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A viagem de Adama
Desde o Burkina Faso, através do Mali, Argélia e Marrocos, até España,
         primeiro nas ilhas Canárias e depois em território continental
                      espanhol. A sua viagem durou mais de três anos.

Adama nasceu em 1991, em Ouagadougu, capital do Burkina Faso, e nunca foi à escola. O
seu pai cultivava milho e mandioca nuns terrenos muito pequenos, o suficiente para
alimentar a família. Quando tinha 12 anos, Adama começou a trabalhar como aprendiz numa oficina, e aos 15 anos já conseguia fazer
reparações eléctricas. Seria um emprego duradouro se o seu patrão não tivesse morrido e a oficina não tivesse encerrado. Aos 20 anos
estava desempregado e começou a questionar-se sobre o que iria fazer da sua vida. Tinha ouvido muitas histórias de vizinhos e parentes
seus que foram para a Europa e de como se estavam a sair bem. Tinha uns 200 Euros de poupança e a sua decisão parecia óbvia.

Primeiro, pediu um visto na embaixada francesa mas foi recusado. Não importava para que país fosse, o que queria era ir para a Europa.
Tinham-lhe dito que teria que passar primeiro por Espanha pois é o único país que tem fronteira com África e aí chegando poderia então
ir para onde desejasse. A viagem começou bem: no início de 2002 Adama pagou um bilhete de autocarro até Bamako, capital do Mali.
Depois de uns dias dormindo na estação de autocarros, verificou que poderia ir dali até Gao e a partir daí conseguir uma boleia numa
carrinha 4x4 que, por 100 Euros, o levaria através do Sahara até Tamanraset, na Argélia. A viagem durou cinco noites e de dia os 20
passageiros escondiam-se em grutas e esperavam o anoitecer.

Mas ainda faltava muito para chegar a Marrocos: tinha que atravessar a Argélia. Adama viajava de noite, clandestino; umas vezes
caminhava, outras vezes conseguia boleia de um camião. Ás vezes tinha que esperar 4 ou 5 dias num oásis por não encontrar transporte
ou receando um controle policial. Levou quase 2 meses para atravessar o deserto e as montanhas do Atlas e chegar à fronteira
marroquina. Ali chegado, um grupo de traficantes levaram-no durante 4 noites até Oujda e depois foi de autocarro até Nador, a cidade
marroquina vizinha de Melilla.

Melilla é um território espanhol no continente africano, separado de Marrocos por um muro de rede. Adama acercava-se dessas redes
todas as noites, observando a Europa ali tão perto, ao alcance dos olhos e tentando descobrir uma maneira de entrar. Sabia que alguns
saltavam mas não parecia nada fácil. Três anos mais tarde, os emigrantes inventariam a técnica da avalanche: centenas de pessoas
atiravam-se de encontro às redes. Mas Adama estava sozinho.

Uma noite aproximou-se demasiado da rede e a polícia marroquina prendeu-o e deportou-o para a Argélia. Adama voltou a entrar
clandestino em Marrocos e ao fim de 2 meses foi de novo expulso. Sentia-se derrotado e sem dinheiro: há muito que se haviam esgotado
os 200 Euros. Era a época da colheita da azeitona e Adama trabalhou dois meses, ganhou algum dinheiro e voltou a Marrocos. Mas desta
vez foi até Rabat: a rede parecia intransponível e queria tentar a via marítima: as famosas pateras, barcos de construção muito frágil,
com 10 metros de comprimento, e um motor.

Em Rabat passou 1 ano a dormir na rua e a alimentar-se dos caixotes do lixo. Não tinha dinheiro, não conhecia ninguém e não encontrava
trabalho. Estava na mesma condição dos marroquinos. Sofria demasiado e queria voltar a casa, mas não tinha dinheiro para fazer a
viagem de regresso.

Um dia, desesperado, entregou-se à polícia para que o mandassem de regresso ao seu país. Um polícia respondeu-lhe que se quisesse
voltar para casa teria que ter meios para pagar a viagem. Adama pensou que já não poderia chegar mais baixo. No seu país pelo menos
teria comida. Estava muito desalentado mas era a sua vida que estava em risco e decidiu continuar a lutar.

A sua sorte começou a mudar. Conheceu um imigrante do Mali que o contratou para trabalhar na empresa de outro imigrante, um ganês
que ganhava a vida a transportar imigrantes nas pateras. Adama tinha que encontrar clientes que pudessem pagar entre 1000 a 1500
Euros pela viagem de travessia para a Europa. Se conseguisse arranjar 20 clientes para o seu patrão, ele oferecia-lhe a viagem para a
Europa. Um desses dias, Adama conseguiu telefonar para a sua família e dizer-lhes que continuava vivo, apesar de ainda não ter saído de
África. Mas soube por telefone que o seu pai tinha morrido.

De princípio, Adama não conseguiu encontrar clientes pois nenhum acreditava nele. Mas aos poucos foi ganhando confiança dos clientes
e no final de 2004 já tinha conseguido uns 40 clientes. Havia ganho a viagem para a Europa. Há dois anos que esperava este momento.

Uma camioneta levou-o até um esconderijo no deserto, juntamente com 20 outros imigrantes, onde deveriam esperar que os polícias
subornados pelos traficantes entrassem ao serviço. Ali passaram vários dias sem água. Adama viu como outros bebiam a sua própria
urina mas não quis fazê-lo. Uma tarde, foram levados para a costa do Atlântico e o traficante informou-os de que para embarcarem
deveriam entregar todos os documentos de identificação. Mas naquela praia, Adama teve uma nova surpresa: os marroquinos que
trabalhavam para o traficante roubaram-lhes tudo: documentos, dinheiro, roupa e relógios. Ainda se tentou defender mas foi ferido
numa mão. Não importava: ele estava prestes a navegar para a Europa.

O capitão da patera era um pescador da Gambia, que pediu a Adama para se ocupar de olhar pela bússola do barco. A viagem seria curta
e em menos de 1 dia chegariam às ilhas Canárias. Se naufragassem, Adama e o capitão do barco seriam os únicos que se salvariam pois
eram apenas eles que tinham coletes salva-vidas. Isso deixou-me um pouco mais tranquilo mas mesmo assim muito nervoso pois nunca
tinha visto o mar. As primeiras horas do dia foram calmas. Ao meio-dia o mar agitou-se mas a patera seguiu viagem. A meio da tarde
avistaram a costa de uma ilha e pouco depois um barco da marinha espanhola deteve-os e os guardas não tardaram a interrogar
Adama, julgando tratar-se do capitão do barco. Desfeito o equívoco, prenderam o capitão e deportaram-no. Os restantes passageiros do
barco receberam roupa, comida e refúgio num albergue do governo espanhol, onde passaram 40 dias.

Durante esses 40 dias, a polícia espanhola interroga os imigrantes ilegais e expulsa aqueles que não têm razões legais para permanecer
na União Europeia. Mas, geralmente, essas ordens não se podem cumprir pois os imigrantes não têm documentos de identificação ou, em
alguns casos, os seus países não querem recebê-los de volta. Por isso devem desfazer-se dos documentos: essa renúncia da identidade
é o paradoxo legal que permite que milhares de africanos fiquem na Europa.

Nas Canárias, Adama não sabia o que iria ser da sua vida: uma noite chamaram-no e disseram que o levariam a Madrid e o libertariam.
Adama aceitou uma proposta da Comissão Espanhola de Ajuda aos Refugiados para passar três meses numa aldeia aprendendo
espanhol. Em Maio de 2005 estava de volta a Madrid e já sem qualquer apoio. Agora estava por sua conta. Durante 1 mês, Adama dormiu
num parque com centenas de outros imigrantes africanos, até que recebeu uma oferta de um homem da Serra Leoa: dar-lhe-ia um
documento de identificação para que pudesse trabalhar e, em troca, Adama teria que lhe pagar 100 euros por mês.

Em Espanha há milhares de imigrantes nessa situação: explorados por outros imigrantes e também pelos seus patrões. Agora, Adama
trabalha como jardineiro para uma empresa construtora e vive num subúrbio de Madrid numa casa que lhe custa demasiado. Ganha 650
euros em cada mês: gasta metade para pagar o alojamento, 100 euros em comida, 50 euros em transporte, 100 euros para o seu
“explorador”, envia algum dinheiro para ajudar a sua mãe, e não lhe sobra mais nada.

“Apesar de tudo, não encontrei nada do que procurava quando saí do meu país. Não tenho dinheiro, não tenho documentos, sofri muito
para chegar cá, dormi nas ruas, caminhei pelo deserto, mas agora que cá estou continuo sofrendo. Eu sabia que tinha que sofrer para
conseguir cá cegar, mas acreditei que o sofrimento teria fim”, desabafa Adama.

Adama gosta muito de Espanha, embora assuma que por vezes são um pouco racistas. As pessoas, diz, são racistas, nem se dignam
olhar para ele, mas o governo trata bem os africanos. Continua sem ter documentos: os advogados dizem que terá que esperar 3 anos
para obter um papel que lhe permita trabalhar legalmente. Por esse papel, deu todo o dinheiro a um espanhol que lhe garantiu que
conseguiria em menos tempo. Mas desapareceu.

O tempo passa para Adama: quando saiu do seu país tinha 20 anos e agora tem 24, mas a sua vida não avança. Está demasiado
preocupado com o seu futuro e nem se consegue divertir. Nem sequer pensa em sair com mulheres da sua idade pois já tem problemas
demasiados. “O que eu procuro é o meu dinheiro. Deixei as mulheres no meu país para vir procurar dinheiro e quando o encontrar posso
então voltar e casar-me. Assim, os meus filhos terão um futuro. Se o meu pai tivesse feito o que eu fiz, agora eu não teria que sofrer
assim” diz Adama.

Não se sabe se a história de Adama é não verdadeira. Muitos africanos, para evitar serem deportados, inventam que vêm de países em
guerra para pedirem asilo político. Ou dizem que os seus países não os aceitam de volta. São milhares de pessoas que inventam vidas
para procurar uma vida melhor do que aquela que pretendem esquecer. Às vezes, a salvação é ter uma boa história. Mas a salvação
pode ser dura de alcançar.
                                                                                                           Adaptado de www.unfpa.org

A. Continua a história de Adama e redige um texto em computador, num máximo de 1 página A4 (letra Times New Roman
    12, espaçamento simples).
B. Pinta e identifica num mapa os países / territórios que Adama percorreu na sua viagem.

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A viagem de Adama

  • 1. A viagem de Adama Desde o Burkina Faso, através do Mali, Argélia e Marrocos, até España, primeiro nas ilhas Canárias e depois em território continental espanhol. A sua viagem durou mais de três anos. Adama nasceu em 1991, em Ouagadougu, capital do Burkina Faso, e nunca foi à escola. O seu pai cultivava milho e mandioca nuns terrenos muito pequenos, o suficiente para alimentar a família. Quando tinha 12 anos, Adama começou a trabalhar como aprendiz numa oficina, e aos 15 anos já conseguia fazer reparações eléctricas. Seria um emprego duradouro se o seu patrão não tivesse morrido e a oficina não tivesse encerrado. Aos 20 anos estava desempregado e começou a questionar-se sobre o que iria fazer da sua vida. Tinha ouvido muitas histórias de vizinhos e parentes seus que foram para a Europa e de como se estavam a sair bem. Tinha uns 200 Euros de poupança e a sua decisão parecia óbvia. Primeiro, pediu um visto na embaixada francesa mas foi recusado. Não importava para que país fosse, o que queria era ir para a Europa. Tinham-lhe dito que teria que passar primeiro por Espanha pois é o único país que tem fronteira com África e aí chegando poderia então ir para onde desejasse. A viagem começou bem: no início de 2002 Adama pagou um bilhete de autocarro até Bamako, capital do Mali. Depois de uns dias dormindo na estação de autocarros, verificou que poderia ir dali até Gao e a partir daí conseguir uma boleia numa carrinha 4x4 que, por 100 Euros, o levaria através do Sahara até Tamanraset, na Argélia. A viagem durou cinco noites e de dia os 20 passageiros escondiam-se em grutas e esperavam o anoitecer. Mas ainda faltava muito para chegar a Marrocos: tinha que atravessar a Argélia. Adama viajava de noite, clandestino; umas vezes caminhava, outras vezes conseguia boleia de um camião. Ás vezes tinha que esperar 4 ou 5 dias num oásis por não encontrar transporte ou receando um controle policial. Levou quase 2 meses para atravessar o deserto e as montanhas do Atlas e chegar à fronteira marroquina. Ali chegado, um grupo de traficantes levaram-no durante 4 noites até Oujda e depois foi de autocarro até Nador, a cidade marroquina vizinha de Melilla. Melilla é um território espanhol no continente africano, separado de Marrocos por um muro de rede. Adama acercava-se dessas redes todas as noites, observando a Europa ali tão perto, ao alcance dos olhos e tentando descobrir uma maneira de entrar. Sabia que alguns saltavam mas não parecia nada fácil. Três anos mais tarde, os emigrantes inventariam a técnica da avalanche: centenas de pessoas atiravam-se de encontro às redes. Mas Adama estava sozinho. Uma noite aproximou-se demasiado da rede e a polícia marroquina prendeu-o e deportou-o para a Argélia. Adama voltou a entrar clandestino em Marrocos e ao fim de 2 meses foi de novo expulso. Sentia-se derrotado e sem dinheiro: há muito que se haviam esgotado os 200 Euros. Era a época da colheita da azeitona e Adama trabalhou dois meses, ganhou algum dinheiro e voltou a Marrocos. Mas desta vez foi até Rabat: a rede parecia intransponível e queria tentar a via marítima: as famosas pateras, barcos de construção muito frágil, com 10 metros de comprimento, e um motor. Em Rabat passou 1 ano a dormir na rua e a alimentar-se dos caixotes do lixo. Não tinha dinheiro, não conhecia ninguém e não encontrava trabalho. Estava na mesma condição dos marroquinos. Sofria demasiado e queria voltar a casa, mas não tinha dinheiro para fazer a viagem de regresso. Um dia, desesperado, entregou-se à polícia para que o mandassem de regresso ao seu país. Um polícia respondeu-lhe que se quisesse voltar para casa teria que ter meios para pagar a viagem. Adama pensou que já não poderia chegar mais baixo. No seu país pelo menos teria comida. Estava muito desalentado mas era a sua vida que estava em risco e decidiu continuar a lutar. A sua sorte começou a mudar. Conheceu um imigrante do Mali que o contratou para trabalhar na empresa de outro imigrante, um ganês que ganhava a vida a transportar imigrantes nas pateras. Adama tinha que encontrar clientes que pudessem pagar entre 1000 a 1500 Euros pela viagem de travessia para a Europa. Se conseguisse arranjar 20 clientes para o seu patrão, ele oferecia-lhe a viagem para a Europa. Um desses dias, Adama conseguiu telefonar para a sua família e dizer-lhes que continuava vivo, apesar de ainda não ter saído de África. Mas soube por telefone que o seu pai tinha morrido. De princípio, Adama não conseguiu encontrar clientes pois nenhum acreditava nele. Mas aos poucos foi ganhando confiança dos clientes e no final de 2004 já tinha conseguido uns 40 clientes. Havia ganho a viagem para a Europa. Há dois anos que esperava este momento. Uma camioneta levou-o até um esconderijo no deserto, juntamente com 20 outros imigrantes, onde deveriam esperar que os polícias subornados pelos traficantes entrassem ao serviço. Ali passaram vários dias sem água. Adama viu como outros bebiam a sua própria
  • 2. urina mas não quis fazê-lo. Uma tarde, foram levados para a costa do Atlântico e o traficante informou-os de que para embarcarem deveriam entregar todos os documentos de identificação. Mas naquela praia, Adama teve uma nova surpresa: os marroquinos que trabalhavam para o traficante roubaram-lhes tudo: documentos, dinheiro, roupa e relógios. Ainda se tentou defender mas foi ferido numa mão. Não importava: ele estava prestes a navegar para a Europa. O capitão da patera era um pescador da Gambia, que pediu a Adama para se ocupar de olhar pela bússola do barco. A viagem seria curta e em menos de 1 dia chegariam às ilhas Canárias. Se naufragassem, Adama e o capitão do barco seriam os únicos que se salvariam pois eram apenas eles que tinham coletes salva-vidas. Isso deixou-me um pouco mais tranquilo mas mesmo assim muito nervoso pois nunca tinha visto o mar. As primeiras horas do dia foram calmas. Ao meio-dia o mar agitou-se mas a patera seguiu viagem. A meio da tarde avistaram a costa de uma ilha e pouco depois um barco da marinha espanhola deteve-os e os guardas não tardaram a interrogar Adama, julgando tratar-se do capitão do barco. Desfeito o equívoco, prenderam o capitão e deportaram-no. Os restantes passageiros do barco receberam roupa, comida e refúgio num albergue do governo espanhol, onde passaram 40 dias. Durante esses 40 dias, a polícia espanhola interroga os imigrantes ilegais e expulsa aqueles que não têm razões legais para permanecer na União Europeia. Mas, geralmente, essas ordens não se podem cumprir pois os imigrantes não têm documentos de identificação ou, em alguns casos, os seus países não querem recebê-los de volta. Por isso devem desfazer-se dos documentos: essa renúncia da identidade é o paradoxo legal que permite que milhares de africanos fiquem na Europa. Nas Canárias, Adama não sabia o que iria ser da sua vida: uma noite chamaram-no e disseram que o levariam a Madrid e o libertariam. Adama aceitou uma proposta da Comissão Espanhola de Ajuda aos Refugiados para passar três meses numa aldeia aprendendo espanhol. Em Maio de 2005 estava de volta a Madrid e já sem qualquer apoio. Agora estava por sua conta. Durante 1 mês, Adama dormiu num parque com centenas de outros imigrantes africanos, até que recebeu uma oferta de um homem da Serra Leoa: dar-lhe-ia um documento de identificação para que pudesse trabalhar e, em troca, Adama teria que lhe pagar 100 euros por mês. Em Espanha há milhares de imigrantes nessa situação: explorados por outros imigrantes e também pelos seus patrões. Agora, Adama trabalha como jardineiro para uma empresa construtora e vive num subúrbio de Madrid numa casa que lhe custa demasiado. Ganha 650 euros em cada mês: gasta metade para pagar o alojamento, 100 euros em comida, 50 euros em transporte, 100 euros para o seu “explorador”, envia algum dinheiro para ajudar a sua mãe, e não lhe sobra mais nada. “Apesar de tudo, não encontrei nada do que procurava quando saí do meu país. Não tenho dinheiro, não tenho documentos, sofri muito para chegar cá, dormi nas ruas, caminhei pelo deserto, mas agora que cá estou continuo sofrendo. Eu sabia que tinha que sofrer para conseguir cá cegar, mas acreditei que o sofrimento teria fim”, desabafa Adama. Adama gosta muito de Espanha, embora assuma que por vezes são um pouco racistas. As pessoas, diz, são racistas, nem se dignam olhar para ele, mas o governo trata bem os africanos. Continua sem ter documentos: os advogados dizem que terá que esperar 3 anos para obter um papel que lhe permita trabalhar legalmente. Por esse papel, deu todo o dinheiro a um espanhol que lhe garantiu que conseguiria em menos tempo. Mas desapareceu. O tempo passa para Adama: quando saiu do seu país tinha 20 anos e agora tem 24, mas a sua vida não avança. Está demasiado preocupado com o seu futuro e nem se consegue divertir. Nem sequer pensa em sair com mulheres da sua idade pois já tem problemas demasiados. “O que eu procuro é o meu dinheiro. Deixei as mulheres no meu país para vir procurar dinheiro e quando o encontrar posso então voltar e casar-me. Assim, os meus filhos terão um futuro. Se o meu pai tivesse feito o que eu fiz, agora eu não teria que sofrer assim” diz Adama. Não se sabe se a história de Adama é não verdadeira. Muitos africanos, para evitar serem deportados, inventam que vêm de países em guerra para pedirem asilo político. Ou dizem que os seus países não os aceitam de volta. São milhares de pessoas que inventam vidas para procurar uma vida melhor do que aquela que pretendem esquecer. Às vezes, a salvação é ter uma boa história. Mas a salvação pode ser dura de alcançar. Adaptado de www.unfpa.org A. Continua a história de Adama e redige um texto em computador, num máximo de 1 página A4 (letra Times New Roman 12, espaçamento simples). B. Pinta e identifica num mapa os países / territórios que Adama percorreu na sua viagem.