de uma questão geral” (Marques, 2009, p. 13). Nessa pers- pectiva, observa-se o manifesto da UNE fa- vorável ao Decreto: A União Nacional dos Estudantes acredita que mais participação popular não é sinô- nimo de ditadura, como alguns tentam ro- tular, mas sim de efetiva democracia e vai ao encontro do desejo dos brasileiros/as em participar mais da vida política e deci- sões do país (UNE, 2014). Enquanto algumas manifestações, princi- palmente por parte de membros da classe política, buscam associar o Decreto a uma perspectiva ditatorial, outras querem mostrar que ele tem sua base em uma proposta de consolidação democrática. O interessante é observar que algumas rea- ções posteriores à publicação do Decreto n. 8.243 encontram fundamento no caso NICE descrito por Gutmann e Thompson (2009) neste estudo. Nesse caso, a instância de onde partiu a maioria das críticas também foi o Legislativo. No entanto, observamos uma diferença significativa. No caso do Brasil, an- tes de um debate amplo sobre a pertinência ou não da institucionalização das instâncias de participação, há membros do legislativo que pretendem votar, “em regime de urgên- cia, um decreto legislativo que anule os efei- tos do decreto presidencial” (Partidos, 2014). Referindo-se ao Decreto n. 8.243, o Senador Álvaro Dias, em vídeo disponível no Youtube, afirma: “ao assinar este decreto, a presidente da República decreta a falência do poder le- gislativo federal e o sucateamento total e ab- soluto do Congresso Nacional” (Dias, 2014). Embora também taxado como “afronta ao Le- gislativo”(Dias, 2014), na realidade, o Decreto trata da participação direta, que está prevista no art. 1o, parágrafo único, da Constituição Federal de 1988, onde se lê que “todo o po- der emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente nos termos desta Constituição” (Brasil, 2005). Ou seja, devem-se distinguir os processos pe- los quais o cidadão pode exercer seu poder. Segundo a Constituição de 1988, o cidadão pode exercê-lo através da delegação a po- líticos eleitos determinadas deliberações ou atuando diretamente em defesa dos seus interesses, incluindo aí diversas formas de organização. Quanto ao processo de delega- ção, o Decreto não altera nada, não fazendo nenhuma menção que implique mudanças. Avritzer (2009, p. 7) afirma que, na demo- cracia deliberativa, podem-se observar qua- tro elementos principais, sendo o primeiro a “superação de uma concepção agregativa de democracia centrada no voto”. Perspectivas além da democracia representativa, a princí-