13. O raciocínio a seguir pretende explicar Gamefication como um subfenômeno de
algo maior chamado Game Thinking. Um pensamento orientado a jogos é, na
verdade, um pensamento orientado essencialmente à lógica, à objetividade, à
não-linearidade e à interação de sistemas. Pensar para jogos é pensar de modo
racional e sensível ao mesmo tempo, entendendo o ser humano como parte de
um sistema dinâmico que faz requerimentos constantes de suas habilidades
cognitivas e técnicas. Escolhi abordar Jogos e Brinquedos porque a íntima
relação entre esses objetos sugere um caminho mais natural e didático para
alcançar algumas conclusões possíveis. Por fim, a intenção é conduzi-lo por uma
linha de raciocínio que ressignifique o fenômeno Gamefication como parte de um
conceito mais abrangente, mais consistente e atemporal.
Israel Mendes é Publicitário, Redator, Escritor, Estudante de Filosofia e Game Thinker. Sócio da Aquiris Game Experience,
um estúdio de jogos situado no sul do Brasil, é autor de dezenas de games para clientes nacionais e globais. Interessa-se por
comunicação, linguística, filosofia, poesia, games, puzzles, puzzles, puzzles, brinquedos, astronomia, física e matemática.
17. DEFINIÇÃO
“É uma atividade voluntária com um fim em si própria, que segue regras
convencionadas e que é limitada no tempo e no espaço.”
Johan Huizinga, Historiador, autor do livro Homo Ludens
19. PAR-OU-ÍMPAR
1) Duas pessoas escolhem entre as alternativas Par ou Ímpar.
2) É proibido ambas escolherem a mesma alternativa.
3) Ambas devem revelar ao mesmo tempo um número X de dedos das mãos.
4) Se a contagem total somar um número par, vence quem escolheu Par.
5) Se a contagem total somar um número ímpar, vence quem escolheu Ímpar.
Obs.: se a contagem somar zero, vence quem escolheu Par (zero é par).
20. 1) As definições sobre jogo se repetem em alguns momentos. “Regras” é um
termo recorrente. Mas acima de tudo, todas elas remetem a dinamismo e a
mecânica clássica, como conceito físico de movimento. Esse dinamismo, por
sua vez, é diretamente proporcional à inércia ou movimentação do jogador e traz
embutido a ideia de tensão. Em um Jogo, algo está sempre em jogo.
2) A revista Veja, em 2006, publicou na capa de uma de suas edições uma
definição que atualizou a percepção negativa vigente até então no país. Um
representante tão simbólico da sociedade brasileira ter definido videogames
como “ginástica para o cérebro (...) torna filhos mais inteligentes” inauguraria
uma nova postura.
3) Par-ou-Ímpar é um exemplo de Jogo com limites claros, regras rígidas e uma
mecânica de movimento simples: esconder e em seguida revelar os dedos das
mãos sincronizadamente. No Par-ou-Ímpar, o acaso confere a vitória.
21. Homo Homo Homo
Sapiens Faber Ludens
pensar fazer brincar
refletir trabalhar jogar
ponderar construir descontrair
criar progredir se divertir
22. 4) Johan Huizinga, em seu livro Homo Ludens, estudou as características
culturais do Jogo como um fenômeno inerente à humanidade.
5) O homem então essencialmente: pensa/reflete, faz/progride e joga/brinca.
6) Nesse sentido, jogos são ferramentas psico-técnicas que fazem uso
harmônico e evolutivo do nosso dueto mais essencial: a mente e o corpo.
7) A ludicidade, em sentido mais amplo, é a premissa básica de um Jogo. Quem
joga, se transporta conscientemente da realidade real para uma realidade
convencionada (irreal/simulada/fantasiosa).
8) Vale lembrar que em várias línguas os significados de Jogar e Brincar são mais
próximos do que no Português. Play, Spielen, Jouer, Jugar conseguem, via de
regra, exprimir facilmente ambos os significados. Jogar e Brincar, por sua vez,
possuem um afastamento semântico um pouco maior.
24. 9) Jogos são sistemas dinâmicos e lógicos com ingredientes dramáticos
(mesmo os abstratos). Possuem interatividade e não-linearidade. Num Jogo,
não há avanço sem um jogador no controle. Não é possível participar de um
Jogo sem ser parte dele. Apenas assistir um Jogo não é jogar, é ver televisão.
10) Jogos tem curva de progresso. Essas curvas são planejadas para desafiar
gradativamente as habilidades intelectuais e motoras dos jogadores. É essencial
que o jogador sinta isso acontecendo. Ele precisa intuitivamente perceber que
os desafios propostos são compatíveis e os objetivos, alcançáveis.
11) Dessa forma, um mundo lógico faz-se necessário. A Lógica Elementar é o
pano de fundo cognitivo que permite ao jogador detectar os padrões de desafios
apresentados e entender o que é preciso ser feito para progredir no Jogo. Em
um mundo jogável inventado, espaço e tempo também exercem papéis
fundamentais para limitar e determinar a grandeza do desafio proposto.
26. Neste momento sei que estou jogando. Se o Jogo
JOGO for Lúdico, ou não há conexão com a realidade ou ela é
metafórica. Se for um Simulador, há uma intenção de conexão
literal máxima com a realidade, embora nunca ocorra de fato.
Afinal, é apenas um simulador, não a realidade em si.
demanda: mental
Entendimento
feedback de progresso
e aceitação
da premissa
fina (dedos/mãos)
e das regras.
saída: motora
ampla (pernas/corpo)
ciclos constantes
Aqui existe Aprendizado. Concreto: histórias,
personagens, cenários. Abstrato: formas, cores,
padrões. Motor: habilidade adquirida.
27. 12) Cientes do dualismo mente-corpo da estrutura humana, os jogos partem
então para fazer uso disso em suas demandas. Tudo começa com um input
intelectual que informa a premissa básica (conta o objetivo) e explica as regras.
Esse é um momento de decisão entre jogar ou não jogar. Se houver interesse do
potencial jogador, ele precisa antes assumir para si que aceitará embarcar em
uma realidade alternativa. Neste momento ele se torna um jogador.
13) A partir daí, o jogador passa a ter consciência dessa nova dimensão ficcional,
a do Jogo. Saber, ter consciência de que está jogando, é o que o resguarda da
realidade real segurando-o voluntariamente nessa realidade alternativa. Isso é
justamente o que mantém o jogador engajado. No mundo real, uma pessoa
não conviveria bem com tantas falhas e fracassos. No entanto, quando em um
Jogo, o jogador, por mais que perca, não desiste. Ao contrário, insiste. Basta
apenas que ele perceba ou sinta uma perspectiva de progresso compatível.
O desafio, na verdade, torna-se um autodesafio.
28. 14) A comunicação entre o cérebro e seus terminais motores no corpo (mãos,
principalmente) é fundamental para que se tenha controle sobre um Jogo. No
caso dos videogames, há historicamente o uso de periféricos que traduzem e
enviam essas reações para o sistema de Jogo em diferentes níveis de
motricidade. Joysticks, por exemplo, fazem uso da motricidade fina. Eles tem
sido dominantes na história até hoje. Porém na atual geração de consoles, a do
Wii, Kinect e PS Move, a motricidade ampla vem sendo fortemente adotada.
Jogamos com nossos corpos inteiros, não mais apenas com nossas mãos.
15) Ressalva: há um possível contraexemplo de alguém que pensa o jogo e diz
para uma outra pessoa o que ela deve fazer. Neste caso, ainda assim temos
virtualmente a mesma estruturação, já que segue existindo um esforço de
coordenação de tarefas entre uma mente e um corpo. Ou seja, haveria apenas
uma outra mente intermediando esse processo.
29. 16) Como a relação do jogador com o Jogo é interativa, isso nos sugere ciclos
com cadências diversas. Exemplo: em um Jogo de estratégia as demandas
motoras normalmente são mais escassas em comparação às intelectuais. Já em
um Jogo de ação, o contrário provavelmente seja verdade. Esta é a tônica,
embora não seja regra. Podem existir mesclas ou inversões em tempo real
conforme as demandas evolutivas dos jogos. Isso, na verdade, é desenhado de
acordo com o objetivo de cada Jogo. O game designer é Deus. E vice-versa.
17) Mas para que o cérebro catalogue uma ação, dando-a como encerrada (ou
aprendida), e parta para uma próxima, é preciso que ele receba feedbacks
constantes. Um bom sistema de Jogo conduz essas interações de modo claro e
preciso. Lembremo-nos que existe um universo lógico e regrado acontecendo
em um jogo. A lógica e as regras são seus guias máximos. O cérebro tende a
agir em conformidade. Detectado um padrão, ele relaxa, toma isso como
aprendido, e parte para o próximo. E assim ciclicamente, até que o Jogo
termine ou então seja percebido como sem mais perspectivas de progresso.
30. 18) Um dos mecanismos mais poderosos de um Jogo é justamente o aprendizado
que obtemos jogando. Ele ocorre em dois níveis principais. Narrativo e Motor.
Nos videogames, por exemplo. Meia-Lua pra Frente + Soco = Magia é um
aprendizado narrativo e motor. Narrativo porque eu sei que o personagem Ryu,
no jogo Street Fighter, dispara uma magia contra os oponentes quando eu realizo
esta ação. Motor porque se, e somente se, eu realizar este movimento com a
rapidez e timing necessários no joystick, o movimento acontece.
19) O aprendizado narrativo é fixado com o auxílio da memória. Quanto mais se
joga, mais se sabe o que cada personagem faz. Já o aprendizado motor é fixado
com a repetição. Um exemplo amplamente familiar de aprendizado motor é o
dirigir de um carro. Inicialmente é algo que requer alto esforço comunicacional
entre cérebro e corpo para coordenar algumas motricidades. Mas a partir de um
dado momento, passa a ser algo natural, comumente chamado de instintivo.
32. LADO ESQUERDO LADO DIREITO
Lógico e Analítico Artístico e Criativo
33. UM TESTE SIMPLES
(Perceba o conflito entre os processamentos
lógico e artístico ocorrendo simultaneamente.
Para deixar mais evidente, leia-os em voz alta.)
35. 20) Nosso cérebro lida com duas grandes naturezas de informações: lógicas,
analíticas, concretas, objetivas. E com as artísticas, estéticas, abstratas,
subjetivas. Game Designers sabem disso e nos fazem de cobaias.
21) Jogos são desafios. Dado um problema, parte-se em busca da vitória, da
solução. Esse desafio é desenhado fazendo uma espécie de engenharia reversa
da estruturação mental. E, por consequência, de sua conectividade com o corpo.
A ideia é entender esse funcionamento e tentar fraudá-lo sistematicamente.
22) Basicamente jogos propõem desafios de Perícia, Estratégia e Sorte. Dentro
dessas categorias faz-se uso de todos os recursos existentes na natureza
humana para pôr à prova essa estrutura comum. Exemplos: memória, reflexo,
ritmo, noção espacial, noção temporal, capacidade analítica, sensibilidade,
paciência, ansiedade, organização, noção estética, curiosidade, QI, habilidades
motoras, emoções em geral. Novamente: jogar é também autodesafiar-se.
37. DEFINIÇÃO
“Objeto que serve para as crianças brincarem. Jogo
de crianças; brincadeira. Divertimento, passatempo.”
Dicionário Aurélio
38. DEFINIÇÃO
“Objeto ou atividade lúdica voltada única e especialmente
para o lazer, e geralmente associado a crianças.”
Wikipedia
39. 23) Brinquedos são objetos relacionais. Eles intermediam nossas primeiras
conexões com o mundo real. São personificações, simplificações geométricas,
estimuladores sensoriais, provocadores lógicos e matemáticos, entre outros.
24) O mundo é percebido através dos sentidos, expressado através da
linguagem e processado através do raciocínio e da memória. Dessa forma, os
brinquedos tem papel fundamental, pois impulsionam a evolução das nossas
matrizes cognitivas, dando início ao processo de conscientização da
participação no mundo real.
25) Brinquedos são manuseáveis e tipicamente não possuem regras rígidas.
Pelo contrário, por mais que sugiram mecânicas básicas de interação, ainda
assim são amplamente abertos a novas interpretações e utilizações criativas.
26) A pedagogia faz intenso uso de brinquedos para promover seus esforços na
educação. Programas como o Espaço LEGO Zoom promovem aprendizado e
estimulação criativa via desenvolvimento cognitivo, sensorial e de motricidade.
40. LEGO é um dos brinquedos mais NeoCube foi eleito o brinquedo do ano
convidativos à criatividade que existem. nos Estados Unidos em 2010. É um
Sua lógica de blocos simples e Puzzle-Toy com 216 pequenas esferas
acopláveis permite construir estruturas fortemente magnetizadas. O desafio é
complexas, simulando a elementaridade construir formas geométricas ligando os
x complexidade do próprio mundo. pólos positivos e negativos das esferas.
Miniaturas de Pelúcia são extremamente Cubo Mágico é um Puzzle-Toy que
lúdicas. Possuem fisionomia caricatural provoca nossa noção de Matemática
em versões “queridas” de seres ou Estrutural. Solucioná-lo é uma tarefa
coisas. Além disso, oferecem liberdade hercúlea. Mas apenas manuseá-lo é, por si
de manuseio, aspecto este que permite só, divertido, convidativo e estimulante
personificar companhias imaginárias. de um ponto de vista sensorial.
Bolinhas de Gude são um requisito Brinquedos Musicais são altamente
básico de qualquer infância bem vivida estimulantes, especialmente nas idades
(pelo menos de meninos). Sua diversão, mais tenras da infância onde ainda não há
entre outros motivos, vem do fato de Linguagem bem estabelecida. Mesmo
brincarem com conceitos de Mecânica simples grupos de notas musicais podem
Clássica, como, por exemplo, a Dinâmica. representar sólidos saltos no aprendizado.
43. 27) O Círculo Azul representa a Área de Diversão do Jogo. O Contorno Preto
simboliza as Regras que determinam seus Limites Temporais e Espaciais.
Aceitar tornar-se um jogador é passar do Espaço em Branco para o Espaço
Azul. Embutido nessa decisão está o acatar rigoroso das regras dessa nova
dimensão convencionada, sabidamente diferentes das do mundo real.
28) O Círculo Amarelo representa o Espaço de Diversão do Brinquedo. Note
que ele não possui um limitador, que aqui dá lugar a apenas um gradiente.
A ideia é representar Limites regidos pela Imaginação. Ou seja, livres e
flexíveis. Brincar é, na verdade, estabelecer os próprios limites de diversão.
29) O Pequeno Círculo Amarelo Dentro do Azul representa o caso de um
Brinquedo que vira parte de um Jogo. Quando isso ocorre, ele também
obedece a regras rígidas, deixando de ter a Liberdade como propriedade ímpar.
O Brinquedo assume então um papel de coadjuvante da diversão no Jogo.
48. 30) A Bola é um dos brinquedos mais livres já inventados. E por isso, um dos
mais divertidos também. Tecnicamente estamos falando de uma esfera oca,
preenchida com ar comprimido em níveis que se preserve uma certa elasticidade,
de modo a fazer uso da gravidade e de outros conceitos físicos de acúmulo e
conversão de energia elástica e cinética. Isso, porém, é o que ela proporciona.
31) Agora, quando a Bola pertence a um campo retangular, demarcado com 4
linhas, 2 goleiras, 22 jogadores, 11 de um lado e 11 de outro, que enfrentam-se
com o objetivo de tentar chutá-la no gol adversário, daí as coisas mudam
bastante. Porque nesse momento a Bola perde sua liberdade, coadjuvando
com os demais elementos que fazem o balanceamento correto do Futebol.