O documento discute a intertextualidade em anúncios publicitários da rede Hortifruti que faziam referência a filmes famosos. A análise de um anúncio específico mostra como ele alude implicitamente ao filme "O Diabo Veste Prada" por meio de jogos de palavras e estilização, demonstrando processos de intertextualidade.
1. O DISCURSO É A ESTRELA
INTERTEXTUALIDADE EM ANÚNCIOS PUBLICITÁRIOS.
Hélia Coelho Mello Cunha
Rosângela Azevedo Caldas
2. INTERTEXTUALIDADE E ANÚNCIOS PUBLICITÁRIOS
O objetivo deste trabalho é demostrar a necessidade de o
pesquisador das ciências da linguagem , formador de
leitores competentes, ter conhecimento da importância
do contexto situacional, contexto linguístico, processos de
alusão e estilização, gêneros discursivos e de informações
anteriores à enunciação para que se compreendam bem
textos que dialogam com outros.
A análise de anúncios publicitários será um exemplo da
intertextualidade implícita e intergenérica que se
evidencia em muitos textos da atualidade.
3. “Aqui a natureza é a estrela”
Constata-se a intertextualidade implícita e intergenérica
em muitos anúncios publicitários da atualidade; fato que
será demonstrado, neste trabalho, por meio da análise de
um deles, extraído da campanha “Hollywood” da rede
Hortifruti, veiculada em 2008, que apresentou 21
anúncios impressos que faziam referência a filmes
famosos cujo mote foi “Aqui a natureza é a estrela”.
Os cartazes dos filmes em questão foram refeitos,
ganhando novos nomes (similares aos originais) e
colocando as frutas, verduras e legumes como as
“estrelas” principais desses filmes.
4. INTERTEXTUALIDADE IMPLÍCITA E INTERGENÉRICA
Implícita - o intertexto alheio é introduzido na própria fala
sem qualquer indicação de fonte.
Intergenérica - o produtor do texto, contando com o
conhecimento prévio dos interlocutores a respeito dos
gêneros textuais possíveis na nossa sociedade, apresenta,
no lugar próprio de determinada prática social, um
gênero pertencente a uma outra, com o objetivo de
produzir determinados efeitos de sentido.
KOCH, BENTES e CAVALCANTE (2008: 28-43)
5. MAINGUENEAU- CONTEXTO
Compreender um enunciado significa “mobilizar saberes
muito diversos, fazer hipóteses, raciocinar, construindo
um contexto que não é um dado preestabelecido e
estável” (2001: 20).
CONTEXTOS:
O ambiente físico da enunciação, ou contexto situacional.
O “cotexto”, isto é, o contexto linguístico, as sequências
verbais encontradas antes ou depois das unidades a
interpretar.
Os saberes anteriores à enunciação.
6. MAINGUENEAU-COMPETÊNCIA COMUNICATIVA
Para o estabelecimento efetivo da competência
comunicativa (2001: 41), no caso específico da
intertextualidade, é preciso ter:
Competência enciclopédica – referente a um repertório,
conhecimento de mundo.
Competência linguística – domínio da língua em questão.
Competência genérica -- referente ao domínio dos
diversos gêneros discursivos.
7. Koch e Travaglia (1997)
A diversidade de modos marcados pela intertextualidade
envolve fatores atinentes a três esferas :
Esfera do conteúdo - vincula-se ao conhecimento de
mundo, que permite ao interlocutor o acesso a
informações que dependem de um conhecimento prévio.
Esfera da forma - repetição de expressões, enunciados
ou trechos de outros textos, ou então, o estilo de um
determinado autor ou obra.
Esfera da tipologia textual- pode estar vinculada tanto à
estrutura típica de cada tipo de texto quanto aos aspectos
formais de caráter linguístico.
8. PROCESSOS DE INTERTEXTUALIDADE:
CITAÇÃO - mostra a relação discursiva explicitamente, mas não
há o comprometimento de se manter o sentido do texto citado,
podendo-se, assim, confirmá-lo ou transformá-lo.
ALUSÃO - construção que reproduz a ideia central de algo já
discursado e que alude a um discurso já conhecido do público
em geral. Não são citadas as palavras do outro texto, mas
reproduzem-se construções sintáticas em que certas figuras são
substituídas por outras.
ESTILIZAÇÃO - forma de reproduzir os elementos de um discurso
já existente, como uma reprodução estilística do conteúdo
formal ou textual. É reprodução do conjunto dos procedimentos
do estilo do outro.
Fiorin (2003)
10. INTERTEXTUALIDADE IMPLÍCITA E INTERGENÉRICA
O anúncio publicitário intertextualiza com o título do
filme “O diabo veste Prada”, lançado em 2006. Nele
ocorre uma intertextualidade intergenérica e implícita.
Apela para o conhecimento de mundo do leitor/
consumidor, que precisa ativar seu repertório, seus
saberes anteriores à enunciação para compreender a
alusão feita ao anúncio do filme (competência
enciclopédica, Maingueneau).
11. MAINGUENEAU, KOCH E TRAVAGLIA
Reforça o intertexto a referência à entrada do quiabo no
“seleto mundo da Hotifruti”, alusão inequívoca ao “seleto
mundo da moda”, ambientação do filme, referência à
grife Prada (competência linguística / ambiente físico da
enunciação / contexto - Maingueneau).
Em Koch eTravaglia a repetição dessa expressão insere-se
na esfera da forma.
12. MAINGUENEAU, KOCH E TRAVAGLIA
Reconhecer o logotipo do Hortifruti no canto direito do
texto em questão remete ao gênero anúncio publicitário
(competência genérica - Maingueneau).
Koch e Travaglia (1997) falam em esfera da tipologia
textual- vinculada tanto à estrutura típica de cada tipo de
texto quanto aos aspectos formais de caráter linguístico.
13. ESTILIZAÇÃO E JOGO DE PALAVRAS
Sem o conhecimento prévio do anúncio do filme, não é
possível perceber algumas sutilezas do texto publicitário
em questão: o quiabo se transforma em um sapato de
salto bem alto, de cuja extremidade surge um tridente,
marca visual do filme, símbolo do ambiente focalizado e
da associação com o diabo. (competência enciclopédica /
esfera do conteúdo).
14. ESTILIZAÇÃO E JOGO DE PALAVRAS
Como nos anúncios de publicidade, o jogo de palavras
acontece. Há semelhança fonética entre o nome da
hortaliça (“quiabo”) e o signo linguístico que entra na
composição do título do filme (“diabo”), motivo da
escolha: altera-se apenas um fonema: /d/ é substituído
por /k/, situação que confirma o valor distintivo dos
fonemas (competência linguística / esfera da forma).
17. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O pesquisador das ciências da linguagem que tem
conhecimento desses conceitos pode levar leitores a
compreenderem melhor como a intertextualidade se
realiza a fim de que percebam como ela se manifesta no
discurso que, materializado pela linguagem e reflexo de
valores culturais mais amplos que aqueles inerentes ao
sujeito produtor do texto, torna-se, portanto, a “estrela” de
qualquer processo de compreensão.
18. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Assim como “A Natureza é a estrela” na
campanha da Hortifruti, consideramos que
o discurso seja a estrela para os
pesquisadores das ciências da linguagem .
19. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
FIORIN, J. L. “Polifonia Textual e Discursiva”. In: BARROS, D. L.
P. de; FIORIN, J. L. (Orgs.). Dialogismo, Polifonia,
Intertextualidade: Em torno de Bakhtin. 2ª ed. São Paulo:
Editora da Universidade de São Paulo, 2003.
KOCH, Ingedore Grunfeld; BENTES, A.C.;CAVALCANTE, M.M.
Intertextualidade: diálogos possíveis. 2. Ed. São Paulo: Cortez,
2008.
MAINGUENEAU, Dominique. Análise de textos de
comunicação. Trad. De Cecília P. de Souza-e-Silva e Décio
Rocha. São Paulo: Cortez, 2001.
PINTO, A. G. Publicidade: um discurso de sedução. Porto:
Porto Editora, 1997.
20. Hélia Coelho Mello Cunha (heliacoelho14@gmail.com)
(LINGUA AFI(N)ADA) : professora aposentada do Instituto
Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Fluminense,
Campus Campos dos Goytacazes - Centro. Doutoranda
em Cognição e Linguagem-Universidade Estadual do
Norte-Fluminense Darcy Ribeiro (UENF).
Rosângela Azevedo Caldas (rorocaldas@hotmail.com):
professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e
Tecnologia Fluminense, Campus Campos dos Goytacazes-
Centro.