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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓTILA DE SÃO PAULO
CIÊNCIAS SOCIAIS
COM QUANTAS INTERROGAÇÕES SE FAZ UM BRINCANTE
MARINAABIB CANDUSSO
SÃO PAULO
2010
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓTILA DE SÃO PAULO
CIÊNCIAS SOCIAIS
COM QUANTAS INTERROGAÇÕES SE FAZ UM BRINCANTE
MARINAABIB CANDUSSO
ORIENTADOR: GUILHERME GOMES JUNIOR
Í NDICE
1. INTRODUÇÃO.........................................................................................................2
2. O BRINCANTE........................................................................................................5
2.1 O BRINCANTE EM SUA MAIORIDADE.......................................................7
3. TRAJETÓRIAS. OS PILARES DO TEATRO ESCOLA.........................................12
4. UM RÁPIDO PANORAMA HISTÓRICO DA DISCUSSÃO SOBRE O NACIONAL
POPULAR..................................................................................................................20
4.1 OS PRIMEIROS PASSO............................................................................21
4.2 A MESTIÇAGEM EM UM BRASIL "MODERNO".......................................22
4.3 UMA VERTENTE ENGAJADA POLITICAMENTE......................................25
4.4 O MARCO DE 1964....................................................................................27
4.5 UMA BREVE CONSIDERAÇÃO.................................................................31
5. CONVERSAS - A DISCUSSÃO DENTRO DO BRINCANTE................................33
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS - UM COMEÇO.........................................................41
BIBLIOGRAFIA..........................................................................................................45
1. INTRODUÇÃO
“A crença no poder transformador da educação aliada ao vasto universo da cultura popular fez
surgir o Brincante.” (ALMEIDA, 2009. pp 4).
O termo brincante nasceu no nordeste do Brasil, e designa o modo como os artistas populares
se autodenominam. O artista popular nunca se diz dançarino, músico ou ator, ele se diz brincante; e
brincadeira - por causa ou consequencia - é o nome dado à certas manifestações populares onde
estão presentes diversas linguagens artísticas, como a poesia, as artes plásticas, o teatro, a música e
a dança. São homens, mulheres e crianças que participam de manifestações como o Cavalo-
marinho, o Reisado, o Caboclinho, os Maracatus e outras tantas brincadeiras.
Em um estudo sobre o carácter lúdico dessas manifestações me deparei com livro Homo
Ludens de Johan Huizinga. Nele o autor expõe uma definição daquilo que ele entende por jogo:
"(...) é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e
determinados limites de tempo e espaço, segundo regras livremente
consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo,
acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de
ser diferente da “vida quotidiana” (...) Visto que não pertence à vida
“comum”, ele [o jogo, e para nós a brincadeira] se situa fora do mecanismo de
satisfação imediata das necessidades e dos desejos e, pelo contrário interrompe
este mecanismo. Ele se insinua como uma atividade temporária, que tem uma
finalidade autônoma e se realiza tendo em vista uma satisfação que consiste
nessa própria realização. É pelo menos assim que, em primeira instância, ele
se nos apresenta: como um intervalo em nossa vida quotidiana. Todavia, (...)
ele se torna um acompanhamento, um complemento e, em última análise, uma
parte integrante da vida em geral." (HUIZINGA, 2000. pp12).
A palavra "jogo" foi uma escolha feita pelo tradutor na medida em que nas principais línguas
europeias tanto jogar como brincar são traduzidas por uma mesma palavra como: spielen, to play,
louer, jugar.
Tal definição se aplica também às brincadeiras populares. A brincadeira estaria nas bases da
civilização humana. O homem seria, antes de tudo, um ser brincante.
Maria Acselrad quando fala da brincadeira popular diz que, “é uma prática que implica, antes
de tudo, como categoria primordial, o cuidado. Pois significa estar vinculado a um coletivo,
compartilhar algo que se acredita e merece respeito” (ACSELRAD, 2002. pp36). Uma hipótese diz
que a própria palavra "brincar", em sua origem etimológica, está ligada à palavra vinculum, do
latim. Seu caminho é um pouco nebuloso, mas o que sabemos é que vinculum se transformou em
vincro que passou a ser grafado como vrinco, para originar brinco, que virou brincar.
A brincadeira, sendo um tempo “destacado” do cotidiano e criado pelos próprios brincantes,
implica uma realização voluntária. É na expressão dessa vontade que os seus participantes
experimentam a liberdade dentro das regras que eles escolheram seguir, as regras da própria
brincadeira. Tensão e alegria parecem então caminhar juntas. Ordem e liberdade. Duas ordens de
valores que, do modo que costumam ser entendidas hoje em dia, estariam situadas em polos
opostos, na brincadeira existem juntas e complementam-se, se alimentando para sustentar a
possibilidade do espontâneo.
A finalidade do brincar, portanto, reside em si mesmo. Sua ação, a princípio, não produz nada
em termos materiais, não tem um fim exterior, mas suas características permitem com que o homem
desfrute, naquele momento, uma ação prazerosa por si própria.
A idéia da brincadeira e de sua importância no desenvolvimento do ser humano acompanha as
atividades do Instituto, começando já pelo seu nome: Brincante. Assim como explicita sua estreita
relação com a cultura popular brasileira.
Tomando como ponto de partida um lugar como esse, pioneiro no trabalho com as
manifstações populares na cidade de São Paulo, foi necessário buscar, para além das trajetórias de
seus fundadores, os ideais aos quais suas influências estavam atreladas. Entendendo este contexto
foi possível elaborar questões que iriam nortear as conversas com aqueles que chamei de "pilares do
teatro escola". E foi a partir delas que foi possível compreender um olhar "Brincante" para o mundo,
entendendo a construção de sua pedagogia e sua inserção na sociedade contemporânea.
Este trabalho então, busca revelar uma visão sobre a cultura popular brasileira, inserida no
contexto histórico da discussão nacional sobre o tema, além de entender como essa visão busca se
propagar dentro de um espaço como o de um teatro escola. Como a interpretação das manifestações
populares é trabalhada na construção de uma pedagogia que busca, em seu limite, a transformação
do indivíduo.
2. O BRINCANTE
A história do hoje chamado Instituto Brincante começou em 1992 em São Paulo, no
bairro Vila Madalena. Buscando um espaço onde pudessem ensaiar e criar seus espetáculos a
dupla de artistas, Antonio Nóbrega e Rosane Almeida, encontrou na Rua Purpurina uma
antiga fábrica de lustres que depois de alugada e reformada passou a abrigar o Espaço
Brincante. Nele a dupla experimentava as possibilidades que surgiam inspiradas nas diversas
manifestações artísticas populares. Dessa pesquisa nasceram espetáculos, esquetes e muitos
curiosos.
O Espaço então foi aberto ao público com um espetáculo de mesmo nome: Brincante
(1992). Os dois galpões da antiga fábrica ganharam ares de teatro, com palco, platéia e salas
de dança, e dessa maneira o Brincante que antes era apenas Espaço virou Teatro. Nele
aconteceram temporadas de espetáculos como Figural (1993); Segundas Histórias (1994); e
Na Pancada do Ganzá (1996).
Os espetáculos apresentados despertaram o interesse do público, que aumentava.
Um grupo de pessoas se organizou e convocou a dupla como professores. Dessa
iniciativa nasceu o curso AArte do Brincante. E com esse curso o Teatro agregou ao seu
definir a palavra escola. Em 1995 o Brincante virou Teatro Escola.
Com o conselho e ajuda da pedagoga Maria Amélia Pereira, a Péo, no ano seguinte o
curso ganhou um outro foco: educadores. Para ela, em uma das respostas concedida à
entrevista feita para a revista do Brincante (2009), as escolas não lidam adequadamente com
a cultura brasileira.
E esse afastamento é fruto de uma ignorância sobre a cultura
brasileira. Ao mesmo tempo, há uma desvalorização por se tratar
de manifestações do povo – e o povo, no Brasil, é identificado com
a pobreza. A elite e a mídia são comprometidas com o poder
econômico, que folcloriza perjorativamente a nossa cultura como
se esta precisasse mendigar o reconhecimento de sua existência.
Nosso país carrega uma forte dose de colonialismo cultural. Nas
escolas, é muito comum a preferência por modelos estrangeiros de
educação em detrimento da experiência de educadores brasileiros.
Isso é muito triste, porque é fruto de uma visão mesquinha que
desconhece a importância do povo como guardião de arquétipos
importantes de nossas raízes. A cidadania não se constrói sem a
inserção da cultura do povo. (ALMEIDA, 2009. pp 12).
E o Teatro Escola passou a trabalhar, inclusive e principalmente, para a formação de
educadores brincantes, que soubessem cantar, dançar, tocar, contar histórias, construir
adereços e brinquedos. Educadores que conseguissem conceber as manifestações populares
como instrumentos para o ensino.
“Outros profissionais foram chamados para compor um currículo que abrigasse a
mesma multiplicidade de linguagens” (ALMEIDA, 2009. pp 10) presentes nas manifestações
artísticas populares. “O curso original deu então lugar para A Arte do Brincante para
Educadores, que capacita o professor com linguagens da cultura popular brasileira e instiga à
reflexão sobre o ensino tradicionalmente oferecido a crianças e jovens.” (ALMEIDA, 2009.
pp 10). Pelos treze anos de existência do curso para educadores, ele foi se aperfeiçoando e
figurou como foco do Teatro Escola Brincante.
Em 1998 foi organizado o I Encontro com a Dança e a Música Brasileiras que
consolidou o Brincante como ponto de encontro entre o “público de São Paulo e os mestres e
grupos populares vindos de várias partes do país.” (site).
A quantidade de atividades oferecidas pelo Brincante aumentou. Foram organizados
cursos de percussão e danças brasileiras; curso para jovens brincantes; oficinas das mais
variadas manifestações artísticas populares; aulas-espetáculos; além do curso AArte do
Brincante para Educadores e dos espetáculos que continuavam a acontecer. “Em 2000 o
Brincante consolidou suas múltiplas vocações e, para isso, tornou-se Instituto Brincante, com
um estatuto que permite a ampliação das suas ações e formas de gerir recursos e patrocínios
necessários à continuidade dessas atividades.” (site).
No ano de 2005 o curso AArte do Brincante para Educadores foi selecionado pelo
Ministério da Cultura e durante um período de três anos integrou o Programa Nacional
Cultura Viva fazendo do Brincante um Ponto de Cultura e atendendo a educadores da rede
pública de ensino.
Durante todos esses anos o Brincante estabeleceu diversas parcerias com empresas e
institutos. Dentre elas estão: Instituto C&A, Philips do Brasil, Fundação Vitae, Itaú Cultural,
Instituto Alana, Ministério da Cultura, Instituto Votorantim e IMPAES (Instituto Minidi
Pedroso de Arte e Educação Social).
2.1 O BRINCANTE EM SUA MAIORIDADE
No ano em que completa dezoito anos de existência, o Instituto Brincante passa por
um processo de remodelagem institucional, reorganizando toda a sua equipe e
consequentemente o funcionamento do espaço. Até então a organização das atividades, a
elaboração e manutenção de projetos e a produção dos eventos do teatro ocorriam de uma
forma tal que foi possível manter o Instituto, mas sem atingir o potencial que ele pode
oferecer.
Atualmente, com a clara intenção de se consolidar como uma Escola de Educação
Artística Brasileira, o Brincante passa por um “processo de fortalecimento institucional,
através da introdução de processos de gestão organizacional, da sistematização de seu método
educacional e do desenvolvimento de estratégias de articulação institucional para viabilizar a
sustentabilidade de suas atividades.” (documento institucional – Relatório de atividades 2010
v2).
Durante esse processo construiu-se uma equipe que conta pessoas direcionadas para
cada área específica de atuação: coordenação, gestão institucional, financeira, gerência e
produção. Já perante o contrato social do Instituto, que manteve o nome de Teatro Escola, a
organização se dá da seguinte maneira:
Presidente: Antonio Nóbrega; vice presidente: Maria Amélia Pereira; tesoureiro:
Eduardo José Afonso; conselheiros: Alais Avila, Âmbar de Barros, Ana Lucia de Mattos
Baretto Villela, Anna Helena Mariani Bittencourt, Enilton Sérgio Tabosa do Egito, Marcos
Antonio Magalhães, Suzana Emilio de Moraes.
* * *
Durante o ano de 2010 o Instituto mantém a sua parceria com o Instituto C&A e
iniciou uma nova com o Instituto Alana. O primeiro apoia hoje, o curso A Formação de
Jovem Brincante, enquanto o segundo se posicionou como parceiro no processo de
reorganização administrativa do Brincante em busca de sua sustentabilidade.
A escola disponibiliza para o público, além dos chamados cursos livres, nos quais
estão inseridos: Danças brasileiras, Dança afro-brasileira e Percussão brasileira; cursos
contínuos como A Arte do Brincante para Educadores e A Formação de Jovem Brincante, os
quais contam com estrutura, equipe e metodologia específicas e que são o principal foco de
desenvolvimento da escola.
O primeiro deles, A Arte do Brincante para Educadores, tem como público alvo
educadores/professores, principalmente da rede pública de ensino. Através de uma estrutura
modular o curso pretende apresentar e oferecer elementos da arte e da cultura popular
brasileira, aos professores da educação básica, para gerar reflexão e possibilitar a criação de
novas abordagens pedagógicas.
O curso iniciado no ano de 1996, tem como objetivo principal preencher uma lacuna no
sistema atual de ensino.
Durante um período de oito meses, dos quais cada mês é dedicado a um módulo, os
educadores frequentam aulas semanais com duração de quatro horas, sendo que todos os
encontros são precedidos por um trabalho corporal.
O curso se inicia com o módulo de uma de suas fundadoras, a pedagoga Maria Amelia
Pereira, a Peo - Por uma Educação da Sensibilidade. Procedida pelo módulo Danças
Brasileiras, de Rosane Almeida; Cantos e Hisórias Tradicionais, de Cristiane Velasco; Figuras
e Adereços dos Folguedos Populares, de Cris Cruz; Música das Manifestações Populares da
Cultura Brasileira, de Eugenia Nóbrega; Iniciação a Cultura da Crinça, de Lydia Hortélio; A
Palavra Poética, de Lucilene Silva e convidados; e Construção de Brinquedos de Adelson
Murta.
Cada módulo, com diferentes objetivos, parecem, juntos, abraçar um vasto repertório de
linguagens artísticas disponibilizando para os educadores um amplo material para recriações
e reflexões.
Já o curso A Formação de Jovens Brincantes, tem como público alvo jovens, entre 15
e 25 anos, “selecionados a partir da análise de sua situação sócio-econômica e educacional e
da presença de vínculo com ações educacionais e sociais, em comunidades de baixa renda.”
(documento institucional – Relatório de atividades 2010 v2). Tem como objetivo principal a
formação artística e educacional multidiciplinar que percorre o repertório de cantos, danças,
histórias e ritmos da cultura popular brasileira. Instrumentalizando, a partir disso, esses
jovens para o desenvolvimento de criações artísticas e de novas formas de ações e interações
com as suas realidades.
Com dois anos de duração o curso se estrutura da seguinte maneira: no primeiro ano
com uma aula semanal de três horas, e no segundo ano com três aulas semanais de três horas.
No ano de 2010 um terceiro ano começou a estruturar-se de maneira a dar continuidade na
formação, criando um núcleo pedagógico com objetivos de acompanhar, registrar, e
identificar uma metodologia das atividades do Instituto.
De forma geral, cada aula possui uma estrutura básica, composta por quatro fases:
“a. Aquecimento - trabalho de conscientização corporal, jogos e exercícios para facilitar a
assimilação da seqüência do tema proposto.
b. Apropriação - dos conteúdos presentes nas manifestações populares, tais como passos,
manobras coreográficas, canções, ritmos e jogos dramáticos, visando sua aprendizagem e
desdobramento.
c. Criação - conexões das linguagens estudadas com os materiais pessoais e dos grupos, para
o desenvolvimento de processos criativos.
d. Reflexão - sobre o conteúdo da aula e desaquecimento do corpo.” (documento institucional
– Relatório de atividades 2010 v2).
O primeiro ano do curso é voltado para o contato inicial do participante com o
universo da cultura popular brasileira. Nele se pretende desenvolver o reconhecimento desta
referência coletiva como possível elemento para uma construção do presente.
O segundo ano é direcionado para um refinamento dos conhecimentos apreendidos até
então, encaminhando os alunos para o desenvolvimento de sua autonomia e da criação de
aulas e números artísticos.
Além disso, durante todo esse período, ocorrem eventos mensais no Instituto, abertos
ao público, mas que complementam a formação dos jovens, como:
“a. Rodas - encontros mensais com debates, palestras, vídeos e outras vivências intelectuais,
ministrados em duas horas, que auxiliem na assimilação dos conteúdos teóricos sobre os
temas que relacionam as manifestações populares à brasilidade.
b. Oficinas – imersões práticas para o aprofundamento das técnicas de canto, dança, teatro e
percussão, desenvolvidas durante um final de semana por mês, com carga horária de doze
horas.
c. Sambadas – o Teatro Escola Brincante oferece um espaço mensal para a apresentação de
jovens artistas. Um espaço aberto e gratuito para que surjam novos talentos e para que as
pessoas da comunidade do entorno, família e amigos também participem, vivenciem e
experimente a arte do brincante.” (documento institucional – Relatório de atividades 2010
v2).
Em todos os cursos oferecidos pelo Instituto, arte e educação caminham sempre juntas,
explicitando a crença de seus fundadores evidenciada na fala de Antonio Nóbrega: “a boa arte
educa. E a boa educação deve ser artística.” (ALMEIDA, 2009. pp 11).
Segundo relatório de atividades do Brincante do ano de 2008, os cursos querem
"oferecer a formação de intérpretes e de educadores para que aprendam a "ver e ouvir o
Brasil" através do nosso vasto repertório de danças, cantos, histórias, poesias, artes plásticas,
brinquedos e brincadeiras".
3. TRAJETÓRIAS. OS PILARES DO TEATRO ESCOLA.
A história do Instituto Brincante, suas atividades e sua ideologia não podem ser
separadas da trajetória e do fazer artístico de seus fundadores Antonio Nóbrega e Rosane
Almeida, assim como de sua orientadora pedagógica Maria Amélia Pereira, a Peo.
* * *
Nascido no Recife, Antonio Nóbrega se iniciou na música ainda cedo. Deu inicio a três
diferentes cursos de graduação (Direito, Letras e Música), não chegando a concluir nenhum.
Tocando violino integrou a Orquestra de Câmara da Paraiba e a Orquestra Sinfônica do
Recife, até Ariano Suassuna, escritor e dramaturgo pernambucano, lhe convidar a integrar o
Quinteto Armorial. O quinteto fazia parte do movimento Armorial que foi oficialmente
lançado no dia 18 de outrubro de 1970 com um concerto e uma exposição de artes plásticas
no Patio São Pedro (no centro antigo da cidade do Recife).
O movimento tinha como proposta a criação de uma arte brasileira erudita criada a
partir das raízes populares da cultura nacional. Sua realização tinha como base o estudo das
intersecções entre as manifestações da cultura popular nordestina com a cultura ibérica
renascentista da qual provinham, passando pela música, literatura, cinema, dança, arquitetura,
dramaturgia, artes plásticas e etc. Durante os quase dez anos que integrou o movimento
Armorial, Nóbrega passou a se interessar não só pela música, mas por todo o universo dos
artistas populares, e foi a partir dessas vivências e referências que ele encontrou um vasto e
rico material para criar seus próprios espetáculos. Nóbrega, em uma entrevista cedida a
revista Achei!, quando questionado sobre o significado da experiência no Quinteto Armorial
para a sua formação, ele responde: "Teve um papel grande. A partir dai fui reconhecer o
território da cultura popular, que me era desconhecido, a cultura brasileira como um todo. Foi
um abridor de janelas." (Revista Achei! - 2010)
Misturando as várias linguagens artísticas como instrumentista, cantor, dançarino, ator
e compositor, no ano de 1976 ele apresenta seu primeiro espectáculo "Bandeira do Divino",
acompanhado de mais de vinte intérpretes. Ainda em Recife ele cria e apresenta os
espectáculos: "AArte da Cantoria" e "O Maracatu Misterioso".
No ano de 1983 Antonio Nóbrega, já casado com Rosane se muda pra São Paulo, onde
continua seu trabalho. Na capital paulista ele cria "Mateus Presepeiro" (1985); "O Reino do
Meio Dia" (1989); "Figural" (1990); "Brincante" (1992); "Segundas Histórias" (1994); "Na
Pancada do Ganzá" (1995); "Madeira que Cupim Não Rói" (1997); "Pernambuco Falando
para o Mundo" (1998); "O Marco do Meio Dia" (2000); "Lunário Perpétuo" (2002); "Nove
de Frevereiro" (2006); "Passo" (2007); e "Naturalmente - Teoria e Jogo de uma Dança
Brasileira" (2009).
No ano de 1986 volta para o meio acadêmico, mas agora como professor na
Universidade de Campinas (UNICAMP). Convidado para ser um dos fundadores do curso de
Dança da instituição, leciona o curso de Danças Brasileiras do qual resultará uma pesquisa de
campo pelo Nordeste do país com o objetivo de registrar algumas manifestações populares da
região procurando atentar não apenas a dança, mas o todo dessas manifestações.
Sua formação como artista passou pelo popular e pelo erudito. Teve contato com os
mestres populares, dançarinos, palhaços, instrumentistas e cantores, assim como aprendeu
com figuras como Luis Soler - músico e professor de violino - Maria Eugenia Popova -
também musicista e professora de violino - Klauss Vianna - importante bailarino, coreógrafo
e professor, criador um método próprio de consciência corporal e trabalho com o movimento
- e o palhaço Dimitri (Suiça), entre outras experiências como a passagem pela Escola
Superior das Artes do Circo em Châlons-sur-Marne (França). Da união de todas essas
referências atrelada a expressão de outros significados e inquietações particulares surgem
todos os seus trabalhos. Numa entrevista concedida à pesquisadora Ana Paula Lourenço de
Sá, Nóbrega diz:
(…) o meu encontro com a cultura popular se deu através do
convite de Ariano Suassuna para que eu integrasse o Quinteto
Armorial, e eu aprendi muito bem a lição, ou seja, a lição para
mim maior é o seguinte: é que a cultura popular (…) tem um
significado, ela tem uma função, na medida em que eu consiga
dinamizá-la, ou seja, sem perder aquilo que lhe é essencial, eu
conseguir ainda incorporar alguns outros significados. (…)
Recriar. (…) E os meus padrinhos, assim, de Crisma dessa postura
são Guimarães Rosa, Villa-Lobos, os grandes sambistas
brasileiros.
* * *
Rosane Almeida é natural de Curitiba, e aos 16 anos se mudou para a cidade do Recife,
onde conheceu Antonio Nóbrega com quem se casou e começou a trabalhar. Foi ele quem lhe
levou, pela primeira vez, a um folguedo de Cavalo-marinho. Escrevendo sobre sua
experiência de vida para o programa de seu espetáculo Adeodata ela diz:
Eu, uma pós adolescente curitibana, não tive olhos para ver a
complexidade dos passos, a originalidade das músicas, a
exuberância teatral daquilo tudo. O que me chamou a atenção
foram os homens de rostos fortes, feições rachadas pelo sol e pela
aspereza da vida, vestindo saias, dançando, cantando e,
principalmente, brincando.
Nesses últimos vinte anos, convivendo com mestres, folguedos,
brincantes, e já bem seduzida pela dança, pela música e pelos
procedimentos teatrais, coreográficos e ritualísticos, sempre
presentes, o que mais me fascina - e o que se renova a cada
encontro - (…) é a qualidade dos seres humanos que se colocam a
serviço desses autos. (ALMEIDA, 2006. pp.3).
Entre os anos de 1983 e 1993 estudou arte circense na Escola de Circo Picadeiro em
São Paulo, na Escola Superior das Artes do Circo em Châlons-sur-Marne (França) e na
Scuola de Teatro Dimitri em Versio (Suíça).
À sua formação circense somou estudos e atuações em dança, teatro e música numa
constante investigação das manifestações populares brasileiras. E, junto a Antonio Nóbrega,
criou e participou como atriz - dançarina dos espectáculos: "Brincante"; "Segundas
Histórias"; "Na Pancada do Ganzá"; "Madeira que Cupim Não Rói"; "Pernambuco Falando
para o Mundo"; "O Marco do Meio Dia"; "Lunário Perpétuo"; e "Nove de Frevereiro".
No ano de 2004 criou seu espetáculo solo “A Mais Bela História de Adeodata” o qual
lhe rendeu a publicação de livro homônimo pela editora Salamandra no ano de 2006.
Juntos, durante os anos de 2005 e 2007, Rosane e Nóbrega viajaram de norte a sul o
Brasil numa pesquisa e documentação das danças populares brasileiras que resultou na serie
documental Danças Brasileiras, exibida pelo canal Futura.
Durante anos aprenderam com os mestres populares, fizeram aulas, participaram das
brincadeiras e leram uma vasta bibliografia (hoje organizada no Centro de Documentação -
CeDoc - do Instituto) que desse suporte teórico às suas pesquisas práticas. Foram
historiadores, sociólogos, poetas, dançarinos, atores, romancistas que compuseram o histórico
"acadêmico" dos fundadores do Instituto Brincante. Sendo ressaltados entre eles três
importantes referências: Mario de Andrade, Darcy Ribeiro e Edgar Morin.
Como fica claro na trajetória de ambos, a cultura teve um papel importante não só
como instrumento de trabalho, mas também como maneira de pensar o mundo.
Ao Instituto Brincante ficou a "tarefa" de centralizar e organizar todos esses anseios
que os levaram a criar seus espetáculos, mas nesse caso, objetivando o ensino.
* * *
Nascida em Salvador, Bahia, Maria Amélia Pereira, a Peo, cresceu em uma família
grande e aberta para estímulos sobre o conhecimento da cultura brasileira e para com uma
"consciência social e cultural comprometida com as nossa raízes" (CRUZ, 2005. pp 27).
Formou-se no magistério ainda em sua cidade natal onde iniciou sua história de
professora. Durante esse período teve a possibilidade de conhecer a Escola Parque de
Salvador. Uma experiência na área da educação criada pelo professor Anísio Teixeira, em
uma escola da rede pública.
Foi a partir desse contacto que Péo decidiu por ingressar na área da educação.
Aos 17 anos então, abriu em Salvador o primeiro lugar de atendimento de crianças
entre 2 e 7 anos, onde elas pudessem brincar num espaço de natureza, o qual acreditava ser o
ideal para crianças dessa faixa etária. Essa relação com a natureza foi se consolidando desde
o período, entre seus 12 e 17 anos, em que participava de atividades com crianças em um
bairro pobre de Salvador, e percebeu que o convivio com a natureza parecia algo necessário
para que a brincadeira pudesse ocorrer de uma forma plena, "como uma linguagem universal
de conhecimento".(CRUZ, 2005. pp 28).
Foi nesse periodo que conheceu Agostinho da Silva, "mestre e amigo" (CRUZ, 2005.
pp 28), segundo ela. Com ele pode refletir sobre o "ser brasileiro" e sobre a "essência do ser
criança" (CRUZ, 2005). Além disso teve contato com o método de alfabetização de Paulo
Freire.
A partir daí decidiu cursar pedagogia na Universidade Nacional de Brasilia buscando
pessoas que estivessem pensando um caminho novo para a educação brasileira…o que não
aconteceu. Veio então para São Paulo, em 1963 para conhecer experiências novas que
aconteciam em escolas tanto públicas como particulares.
Durante um curso de formação de professores no método Montessori-Lubienska, Péo
foi convidada a participar, como estagiária, da Escola Experimental Vera Cruz. E, chegando a
ser sócia fundadora, participou da experiência durante 16 anos. Durante essa experiência ela
pode participar de um processo de pesquisa que ocorria na praxis diária da escola, na
construção constante de uma reflexão sobre a educação fundamentada na relação entre
professores alunos e pais. Foi nessa época que conseguiu iniciar o curso de pedagogia na
PUC-SP. E foi relacionando essas atividades que conduzia paralelamente, que pode perceber
o "descompasso existente entre o sistema teórico presente no curso de pedagogia e a
realidade prática da educação brasileira dentro do sistema de ensino das escolas." (CRUZ,
2005. pp 29).
Durante a década de 1970 ocorre uma reforma no ensino que auxiliou para a
burocratização do sistema de educação e consequentemente para a degradação qualitativa de
seus conteúdos e experiências. A partir disso Péo se distanciou das escolas e foi buscar
experiências fora delas. Mudou-se para Brasilia onde pode trabalhar com crianças portadoras
de deficiência física na Comunidade Terapeutica do Hospital Sarah Kubitschek, e refletir
sobre a prática do professor, o que lhe rendeu a publicação de O Professor, uma pessoa
guardada e aguardada.
Iniciou, ainda em Brasília, uma pesquisa sobre o repertório gestual das brincadeiras
espontâneas das crianças, que aconteciam fora das escolas. Essa experiência lhe trouxe a
possibilidade de entender o incômodo que sentia frente as estruturas de ensino. Percebeu que
as escolas, privilegiando uma "linguagem estruturalista, um cientificismo" (CRUZ, 2005. pp
30), ignoravam a espontaneidade e a curiosidade presentes nas crianças e que indicavam um
processo de conhecimento orgânico.
Dois anos depois, voltou para Salvador onde, junto a também educadora Lydia Hortélio
dentre outros profissionais, criou um "espaço público educacional dentro de um
parque"(CRUZ, 2005. pp 30), como uma experiência que retomava as reflexões de Anísio
Teixeira e buscava caminhos para uma educação "criativa e libertadora." (CRUZ, 2005. pp
30).
De volta a São Paulo, retomou o trabalho na Escola Vera Cruz, até que quis dar
continuidade à pesquisa de brincadeiras de rua na periferia da cidade. Foi então para uma
comunidade na periferia do município de Carapicuiba onde documentou detalhadamente
vários brinquedos e brincadeiras que ali encontrou. E viajando por várias partes do Brasil
pode perceber que a maioria das brincadeiras aconteciam em todos os lugares, afirmando para
seus trabalhos a importância desse brincar como o desenvolvimento de um processo de
conhecimento.
Com a orientação do Professor Petho Sándor para essa pesquisa, Péo percebeu o ato de
brincar como um "processo espontâneo de auto-regulação do desenvolvimento da criança"
(CRUZ, 2005. pp 31).
Entre os anos de 1985 e 1990 ela foi convidada pela International Playing Association,
uma organização internacional sobre o direito da criança a brincar, para fazer parte de seu
Conselho devida as inúmeras apresentações de diferentes trabalhos que vinha mostrando em
conferências nacionais e internacionais. Nessa mesma época foi convidada também a fazer
parte do conselho do International Play Journal e para desenvolver o treinamento de
professores de creches como iniciativa das Secretarias de Educação dos Estados de São
Paulo, Rondonia, Salvador, Belo Horizonte dentre outras cidades do interior.
A partir de todas as suas experiências Péo então resolveu abrir um espaço - a Casa
Redonda - que pudesse abarcar a experiência de uma educação que vinha se afirmando para
ela ao longo de todos esses anos e, principalmente, através do contato com as crianças.
Aquilo que ela chamou de uma educação da sensibilidade.
Lidando com crianças de 2 a 7 anos o "trabalho na Casa Redonda está voltado para a
descoberta da linguagem do espontâneo através do universo das brincadeiras das
crianças."(CRUZ, 2005. pp 32).
Seguindo esse mesmo objetivo nasceu o curso para educadores no Instituto Brincante, o
qual ajudou a fundar no ano de 1995 "Juntamente com outros profissionais que buscam no
encontro com a atividade lúdica, o fio da meada para uma educação que afirme no homem o
seu caráter eminentemente criador."(CRUZ, 2005. pp 32).
No ano seguinte Péo inicia um trabalho com as crianças do município de Carapicuiba
criando o que hoje eles chamam de uma Escola Cultural, voltada para o ensino de danças,
cantos, histórias e brincadeiras, com a intenção de construir um caminho para o acesso à
cultura brasileira através de uma formação que lhes permita descobrir a si mesmas e integrar-
se criativamente à comunidade.
Atualmente Maria Amélia Pereira desenvolve, durante o curso A Arte do Brincante
para Educadores, o módulo Educação da Sensibilidade no qual compartilha com os
participantes histórias que foi experenciando ao longo dos anos como educadora. As histórias
costumam narrar fatos interessantes e muitas vezes surpreendentes de seu convívio com as
crianças, tentando por esse caminho mostrar aos educadores sua simples "metodologia" sem
receita: deixar as crianças livres para brincar.
4. UM RÁPIDO PANORAMA HISTÓRICO DA DISCUSSÃO SOBRE O NACIONAL
POPULAR
A discussão em torno do nacional popular, independentemente da vertente que seguiu,
esteve sempre atrelada a uma busca pela identidade nacional, ou seja, por uma "construção
simbólica" (ORTIZ, 1991. pp 183) que seria a referência mais autêntica sobre o Brasil. Ao
longo da história essa construção variou de acordo com os interesses políticos atrelados aos
grupos que a construíram, e sempre estabeleceu uma relação com o exterior. Ou seja, o
Brasil, assim como os países que compõem o chamado, nas palavras de Ortiz, "Terceiro
Mundo", buscaram estabelecer suas identidades sempre em confronto com o que era
estrangeiro, com o que vinha "de fora", sempre com um posicionamento anti imperialista
bastante definido.
Segundo Renato Ortiz, existem duas vertentes sobre o debate do nacional-popular. A
primeira delas teve início com os estudos de Silvio Romero e Celso Magalhães durante
século XIX. Nesse período, tanto Europa como Estados Unidos demonstravam bastante
interesse sobre a chamada cultura popular, e foi na rabeira desse movimento que alguns
intelectuais e artistas brasileiros começaram a se interessar pelo tema.
Segundo essa visão, "popular significa tradicional, e se identifica com as manifestações
culturais das classes populares, que em princípio preservariam uma cultura "milenar",
romanticamente idealizada pelos folcloristas. (…) o popular é visto como objeto que deve ser
conservado em museus, livros e casas de cultura, alimentando o saber nostálgico dos
intelectuais tradicionais" (ORTIZ, 1991. pp 160).
Assim como ocorreu em diferentes países da Europa, no Brasil os estudos folclóricos e
o desenvolvimento desse pensamento se deu a partir de uma ligação bastante forte com a
questão nacional e a busca por uma identidade que fosse comum a todos os indivíduos da
nação. A cultura popular serviu então de alicerce principal na busca por aquilo que seria o
mais "verdadeiramente" brasileiro.
Para Ortiz, os estudos da cultura popular também passam pela relação de oposição entre
o regional e as elites que formam o Estado centralizador. Expondo por tanto, que não seria
mera coincidência a predominância dos folcloristas em regiões periféricas do país. Segundo
suas palavras "(…) no momento em que a elite local perde o poder no processo de unificação
nacional, tem-se o florescimento do estudo da cultura popular." (ORTIZ, 1991. pp. 162).
A segunda visão sobre o nacional-popular, localizada na década de 1950, abrangeria
diversos exemplos como: o ISEB, os Centros Populares de Cultura, o Movimento de Cultura
Popular no Nordeste, entre outros, que podendo ser bastante distintos entre si, tem em comum
o seu viés extremamente politizado. A cultura popular, para essa vertente, seria, em oposição
ao romantismo folclorista, uma ação política atrelada às classes subalternas, uma forma de
conscientização e consequentemente transformação da sociedade.
De acordo com essa colocação, segue um pequeno traçado pela história de uma
construção intelectual, política e artística sobre o nacional popular.
4.1 OS PRIMEIROS PASSOS
Silvio Romero, Nina Rodrigues e Euclides da Cunha foram autores do fim do século
XIX que podem ser considerados como precursores das Ciências Sociais no Brasil. Foi com
eles também que se iniciou uma discussão sobre o nacional.
Entre fins do século XIX e inicio do século XX deu-se, na Europa, a transição entre o
período romântico para a construção e consolidação de teorias como o positivismo, o
darwinismo social e o evolucionismo. Foi na esteira dessa transição que os intelectuais
brasileiros passaram a pensar o país e a sociedade nacional. Nesse momento, mais
especificamente entre 1888 e 1914, dois conceitos se tornaram importantes: raça e meio.
A raça estaria ligada ao entendimento da construção da sociedade brasileira a partir de
três pilares raciais: índios, negros e brancos. Sendo esses últimos os mais importantes e
"superiores".
O meio seria uma maneira de tentar vincular o entendimento do desenvolvimento da
sociedade brasileira com as alterações da região como as condições climáticas, geográficas,
botânicas e etc.
São esses dois conceitos que auxiliam os intelectuais a construir uma "identidade" que
distingue o nacional do estrangeiro:
"Ser brasileiro significa viver em um país geograficamente
diferente da Europa, povoado por uma raça distinta da europeia.
(…) Meio e raça traduzem, por tanto, dois elementos
imprescindíveis para a construção de uma identidade brasileira: o
nacional e o popular." (ORTIZ, 1994. pp 17).
Sendo assim: "A mestiçagem, moral e étnica, possibilita a "aclimatação" da civilização
europeia nos trópicos." (ORTIZ, 1994. pp 21), e é isso que, segundo os intelectuais desse
período, diferencia aquilo que é brasileiro daquilo que não o é.
4.2 A MESTIÇAGEM EM UM BRASIL "MODERNO"
Até o final do século XIX a escravidão colocava impecílios para o entendimento do
Brasil como um todo. Desconsiderar a participação do negro na construção de uma identidade
nacional tornava as análises da época um tanto incompletas. Só após as transformações
sociais decorrentes do processo abolicionista é que os intelectuais passam a considerar o
Brasil como fruto da mestiçagem entre índios, negros e brancos. Mesmo assim o caráter
mestiço da identidade nacional, em suas interpretações, carregava o fardo negativo dessa
mistura. O mestiço era considerado um sujeito pouco racional, sem o ímpeto do trabalho,
preguiçoso entre outros adjetivos. Em consequência disso, os intelectuais desse período de
transição se deparavam com dificuldades em entender a sociedade que vinha se constituindo,
tanto com seus pontos negativos como positivos.
O Brasil passava por um período de transformações profundas. O "processo de
urbanização e industrialização se acelera, uma classe média se desenvolve, surge um
proletariado urbano." (ORTIZ, 1994. pp 39). As antigas interpretações do nacional passam a
não dar mais conta da realidade e surgem interpretações como as de Gilberto Freyre, Sérgio
Buarque de Holanda e Caio Prado Jr. O mestiço é, pela primeira vez, visto em sua
positividade e se consolida como o nacional. O conceito de raça é substituído e dá lugar ao
conceito de cultura, muito influenciado pelo culturalismo de Franz Boas. As interpretações
sociais se distanciam do aspecto biológico carregado pela idéia de raça e abre espaço para
análises mais ricas da sociedade.
Na década de 1930, o Estado Novo então se apropria dessa identidade mestiça para, a
sua maneira, colocá-la em função do desenvolvimento de um Brasil "moderno".
* * *
Foi apenas no início do século XX, com o Movimento Modernista, que veio a tona uma
visão da sociedade brasileira nunca antes expressada. Na década de 1920, na cidade de São
Paulo, o movimento se instaurou com a reunião de jovens intelectuais e artistas que se
propunham a uma redescoberta do Brasil. O Movimento Modernista investiu na procura do
"exótico" de seu país para tentar renovar e aproximar as artes e a cultura, do povo brasileiro,
algo que antes se achava restrito ao grupo elitista da sociedade.
Segundo Roberto Barbato Jr. " A transformação operada pela geração modernista tem
seu alicerce calcado no modo pelo qual se definem as formas de articulação cultural entre o
património nacional e o universal." (BARBATO, 2004. pg 131). As influências externas
vindas das vanguardas européias eram assimilidas de maneira a "adequá-las" às
características da cultura nacional, nos termos modernistas, essas influências deveriam ser
"deglutidas" de forma crítica para assim recriá-las com uma feição brasileira.
Uma das principais figuras do movimento foi Mario de Andrade. Nascido na cidade de
São Paulo em 1893 ele pesquisou amplamente a cultura popular brasileira. Enquanto
desenvolvia estes seus estudos é que se envolveu com os jovens artístas que viriam a
participar do Movimento Modernista. Mas passado o fervor e o auge do movimento, na
década seguinte Mario de Andrade entra para a política como diretor do Departamento de
Cultura e Recreação da Prefeitura Municipal de São Paulo.
Seguindo os mesmo ideais do modernismo, tal departamento tinha como principal
objetivo "levar a termo a edificação da nacionalidade" (Roberto Barbarato Jr, pg. 15)
brasileira, além de divulgar para todo o país a cultura popular, entendida como nacional. Os
intelectuais que fizeram parte dessa experiência desejavam compreender melhor a realidade
nacional para assim propor caminhos para o desenvolvimento do país. Entre 1935 e 1938 o
Departamento pode então ter a experiência de implementar políticas públicas condizentes
com suas intenções, além de, em 1938 iniciar, encabeçada pelo seu diretor, a missão de
pesquisas folclóricas. Com o intuito de catalogar manifestações da cultura popular brasileira
Mario de Andrade reuniu uma equipe para viajar para as regiões norte e nordeste do país. O
que resultou em um vasto acervo de registros em audio, vídeo, imagem e escritos que ainda
hoje impressionam pela sua abrangência em relação a quantidade de manifestações
"catalogadas" e pelo cuidado na sua qualidade detalista.
4.3 UMA VERTENTE ENGAJADA POLITICAMENTE
A interpretação de cultura do início do século é, na década de 1950, remodelada pelos
intelectuais do Iseb (Instituto Superior de Estudos Brasileiros), que, distantes da influência do
culturalismo americano, querem construir uma outra teoria do Brasil. Sua idéia de cultura é
influenciada pela filosofia e sociologia alemãs que entendem esse conceito como
"objetivações do espírito humano. Mas eles insistirão sobretudo no fato de que a cultura
significa um vir a ser." (ORTIZ, 1994. pp 45). Nesse sentido a cultura passa a ser
interpretada como um elemento de transformação social.
O Instituto, criado no ano de 1955, unia intelectuais e pessoas do governo, e esteve
sempre subordinado ao Ministério da Educação e Cultura. Foi um centro de "formação
política e ideológica, de orientação democrática e reformista." (TOLEDO, 2005. pp 11).
Intelectuais de diferentes orientações teóricas debatiam para a construção de um projeto
ideológico comum para o país. O incentivo a um "nacional desenvolvimentismo" (TOLEDO,
2005. pp 11) esteve não em função do Estado que na época se estabelecia - o período JK -
mas sim em total sintonia com o mesmo. O Brasil, assim como outros países do chamado
"Terceiro Mundo", começavam a se colocar frente ao quadro de dominação internacional
estabelecia desde a época colonial. Questões como da situação colonial e da alienação
tomavam força nas discussões da intelectualidade brasileira para a construção do nacional.
Anos depois, o Iseb se fragmentou e seus intelectuais perceberam que o nacional
desenvolvimentismo serviu apenas para o crescimento econômico do país, enquanto as
desigualdades sociais históricas permaneciam as mesmas, revelando assim o caráter da
ideologia como representação de uma classe dominante. Mesmo assim o Instituto esteve
conectado com as lutas sociais entre as décadas de 1950 e 1960, tanto que, chegada a ditadura
militar, sua sede foi vandalizada e destruída.
Essa construção de ideais políticos iniciada pelo Iseb influencia dois movimentos
distintos do inicio da década de 1960: o Movimento de Cultura Popular no Recife e o CPC.
O Movimento de Cultura Popular no Recife nasceu no ano de 1960 como uma
instituição sem fins lucrativos e que pretendia conscientizar as massas através da educação de
base. Eram apresentados espetáculos em lugares públicos, grupos artísticos eram organizados,
assim como cursos de arte, exposições e etc. Dentre os intelectuais que integravam o
movimento estavam: Paulo Freire, Ariano Suassuna e Francisco Brennand, que receberam o
apoio da prefeitura de Recife, assim como da UNE e do PCB, chegando a influênciar outras
iniciativas em diferentes Estados do país. Até que, com o golpe militar de 1964 o movimento
foi extinto.
O CPC - Centro Popular de Cultura - tinha objetivos e fases definidas para a
concretização dos mesmo. Para chegar às massas deveria-se passar por duas etapas: a
primeira delas estava voltada para a criação de uma intelectualidade que estivesse
comprometida com a realidade do país; enquanto a segunda estava voltada para a "união e
formação do povo não somente como recebedor, mas também como criador de cultura." (…)
"As principais atividades do CPC sempre estiveram vinculadas à produção de "cultura
popular". Entretanto, distinta da interpretação adotada pelos intelectuais folcloristas"
(GARCIA, 2004. pp 12) associada a uma perspectiva romântica na qual o popular estaria
ligado à manifestações culturais de classes populares que guardam uma cultura espontânea e
que deve ser conservada. Para os intelectuais do CPC a "arte popular revolucionária" é que
interessava. Era necessário que o artista brasileiro tomasse consciência da necessidade de
uma revolução, e que através de sua arte conscientizasse o povo, mesmo que as preocupações
estéticas ficassem subjulgadas às fórmulas de fácil compreensão, buscando assim atigir o
maior número possível de pessoas. Nesse caso, "o conceito de cultura popular se confunde,
pois, com a idéia de conscientização." (ORTIZ, 1994), e se coloca em oposição a uma
"cultura alienada" (ORTIZ, 1994).
Acreditando na construção de uma prática anterior à teoria, segundo as análises de
Renato Ortiz, o manifesto do CPC não pode ser considerado como um projeto previamente
elaborado mesmo tendo objetivos e fases bem definidas. De qualquer maneira a integração e
consequentemente a conscientização das classes populares não ocorreu, o que caracterizou
principalmente a atuação do CPC foi a mobilização de intelectuais e artistas da classe média.
Movimentos e iniciativas como essas indicam uma necessidade da intelectualidade em
não apenas expor uma visão e uma interpretação sobre a realidade brasileira, mas
experimentar maneiras de transformar essa realidade. O nacional e o popular passam a traçar
não só vertentes de construção de uma identidade como também apontar caminhos para a
transformação da sociedade brasileira.
4.4 O MARCO DE 1964
Segundo Renato Ortiz, o golpe militar de 1964 marcou a história brasileira tanto
política como economicamente, com consequências no campo da cultura. As transformações
que então se deram empurraram o país em direção a um modelo de desenvolvimento, de
"modernização" social, econômica e regionalmente desigual. Mesmo assim o estado
autoritário trabalhava com o conceito de "integração nacional". Uma integração que buscava
controlar a sociedade em prol da segurança nacional.
Nesse contexto a área cultural é estimulada e ganha dimensão nacional na medida em
que é tida pelo Estado como um meio para estabelecer a integração, sempre subordinada ao
Poder Nacional, ao Estado centralizador.
Entre o período de 1964 a 1980 o Brasil passa por um grande crescimento da produção,
da distribuição e do consumo de "bens culturais" (ORTIZ, 1994) mas sempre estimuladas e
controladas por órgãos do governo. O crescimento é acompanhado pela censura política e
ideológica.
No ano de 1966 é formado o Conselho Federal de Cultura (CFC) com o objetivo de
controlar as atividades culturais do país. A ideologia deste órgão considerava o Brasil como
mestiço, como fruto da miscigenação entre as três raças - como já havia sido determinado
pelos intelectuais anos antes. O Brasil seria uma "unidade na diversidade" (ORTIZ, 1994).
Porém o problema da questão da diversidade como característica de uma unidade nacional
está no fato de que ela pressupõe uma harmonia que encobre os possíveis e existentes
conflitos e contradições sociais. Indo ao encontro da intenção do governo militar em manter a
ordem e "preservar" a segurança nacional.
Assim como o aspecto mestiço foi importante para a construção ideológica do CFC, a
ideia de tradição também esteve bastante presente como prioridade nas suas ações. A cultura
brasileira entendida como um "conjunto de valores espirituais e materiais acumulados através
do tempo" (ORTIZ, 1994) e que, como um patrimônio, deveria ser preservada. Nessa lógica,
a cultura popular passa a ser considerada como tradição e como identidade.
* * *
Na esteira desse período, nas décadas de 1960 e 1970, surgem em diferentes regiões do
país dois importantes movimentos.
O Tropicalismo surgiu no ano de 1967 criticando movimentos exacerbadamente
nacionalistas que submetiam a discussão artística à orientações de ideologias políticas.
Realizado no eixo Rio - São Paulo o movimento chegou a percorrer o país influenciando,
principalmente jovens universitários, não apenas com suas tendências estéticas mas também
com seus ideais de comportamento. Dentre os artistas que participaram o seu núcleo se
concentrava nas figuras de Tom Zé, Gilberto Gil e Caetano Veloso.
Mesmo criticando movimentos de cunho nacionalista "ortodoxo", o Tropicalismo trazia
a preocupação da construção de uma sociedade nacional capaz de acompanhar as mudanças
que ocorriam no contexto mundial. Segundo Amilcar Almeida Bezerra as obras do
Tropicalismo carregavam um tom pessimista em relação as contradições da sociedade
brasileira. O sonho que se tinha sobre uma possível sociedade estava muito distante da sua
realidade, resultando em um impasse sem solução.
O Movimento Armorial, surge três anos depois na região Nordeste do país, mais
especificamente no estado de Pernambuco. Seu mentor, Ariano Suassuna reúne intelectuais e
artístas com o intuito de construir uma arte brasileira erudita calcada nas matrizes populares.
A cultura popular seria uma matéria prima capaz de revelar a verdadeira identidade brasileira.
Questões como a cultura de massa e, principalmente, a internacionalização da cultura
trazem a tona discussões extremamente polêmicas em torno do movimento. Nessa discussão
a postura assumida por Suassuna aponta para uma retração necessária que implica em um
isolamento frente as transformações mundiais em relação a flexibilização das fronteiras
culturais, e mais do que isso, econômicas.
Ambos os movimentos trabalham de diferentes formas, se não antagônicas, com a
questão do nacional em sua relação com o exterior e do popular em seu caráter identitário. Na
interpretação de Amilcar Almeida Bezerra eles seriam uma continuação recriada das
discussões e das visões trazidas pelo Modernismo brasileiro da década de 1920. O
Tropicalismo estaria ligado ao Manifesto Antropofágico de Oswald de Andrade que propunha
a absorção crítica de influências estrangeiras, enquanto o Movimento Armorial faria a
releitura do ideário de Mario de Andrade sobre as pesquisas e a construção de uma arte
nacional erudita.
* * *
Atualmente a cultura popular está completamente inserida no aparelho de estado
brasileiro. Se construiu e consolidou a ideia de um Brasil mosaico, da miscigenação e da
tolerância. O texto divulgado no site do governo federal confirma sua ideologia:
O Brasil fascina por sua miscigenação de raízes indígenas,
europeias, asiáticas e africanas, e suas várias facetas refletidas na
cultura nacional. Culinária, música, artesanato, arquitetura,
produções artísticas e festas populares ultrapassam as fronteiras do
território nacional. O país conta com 17 bens culturais e naturais
tombados pelo Patrimônio Mundial da Unesco e uma das
maravilhas do mundo contemporâneo, o Cristo Redentor.
O Brasil é o país da tolerância étnica, cultural, religiosa e social. O
grande número de etnias, em vez de hostilidade, encontra no Brasil
um ambiente de respeito e tolerância às diferenças e à troca de
experiências. Essa matriz gera um ambiente social no qual o povo
absorve o pluralismo, o respeito às diferenças e a troca de
experiências. Tal convivência pacífica resulta em manifestações
culturais versáteis e cheias de originalidade. A diversidade também
dá o tom no rico acervo arquitetônico, desde o colonial barroco até
o modernismo da capital federal, Brasília.
A imigração no Brasil foi de extrema importância para a formação
da cultura nacional. Características dos quatro cantos do mundo
foram incorporadas ao longo dos cinco séculos desde a chegada
dos portugueses, em 1500. Além das contribuições de índios,
negros e portugueses, a expressiva vinda de imigrantes de todas as
partes da Europa, do Oriente Médio e da Ásia influenciou a
formação do povo brasileiro. A imigração de países vizinhos, como
Argentina, Uruguai, Chile e Bolívia, também contribuiu para a
diversificação de costumes, hábitos e crenças, mas com um idioma
comum.
Apesar de sua extensão territorial, fala-se o mesmo idioma em
todas as regiões brasileiras. O português é a quinta língua mais
falada, e a terceira entre as ocidentais, após o inglês e o espanhol. A
Constituição Brasileira assegura o pleno exercício dos direitos
culturais e define que o estado deve apoiar, incentivar e valorizar
suas manifestações, além de proteger as culturas indígenas, afro-
brasileiras e de outros grupos participantes do processo
civilizatório nacional. (www.brasil.gov.br/sobre/cultura/cultura-
brasileira).
A partir dessa visão idílica, os diferentes ministérios, assim como regionalmente os
governos estaduais e municipais, elaboram projetos e editais que buscam dar conta de
"conservar" patrimônios materiais e imateriais de uma cultura popular, incentivando assim a
concretização de um Brasil "de todos". Ou a sua ilusão.
4.5 UMA BREVE CONSIDERAÇÃO
Em um de seus seminários Marilena Chaui explicita as possíveis confusões que o termo
"nacional popular" pode suscitar, como sua transformação em nacionalismo cultural ou em
populismo nacionalista. Essa confusão parece se dar quando se misturam aquilo que Renato
Ortiz chamou de "memória coletiva" e "memória nacional".
"A memória coletiva é da ordem da vivência, a memória
nacional se refere a uma história que transcende os sujeitos e não se
concretiza imediatamente no seu cotidiano. (…) a memória
coletiva se aproxima do mito e se manifesta, por tanto ritualmente.
A memória nacional é da ordem da ideologia, ela é produto de uma
história social (…)" (ORTIZ, 1994. pp.135).
A questão da cultura popular, tratada ao longo da história brasileira, apareceu como
uma maneira de se estabelecer uma identidade nacional mas sempre vinculada a uma
ideologia política. Ideologias que buscavam a manutenção da ordem, no caso do Estado, ou
uma transformação da sociedade, como alguns exemplos de movimentos sociais e artísticos.
O caso que abordamos nesse trabalho, do Instituto Brincante, como um teatro escola e
desvinculado de qualquer ideologia política, parece dar continuidade a uma linha de
pensamento sobre o tema que teve início com os estudos de Mario de Andrade, passou pelo
Movimento Armorial e, atrelado a outras influências acabou por consolidar uma visão
própria. Uma visão que busca, em seu limite, uma transformação social através da educação e
da construção de um indivíduo criativo e consciente de si. Dessa maneira o Instituto busca,
assim como outros movimentos acima citados, mudanças objetivas na sociedade, mas o
caminho que percorre não se destaca do caráter subjetivo da ritualidade característica de uma
"memória coletiva", traçando dessa forma uma transformação orgânica através dos próprios
indivíduos.
5. CONVERSAS – A DISCUSSÃO DENTRO DO BRINCANTE
Durante o processo de pesquisa deste trabalho, na busca por uma melhor compreensão
do meu objeto de estudos, algumas questões foram surgindo. A partir delas foi possível
conversar com aqueles que denominei de “pilares do teatro escola”: Antonio Nóbrega,
Rosane Almeida e Peo.
As três principais questões que nortearam essas conversas passaram por:
• • O que você entende por cultura popular?
• • Qual a relevância dessa visão quando inserida na sociedade contemporânea?
• • Como essa visão vira pedagogia dentro de um teatro escola?
Todas as conversar mostraram o encantamento e, ao mesmo tempo, os anos de estudos
voltados para o entendimento e a busca, por diversas vias, da concretização de um
pensamento sobre a cultura popular brasileira, a transformação individual e a criação de uma
escola. O Instituto Brincante, unindo essas três figuras, centralizou essa busca pela via da
educação artística.
* * *
Quando questionada sobre a cultura popular Rosane expõe uma visão que remete a
história longínqua do desenvolvimento do ser humano. Essa cultura seria, segundo ela, a
reminiscência das primeiras tentativas do ser humano em entender o mundo e a sua própria
existência. Ao longo da história, as diferentes formas que essa tentativa foi tomando apenas
se transformaram para se adaptar aos novos questionamentos que surgiam em um tempo e
espaço diferentes. Menifestações como o Coco, o Cavalo Marinho, o Batuque de Umbigada,
o Jongo são formas que no decorrer da nossa história foram se modificando, mas a base
primordial delas, o que as gerou, foram festas e rituais que estavam atreladas a essas buscas
do ser humano. Para exemplificar melhor ela cita a manifestação popular do Bumba meu Boi
que representa em seu enredo o ciclo de vida, morte e renascimento. Representação essa que
pode ser encontrada em diversas outras manifestações e que indica, segundo ela, a
necessidade recorrente do ser humano em compreender os ciclos da vida que contém a morte.
Como de alguma forma essa necessidade se faz presente nos questionamentos do ser humano
ainda nos dias atuais, manifestações como o Bumba meu Boi encontram espaço para se
perpetuar.
Segundo Mario de Andrade:
A simbólica é duma importância decisiva, eu creio, para se
compreender a permanência de certas tradições de realidades
extintas, na coletividade. Parece à primeira vista absurdíssimo que
em capitais regularmente estabelecidas do Brasil atual, ainda
celebrem a morte e a ressurreição do boi, (…). Mas é que esses
assuntos possuem uma simbólica vasta que permite ao povo o
exercício permanente de certas práticas vitais. O boi não representa
já agora o animal tão historicamente básico da civilização nacional,
nem pastoreios, nem mesmo a precisão da carne alimentar.
Representa apenas, e por isso em principal a evocação dele é grata
à representação coletiva, a necessidade do alimento (qualquer), as
dificuldades e lutas pra conquistar o alimento, bem como práticas
da vida familiar e coletiva. (ANDRADE, 1982. pg 71)
Independentemente do motivo que vai auxiliar na continuidade transformadora de uma
manifestação popular, a questão principal trazida pelas duas interpretações do mesmo
exemplo confirma, na verdade, a idéia da necessidade da existência de um sentido, um
"porque" daquela manifestação acontecer. O ser humano que as vivencia precisa estar
suprindo uma necessidade de se deparar com questionamentos que lhe movem em direção à
compreensão de si mesmo e do mundo ao seu redor. Nesse mesmo sentido Peo fala da cultura
popular como manifestações culturais que se mostram como "um recurso que as pessoas
utilizam para manifestar e para elaborar um sentido de vida para eles próprios. Ela traduz a
busca desse povo para dar sentido a sua própria existência." (PEREIRA, informação verbal).
Segundo essa lógica de raciocínio, o caráter flexível e mutante da cultura popular
demonstra por quais caminhos o homem está guiando as suas buscas, e consequentemente
quais os seus questionamentos atuais. Isso nos leva a entender a cultura popular como uma
maneira do indivíduo aprender a enxergar suas necessidades como ser humano e sua relação
com o mundo para, a partir desse entendimento, buscar realizá-las.
Rosane faz uma citação popular, de autor desconhecido: “A gente deve olhar para o
passado sem virar a cabeça.”, para assim finalizar seu raciocínio enfatizando o constante
movimento da construção dessa cultura popular que, segundo ela, parece ser um conceito que
não cabe mais em nenhuma das palavras que buscam designá-lo.
Trazendo um olhar mais histórico da construção cultural do país, Nóbrega
entende que:
"Cultura popular é o nome que, no me entender, denomina um
determinado estrato cultural brasileiro fruto de um processo que
ficou a deriva de outro extrato cultural que foi predominante. Ou
seja, na formação do Brasil nós tivemos contribuições dos índios,
que aqui estavam, que se encontraram com fragmentos da cultura
ibérica e que depois se encontraram também com culturas de
transplante como foi o caso dos negros africanos. Foi possível
acontecer no Brasil um processo de miscigenação cultural na qual
essas três contribuições foram excluidas do extrato cultural do
colonizador. É nesse sentido que eu entendo cultura popular."
(NÓBREGA, informação verbal).
Nessa sua definição busca se distanciar da denominação "folclore" que segundo ele
remete a algo afastado do constante movimento em que se encontra o desenvolvimento
cultural. A visão impregnada na palavra "folclore" nunca passou pelo entendimento dessa
cultura como dinamizadora da cultura contemporânea da época.
Assim também, busca se afastar do nacional popular. Mesmo trazendo uma definição de
cultura popular que pode se aproximar das definições que auxiliaram o nacional popular a se
consolidar ele entende que este traz como primazia o resgate dessa cultura como sendo
elemento de afirmação nacional, independente dos seus conteúdos. Ou seja, muitas vezes, em
prol da construção de uma identidade nacional, se define algo como brasileiro mas que talvez
o seu conteúdo já tenha se tornado "velho" perante a sociedade atual. Talvez uma
manifestação que fez sentido algum dia para aquele tempo e espaço nos quais se
desenvolveu, não tenha o mesmo sentido para a sociedade contemporânea. Acaba por, desse
maneira, construir um produto daquilo que denomina nacional completamente descolado da
realidade vivenciada pelo povo, e com o qual nenhum indivíduo consegue se identificar. Se
torna apenas um discurso político.
"Ao mesmo tempo isso não quer dizer que a gente deva
completamente se abstrair de um pensamento nacional para a
cultura, eu acho que a gente deve relativizar o nacional. Penso que
essa cultura que caminhou a margem da cultura dominante tem uma
substancia com alguma riqueza, e não olhar para essa riqueza e
tentar dinamiza-la, acho uma perda." (NÓBREGA, informação
verbal).
Afastando-se dos folcloristas, e de sua interpretação romântica da cultura popular que
ainda se faz presente no discurso de patrimônio e preservação do atual governo, a reflexão
sobre o tema deve ser feita "sem nenhum saudosismo, sem nenhuma pretensão de resgatar, de
repetir, de reproduzir, porque essas coisas são extremamente vivas e moldáveis dependendo
da época que elas estão sendo vividas." (ALMEIDA, informação verbal). Por isso,
atualmente, deve-se entender a cultura popular a partir do tempo presente, e o "primeiro olhar
que deve se ter para essas manifestações deve passar pela interpretação delas como os
primeiros exercícios para o ser animal passar a ser humano. E isso se dá no momento em que
o humano se reconhece no outro."(ALMEIDA, informação verbal).
Esse reconhecimento estabelece o vínculo etimologicamente enraizado na palavra
brincar. Como se a brincadeira representasse esse olhar diferenciado para a cultura popular
brasileira. Como se no espírito do brincar se concretizassem uma maneira de compreender o
transe, o ritual e o simbólico.
* * *
Considerando que as manifestações populares são formas que ao longo do tempo vão se
transformando, o que está em seu cerne e que independente das modificações em sua forma
se perpetua até os dias de hoje? Segundo Rosane esse núcleo para o qual devemos direcionar
nossa atenção quando trabalhamos com as manifestações da cultura popular é construído a
partir da vivência do transe, do ritual e do simbólico.
O transe não como a forma a qual constantemente associamos essa palavra, atrelada a
rituais religiosos, mas sim como um uso inteligente do corpo que auxilia o ser humano no
alcance de um outro nível de consciência. Como exercício para, a partir do físico, atingir um
estado de prontidão necessário para a vida mas que no nosso cotidiano, da maneira que se
constituiu, não é possível alcançar.
O ritual, assim como o transe que costumamos aproximar das práticas religiosas, deve
ser entendido para além dessa forma, como a mobilização da energia para que se faça uma
coisa. Ou seja, é como um treino para que se exercite estar inteiramente presente naquilo que
se está fazendo, para que, desse maneira se chegue a expressão máxima do potencial do ser
humano.
E por fim, o simbólico como um caminho para "assimliar os conhecimentos através de
formas, de sensações, não só conceitualmente." (ALMEIDA, informação verbal).
Atualmente esses elementos característicos da cultura popular são negados, ou melhor,
a sociedade contemporânea abdicou desses elementos em favor de outros estreitamente
vinculados à racionalidade, à razão, à construção fragmentada de conhecimentos que auxiliou
na criação e no crescimento de especialistas. Essa especialidade desenvolve grandes
competências mas que não conseguem ser transpostas para nenhum outro segmento da vida.
A construção do conhecimento via exclusivamente racional é limitada para o crescimento do
indivíduo. Esse crescimento deveria passar por todos esses elementos que estão no cerne das
manifestações populares, como vivências do simbólico, do ritual e do transe que acontecem
apenas com o indivíduo em sua totalidade, consciente. "Este saber popular não existe fora das
pessoas, mas entre elas." (ORTIZ, 1994. pp. 134)
Nóbrega enxerga a grande contribuição das manifestações da cultura popular para a
sociedade atual na retomada de um equilíbrio que atualmente se encontra desbalanceado em
favor dessa racionalidade e em detrimento do sensível. "É nesse sentido que eu acho que é
importante a gente entender a cultura popular como ela portadora de conteúdos, de
substâncias que, trazidas a tona podem dialogar com que o patrimônio ocidental construiu e
assim criar um outro patamar de construção artística mais equilibrada, mais harmoniosa."
(NÓBREGA, informação verbal). O que ele exemplifica com a criação artística deve ser
entendida em relação a todos os elementos do nosso cotidiano.
Nesse sentido é preciso ter o cuidado para não renegar completamente toda essa
racionalidade construída ao longo da história da civilização ocidental. As manifestações da
cultura popular, segundo Nóbrega, nos trazem o outro pólo na busca por um equilíbrio, mas
que em suas manifestações aparece também desbalanceado mas no sentido da exarcebação da
emoção e da sensibilidade. E é na busca por esse equilíbrio que está o maior desafio.
* * *
O Brincante, fruto dessas visões, se constituiu como um espaço de experimentação. Um
lugar no qual, através de manifestações da cultura popular se busca a transformação do
indivíduo e consequentemente da sociedade. Afinal, isso que "chamamos de familia,
sociedade, Estado, é construída por seres humanos e consequentemente, quanto melhor o ser
humano melhor será essa sociedade." (ALMEIDA, informação verbal).
Para organizar essa busca, a princípio subjetiva, algo de concreto ocorre nas aulas e
atividade desenvolvidas dentro do teatro escola. Nos dezoito anos de experiência e convívio
com as pessoas que por ali passaram se percebeu que é possível estabelecer uma forma para
ensinar passos de determinada dança, toques e cantos de uma determinada música, versos de
poesias e etc. Mas quando se busca transcender a forma para alcançar o sentido que ela pode
carregar para diferentes pessoas, a metodologia é não ter receita.
Essa construção de uma escola que não possui uma fórmula para o desenvolvimento de
suas atividades só se torna sustentável quando se tem na figura do professor uma pessoa
extremamente preparada para esse desenvolvimento. O trabalho do Brincante começa então
na formação de uma equipe de professores que tenham, ao longo de suas trajetórias,
desenvolvido o seu trabalho em uma estreita relação com as manifestações da cultura popular
para a partir desse centro comum desenvolverem suas aulas. Os talento individuais aparecem
ai como um dos principais requisitos para a eficácia dessa experiência. É interessante notar
que muitos dos que hoje são professores do Brincante, foram alunos. Lá experimentaram o
contato com algumas manifestações da cultura popular e a partir daí deram inicio às suas
pesquisas e seus trabalhos relacionados a isso, chegando, tempos depois, a retornar ao
Brincante como professores.
A maneira como se constroem as aulas variam então, de acordo com cada professor. O
diálogo e a ligação entre eles se dá pelo conteúdo. O conteúdo que enxerga nas manifestações
populares ferramentas para o crescimento humano. Em seu trajeto individual cada professor
aprendeu, à sua maneira, os elementos que "sustentam" uma manifestação popular em sua
vivacidade, e de alguma maneira isso se imprime nas aulas. "É uma metodologia que não tem
uma única receita mas a mesmo tempo ela tem pilares muito bem definidos do que é possivel
você fazer para acionar o novo no outro. Essa criatividade, essa atenção, essa entrega, esse
acesso a facetas diferentes de si mesmo" tão presentes na cultura popular. "Porque isso seriam
os pilares do que a gente quer." (ALMEIDA, informação verbal). A maneira como esses
pilares são edificados, como eles se comunicam é que vai variar de um professor para o outro.
Chegando nos alunos, no caso dos cursos de formação (ou de jovens ou de educadores),
essas experiências mais subjetivas são experimentadas fisicamente para a a partir disso
chegarem à uma reflexão intelectual. No caso dos cursos livres com encontros mais
esporádicos e com um público rotativo, o Brincante parece servir de espaço para vivenciar
tudo aquilo que se tornou distante do cotidiano da maioria da população, a festa, o riso, a
transpiração física, a concentração, o outro, enfim, a brincadeira.
Para Nóbrega o próximo passo dentro da escola Brincante é conseguir trabalhar
harmoniosamente com esses pólos dentro de uma aula. Como fazer do Brincante um lugar
que não seja um espaço para se experimentar aqueles elementos tirados do nosso cotidiano,
aqueles elementos que completam as lacunas da sociedade atual, mas sim um espaço onde
possa se experimentar essa totalidade equilibrada.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS - UM COMEÇO
Na tentativa de compreender o trabalho feito dentro do Brincante, esbarrei em questões
extremamente importantes para o entendimento do desenvolvimento político e cultural da
sociedade contemporânea. Os descompassos entre discursos políticos e realidades sociais, a
marginalização do que aqui chamamos de cultura popular em paralelo com a
patrimonialização de suas manifestações quando interessantes para a construção de uma
ideologia política, a chamada cultura de massa que hoje toma o lugar do "popular" e que com
ele se confunde, dentre outras que não tiveram espaço para serem adequadamente abordadas.
De qualquer forma todas essas sugestões me atentaram para um discurso carregado de vícios
e preconceitos que perdura até hoje.
Nesse contexto o Brincante se coloca como uma possível alternativa para se pensar o
ser humano e o mundo contemporâneo através do olhar que é possível de se desenvolver, via
as manifestações da cultura popular brasileira. Nesse sentido não importa discursar sobre uma
suposta identidade nacional, porque ela seria mais uma forma na qual se congelaria um ser
brasileiro, ela reduziria as inúmeras possibilidades do ser humano em uma homogeneidade
nacional. Quando o objetivo passa a ser a transformação social por meio da construção do
indivíduo, mais uma vez a forma é transcendida em prol de uma vivência coletiva da cultura.
No Brincante, a confusão que comumente é trazida pelo conceito de cultura popular
atrelado a idéia do nacional, parece estar bem resolvida. Aquilo que Renato Ortiz fez questão
de separar em "memória nacional" e "memória coletiva" aparece na construção de uma
aprendizagem "brincante". Nela a "memória coletiva", que opera na ordem da vivência, na
concretude do cotidiano, traduz para as atividades ali existentes uma maneira de tornar o
indivíduo parte integrante do todo que chamamos de cultura. Trazendo para perto conceitos
que a priori nos parecem tão distantes.
De uma certa maneira essa pesquisa buscou responder a um questionamento sobre a
relevância do trabalho com manifestações da cultura popular, inserido em uma sociedade
repleta de possibilidades. Qual a transformação que esse trabalho poderia gerar? Qual o
sentido dele? De certo que a visão abordada aqui possui limitações. A busca por enfatizar o
trabalho com o sensível, em oposição à racionalidade predominante na nossa sociedade, cria
uma vivência que tende ao desenvolvimento de uma parte do ser humano que pouco tem
espaço para se desenvolver cotidianamente. Isso faz do Brincante um lugar no qual se
desenvolvem atividades que suprem uma lacuna dos dias atuais. A experiência da conjugação
desses dois pólos fica a cargo de cada indivíduo dentro das relações que este consiga
desenvolver no seu dia a dia. Sendo que, se dentro das atividades do Brincante fosse possível
desenvolver as inúmeras vantagens que a racionalidade possibilitou ao ser humano, sempre
conjugadas àquilo que já está bem consolidado na metodologia Brincante, a potencialidade
daquilo que já ocorre poderia tomar maiores proporções. O foco no desenvolvimento sensível
do ser humano não escapa do engano de transformar as experiências ali vividas, em discursos
pouco fundamentados. Em discursos que apenas reproduzem como informação aquilo que foi
apreendido. A validade que acredito existir na construção dessa totalidade está, tanto no
equilíbrio que Nóbrega cita na conversa como também na construção individual de uma
aprendizagem, de um desenvolvimento, e de uma conclusão racional dos temas vivenciados
sensivelmente, para que se saia do Brincante com bases não apenas intuitivas, mas também
teóricas para a discussão e a argumentação sobre o que ali é feito.
De alguma forma isso já começa ser feito nos cursos de formação quando se propõe
reflexões sobre as vivências. Penso que importante seria também criar bases teóricas para
ampliar o potencial dessas reflexões. Aprofundar conhecimentos que estão à disposição da
humanidade, para além da experiência individual.
* * *
A metodologia do Brincante se apresenta ainda em fase de desenvolvimento. O cerne
de sua construção já se mostra consolidado, mas a maneira como isso se dá ainda parece
nebulosa. Durante os dezoito anos de existência foi apenas nesse último ano que o Brincante
buscou entender qual a metodologia que ali se consolida. Como toda a intuição e os saberes
que fizeram daquele espaço e da carreira individual de seus fundadores, fortes referências
dessa maneira de se trabalhar com as manifestações populares, se transformam em atividades
dentro de um espaço chamado teatro escola. A meu ver só o tempo possibilitará esse
entendimento.
Dentre algumas visões sobre a cultura popular discorridas nesse trabalho, a vertente
abordada pelo Brincante pode ser o início para um entendimento mais profundo dessas
manifestações. Se elas não trouxerem um sentido para quem as vivencia, não existe conceito
que as faça sobreviver em sua totalidade transformadora, não existe ideologia que as torne
representantes de uma "identidade" nacional. O objetivo educacional do Brincante se torna,
em última instância, político. Reconhece, a partir de cada indivíduo, as buscas e as
dificuldades que o coletivo enfrenta vivendo em um tempo como os dias de hoje e em um
espaço como o centro urbano.
A importância do olhar para a cultura popular desenvolvida dentro do teatro escola está
exatamente no seu caráter mobilizador. Ou seja, o Brincante funciona como uma experiência
de ser, ele próprio, um elemento dinamizador da compreensão, do desenvolvimento e da
apropriação do sentido maior de desenvolvimento humano existente nas manifestações da
cultura popular. Seja por meio da festa, do rito ou da reflexão. No Brincante os
frequentadores parecem ter a possibilidade de vivenciar, à sua maneira, uma aproximação
daquilo que costuma estar extremamente distante da construção de sua realidade ou do
entendimento conceitual sobre o tema. Esse viés de entendimento sobre a cultura popular
esforça-se por dismistificar a construção política de uma definição que pouco trabalha com a
vivacidade dessa cultura. Busca livrar esse conceito de vícios e preconceitos ainda hoje
bastante evidentes.
Este trabalho buscou fazer o árduo caminho da concretização teórica de uma vivência
pessoal e de um convívio particular. Da transformação de saberes, a princípio subjetivos, em
um texto concreto que não pendessem à um discurso ideológico.
A concretude da vivência sempre parece menor quando exigimos dela palavras em um
papel.
"Amável o senhor me ouviu, minha idéia confirmou: que o diabo
não existe. Pois não? O senhor é um homem soberano, circuspecto.
Amigos somos. Nonada. O diabo não há! É o que eu digo, se for…
Existe é o homem humano. Travessia." (ROSA, 2001. pp.624)
BIBLIOGRAFIA
ACSELRAD, Maria. Viva Pareia! – A arte da brincadeira ou a beleza da safadeza: uma abordagem
antropológica da estética do Cavalo Marinho. Rio de Janeiro, 2002. Dissertação de mestrado. Pós-
graduação em Sociologia e Antropologia, UFRJ.
ALMEIDA, Rosane. A Mais Bela História de Adeodata. São Paulo: Salamandra, 2006.
ANDRADE, Mario de. "Introdução" In: Danças Dramáticas do Brasil. 1ºTomo. 2ª Ed. Belo Horizonte: Itatiai
BARBATO, Roberto. Missionários de uma utopia nacional-popular: os intelectuais e o
Departamento de Cultura de São Paulo. São Paulo: Annablume/Fapesp, 2004.
BEZERRA, Amilcar Almeida. Movimento Armorial X Tropicalismo: dilemas brasileirs sobre a
questão nacional na cultura contemporânea. V Encontro de Estudos Multidisciplinares em
Cultura, Bahia: UFBa, 2009.
CANDUSSO, Marina Abib, e ALMEIDA, Maria Eugenia. Estudos de uma Pesquisa em
Dança. São Paulo, 2009. Monografia desenvolvida pelo ProAC da Secretaria de Cultura do
Estado de São Paulo.
CHAUÍ, Marilena. “Seminário I”. In: Seminários: o Nacional e o Popular na Cultura
Brasileira. São Paulo: Brasiliense, 1983.
CRUZ, Maria Cristina Meirelles Toledo. Para Uma Educação da Sensibilidade: a experiência
da Casa Redonda Centro de Estudos. São Paulo, 2005. Dissertação de Mestrado, USP.
GARCIA, Miliandre. A Questão da Cultura Popular: as políticas culturais do centro popular de
cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes (UNE). Rio de Janeiro, 2004.Dissertação de
Doutorado em História, UFRJ.
GALVÃO, Isis Barbero. Brincante: teatro, escola e vida. São Paulo, 2009. Trabalho de
conclusão de curso UNESP.
HUIZINGA, Johan. Homo Ludens. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 2000.
MARCHETTI, Joana. A Dança Popular e a Formação da Identidade Brasileira: como o corpo
vivido do brincante integra o si mesmo e o ser-com através da dança. São Paulo, 2002.
Trabalho de conclusão de curso como exigência para a graduação no curso de psicologia. PUC.
ORTIZ, Renato. A Moderna Tradição Brasileira. Cultura brasileira e indústria cultural. 3a
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São Paulo: Brasiliense, 1991.
____________. Cultura Brasileira e Identidade Nacional. 5ª Ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.
PELEGRINI, Sandra C. A. FUNARI, Pedro Paulo A. O que é Patrimônio Cultural Imaterial.
São Paulo: Brasiliense, 2008.
RIBEIRO, Darcy. "Introdução" e "O Novo Mundo" In: O Povo Brasileiro. 5ª Ed. São Paulo: Companhia de B
ROSA, Guimarães. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.
STRINATI, Dominic. Cultura Popular Uma Introdução. 1ª Ed. São Paulo: Hedra, 1999.
Revistas e Publicações:
ALMEIDA, Rosane (coord.). Um Olhar Brincante para o Mundo. São Paulo: publicação
Instituto Brincante, 2009.
TOLEDO, Caio Navarro de. 50 Anos de Fundação do Iseb. S˜åo Paulo: Jornal da UNICAMP,
2005.
AArte do Brincante para Intérpretes e Educadores – Relatório das atividades desenvolvidas
pelo projeto cultural do Instituto Brincante. 2008.
Entrevistas
Maria Amélia Pereira. Entrevista à autora em 01/11/2010.
Rosane Almeida. Entrevista à autora em 02/11/2010.
Antonio Nóbrega. Entrevista à autora em 02/11/2010.
Sites
Instituto Brincante
www.institutobrincante.org.br - acesso em 06/2010
Brasil - República Federativa do Brasil
www.brasil.gov.br/sobre/cultura/cultura-brasileira - acesso em 26/11/2010

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Com quantas interrogações se faz um brincante | Por: Marina Abib

  • 1. PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓTILA DE SÃO PAULO CIÊNCIAS SOCIAIS COM QUANTAS INTERROGAÇÕES SE FAZ UM BRINCANTE MARINAABIB CANDUSSO SÃO PAULO 2010 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓTILA DE SÃO PAULO
  • 2. CIÊNCIAS SOCIAIS COM QUANTAS INTERROGAÇÕES SE FAZ UM BRINCANTE MARINAABIB CANDUSSO ORIENTADOR: GUILHERME GOMES JUNIOR
  • 3. Í NDICE 1. INTRODUÇÃO.........................................................................................................2 2. O BRINCANTE........................................................................................................5 2.1 O BRINCANTE EM SUA MAIORIDADE.......................................................7 3. TRAJETÓRIAS. OS PILARES DO TEATRO ESCOLA.........................................12 4. UM RÁPIDO PANORAMA HISTÓRICO DA DISCUSSÃO SOBRE O NACIONAL POPULAR..................................................................................................................20 4.1 OS PRIMEIROS PASSO............................................................................21 4.2 A MESTIÇAGEM EM UM BRASIL "MODERNO".......................................22 4.3 UMA VERTENTE ENGAJADA POLITICAMENTE......................................25 4.4 O MARCO DE 1964....................................................................................27 4.5 UMA BREVE CONSIDERAÇÃO.................................................................31 5. CONVERSAS - A DISCUSSÃO DENTRO DO BRINCANTE................................33 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS - UM COMEÇO.........................................................41 BIBLIOGRAFIA..........................................................................................................45 1. INTRODUÇÃO
  • 4. “A crença no poder transformador da educação aliada ao vasto universo da cultura popular fez surgir o Brincante.” (ALMEIDA, 2009. pp 4). O termo brincante nasceu no nordeste do Brasil, e designa o modo como os artistas populares se autodenominam. O artista popular nunca se diz dançarino, músico ou ator, ele se diz brincante; e brincadeira - por causa ou consequencia - é o nome dado à certas manifestações populares onde estão presentes diversas linguagens artísticas, como a poesia, as artes plásticas, o teatro, a música e a dança. São homens, mulheres e crianças que participam de manifestações como o Cavalo- marinho, o Reisado, o Caboclinho, os Maracatus e outras tantas brincadeiras. Em um estudo sobre o carácter lúdico dessas manifestações me deparei com livro Homo Ludens de Johan Huizinga. Nele o autor expõe uma definição daquilo que ele entende por jogo: "(...) é uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e determinados limites de tempo e espaço, segundo regras livremente consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e de alegria e de uma consciência de ser diferente da “vida quotidiana” (...) Visto que não pertence à vida “comum”, ele [o jogo, e para nós a brincadeira] se situa fora do mecanismo de satisfação imediata das necessidades e dos desejos e, pelo contrário interrompe este mecanismo. Ele se insinua como uma atividade temporária, que tem uma finalidade autônoma e se realiza tendo em vista uma satisfação que consiste nessa própria realização. É pelo menos assim que, em primeira instância, ele se nos apresenta: como um intervalo em nossa vida quotidiana. Todavia, (...) ele se torna um acompanhamento, um complemento e, em última análise, uma parte integrante da vida em geral." (HUIZINGA, 2000. pp12). A palavra "jogo" foi uma escolha feita pelo tradutor na medida em que nas principais línguas europeias tanto jogar como brincar são traduzidas por uma mesma palavra como: spielen, to play, louer, jugar. Tal definição se aplica também às brincadeiras populares. A brincadeira estaria nas bases da civilização humana. O homem seria, antes de tudo, um ser brincante. Maria Acselrad quando fala da brincadeira popular diz que, “é uma prática que implica, antes
  • 5. de tudo, como categoria primordial, o cuidado. Pois significa estar vinculado a um coletivo, compartilhar algo que se acredita e merece respeito” (ACSELRAD, 2002. pp36). Uma hipótese diz que a própria palavra "brincar", em sua origem etimológica, está ligada à palavra vinculum, do latim. Seu caminho é um pouco nebuloso, mas o que sabemos é que vinculum se transformou em vincro que passou a ser grafado como vrinco, para originar brinco, que virou brincar. A brincadeira, sendo um tempo “destacado” do cotidiano e criado pelos próprios brincantes, implica uma realização voluntária. É na expressão dessa vontade que os seus participantes experimentam a liberdade dentro das regras que eles escolheram seguir, as regras da própria brincadeira. Tensão e alegria parecem então caminhar juntas. Ordem e liberdade. Duas ordens de valores que, do modo que costumam ser entendidas hoje em dia, estariam situadas em polos opostos, na brincadeira existem juntas e complementam-se, se alimentando para sustentar a possibilidade do espontâneo. A finalidade do brincar, portanto, reside em si mesmo. Sua ação, a princípio, não produz nada em termos materiais, não tem um fim exterior, mas suas características permitem com que o homem desfrute, naquele momento, uma ação prazerosa por si própria. A idéia da brincadeira e de sua importância no desenvolvimento do ser humano acompanha as atividades do Instituto, começando já pelo seu nome: Brincante. Assim como explicita sua estreita relação com a cultura popular brasileira. Tomando como ponto de partida um lugar como esse, pioneiro no trabalho com as manifstações populares na cidade de São Paulo, foi necessário buscar, para além das trajetórias de seus fundadores, os ideais aos quais suas influências estavam atreladas. Entendendo este contexto foi possível elaborar questões que iriam nortear as conversas com aqueles que chamei de "pilares do teatro escola". E foi a partir delas que foi possível compreender um olhar "Brincante" para o mundo, entendendo a construção de sua pedagogia e sua inserção na sociedade contemporânea. Este trabalho então, busca revelar uma visão sobre a cultura popular brasileira, inserida no
  • 6. contexto histórico da discussão nacional sobre o tema, além de entender como essa visão busca se propagar dentro de um espaço como o de um teatro escola. Como a interpretação das manifestações populares é trabalhada na construção de uma pedagogia que busca, em seu limite, a transformação do indivíduo.
  • 7. 2. O BRINCANTE A história do hoje chamado Instituto Brincante começou em 1992 em São Paulo, no bairro Vila Madalena. Buscando um espaço onde pudessem ensaiar e criar seus espetáculos a dupla de artistas, Antonio Nóbrega e Rosane Almeida, encontrou na Rua Purpurina uma antiga fábrica de lustres que depois de alugada e reformada passou a abrigar o Espaço Brincante. Nele a dupla experimentava as possibilidades que surgiam inspiradas nas diversas manifestações artísticas populares. Dessa pesquisa nasceram espetáculos, esquetes e muitos curiosos. O Espaço então foi aberto ao público com um espetáculo de mesmo nome: Brincante (1992). Os dois galpões da antiga fábrica ganharam ares de teatro, com palco, platéia e salas de dança, e dessa maneira o Brincante que antes era apenas Espaço virou Teatro. Nele aconteceram temporadas de espetáculos como Figural (1993); Segundas Histórias (1994); e Na Pancada do Ganzá (1996). Os espetáculos apresentados despertaram o interesse do público, que aumentava. Um grupo de pessoas se organizou e convocou a dupla como professores. Dessa iniciativa nasceu o curso AArte do Brincante. E com esse curso o Teatro agregou ao seu definir a palavra escola. Em 1995 o Brincante virou Teatro Escola. Com o conselho e ajuda da pedagoga Maria Amélia Pereira, a Péo, no ano seguinte o curso ganhou um outro foco: educadores. Para ela, em uma das respostas concedida à entrevista feita para a revista do Brincante (2009), as escolas não lidam adequadamente com a cultura brasileira. E esse afastamento é fruto de uma ignorância sobre a cultura brasileira. Ao mesmo tempo, há uma desvalorização por se tratar
  • 8. de manifestações do povo – e o povo, no Brasil, é identificado com a pobreza. A elite e a mídia são comprometidas com o poder econômico, que folcloriza perjorativamente a nossa cultura como se esta precisasse mendigar o reconhecimento de sua existência. Nosso país carrega uma forte dose de colonialismo cultural. Nas escolas, é muito comum a preferência por modelos estrangeiros de educação em detrimento da experiência de educadores brasileiros. Isso é muito triste, porque é fruto de uma visão mesquinha que desconhece a importância do povo como guardião de arquétipos importantes de nossas raízes. A cidadania não se constrói sem a inserção da cultura do povo. (ALMEIDA, 2009. pp 12). E o Teatro Escola passou a trabalhar, inclusive e principalmente, para a formação de educadores brincantes, que soubessem cantar, dançar, tocar, contar histórias, construir adereços e brinquedos. Educadores que conseguissem conceber as manifestações populares como instrumentos para o ensino. “Outros profissionais foram chamados para compor um currículo que abrigasse a mesma multiplicidade de linguagens” (ALMEIDA, 2009. pp 10) presentes nas manifestações artísticas populares. “O curso original deu então lugar para A Arte do Brincante para Educadores, que capacita o professor com linguagens da cultura popular brasileira e instiga à reflexão sobre o ensino tradicionalmente oferecido a crianças e jovens.” (ALMEIDA, 2009. pp 10). Pelos treze anos de existência do curso para educadores, ele foi se aperfeiçoando e figurou como foco do Teatro Escola Brincante. Em 1998 foi organizado o I Encontro com a Dança e a Música Brasileiras que consolidou o Brincante como ponto de encontro entre o “público de São Paulo e os mestres e grupos populares vindos de várias partes do país.” (site). A quantidade de atividades oferecidas pelo Brincante aumentou. Foram organizados cursos de percussão e danças brasileiras; curso para jovens brincantes; oficinas das mais variadas manifestações artísticas populares; aulas-espetáculos; além do curso AArte do Brincante para Educadores e dos espetáculos que continuavam a acontecer. “Em 2000 o
  • 9. Brincante consolidou suas múltiplas vocações e, para isso, tornou-se Instituto Brincante, com um estatuto que permite a ampliação das suas ações e formas de gerir recursos e patrocínios necessários à continuidade dessas atividades.” (site). No ano de 2005 o curso AArte do Brincante para Educadores foi selecionado pelo Ministério da Cultura e durante um período de três anos integrou o Programa Nacional Cultura Viva fazendo do Brincante um Ponto de Cultura e atendendo a educadores da rede pública de ensino. Durante todos esses anos o Brincante estabeleceu diversas parcerias com empresas e institutos. Dentre elas estão: Instituto C&A, Philips do Brasil, Fundação Vitae, Itaú Cultural, Instituto Alana, Ministério da Cultura, Instituto Votorantim e IMPAES (Instituto Minidi Pedroso de Arte e Educação Social). 2.1 O BRINCANTE EM SUA MAIORIDADE No ano em que completa dezoito anos de existência, o Instituto Brincante passa por um processo de remodelagem institucional, reorganizando toda a sua equipe e consequentemente o funcionamento do espaço. Até então a organização das atividades, a elaboração e manutenção de projetos e a produção dos eventos do teatro ocorriam de uma forma tal que foi possível manter o Instituto, mas sem atingir o potencial que ele pode oferecer. Atualmente, com a clara intenção de se consolidar como uma Escola de Educação Artística Brasileira, o Brincante passa por um “processo de fortalecimento institucional, através da introdução de processos de gestão organizacional, da sistematização de seu método educacional e do desenvolvimento de estratégias de articulação institucional para viabilizar a sustentabilidade de suas atividades.” (documento institucional – Relatório de atividades 2010
  • 10. v2). Durante esse processo construiu-se uma equipe que conta pessoas direcionadas para cada área específica de atuação: coordenação, gestão institucional, financeira, gerência e produção. Já perante o contrato social do Instituto, que manteve o nome de Teatro Escola, a organização se dá da seguinte maneira: Presidente: Antonio Nóbrega; vice presidente: Maria Amélia Pereira; tesoureiro: Eduardo José Afonso; conselheiros: Alais Avila, Âmbar de Barros, Ana Lucia de Mattos Baretto Villela, Anna Helena Mariani Bittencourt, Enilton Sérgio Tabosa do Egito, Marcos Antonio Magalhães, Suzana Emilio de Moraes. * * * Durante o ano de 2010 o Instituto mantém a sua parceria com o Instituto C&A e iniciou uma nova com o Instituto Alana. O primeiro apoia hoje, o curso A Formação de Jovem Brincante, enquanto o segundo se posicionou como parceiro no processo de reorganização administrativa do Brincante em busca de sua sustentabilidade. A escola disponibiliza para o público, além dos chamados cursos livres, nos quais estão inseridos: Danças brasileiras, Dança afro-brasileira e Percussão brasileira; cursos contínuos como A Arte do Brincante para Educadores e A Formação de Jovem Brincante, os quais contam com estrutura, equipe e metodologia específicas e que são o principal foco de desenvolvimento da escola. O primeiro deles, A Arte do Brincante para Educadores, tem como público alvo educadores/professores, principalmente da rede pública de ensino. Através de uma estrutura modular o curso pretende apresentar e oferecer elementos da arte e da cultura popular brasileira, aos professores da educação básica, para gerar reflexão e possibilitar a criação de
  • 11. novas abordagens pedagógicas. O curso iniciado no ano de 1996, tem como objetivo principal preencher uma lacuna no sistema atual de ensino. Durante um período de oito meses, dos quais cada mês é dedicado a um módulo, os educadores frequentam aulas semanais com duração de quatro horas, sendo que todos os encontros são precedidos por um trabalho corporal. O curso se inicia com o módulo de uma de suas fundadoras, a pedagoga Maria Amelia Pereira, a Peo - Por uma Educação da Sensibilidade. Procedida pelo módulo Danças Brasileiras, de Rosane Almeida; Cantos e Hisórias Tradicionais, de Cristiane Velasco; Figuras e Adereços dos Folguedos Populares, de Cris Cruz; Música das Manifestações Populares da Cultura Brasileira, de Eugenia Nóbrega; Iniciação a Cultura da Crinça, de Lydia Hortélio; A Palavra Poética, de Lucilene Silva e convidados; e Construção de Brinquedos de Adelson Murta. Cada módulo, com diferentes objetivos, parecem, juntos, abraçar um vasto repertório de linguagens artísticas disponibilizando para os educadores um amplo material para recriações e reflexões. Já o curso A Formação de Jovens Brincantes, tem como público alvo jovens, entre 15 e 25 anos, “selecionados a partir da análise de sua situação sócio-econômica e educacional e da presença de vínculo com ações educacionais e sociais, em comunidades de baixa renda.” (documento institucional – Relatório de atividades 2010 v2). Tem como objetivo principal a formação artística e educacional multidiciplinar que percorre o repertório de cantos, danças, histórias e ritmos da cultura popular brasileira. Instrumentalizando, a partir disso, esses jovens para o desenvolvimento de criações artísticas e de novas formas de ações e interações com as suas realidades. Com dois anos de duração o curso se estrutura da seguinte maneira: no primeiro ano
  • 12. com uma aula semanal de três horas, e no segundo ano com três aulas semanais de três horas. No ano de 2010 um terceiro ano começou a estruturar-se de maneira a dar continuidade na formação, criando um núcleo pedagógico com objetivos de acompanhar, registrar, e identificar uma metodologia das atividades do Instituto. De forma geral, cada aula possui uma estrutura básica, composta por quatro fases: “a. Aquecimento - trabalho de conscientização corporal, jogos e exercícios para facilitar a assimilação da seqüência do tema proposto. b. Apropriação - dos conteúdos presentes nas manifestações populares, tais como passos, manobras coreográficas, canções, ritmos e jogos dramáticos, visando sua aprendizagem e desdobramento. c. Criação - conexões das linguagens estudadas com os materiais pessoais e dos grupos, para o desenvolvimento de processos criativos. d. Reflexão - sobre o conteúdo da aula e desaquecimento do corpo.” (documento institucional – Relatório de atividades 2010 v2). O primeiro ano do curso é voltado para o contato inicial do participante com o universo da cultura popular brasileira. Nele se pretende desenvolver o reconhecimento desta referência coletiva como possível elemento para uma construção do presente. O segundo ano é direcionado para um refinamento dos conhecimentos apreendidos até então, encaminhando os alunos para o desenvolvimento de sua autonomia e da criação de aulas e números artísticos. Além disso, durante todo esse período, ocorrem eventos mensais no Instituto, abertos ao público, mas que complementam a formação dos jovens, como: “a. Rodas - encontros mensais com debates, palestras, vídeos e outras vivências intelectuais, ministrados em duas horas, que auxiliem na assimilação dos conteúdos teóricos sobre os temas que relacionam as manifestações populares à brasilidade.
  • 13. b. Oficinas – imersões práticas para o aprofundamento das técnicas de canto, dança, teatro e percussão, desenvolvidas durante um final de semana por mês, com carga horária de doze horas. c. Sambadas – o Teatro Escola Brincante oferece um espaço mensal para a apresentação de jovens artistas. Um espaço aberto e gratuito para que surjam novos talentos e para que as pessoas da comunidade do entorno, família e amigos também participem, vivenciem e experimente a arte do brincante.” (documento institucional – Relatório de atividades 2010 v2). Em todos os cursos oferecidos pelo Instituto, arte e educação caminham sempre juntas, explicitando a crença de seus fundadores evidenciada na fala de Antonio Nóbrega: “a boa arte educa. E a boa educação deve ser artística.” (ALMEIDA, 2009. pp 11). Segundo relatório de atividades do Brincante do ano de 2008, os cursos querem "oferecer a formação de intérpretes e de educadores para que aprendam a "ver e ouvir o Brasil" através do nosso vasto repertório de danças, cantos, histórias, poesias, artes plásticas, brinquedos e brincadeiras".
  • 14. 3. TRAJETÓRIAS. OS PILARES DO TEATRO ESCOLA. A história do Instituto Brincante, suas atividades e sua ideologia não podem ser separadas da trajetória e do fazer artístico de seus fundadores Antonio Nóbrega e Rosane Almeida, assim como de sua orientadora pedagógica Maria Amélia Pereira, a Peo. * * * Nascido no Recife, Antonio Nóbrega se iniciou na música ainda cedo. Deu inicio a três diferentes cursos de graduação (Direito, Letras e Música), não chegando a concluir nenhum. Tocando violino integrou a Orquestra de Câmara da Paraiba e a Orquestra Sinfônica do Recife, até Ariano Suassuna, escritor e dramaturgo pernambucano, lhe convidar a integrar o Quinteto Armorial. O quinteto fazia parte do movimento Armorial que foi oficialmente lançado no dia 18 de outrubro de 1970 com um concerto e uma exposição de artes plásticas no Patio São Pedro (no centro antigo da cidade do Recife). O movimento tinha como proposta a criação de uma arte brasileira erudita criada a partir das raízes populares da cultura nacional. Sua realização tinha como base o estudo das intersecções entre as manifestações da cultura popular nordestina com a cultura ibérica renascentista da qual provinham, passando pela música, literatura, cinema, dança, arquitetura, dramaturgia, artes plásticas e etc. Durante os quase dez anos que integrou o movimento Armorial, Nóbrega passou a se interessar não só pela música, mas por todo o universo dos artistas populares, e foi a partir dessas vivências e referências que ele encontrou um vasto e rico material para criar seus próprios espetáculos. Nóbrega, em uma entrevista cedida a revista Achei!, quando questionado sobre o significado da experiência no Quinteto Armorial para a sua formação, ele responde: "Teve um papel grande. A partir dai fui reconhecer o
  • 15. território da cultura popular, que me era desconhecido, a cultura brasileira como um todo. Foi um abridor de janelas." (Revista Achei! - 2010) Misturando as várias linguagens artísticas como instrumentista, cantor, dançarino, ator e compositor, no ano de 1976 ele apresenta seu primeiro espectáculo "Bandeira do Divino", acompanhado de mais de vinte intérpretes. Ainda em Recife ele cria e apresenta os espectáculos: "AArte da Cantoria" e "O Maracatu Misterioso". No ano de 1983 Antonio Nóbrega, já casado com Rosane se muda pra São Paulo, onde continua seu trabalho. Na capital paulista ele cria "Mateus Presepeiro" (1985); "O Reino do Meio Dia" (1989); "Figural" (1990); "Brincante" (1992); "Segundas Histórias" (1994); "Na Pancada do Ganzá" (1995); "Madeira que Cupim Não Rói" (1997); "Pernambuco Falando para o Mundo" (1998); "O Marco do Meio Dia" (2000); "Lunário Perpétuo" (2002); "Nove de Frevereiro" (2006); "Passo" (2007); e "Naturalmente - Teoria e Jogo de uma Dança Brasileira" (2009). No ano de 1986 volta para o meio acadêmico, mas agora como professor na Universidade de Campinas (UNICAMP). Convidado para ser um dos fundadores do curso de Dança da instituição, leciona o curso de Danças Brasileiras do qual resultará uma pesquisa de campo pelo Nordeste do país com o objetivo de registrar algumas manifestações populares da região procurando atentar não apenas a dança, mas o todo dessas manifestações. Sua formação como artista passou pelo popular e pelo erudito. Teve contato com os mestres populares, dançarinos, palhaços, instrumentistas e cantores, assim como aprendeu com figuras como Luis Soler - músico e professor de violino - Maria Eugenia Popova - também musicista e professora de violino - Klauss Vianna - importante bailarino, coreógrafo e professor, criador um método próprio de consciência corporal e trabalho com o movimento - e o palhaço Dimitri (Suiça), entre outras experiências como a passagem pela Escola Superior das Artes do Circo em Châlons-sur-Marne (França). Da união de todas essas
  • 16. referências atrelada a expressão de outros significados e inquietações particulares surgem todos os seus trabalhos. Numa entrevista concedida à pesquisadora Ana Paula Lourenço de Sá, Nóbrega diz: (…) o meu encontro com a cultura popular se deu através do convite de Ariano Suassuna para que eu integrasse o Quinteto Armorial, e eu aprendi muito bem a lição, ou seja, a lição para mim maior é o seguinte: é que a cultura popular (…) tem um significado, ela tem uma função, na medida em que eu consiga dinamizá-la, ou seja, sem perder aquilo que lhe é essencial, eu conseguir ainda incorporar alguns outros significados. (…) Recriar. (…) E os meus padrinhos, assim, de Crisma dessa postura são Guimarães Rosa, Villa-Lobos, os grandes sambistas brasileiros. * * * Rosane Almeida é natural de Curitiba, e aos 16 anos se mudou para a cidade do Recife, onde conheceu Antonio Nóbrega com quem se casou e começou a trabalhar. Foi ele quem lhe levou, pela primeira vez, a um folguedo de Cavalo-marinho. Escrevendo sobre sua experiência de vida para o programa de seu espetáculo Adeodata ela diz: Eu, uma pós adolescente curitibana, não tive olhos para ver a complexidade dos passos, a originalidade das músicas, a exuberância teatral daquilo tudo. O que me chamou a atenção foram os homens de rostos fortes, feições rachadas pelo sol e pela aspereza da vida, vestindo saias, dançando, cantando e, principalmente, brincando. Nesses últimos vinte anos, convivendo com mestres, folguedos, brincantes, e já bem seduzida pela dança, pela música e pelos procedimentos teatrais, coreográficos e ritualísticos, sempre presentes, o que mais me fascina - e o que se renova a cada encontro - (…) é a qualidade dos seres humanos que se colocam a serviço desses autos. (ALMEIDA, 2006. pp.3). Entre os anos de 1983 e 1993 estudou arte circense na Escola de Circo Picadeiro em São Paulo, na Escola Superior das Artes do Circo em Châlons-sur-Marne (França) e na
  • 17. Scuola de Teatro Dimitri em Versio (Suíça). À sua formação circense somou estudos e atuações em dança, teatro e música numa constante investigação das manifestações populares brasileiras. E, junto a Antonio Nóbrega, criou e participou como atriz - dançarina dos espectáculos: "Brincante"; "Segundas Histórias"; "Na Pancada do Ganzá"; "Madeira que Cupim Não Rói"; "Pernambuco Falando para o Mundo"; "O Marco do Meio Dia"; "Lunário Perpétuo"; e "Nove de Frevereiro". No ano de 2004 criou seu espetáculo solo “A Mais Bela História de Adeodata” o qual lhe rendeu a publicação de livro homônimo pela editora Salamandra no ano de 2006. Juntos, durante os anos de 2005 e 2007, Rosane e Nóbrega viajaram de norte a sul o Brasil numa pesquisa e documentação das danças populares brasileiras que resultou na serie documental Danças Brasileiras, exibida pelo canal Futura. Durante anos aprenderam com os mestres populares, fizeram aulas, participaram das brincadeiras e leram uma vasta bibliografia (hoje organizada no Centro de Documentação - CeDoc - do Instituto) que desse suporte teórico às suas pesquisas práticas. Foram historiadores, sociólogos, poetas, dançarinos, atores, romancistas que compuseram o histórico "acadêmico" dos fundadores do Instituto Brincante. Sendo ressaltados entre eles três importantes referências: Mario de Andrade, Darcy Ribeiro e Edgar Morin. Como fica claro na trajetória de ambos, a cultura teve um papel importante não só como instrumento de trabalho, mas também como maneira de pensar o mundo. Ao Instituto Brincante ficou a "tarefa" de centralizar e organizar todos esses anseios que os levaram a criar seus espetáculos, mas nesse caso, objetivando o ensino. * * * Nascida em Salvador, Bahia, Maria Amélia Pereira, a Peo, cresceu em uma família
  • 18. grande e aberta para estímulos sobre o conhecimento da cultura brasileira e para com uma "consciência social e cultural comprometida com as nossa raízes" (CRUZ, 2005. pp 27). Formou-se no magistério ainda em sua cidade natal onde iniciou sua história de professora. Durante esse período teve a possibilidade de conhecer a Escola Parque de Salvador. Uma experiência na área da educação criada pelo professor Anísio Teixeira, em uma escola da rede pública. Foi a partir desse contacto que Péo decidiu por ingressar na área da educação. Aos 17 anos então, abriu em Salvador o primeiro lugar de atendimento de crianças entre 2 e 7 anos, onde elas pudessem brincar num espaço de natureza, o qual acreditava ser o ideal para crianças dessa faixa etária. Essa relação com a natureza foi se consolidando desde o período, entre seus 12 e 17 anos, em que participava de atividades com crianças em um bairro pobre de Salvador, e percebeu que o convivio com a natureza parecia algo necessário para que a brincadeira pudesse ocorrer de uma forma plena, "como uma linguagem universal de conhecimento".(CRUZ, 2005. pp 28). Foi nesse periodo que conheceu Agostinho da Silva, "mestre e amigo" (CRUZ, 2005. pp 28), segundo ela. Com ele pode refletir sobre o "ser brasileiro" e sobre a "essência do ser criança" (CRUZ, 2005). Além disso teve contato com o método de alfabetização de Paulo Freire. A partir daí decidiu cursar pedagogia na Universidade Nacional de Brasilia buscando pessoas que estivessem pensando um caminho novo para a educação brasileira…o que não aconteceu. Veio então para São Paulo, em 1963 para conhecer experiências novas que aconteciam em escolas tanto públicas como particulares. Durante um curso de formação de professores no método Montessori-Lubienska, Péo foi convidada a participar, como estagiária, da Escola Experimental Vera Cruz. E, chegando a ser sócia fundadora, participou da experiência durante 16 anos. Durante essa experiência ela
  • 19. pode participar de um processo de pesquisa que ocorria na praxis diária da escola, na construção constante de uma reflexão sobre a educação fundamentada na relação entre professores alunos e pais. Foi nessa época que conseguiu iniciar o curso de pedagogia na PUC-SP. E foi relacionando essas atividades que conduzia paralelamente, que pode perceber o "descompasso existente entre o sistema teórico presente no curso de pedagogia e a realidade prática da educação brasileira dentro do sistema de ensino das escolas." (CRUZ, 2005. pp 29). Durante a década de 1970 ocorre uma reforma no ensino que auxiliou para a burocratização do sistema de educação e consequentemente para a degradação qualitativa de seus conteúdos e experiências. A partir disso Péo se distanciou das escolas e foi buscar experiências fora delas. Mudou-se para Brasilia onde pode trabalhar com crianças portadoras de deficiência física na Comunidade Terapeutica do Hospital Sarah Kubitschek, e refletir sobre a prática do professor, o que lhe rendeu a publicação de O Professor, uma pessoa guardada e aguardada. Iniciou, ainda em Brasília, uma pesquisa sobre o repertório gestual das brincadeiras espontâneas das crianças, que aconteciam fora das escolas. Essa experiência lhe trouxe a possibilidade de entender o incômodo que sentia frente as estruturas de ensino. Percebeu que as escolas, privilegiando uma "linguagem estruturalista, um cientificismo" (CRUZ, 2005. pp 30), ignoravam a espontaneidade e a curiosidade presentes nas crianças e que indicavam um processo de conhecimento orgânico. Dois anos depois, voltou para Salvador onde, junto a também educadora Lydia Hortélio dentre outros profissionais, criou um "espaço público educacional dentro de um parque"(CRUZ, 2005. pp 30), como uma experiência que retomava as reflexões de Anísio Teixeira e buscava caminhos para uma educação "criativa e libertadora." (CRUZ, 2005. pp 30).
  • 20. De volta a São Paulo, retomou o trabalho na Escola Vera Cruz, até que quis dar continuidade à pesquisa de brincadeiras de rua na periferia da cidade. Foi então para uma comunidade na periferia do município de Carapicuiba onde documentou detalhadamente vários brinquedos e brincadeiras que ali encontrou. E viajando por várias partes do Brasil pode perceber que a maioria das brincadeiras aconteciam em todos os lugares, afirmando para seus trabalhos a importância desse brincar como o desenvolvimento de um processo de conhecimento. Com a orientação do Professor Petho Sándor para essa pesquisa, Péo percebeu o ato de brincar como um "processo espontâneo de auto-regulação do desenvolvimento da criança" (CRUZ, 2005. pp 31). Entre os anos de 1985 e 1990 ela foi convidada pela International Playing Association, uma organização internacional sobre o direito da criança a brincar, para fazer parte de seu Conselho devida as inúmeras apresentações de diferentes trabalhos que vinha mostrando em conferências nacionais e internacionais. Nessa mesma época foi convidada também a fazer parte do conselho do International Play Journal e para desenvolver o treinamento de professores de creches como iniciativa das Secretarias de Educação dos Estados de São Paulo, Rondonia, Salvador, Belo Horizonte dentre outras cidades do interior. A partir de todas as suas experiências Péo então resolveu abrir um espaço - a Casa Redonda - que pudesse abarcar a experiência de uma educação que vinha se afirmando para ela ao longo de todos esses anos e, principalmente, através do contato com as crianças. Aquilo que ela chamou de uma educação da sensibilidade. Lidando com crianças de 2 a 7 anos o "trabalho na Casa Redonda está voltado para a descoberta da linguagem do espontâneo através do universo das brincadeiras das crianças."(CRUZ, 2005. pp 32). Seguindo esse mesmo objetivo nasceu o curso para educadores no Instituto Brincante, o
  • 21. qual ajudou a fundar no ano de 1995 "Juntamente com outros profissionais que buscam no encontro com a atividade lúdica, o fio da meada para uma educação que afirme no homem o seu caráter eminentemente criador."(CRUZ, 2005. pp 32). No ano seguinte Péo inicia um trabalho com as crianças do município de Carapicuiba criando o que hoje eles chamam de uma Escola Cultural, voltada para o ensino de danças, cantos, histórias e brincadeiras, com a intenção de construir um caminho para o acesso à cultura brasileira através de uma formação que lhes permita descobrir a si mesmas e integrar- se criativamente à comunidade. Atualmente Maria Amélia Pereira desenvolve, durante o curso A Arte do Brincante para Educadores, o módulo Educação da Sensibilidade no qual compartilha com os participantes histórias que foi experenciando ao longo dos anos como educadora. As histórias costumam narrar fatos interessantes e muitas vezes surpreendentes de seu convívio com as crianças, tentando por esse caminho mostrar aos educadores sua simples "metodologia" sem receita: deixar as crianças livres para brincar.
  • 22. 4. UM RÁPIDO PANORAMA HISTÓRICO DA DISCUSSÃO SOBRE O NACIONAL POPULAR A discussão em torno do nacional popular, independentemente da vertente que seguiu, esteve sempre atrelada a uma busca pela identidade nacional, ou seja, por uma "construção simbólica" (ORTIZ, 1991. pp 183) que seria a referência mais autêntica sobre o Brasil. Ao longo da história essa construção variou de acordo com os interesses políticos atrelados aos grupos que a construíram, e sempre estabeleceu uma relação com o exterior. Ou seja, o Brasil, assim como os países que compõem o chamado, nas palavras de Ortiz, "Terceiro Mundo", buscaram estabelecer suas identidades sempre em confronto com o que era estrangeiro, com o que vinha "de fora", sempre com um posicionamento anti imperialista bastante definido. Segundo Renato Ortiz, existem duas vertentes sobre o debate do nacional-popular. A primeira delas teve início com os estudos de Silvio Romero e Celso Magalhães durante século XIX. Nesse período, tanto Europa como Estados Unidos demonstravam bastante interesse sobre a chamada cultura popular, e foi na rabeira desse movimento que alguns intelectuais e artistas brasileiros começaram a se interessar pelo tema. Segundo essa visão, "popular significa tradicional, e se identifica com as manifestações culturais das classes populares, que em princípio preservariam uma cultura "milenar", romanticamente idealizada pelos folcloristas. (…) o popular é visto como objeto que deve ser conservado em museus, livros e casas de cultura, alimentando o saber nostálgico dos intelectuais tradicionais" (ORTIZ, 1991. pp 160). Assim como ocorreu em diferentes países da Europa, no Brasil os estudos folclóricos e o desenvolvimento desse pensamento se deu a partir de uma ligação bastante forte com a questão nacional e a busca por uma identidade que fosse comum a todos os indivíduos da
  • 23. nação. A cultura popular serviu então de alicerce principal na busca por aquilo que seria o mais "verdadeiramente" brasileiro. Para Ortiz, os estudos da cultura popular também passam pela relação de oposição entre o regional e as elites que formam o Estado centralizador. Expondo por tanto, que não seria mera coincidência a predominância dos folcloristas em regiões periféricas do país. Segundo suas palavras "(…) no momento em que a elite local perde o poder no processo de unificação nacional, tem-se o florescimento do estudo da cultura popular." (ORTIZ, 1991. pp. 162). A segunda visão sobre o nacional-popular, localizada na década de 1950, abrangeria diversos exemplos como: o ISEB, os Centros Populares de Cultura, o Movimento de Cultura Popular no Nordeste, entre outros, que podendo ser bastante distintos entre si, tem em comum o seu viés extremamente politizado. A cultura popular, para essa vertente, seria, em oposição ao romantismo folclorista, uma ação política atrelada às classes subalternas, uma forma de conscientização e consequentemente transformação da sociedade. De acordo com essa colocação, segue um pequeno traçado pela história de uma construção intelectual, política e artística sobre o nacional popular. 4.1 OS PRIMEIROS PASSOS Silvio Romero, Nina Rodrigues e Euclides da Cunha foram autores do fim do século XIX que podem ser considerados como precursores das Ciências Sociais no Brasil. Foi com eles também que se iniciou uma discussão sobre o nacional. Entre fins do século XIX e inicio do século XX deu-se, na Europa, a transição entre o período romântico para a construção e consolidação de teorias como o positivismo, o darwinismo social e o evolucionismo. Foi na esteira dessa transição que os intelectuais brasileiros passaram a pensar o país e a sociedade nacional. Nesse momento, mais
  • 24. especificamente entre 1888 e 1914, dois conceitos se tornaram importantes: raça e meio. A raça estaria ligada ao entendimento da construção da sociedade brasileira a partir de três pilares raciais: índios, negros e brancos. Sendo esses últimos os mais importantes e "superiores". O meio seria uma maneira de tentar vincular o entendimento do desenvolvimento da sociedade brasileira com as alterações da região como as condições climáticas, geográficas, botânicas e etc. São esses dois conceitos que auxiliam os intelectuais a construir uma "identidade" que distingue o nacional do estrangeiro: "Ser brasileiro significa viver em um país geograficamente diferente da Europa, povoado por uma raça distinta da europeia. (…) Meio e raça traduzem, por tanto, dois elementos imprescindíveis para a construção de uma identidade brasileira: o nacional e o popular." (ORTIZ, 1994. pp 17). Sendo assim: "A mestiçagem, moral e étnica, possibilita a "aclimatação" da civilização europeia nos trópicos." (ORTIZ, 1994. pp 21), e é isso que, segundo os intelectuais desse período, diferencia aquilo que é brasileiro daquilo que não o é. 4.2 A MESTIÇAGEM EM UM BRASIL "MODERNO" Até o final do século XIX a escravidão colocava impecílios para o entendimento do Brasil como um todo. Desconsiderar a participação do negro na construção de uma identidade nacional tornava as análises da época um tanto incompletas. Só após as transformações sociais decorrentes do processo abolicionista é que os intelectuais passam a considerar o Brasil como fruto da mestiçagem entre índios, negros e brancos. Mesmo assim o caráter mestiço da identidade nacional, em suas interpretações, carregava o fardo negativo dessa
  • 25. mistura. O mestiço era considerado um sujeito pouco racional, sem o ímpeto do trabalho, preguiçoso entre outros adjetivos. Em consequência disso, os intelectuais desse período de transição se deparavam com dificuldades em entender a sociedade que vinha se constituindo, tanto com seus pontos negativos como positivos. O Brasil passava por um período de transformações profundas. O "processo de urbanização e industrialização se acelera, uma classe média se desenvolve, surge um proletariado urbano." (ORTIZ, 1994. pp 39). As antigas interpretações do nacional passam a não dar mais conta da realidade e surgem interpretações como as de Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Caio Prado Jr. O mestiço é, pela primeira vez, visto em sua positividade e se consolida como o nacional. O conceito de raça é substituído e dá lugar ao conceito de cultura, muito influenciado pelo culturalismo de Franz Boas. As interpretações sociais se distanciam do aspecto biológico carregado pela idéia de raça e abre espaço para análises mais ricas da sociedade. Na década de 1930, o Estado Novo então se apropria dessa identidade mestiça para, a sua maneira, colocá-la em função do desenvolvimento de um Brasil "moderno". * * * Foi apenas no início do século XX, com o Movimento Modernista, que veio a tona uma visão da sociedade brasileira nunca antes expressada. Na década de 1920, na cidade de São Paulo, o movimento se instaurou com a reunião de jovens intelectuais e artistas que se propunham a uma redescoberta do Brasil. O Movimento Modernista investiu na procura do "exótico" de seu país para tentar renovar e aproximar as artes e a cultura, do povo brasileiro, algo que antes se achava restrito ao grupo elitista da sociedade. Segundo Roberto Barbato Jr. " A transformação operada pela geração modernista tem
  • 26. seu alicerce calcado no modo pelo qual se definem as formas de articulação cultural entre o património nacional e o universal." (BARBATO, 2004. pg 131). As influências externas vindas das vanguardas européias eram assimilidas de maneira a "adequá-las" às características da cultura nacional, nos termos modernistas, essas influências deveriam ser "deglutidas" de forma crítica para assim recriá-las com uma feição brasileira. Uma das principais figuras do movimento foi Mario de Andrade. Nascido na cidade de São Paulo em 1893 ele pesquisou amplamente a cultura popular brasileira. Enquanto desenvolvia estes seus estudos é que se envolveu com os jovens artístas que viriam a participar do Movimento Modernista. Mas passado o fervor e o auge do movimento, na década seguinte Mario de Andrade entra para a política como diretor do Departamento de Cultura e Recreação da Prefeitura Municipal de São Paulo. Seguindo os mesmo ideais do modernismo, tal departamento tinha como principal objetivo "levar a termo a edificação da nacionalidade" (Roberto Barbarato Jr, pg. 15) brasileira, além de divulgar para todo o país a cultura popular, entendida como nacional. Os intelectuais que fizeram parte dessa experiência desejavam compreender melhor a realidade nacional para assim propor caminhos para o desenvolvimento do país. Entre 1935 e 1938 o Departamento pode então ter a experiência de implementar políticas públicas condizentes com suas intenções, além de, em 1938 iniciar, encabeçada pelo seu diretor, a missão de pesquisas folclóricas. Com o intuito de catalogar manifestações da cultura popular brasileira Mario de Andrade reuniu uma equipe para viajar para as regiões norte e nordeste do país. O que resultou em um vasto acervo de registros em audio, vídeo, imagem e escritos que ainda hoje impressionam pela sua abrangência em relação a quantidade de manifestações "catalogadas" e pelo cuidado na sua qualidade detalista.
  • 27. 4.3 UMA VERTENTE ENGAJADA POLITICAMENTE A interpretação de cultura do início do século é, na década de 1950, remodelada pelos intelectuais do Iseb (Instituto Superior de Estudos Brasileiros), que, distantes da influência do culturalismo americano, querem construir uma outra teoria do Brasil. Sua idéia de cultura é influenciada pela filosofia e sociologia alemãs que entendem esse conceito como "objetivações do espírito humano. Mas eles insistirão sobretudo no fato de que a cultura significa um vir a ser." (ORTIZ, 1994. pp 45). Nesse sentido a cultura passa a ser interpretada como um elemento de transformação social. O Instituto, criado no ano de 1955, unia intelectuais e pessoas do governo, e esteve sempre subordinado ao Ministério da Educação e Cultura. Foi um centro de "formação política e ideológica, de orientação democrática e reformista." (TOLEDO, 2005. pp 11). Intelectuais de diferentes orientações teóricas debatiam para a construção de um projeto ideológico comum para o país. O incentivo a um "nacional desenvolvimentismo" (TOLEDO, 2005. pp 11) esteve não em função do Estado que na época se estabelecia - o período JK - mas sim em total sintonia com o mesmo. O Brasil, assim como outros países do chamado "Terceiro Mundo", começavam a se colocar frente ao quadro de dominação internacional estabelecia desde a época colonial. Questões como da situação colonial e da alienação tomavam força nas discussões da intelectualidade brasileira para a construção do nacional. Anos depois, o Iseb se fragmentou e seus intelectuais perceberam que o nacional desenvolvimentismo serviu apenas para o crescimento econômico do país, enquanto as desigualdades sociais históricas permaneciam as mesmas, revelando assim o caráter da ideologia como representação de uma classe dominante. Mesmo assim o Instituto esteve conectado com as lutas sociais entre as décadas de 1950 e 1960, tanto que, chegada a ditadura militar, sua sede foi vandalizada e destruída.
  • 28. Essa construção de ideais políticos iniciada pelo Iseb influencia dois movimentos distintos do inicio da década de 1960: o Movimento de Cultura Popular no Recife e o CPC. O Movimento de Cultura Popular no Recife nasceu no ano de 1960 como uma instituição sem fins lucrativos e que pretendia conscientizar as massas através da educação de base. Eram apresentados espetáculos em lugares públicos, grupos artísticos eram organizados, assim como cursos de arte, exposições e etc. Dentre os intelectuais que integravam o movimento estavam: Paulo Freire, Ariano Suassuna e Francisco Brennand, que receberam o apoio da prefeitura de Recife, assim como da UNE e do PCB, chegando a influênciar outras iniciativas em diferentes Estados do país. Até que, com o golpe militar de 1964 o movimento foi extinto. O CPC - Centro Popular de Cultura - tinha objetivos e fases definidas para a concretização dos mesmo. Para chegar às massas deveria-se passar por duas etapas: a primeira delas estava voltada para a criação de uma intelectualidade que estivesse comprometida com a realidade do país; enquanto a segunda estava voltada para a "união e formação do povo não somente como recebedor, mas também como criador de cultura." (…) "As principais atividades do CPC sempre estiveram vinculadas à produção de "cultura popular". Entretanto, distinta da interpretação adotada pelos intelectuais folcloristas" (GARCIA, 2004. pp 12) associada a uma perspectiva romântica na qual o popular estaria ligado à manifestações culturais de classes populares que guardam uma cultura espontânea e que deve ser conservada. Para os intelectuais do CPC a "arte popular revolucionária" é que interessava. Era necessário que o artista brasileiro tomasse consciência da necessidade de uma revolução, e que através de sua arte conscientizasse o povo, mesmo que as preocupações estéticas ficassem subjulgadas às fórmulas de fácil compreensão, buscando assim atigir o maior número possível de pessoas. Nesse caso, "o conceito de cultura popular se confunde, pois, com a idéia de conscientização." (ORTIZ, 1994), e se coloca em oposição a uma
  • 29. "cultura alienada" (ORTIZ, 1994). Acreditando na construção de uma prática anterior à teoria, segundo as análises de Renato Ortiz, o manifesto do CPC não pode ser considerado como um projeto previamente elaborado mesmo tendo objetivos e fases bem definidas. De qualquer maneira a integração e consequentemente a conscientização das classes populares não ocorreu, o que caracterizou principalmente a atuação do CPC foi a mobilização de intelectuais e artistas da classe média. Movimentos e iniciativas como essas indicam uma necessidade da intelectualidade em não apenas expor uma visão e uma interpretação sobre a realidade brasileira, mas experimentar maneiras de transformar essa realidade. O nacional e o popular passam a traçar não só vertentes de construção de uma identidade como também apontar caminhos para a transformação da sociedade brasileira. 4.4 O MARCO DE 1964 Segundo Renato Ortiz, o golpe militar de 1964 marcou a história brasileira tanto política como economicamente, com consequências no campo da cultura. As transformações que então se deram empurraram o país em direção a um modelo de desenvolvimento, de "modernização" social, econômica e regionalmente desigual. Mesmo assim o estado autoritário trabalhava com o conceito de "integração nacional". Uma integração que buscava controlar a sociedade em prol da segurança nacional. Nesse contexto a área cultural é estimulada e ganha dimensão nacional na medida em que é tida pelo Estado como um meio para estabelecer a integração, sempre subordinada ao Poder Nacional, ao Estado centralizador. Entre o período de 1964 a 1980 o Brasil passa por um grande crescimento da produção, da distribuição e do consumo de "bens culturais" (ORTIZ, 1994) mas sempre estimuladas e
  • 30. controladas por órgãos do governo. O crescimento é acompanhado pela censura política e ideológica. No ano de 1966 é formado o Conselho Federal de Cultura (CFC) com o objetivo de controlar as atividades culturais do país. A ideologia deste órgão considerava o Brasil como mestiço, como fruto da miscigenação entre as três raças - como já havia sido determinado pelos intelectuais anos antes. O Brasil seria uma "unidade na diversidade" (ORTIZ, 1994). Porém o problema da questão da diversidade como característica de uma unidade nacional está no fato de que ela pressupõe uma harmonia que encobre os possíveis e existentes conflitos e contradições sociais. Indo ao encontro da intenção do governo militar em manter a ordem e "preservar" a segurança nacional. Assim como o aspecto mestiço foi importante para a construção ideológica do CFC, a ideia de tradição também esteve bastante presente como prioridade nas suas ações. A cultura brasileira entendida como um "conjunto de valores espirituais e materiais acumulados através do tempo" (ORTIZ, 1994) e que, como um patrimônio, deveria ser preservada. Nessa lógica, a cultura popular passa a ser considerada como tradição e como identidade. * * * Na esteira desse período, nas décadas de 1960 e 1970, surgem em diferentes regiões do país dois importantes movimentos. O Tropicalismo surgiu no ano de 1967 criticando movimentos exacerbadamente nacionalistas que submetiam a discussão artística à orientações de ideologias políticas. Realizado no eixo Rio - São Paulo o movimento chegou a percorrer o país influenciando, principalmente jovens universitários, não apenas com suas tendências estéticas mas também com seus ideais de comportamento. Dentre os artistas que participaram o seu núcleo se
  • 31. concentrava nas figuras de Tom Zé, Gilberto Gil e Caetano Veloso. Mesmo criticando movimentos de cunho nacionalista "ortodoxo", o Tropicalismo trazia a preocupação da construção de uma sociedade nacional capaz de acompanhar as mudanças que ocorriam no contexto mundial. Segundo Amilcar Almeida Bezerra as obras do Tropicalismo carregavam um tom pessimista em relação as contradições da sociedade brasileira. O sonho que se tinha sobre uma possível sociedade estava muito distante da sua realidade, resultando em um impasse sem solução. O Movimento Armorial, surge três anos depois na região Nordeste do país, mais especificamente no estado de Pernambuco. Seu mentor, Ariano Suassuna reúne intelectuais e artístas com o intuito de construir uma arte brasileira erudita calcada nas matrizes populares. A cultura popular seria uma matéria prima capaz de revelar a verdadeira identidade brasileira. Questões como a cultura de massa e, principalmente, a internacionalização da cultura trazem a tona discussões extremamente polêmicas em torno do movimento. Nessa discussão a postura assumida por Suassuna aponta para uma retração necessária que implica em um isolamento frente as transformações mundiais em relação a flexibilização das fronteiras culturais, e mais do que isso, econômicas. Ambos os movimentos trabalham de diferentes formas, se não antagônicas, com a questão do nacional em sua relação com o exterior e do popular em seu caráter identitário. Na interpretação de Amilcar Almeida Bezerra eles seriam uma continuação recriada das discussões e das visões trazidas pelo Modernismo brasileiro da década de 1920. O Tropicalismo estaria ligado ao Manifesto Antropofágico de Oswald de Andrade que propunha a absorção crítica de influências estrangeiras, enquanto o Movimento Armorial faria a releitura do ideário de Mario de Andrade sobre as pesquisas e a construção de uma arte nacional erudita.
  • 32. * * * Atualmente a cultura popular está completamente inserida no aparelho de estado brasileiro. Se construiu e consolidou a ideia de um Brasil mosaico, da miscigenação e da tolerância. O texto divulgado no site do governo federal confirma sua ideologia: O Brasil fascina por sua miscigenação de raízes indígenas, europeias, asiáticas e africanas, e suas várias facetas refletidas na cultura nacional. Culinária, música, artesanato, arquitetura, produções artísticas e festas populares ultrapassam as fronteiras do território nacional. O país conta com 17 bens culturais e naturais tombados pelo Patrimônio Mundial da Unesco e uma das maravilhas do mundo contemporâneo, o Cristo Redentor. O Brasil é o país da tolerância étnica, cultural, religiosa e social. O grande número de etnias, em vez de hostilidade, encontra no Brasil um ambiente de respeito e tolerância às diferenças e à troca de experiências. Essa matriz gera um ambiente social no qual o povo absorve o pluralismo, o respeito às diferenças e a troca de experiências. Tal convivência pacífica resulta em manifestações culturais versáteis e cheias de originalidade. A diversidade também dá o tom no rico acervo arquitetônico, desde o colonial barroco até o modernismo da capital federal, Brasília. A imigração no Brasil foi de extrema importância para a formação da cultura nacional. Características dos quatro cantos do mundo foram incorporadas ao longo dos cinco séculos desde a chegada dos portugueses, em 1500. Além das contribuições de índios, negros e portugueses, a expressiva vinda de imigrantes de todas as partes da Europa, do Oriente Médio e da Ásia influenciou a formação do povo brasileiro. A imigração de países vizinhos, como Argentina, Uruguai, Chile e Bolívia, também contribuiu para a diversificação de costumes, hábitos e crenças, mas com um idioma comum. Apesar de sua extensão territorial, fala-se o mesmo idioma em todas as regiões brasileiras. O português é a quinta língua mais falada, e a terceira entre as ocidentais, após o inglês e o espanhol. A Constituição Brasileira assegura o pleno exercício dos direitos culturais e define que o estado deve apoiar, incentivar e valorizar suas manifestações, além de proteger as culturas indígenas, afro- brasileiras e de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional. (www.brasil.gov.br/sobre/cultura/cultura- brasileira). A partir dessa visão idílica, os diferentes ministérios, assim como regionalmente os
  • 33. governos estaduais e municipais, elaboram projetos e editais que buscam dar conta de "conservar" patrimônios materiais e imateriais de uma cultura popular, incentivando assim a concretização de um Brasil "de todos". Ou a sua ilusão. 4.5 UMA BREVE CONSIDERAÇÃO Em um de seus seminários Marilena Chaui explicita as possíveis confusões que o termo "nacional popular" pode suscitar, como sua transformação em nacionalismo cultural ou em populismo nacionalista. Essa confusão parece se dar quando se misturam aquilo que Renato Ortiz chamou de "memória coletiva" e "memória nacional". "A memória coletiva é da ordem da vivência, a memória nacional se refere a uma história que transcende os sujeitos e não se concretiza imediatamente no seu cotidiano. (…) a memória coletiva se aproxima do mito e se manifesta, por tanto ritualmente. A memória nacional é da ordem da ideologia, ela é produto de uma história social (…)" (ORTIZ, 1994. pp.135). A questão da cultura popular, tratada ao longo da história brasileira, apareceu como uma maneira de se estabelecer uma identidade nacional mas sempre vinculada a uma ideologia política. Ideologias que buscavam a manutenção da ordem, no caso do Estado, ou uma transformação da sociedade, como alguns exemplos de movimentos sociais e artísticos. O caso que abordamos nesse trabalho, do Instituto Brincante, como um teatro escola e desvinculado de qualquer ideologia política, parece dar continuidade a uma linha de pensamento sobre o tema que teve início com os estudos de Mario de Andrade, passou pelo Movimento Armorial e, atrelado a outras influências acabou por consolidar uma visão própria. Uma visão que busca, em seu limite, uma transformação social através da educação e da construção de um indivíduo criativo e consciente de si. Dessa maneira o Instituto busca,
  • 34. assim como outros movimentos acima citados, mudanças objetivas na sociedade, mas o caminho que percorre não se destaca do caráter subjetivo da ritualidade característica de uma "memória coletiva", traçando dessa forma uma transformação orgânica através dos próprios indivíduos.
  • 35. 5. CONVERSAS – A DISCUSSÃO DENTRO DO BRINCANTE Durante o processo de pesquisa deste trabalho, na busca por uma melhor compreensão do meu objeto de estudos, algumas questões foram surgindo. A partir delas foi possível conversar com aqueles que denominei de “pilares do teatro escola”: Antonio Nóbrega, Rosane Almeida e Peo. As três principais questões que nortearam essas conversas passaram por: • • O que você entende por cultura popular? • • Qual a relevância dessa visão quando inserida na sociedade contemporânea? • • Como essa visão vira pedagogia dentro de um teatro escola? Todas as conversar mostraram o encantamento e, ao mesmo tempo, os anos de estudos voltados para o entendimento e a busca, por diversas vias, da concretização de um pensamento sobre a cultura popular brasileira, a transformação individual e a criação de uma escola. O Instituto Brincante, unindo essas três figuras, centralizou essa busca pela via da educação artística. * * * Quando questionada sobre a cultura popular Rosane expõe uma visão que remete a história longínqua do desenvolvimento do ser humano. Essa cultura seria, segundo ela, a reminiscência das primeiras tentativas do ser humano em entender o mundo e a sua própria existência. Ao longo da história, as diferentes formas que essa tentativa foi tomando apenas se transformaram para se adaptar aos novos questionamentos que surgiam em um tempo e espaço diferentes. Menifestações como o Coco, o Cavalo Marinho, o Batuque de Umbigada, o Jongo são formas que no decorrer da nossa história foram se modificando, mas a base
  • 36. primordial delas, o que as gerou, foram festas e rituais que estavam atreladas a essas buscas do ser humano. Para exemplificar melhor ela cita a manifestação popular do Bumba meu Boi que representa em seu enredo o ciclo de vida, morte e renascimento. Representação essa que pode ser encontrada em diversas outras manifestações e que indica, segundo ela, a necessidade recorrente do ser humano em compreender os ciclos da vida que contém a morte. Como de alguma forma essa necessidade se faz presente nos questionamentos do ser humano ainda nos dias atuais, manifestações como o Bumba meu Boi encontram espaço para se perpetuar. Segundo Mario de Andrade: A simbólica é duma importância decisiva, eu creio, para se compreender a permanência de certas tradições de realidades extintas, na coletividade. Parece à primeira vista absurdíssimo que em capitais regularmente estabelecidas do Brasil atual, ainda celebrem a morte e a ressurreição do boi, (…). Mas é que esses assuntos possuem uma simbólica vasta que permite ao povo o exercício permanente de certas práticas vitais. O boi não representa já agora o animal tão historicamente básico da civilização nacional, nem pastoreios, nem mesmo a precisão da carne alimentar. Representa apenas, e por isso em principal a evocação dele é grata à representação coletiva, a necessidade do alimento (qualquer), as dificuldades e lutas pra conquistar o alimento, bem como práticas da vida familiar e coletiva. (ANDRADE, 1982. pg 71) Independentemente do motivo que vai auxiliar na continuidade transformadora de uma manifestação popular, a questão principal trazida pelas duas interpretações do mesmo exemplo confirma, na verdade, a idéia da necessidade da existência de um sentido, um "porque" daquela manifestação acontecer. O ser humano que as vivencia precisa estar suprindo uma necessidade de se deparar com questionamentos que lhe movem em direção à compreensão de si mesmo e do mundo ao seu redor. Nesse mesmo sentido Peo fala da cultura popular como manifestações culturais que se mostram como "um recurso que as pessoas utilizam para manifestar e para elaborar um sentido de vida para eles próprios. Ela traduz a
  • 37. busca desse povo para dar sentido a sua própria existência." (PEREIRA, informação verbal). Segundo essa lógica de raciocínio, o caráter flexível e mutante da cultura popular demonstra por quais caminhos o homem está guiando as suas buscas, e consequentemente quais os seus questionamentos atuais. Isso nos leva a entender a cultura popular como uma maneira do indivíduo aprender a enxergar suas necessidades como ser humano e sua relação com o mundo para, a partir desse entendimento, buscar realizá-las. Rosane faz uma citação popular, de autor desconhecido: “A gente deve olhar para o passado sem virar a cabeça.”, para assim finalizar seu raciocínio enfatizando o constante movimento da construção dessa cultura popular que, segundo ela, parece ser um conceito que não cabe mais em nenhuma das palavras que buscam designá-lo. Trazendo um olhar mais histórico da construção cultural do país, Nóbrega entende que: "Cultura popular é o nome que, no me entender, denomina um determinado estrato cultural brasileiro fruto de um processo que ficou a deriva de outro extrato cultural que foi predominante. Ou seja, na formação do Brasil nós tivemos contribuições dos índios, que aqui estavam, que se encontraram com fragmentos da cultura ibérica e que depois se encontraram também com culturas de transplante como foi o caso dos negros africanos. Foi possível acontecer no Brasil um processo de miscigenação cultural na qual essas três contribuições foram excluidas do extrato cultural do colonizador. É nesse sentido que eu entendo cultura popular." (NÓBREGA, informação verbal). Nessa sua definição busca se distanciar da denominação "folclore" que segundo ele remete a algo afastado do constante movimento em que se encontra o desenvolvimento cultural. A visão impregnada na palavra "folclore" nunca passou pelo entendimento dessa cultura como dinamizadora da cultura contemporânea da época. Assim também, busca se afastar do nacional popular. Mesmo trazendo uma definição de cultura popular que pode se aproximar das definições que auxiliaram o nacional popular a se consolidar ele entende que este traz como primazia o resgate dessa cultura como sendo
  • 38. elemento de afirmação nacional, independente dos seus conteúdos. Ou seja, muitas vezes, em prol da construção de uma identidade nacional, se define algo como brasileiro mas que talvez o seu conteúdo já tenha se tornado "velho" perante a sociedade atual. Talvez uma manifestação que fez sentido algum dia para aquele tempo e espaço nos quais se desenvolveu, não tenha o mesmo sentido para a sociedade contemporânea. Acaba por, desse maneira, construir um produto daquilo que denomina nacional completamente descolado da realidade vivenciada pelo povo, e com o qual nenhum indivíduo consegue se identificar. Se torna apenas um discurso político. "Ao mesmo tempo isso não quer dizer que a gente deva completamente se abstrair de um pensamento nacional para a cultura, eu acho que a gente deve relativizar o nacional. Penso que essa cultura que caminhou a margem da cultura dominante tem uma substancia com alguma riqueza, e não olhar para essa riqueza e tentar dinamiza-la, acho uma perda." (NÓBREGA, informação verbal). Afastando-se dos folcloristas, e de sua interpretação romântica da cultura popular que ainda se faz presente no discurso de patrimônio e preservação do atual governo, a reflexão sobre o tema deve ser feita "sem nenhum saudosismo, sem nenhuma pretensão de resgatar, de repetir, de reproduzir, porque essas coisas são extremamente vivas e moldáveis dependendo da época que elas estão sendo vividas." (ALMEIDA, informação verbal). Por isso, atualmente, deve-se entender a cultura popular a partir do tempo presente, e o "primeiro olhar que deve se ter para essas manifestações deve passar pela interpretação delas como os primeiros exercícios para o ser animal passar a ser humano. E isso se dá no momento em que o humano se reconhece no outro."(ALMEIDA, informação verbal). Esse reconhecimento estabelece o vínculo etimologicamente enraizado na palavra brincar. Como se a brincadeira representasse esse olhar diferenciado para a cultura popular brasileira. Como se no espírito do brincar se concretizassem uma maneira de compreender o
  • 39. transe, o ritual e o simbólico. * * * Considerando que as manifestações populares são formas que ao longo do tempo vão se transformando, o que está em seu cerne e que independente das modificações em sua forma se perpetua até os dias de hoje? Segundo Rosane esse núcleo para o qual devemos direcionar nossa atenção quando trabalhamos com as manifestações da cultura popular é construído a partir da vivência do transe, do ritual e do simbólico. O transe não como a forma a qual constantemente associamos essa palavra, atrelada a rituais religiosos, mas sim como um uso inteligente do corpo que auxilia o ser humano no alcance de um outro nível de consciência. Como exercício para, a partir do físico, atingir um estado de prontidão necessário para a vida mas que no nosso cotidiano, da maneira que se constituiu, não é possível alcançar. O ritual, assim como o transe que costumamos aproximar das práticas religiosas, deve ser entendido para além dessa forma, como a mobilização da energia para que se faça uma coisa. Ou seja, é como um treino para que se exercite estar inteiramente presente naquilo que se está fazendo, para que, desse maneira se chegue a expressão máxima do potencial do ser humano. E por fim, o simbólico como um caminho para "assimliar os conhecimentos através de formas, de sensações, não só conceitualmente." (ALMEIDA, informação verbal). Atualmente esses elementos característicos da cultura popular são negados, ou melhor, a sociedade contemporânea abdicou desses elementos em favor de outros estreitamente vinculados à racionalidade, à razão, à construção fragmentada de conhecimentos que auxiliou na criação e no crescimento de especialistas. Essa especialidade desenvolve grandes
  • 40. competências mas que não conseguem ser transpostas para nenhum outro segmento da vida. A construção do conhecimento via exclusivamente racional é limitada para o crescimento do indivíduo. Esse crescimento deveria passar por todos esses elementos que estão no cerne das manifestações populares, como vivências do simbólico, do ritual e do transe que acontecem apenas com o indivíduo em sua totalidade, consciente. "Este saber popular não existe fora das pessoas, mas entre elas." (ORTIZ, 1994. pp. 134) Nóbrega enxerga a grande contribuição das manifestações da cultura popular para a sociedade atual na retomada de um equilíbrio que atualmente se encontra desbalanceado em favor dessa racionalidade e em detrimento do sensível. "É nesse sentido que eu acho que é importante a gente entender a cultura popular como ela portadora de conteúdos, de substâncias que, trazidas a tona podem dialogar com que o patrimônio ocidental construiu e assim criar um outro patamar de construção artística mais equilibrada, mais harmoniosa." (NÓBREGA, informação verbal). O que ele exemplifica com a criação artística deve ser entendida em relação a todos os elementos do nosso cotidiano. Nesse sentido é preciso ter o cuidado para não renegar completamente toda essa racionalidade construída ao longo da história da civilização ocidental. As manifestações da cultura popular, segundo Nóbrega, nos trazem o outro pólo na busca por um equilíbrio, mas que em suas manifestações aparece também desbalanceado mas no sentido da exarcebação da emoção e da sensibilidade. E é na busca por esse equilíbrio que está o maior desafio. * * * O Brincante, fruto dessas visões, se constituiu como um espaço de experimentação. Um lugar no qual, através de manifestações da cultura popular se busca a transformação do indivíduo e consequentemente da sociedade. Afinal, isso que "chamamos de familia,
  • 41. sociedade, Estado, é construída por seres humanos e consequentemente, quanto melhor o ser humano melhor será essa sociedade." (ALMEIDA, informação verbal). Para organizar essa busca, a princípio subjetiva, algo de concreto ocorre nas aulas e atividade desenvolvidas dentro do teatro escola. Nos dezoito anos de experiência e convívio com as pessoas que por ali passaram se percebeu que é possível estabelecer uma forma para ensinar passos de determinada dança, toques e cantos de uma determinada música, versos de poesias e etc. Mas quando se busca transcender a forma para alcançar o sentido que ela pode carregar para diferentes pessoas, a metodologia é não ter receita. Essa construção de uma escola que não possui uma fórmula para o desenvolvimento de suas atividades só se torna sustentável quando se tem na figura do professor uma pessoa extremamente preparada para esse desenvolvimento. O trabalho do Brincante começa então na formação de uma equipe de professores que tenham, ao longo de suas trajetórias, desenvolvido o seu trabalho em uma estreita relação com as manifestações da cultura popular para a partir desse centro comum desenvolverem suas aulas. Os talento individuais aparecem ai como um dos principais requisitos para a eficácia dessa experiência. É interessante notar que muitos dos que hoje são professores do Brincante, foram alunos. Lá experimentaram o contato com algumas manifestações da cultura popular e a partir daí deram inicio às suas pesquisas e seus trabalhos relacionados a isso, chegando, tempos depois, a retornar ao Brincante como professores. A maneira como se constroem as aulas variam então, de acordo com cada professor. O diálogo e a ligação entre eles se dá pelo conteúdo. O conteúdo que enxerga nas manifestações populares ferramentas para o crescimento humano. Em seu trajeto individual cada professor aprendeu, à sua maneira, os elementos que "sustentam" uma manifestação popular em sua vivacidade, e de alguma maneira isso se imprime nas aulas. "É uma metodologia que não tem uma única receita mas a mesmo tempo ela tem pilares muito bem definidos do que é possivel
  • 42. você fazer para acionar o novo no outro. Essa criatividade, essa atenção, essa entrega, esse acesso a facetas diferentes de si mesmo" tão presentes na cultura popular. "Porque isso seriam os pilares do que a gente quer." (ALMEIDA, informação verbal). A maneira como esses pilares são edificados, como eles se comunicam é que vai variar de um professor para o outro. Chegando nos alunos, no caso dos cursos de formação (ou de jovens ou de educadores), essas experiências mais subjetivas são experimentadas fisicamente para a a partir disso chegarem à uma reflexão intelectual. No caso dos cursos livres com encontros mais esporádicos e com um público rotativo, o Brincante parece servir de espaço para vivenciar tudo aquilo que se tornou distante do cotidiano da maioria da população, a festa, o riso, a transpiração física, a concentração, o outro, enfim, a brincadeira. Para Nóbrega o próximo passo dentro da escola Brincante é conseguir trabalhar harmoniosamente com esses pólos dentro de uma aula. Como fazer do Brincante um lugar que não seja um espaço para se experimentar aqueles elementos tirados do nosso cotidiano, aqueles elementos que completam as lacunas da sociedade atual, mas sim um espaço onde possa se experimentar essa totalidade equilibrada. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS - UM COMEÇO
  • 43. Na tentativa de compreender o trabalho feito dentro do Brincante, esbarrei em questões extremamente importantes para o entendimento do desenvolvimento político e cultural da sociedade contemporânea. Os descompassos entre discursos políticos e realidades sociais, a marginalização do que aqui chamamos de cultura popular em paralelo com a patrimonialização de suas manifestações quando interessantes para a construção de uma ideologia política, a chamada cultura de massa que hoje toma o lugar do "popular" e que com ele se confunde, dentre outras que não tiveram espaço para serem adequadamente abordadas. De qualquer forma todas essas sugestões me atentaram para um discurso carregado de vícios e preconceitos que perdura até hoje. Nesse contexto o Brincante se coloca como uma possível alternativa para se pensar o ser humano e o mundo contemporâneo através do olhar que é possível de se desenvolver, via as manifestações da cultura popular brasileira. Nesse sentido não importa discursar sobre uma suposta identidade nacional, porque ela seria mais uma forma na qual se congelaria um ser brasileiro, ela reduziria as inúmeras possibilidades do ser humano em uma homogeneidade nacional. Quando o objetivo passa a ser a transformação social por meio da construção do indivíduo, mais uma vez a forma é transcendida em prol de uma vivência coletiva da cultura. No Brincante, a confusão que comumente é trazida pelo conceito de cultura popular atrelado a idéia do nacional, parece estar bem resolvida. Aquilo que Renato Ortiz fez questão de separar em "memória nacional" e "memória coletiva" aparece na construção de uma aprendizagem "brincante". Nela a "memória coletiva", que opera na ordem da vivência, na concretude do cotidiano, traduz para as atividades ali existentes uma maneira de tornar o indivíduo parte integrante do todo que chamamos de cultura. Trazendo para perto conceitos que a priori nos parecem tão distantes. De uma certa maneira essa pesquisa buscou responder a um questionamento sobre a
  • 44. relevância do trabalho com manifestações da cultura popular, inserido em uma sociedade repleta de possibilidades. Qual a transformação que esse trabalho poderia gerar? Qual o sentido dele? De certo que a visão abordada aqui possui limitações. A busca por enfatizar o trabalho com o sensível, em oposição à racionalidade predominante na nossa sociedade, cria uma vivência que tende ao desenvolvimento de uma parte do ser humano que pouco tem espaço para se desenvolver cotidianamente. Isso faz do Brincante um lugar no qual se desenvolvem atividades que suprem uma lacuna dos dias atuais. A experiência da conjugação desses dois pólos fica a cargo de cada indivíduo dentro das relações que este consiga desenvolver no seu dia a dia. Sendo que, se dentro das atividades do Brincante fosse possível desenvolver as inúmeras vantagens que a racionalidade possibilitou ao ser humano, sempre conjugadas àquilo que já está bem consolidado na metodologia Brincante, a potencialidade daquilo que já ocorre poderia tomar maiores proporções. O foco no desenvolvimento sensível do ser humano não escapa do engano de transformar as experiências ali vividas, em discursos pouco fundamentados. Em discursos que apenas reproduzem como informação aquilo que foi apreendido. A validade que acredito existir na construção dessa totalidade está, tanto no equilíbrio que Nóbrega cita na conversa como também na construção individual de uma aprendizagem, de um desenvolvimento, e de uma conclusão racional dos temas vivenciados sensivelmente, para que se saia do Brincante com bases não apenas intuitivas, mas também teóricas para a discussão e a argumentação sobre o que ali é feito. De alguma forma isso já começa ser feito nos cursos de formação quando se propõe reflexões sobre as vivências. Penso que importante seria também criar bases teóricas para ampliar o potencial dessas reflexões. Aprofundar conhecimentos que estão à disposição da humanidade, para além da experiência individual. * * *
  • 45. A metodologia do Brincante se apresenta ainda em fase de desenvolvimento. O cerne de sua construção já se mostra consolidado, mas a maneira como isso se dá ainda parece nebulosa. Durante os dezoito anos de existência foi apenas nesse último ano que o Brincante buscou entender qual a metodologia que ali se consolida. Como toda a intuição e os saberes que fizeram daquele espaço e da carreira individual de seus fundadores, fortes referências dessa maneira de se trabalhar com as manifestações populares, se transformam em atividades dentro de um espaço chamado teatro escola. A meu ver só o tempo possibilitará esse entendimento. Dentre algumas visões sobre a cultura popular discorridas nesse trabalho, a vertente abordada pelo Brincante pode ser o início para um entendimento mais profundo dessas manifestações. Se elas não trouxerem um sentido para quem as vivencia, não existe conceito que as faça sobreviver em sua totalidade transformadora, não existe ideologia que as torne representantes de uma "identidade" nacional. O objetivo educacional do Brincante se torna, em última instância, político. Reconhece, a partir de cada indivíduo, as buscas e as dificuldades que o coletivo enfrenta vivendo em um tempo como os dias de hoje e em um espaço como o centro urbano. A importância do olhar para a cultura popular desenvolvida dentro do teatro escola está exatamente no seu caráter mobilizador. Ou seja, o Brincante funciona como uma experiência de ser, ele próprio, um elemento dinamizador da compreensão, do desenvolvimento e da apropriação do sentido maior de desenvolvimento humano existente nas manifestações da cultura popular. Seja por meio da festa, do rito ou da reflexão. No Brincante os frequentadores parecem ter a possibilidade de vivenciar, à sua maneira, uma aproximação daquilo que costuma estar extremamente distante da construção de sua realidade ou do entendimento conceitual sobre o tema. Esse viés de entendimento sobre a cultura popular
  • 46. esforça-se por dismistificar a construção política de uma definição que pouco trabalha com a vivacidade dessa cultura. Busca livrar esse conceito de vícios e preconceitos ainda hoje bastante evidentes. Este trabalho buscou fazer o árduo caminho da concretização teórica de uma vivência pessoal e de um convívio particular. Da transformação de saberes, a princípio subjetivos, em um texto concreto que não pendessem à um discurso ideológico. A concretude da vivência sempre parece menor quando exigimos dela palavras em um papel. "Amável o senhor me ouviu, minha idéia confirmou: que o diabo não existe. Pois não? O senhor é um homem soberano, circuspecto. Amigos somos. Nonada. O diabo não há! É o que eu digo, se for… Existe é o homem humano. Travessia." (ROSA, 2001. pp.624) BIBLIOGRAFIA
  • 47. ACSELRAD, Maria. Viva Pareia! – A arte da brincadeira ou a beleza da safadeza: uma abordagem antropológica da estética do Cavalo Marinho. Rio de Janeiro, 2002. Dissertação de mestrado. Pós- graduação em Sociologia e Antropologia, UFRJ. ALMEIDA, Rosane. A Mais Bela História de Adeodata. São Paulo: Salamandra, 2006. ANDRADE, Mario de. "Introdução" In: Danças Dramáticas do Brasil. 1ºTomo. 2ª Ed. Belo Horizonte: Itatiai BARBATO, Roberto. Missionários de uma utopia nacional-popular: os intelectuais e o Departamento de Cultura de São Paulo. São Paulo: Annablume/Fapesp, 2004. BEZERRA, Amilcar Almeida. Movimento Armorial X Tropicalismo: dilemas brasileirs sobre a questão nacional na cultura contemporânea. V Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura, Bahia: UFBa, 2009. CANDUSSO, Marina Abib, e ALMEIDA, Maria Eugenia. Estudos de uma Pesquisa em Dança. São Paulo, 2009. Monografia desenvolvida pelo ProAC da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo. CHAUÍ, Marilena. “Seminário I”. In: Seminários: o Nacional e o Popular na Cultura Brasileira. São Paulo: Brasiliense, 1983. CRUZ, Maria Cristina Meirelles Toledo. Para Uma Educação da Sensibilidade: a experiência da Casa Redonda Centro de Estudos. São Paulo, 2005. Dissertação de Mestrado, USP. GARCIA, Miliandre. A Questão da Cultura Popular: as políticas culturais do centro popular de cultura (CPC) da União Nacional dos Estudantes (UNE). Rio de Janeiro, 2004.Dissertação de Doutorado em História, UFRJ. GALVÃO, Isis Barbero. Brincante: teatro, escola e vida. São Paulo, 2009. Trabalho de conclusão de curso UNESP. HUIZINGA, Johan. Homo Ludens. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 2000. MARCHETTI, Joana. A Dança Popular e a Formação da Identidade Brasileira: como o corpo vivido do brincante integra o si mesmo e o ser-com através da dança. São Paulo, 2002. Trabalho de conclusão de curso como exigência para a graduação no curso de psicologia. PUC. ORTIZ, Renato. A Moderna Tradição Brasileira. Cultura brasileira e indústria cultural. 3a ed. São Paulo: Brasiliense, 1991. ____________. Cultura Brasileira e Identidade Nacional. 5ª Ed. São Paulo: Brasiliense, 1994. PELEGRINI, Sandra C. A. FUNARI, Pedro Paulo A. O que é Patrimônio Cultural Imaterial. São Paulo: Brasiliense, 2008. RIBEIRO, Darcy. "Introdução" e "O Novo Mundo" In: O Povo Brasileiro. 5ª Ed. São Paulo: Companhia de B ROSA, Guimarães. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.
  • 48. STRINATI, Dominic. Cultura Popular Uma Introdução. 1ª Ed. São Paulo: Hedra, 1999. Revistas e Publicações: ALMEIDA, Rosane (coord.). Um Olhar Brincante para o Mundo. São Paulo: publicação Instituto Brincante, 2009. TOLEDO, Caio Navarro de. 50 Anos de Fundação do Iseb. S˜åo Paulo: Jornal da UNICAMP, 2005. AArte do Brincante para Intérpretes e Educadores – Relatório das atividades desenvolvidas pelo projeto cultural do Instituto Brincante. 2008. Entrevistas Maria Amélia Pereira. Entrevista à autora em 01/11/2010. Rosane Almeida. Entrevista à autora em 02/11/2010. Antonio Nóbrega. Entrevista à autora em 02/11/2010. Sites Instituto Brincante www.institutobrincante.org.br - acesso em 06/2010 Brasil - República Federativa do Brasil www.brasil.gov.br/sobre/cultura/cultura-brasileira - acesso em 26/11/2010