O documento discute como Michel Foucault entende o poder não como algo que uns têm e outros não, mas como uma rede de relações que se exerce em toda a sociedade através de micropoderes. Foucault analisa como esses poderes disciplinam os corpos e como movimentos de resistência locais surgiram em resposta a eles.
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Texto 01:
Filosofia pós-moderna - Michel Foucault
A genealogia dos micropoderes
José Renato Salatiel1
Desde crianças, adoramos os super-heróis. Torcemos por eles e esperamos que
derrotem os vilões. São narrativas importantes em nossas vidas, e nos ajudam a assimilar
noções de bem e mal, certo e errado. Em geral, nos identificamos também como o mais
fraco, que desafia o poder do mais forte, como o tímido e fraco Clark Kent, que usa seus
poderes secretos, como Superman, para derrotar Lex Luthor. Afinal de contas, também
somos fracos e o mundo, tão cruel, que não custa imaginar que temos algum tipo de
superpoder para enfrentar os vilões que aparecem pelo caminho.
Agora, imaginem a confusão de uma HQ (História em Quadrinhos) como Watchmen
- cujo filme estréia em 2009 -, em que os super-heróis cuidam de sua própria vida, não
têm mais uma "causa" pela qual lutar e, pior, alguns deles comportam-se como vilões!
Escrita nos anos 80 por Alan Moore, o enredo é tipicamente pós-moderno. Em uma
realidade fragmentada, com um cotidiano multifacetado e sem coesão, como agiriam os
super-heróis? E como fica a questão do poder?
Para responder a essas perguntas, vamos conhecer um pouco do pensamento de
Michel Foucault (1926-1984), um dos mais conhecidos e estudados filósofos franceses
contemporâneos, sendo alinhado, por suas teorias, tanto entre os estruturalistas como
entre os pós-estruturalistas ou pós-modernos. De sua obra, nos interessa discutir aqui
apenas sua teoria do poder.
Poder no plural
Antes de Foucault, a teoria política concebia o poder como algo que uns tem, outros
não, além de estar associado, mais comumente, à figura da Igreja ou do Estado. Toda
teoria política clássica, de Maquiavel e os contratualistas (Hobbes, Locke e Rousseau) até
Marx, discutia-se como legitimar o poder de uns poucos sobre muitos, e assim, manter
(ou subverter, no caso de Marx) a ordem social.
Foucault entende o poder não como um objeto natural, mas uma prática social
expressa por um conjunto de relações. Temos que pensar o poder não como uma "coisa"
que uns tem e outros não, como, por exemplo, o pai e o filho, o rei e seus súditos, o
presidente e seus governados, etc., mas como uma relação que se exerce, que opera
entre os pares: o filho que negocia com o pai, os súditos que reivindicam ao rei, os
governados que usam dispositivos legais para fiscalizar o presidente, etc.
Deste ponto de vista, poder não se restringe ao governo, mas espalha-se pela
sociedade em um conjunto de práticas, a maioria delas essencial à manutenção do
Estado. O poder é uma espécie de rede formada por mecanismos e dispositivos que se
espraiam por todo cotidiano - uma rede da qual ninguém pode escapar. Ele molda nossos
comportamentos, atitudes e discursos.
Para descobrir como o poder funciona, Foucault vai usar o método genealógico,
empregado por Nietzsche para contar a "história secreta" dos valores (ver o texto
"Filosofia pós-moderna - Nietzsche"). Vamos ver alguns exemplos disso.
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José Renato Salatiel é jornalista e professor universitário.
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Corpos dóceis
Uma manifestação externa desses poderes que Foucault analisa diz respeito aos
seus efeitos sobre nossos corpos, que ele chama de poder disciplinar e que
caracterizou determinadas sociedades no século 20.
Foucault argumenta que nenhum poder que fosse somente repressor poderia se
sustentar por muito tempo, porque uma hora as pessoas iriam se rebelar. Portanto, seu
segredo é que, ao mesmo tempo em que reprime, gera conhecimento e corpos produtivos
para o trabalho.
Era comum, e ainda é nos dias atuais, encontrarmos pátios escolares em que se
formam filas com crianças para entrar nas salas de aula. Depois, na sala de aula, era
preciso que as crianças controlassem suas vontades corporais (fome, vontade de fazer
xixi, etc.) até que tocasse o sinal. Este é um exemplo da domesticação de corpos de que
fala o filósofo.
Mais tarde, na Igreja, no Exército e nas fábricas, esse indivíduo viveria a mesma
rotina de adestramento corporal. O objetivo? Segundo Foucault, maximizar a utilidade
econômica de nossos corpos, para o trabalho, e diminuir a força política e criativa, de
contestação, que temos também, criaturas cheias de desejos que somos.
Afinal de contas, imagine o que seria de uma sociedade, livre de mecanismos de
poder, em que quiséssemos trabalhar ou estudar na hora em que desse na telha e
resolvêssemos passar a maior parte do nosso tempo namorando, jogando futebol ou
simplesmente não fazendo nada? E, para dar o exemplo para aqueles que são
considerados corpos improdutivos para a sociedade, diz Foucault, foram criados asilos
para os loucos e prisões para os ladrões. Desse encarceramento surgem áreas de
conhecimento como a psiquiatria e a criminologia.
Resistências locais
O ponto em que a teoria de poder de Foucault converge com o pós-modernismo é
que, da mesma maneira que lidamos com o fim das visões totalizantes de mundo, o poder
também se pulveriza em micropoderes. E, consequentemente, a resistência aos poderes
passa a ser local, em ações cada vez mais regionalizadas.
Não adianta investir contra o Estado, achando que ele é a causa de todos os males.
Ele é apenas uma das representações desse poder que se exerce em uma série de
mecanismos, que reproduzimos todos os dias sem ao menos nos darmos conta disso. Por
exemplo, quando tratamos com autoritarismo nossos filhos, namoradas ou pais.
E onde Foucault identifica estes focos de resistências locais aos poderes? Nos
movimentos ativistas pelos direitos humanos, além de gays, negros, feministas,
ecologistas e outras minorias que se organizaram como pólos de contra-poder,
principalmente a partir da década de 1960, quando emerge o pós-modernismo.
Neste nosso mundo pós-moderno, fica cada dia mais difícil saber quem é o vilão e
quem é o mocinho. Os super-heróis estão cada vez mais humanos. Ou, como diria
Nietzsche, demasiadamente humanos.
Sugestão de leitura
FOUCAULT, Michel. Microfísica do poder. São Paulo: Editora Graal, 2007.
Extraído de: http://educacao.uol.com.br/filosofia/filosofia-pos-moderna-Michel-Foucault.jhtm
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TEXTO 02:
Ceticismo - Deve se duvidar de tudo
Josué Cândido da Silva*
Para Kant, o cético nos lembra de que pensar não é um fim, mas
uma atividade
Se alguém lhe perguntasse "O que você conhece?", você poderia pensar em uma
porção de coisas, a maioria delas adquiridas em sua experiência cotidiana. Mas se a
pessoa insistisse e perguntasse "Algo do que você sabe é realmente verdade? Apostaria
sua vida nisso?", essas questões complicariam um bocado as coisas.
Eu, por exemplo, poderia dizer que tenho certeza que sou filho dos meus pais, mas
talvez eu tivesse sido adotado ou trocado na maternidade e estar enganado a esse
respeito. Poderia ainda estar enganado sobre uma série de outras coisas que até então
julgava certas. E se reparar direito, tudo o que eu tenho são crenças, algumas até muito
razoáveis, mas nada de que eu possa dizer que é uma verdade irrefutável. Percebo,
então, que me falta um parâmetro para examinar as minhas crenças e verificar quais são
realmente certas e quais são falsas.
Condições universais de validade
Durante a história da filosofia, vários foram os filósofos que tentaram estabelecer as
condições para que algo fosse tomado como absolutamente verdadeiro, isto é, uma
verdade que independesse de fatores circunstanciais e que fosse algo que não fosse
verdadeiro para mim ou para um grupo de pessoas, mas para todos os seres racionais.
Você deve estar cansado de ver por aí grupos de pessoas com crenças estranhas,
que dizem que eles estão certos e todos os outros enganados. Nesse caso, como decidir
quem está certo? Votando? Mas se a maioria estiver errada e o pequeno grupo estiver
certo, nunca conheceremos a verdade porque eles sempre perderão nas votações. É
preciso que se trate de uma verdade universal, isto é, válida para todos, tanto para a
maioria quanto para as minorias. Portanto, o que os filósofos investigam são as condições
universais de validade, aquelas condições que independem das opiniões particulares que
eu ou você possamos ter.
Ceticismo
Na investigação sobre as condições de validade do nosso conhecimento um grupo
de filósofos merece destaque: os céticos. O termo cético vem da palavra grega skepsis,
que significa "exame". Atualmente, dizemos que uma pessoa cética é alguém que não
acredita em nada, mas não é bem assim. Um filósofo cético é aquele que coloca suas
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crenças e as dos outros sob exame, a fim de verificar se elas são realmente dignas de
crédito ou não.
Pirro de Elis (360-275 a.C.) é considerado o fundador do ceticismo. Segundo ele,
não podemos ter posições definitivas sobre determinado assunto, pois mesmo pessoas
muito sábias podem ter posições absolutamente opostas sobre um mesmo tema e ótimos
argumentos para fundamentar suas posições. Nesse caso, Pirro nos aconselha a
suspensão do juízo e a mantermos nossa mente tranqüila (ataraxia). Ao invés de
enfrentarmos o desgaste de acalorados debates que não produzirão certeza alguma,
devemos manter silêncio (apraxia) e preservar uma atitude de suspeita diante de qualquer
tipo de dogmatismo.
Depois de Pirro, muitos outros filósofos tornaram o ceticismo uma das mais
importantes correntes filosóficas até os dias de hoje. Atualmente, alguns céticos
defendem o probabilismo ou falibilismo, ou seja, na impossibilidade de encontrarmos
verdades absolutas, seja pelas limitações de nossos sentidos e intelecto, seja pela
complexidade da realidade, devemos tratar nossas crenças sempre como provisórias,
como quem anda em gelo fino.
Desse modo, um cético nunca seria pego de surpresa se algo que todos acreditavam
ser verdade se revelasse falso no futuro. Por outro lado, reconhecer que as verdades são
provisórias não significa uma completa inação. Sabemos que os remédios são falhos,
mas são a única coisa que temos para combater as doenças.
Isso também vale para o campo da ética. O filósofo Montaigne propunha que
vivêssemos em harmonia com os costumes de nosso povo ou cultura, pois embora eles
sejam falhos, são tão falhos quanto os de qualquer outro povo, não havendo razão para
preferir este a aquele.
Despertar do sono dogmático
Conta a lenda que Pirro morreu enquanto dava aula de olhos vendados. Um aluno o
teria alertado quanto ao precipício à sua frente. Cético, Pirro desconfiou do aluno e caiu.
Essa lenda, obviamente, pretende mostrar os perigos de se duvidar de tudo. Mas será
que um cético autêntico não duvidaria também de suas próprias dúvidas?
Odiado por alguns, o cético é como a abelha que aferroa o boi do conhecimento,
retirando-o da mesmice das ideias prontas e acabadas, nos provocando, por meio da
dúvida, a investigar a fundo os pressupostos de nossas crenças; ou, como diria Kant, o
cético é aquele que nos desperta do nosso sono dogmático para lembrar-nos que pensar
não é um fim, mas uma atividade.
Extraído de http://educacao.uol.com.br/filosofia/teoria-conhecimento-ceticismo.jhtm
Anotações de aula
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TEXTO 03
Como e para que se estabelece um governo
democrático
Plenário da Câmara dos Deputados do Brasil
Para você pensar
O processo democrático pode ser prejudicado pelo desvirtuamento da
atividade política, quando ela se volta para interesses particulares, ou se faz ao
sabor de casuísmos, oportunismos e conchavos. Mas será que a culpa disso pode
ser atribuída somente à classe política? A própria população, também, não seria
responsável pelo problema, caso ela assuma uma postura despolitizada e não-
participante?
Suponha que você se tornou amigo de um estrangeiro que acabou de chegar ao
Brasil para passar as férias. Imagine que, um dia, ele lhe perguntará se o Brasil é uma
democracia. O que você iria responder?
Em princípio, é bem provável que sua resposta seja afirmativa e, de fato, se for
assim, ela estará correta. Há cerca de 20 anos, o Brasil é uma democracia, e essa
condição foi conquistada pelo nosso próprio povo, que agüentou um governo ditatorial,
imposto pelos militares, de 1964 a 1985.
Mas o que significa dizer que o Brasil é uma democracia? Bem, num primeiro
momento, talvez seja possível dizer que o Brasil é uma democracia porque elegemos
nossos governantes, porque os direitos dos cidadãos brasileiros são estabelecidos por
leis, que também os garantem, porque - ao menos em tese - somos todos iguais perante
as leis, porque existe liberdade de imprensa etc.
Por outro lado, alguém poderia questionar o caráter democrático de nosso país,
levando-se em conta nossos altos índices de pobreza e miséria, isto é, o fato de estarmos
num país cuja distribuição de renda está esntre as piores do mundo. Além disso, sabemos
que há uma diferença muito grande do tratamento que o Estado dedica aos ricos e aos
pobres. Isso sem falar na questão da corrupção que - entra governo e sai governo -
parece jamais acabar.
Forma e substância
Bem, o Brasil é uma democracia, mas isso - por si só - não resolve todos os seus
problemas. Para resolvê-los, talvez o primeiro passo fosse justamente aprofundar a
compreensão que temos do conceito de democracia. Para isso, em primeiro lugar, é
importante estabelecer uma distinção entre os aspectos formais e substanciais de uma
democracia.
O aspecto formal da democracia constitui-se no conjunto das instituições
características deste regime político. Entre elas, destacam-se as eleições livres, o voto
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secreto e universal, a autonomia dos poderes de Estado (Executivo, Legislativo e
Judiciário), a existência de mais de um partido político, e a liberdade de pensamento,
expressão e associação. Em outras palavras, estamos nos referindo às regras do "jogo"
democrático, ao estabelecimento dos meios pelos quais a democracia é posta em prática.
Já o aspecto substancial é aquele que se refere aos resultados do processo, aos fins
a serem alcançados. Aqui se destaca, em primeiro lugar, a existência efetiva - e não
somente em tese - da igualdade jurídica e política dos cidadãos. Ao mesmo tempo, deve-
se levar em conta também as desigualdades econômicas, que deveriam ser as menores
possíveis.
Ainda que as pessoas sejam diferentes e integrem grupos sociais diversos, ninguém
pode ser privilegiado ou discriminado no tocante a direitos básicos. Todos devem ter a
possibilidade de acesso aos bens materiais básicos como moradia, alimentação e saúde,
e ainda aos bens culturais, em todos os níveis: educação, profissionalização, lazer, arte,
etc.
Democracia e estado de direito
Atingir uma democracia substancial, porém, só é possível a partir do momento em
que se respeitam as regras do jogo. Nesse sentido, antes de mais nada, a democracia
pressupõe a existência de um estado de direito, ou seja, o respeito às leis, das quais a
principal é a Constituição do país. Além disso, é fundamental a autonomia dos Poderes
legislativo e judiciário. Uma das características do autoritarismo e da ditadura é a
submissão dos poderes legislativo e judiciário ao executivo.
Na época da última ditadura militar no Brasil, a presidência da República emitia atos
institucionais e decretos-leis, que não precisavam ser nem debatidos nem aprovados pelo
Congresso Nacional. Na verdade, a democracia brasileira ainda não conseguiu se livrar
totalmente desse viés autoritário e ainda é constante o recurso às medidas provisórias
pelo poder executivo, que temporariamente passam por cima do legislativo.
Para ser de fato substancial, a democracia não pode permitir a prevalência de um
poder executivo sobre os outros e deve estar baseada em uma legislação que realmente
atenda ao interesse da sociedade. Ao mesmo tempo, precisa contar com um poder
judiciário eficiente e capaz de resistir às pressões, em especial do poder econômico, de
modo que qualquer cidadão - rico ou pobre - possa obter justiça.
O público e o privado
É particularmente importante observar o respeito à res publica, à coisa pública, que
não pode se sujeitar a interesses privados ou particulares. Por isso, o poder político deve
ser exercido de modo institucional e não pessoal. Quem está no poder encontra-se nessa
posição enquanto representante do povo. Ele não é o dono do poder. Sua posição é
transitória e será ocupada também por outras pessoas, pois está estabelecida a
rotatividade do exercício do poder.
Aliás, na democracia, o acesso ao poder se faz de forma ascendente, isto é, de
baixo para cima. A maioria da população, a base da sociedade, escolhe seus
governantes, contando com os recursos de, no mínimo, dois partidos políticos: o que é
governa (após eleito) e o que a ele se opõe, fiscalizando e questionando seus atos, tendo
em vista o interesse geral da população.
De fato, a democracia supõe o consenso, isto é, a aceitação geral das regras
estabelecidas após as discussões. Isso, porém, não elimina a existência do dissenso, isto
é, a possibilidade de discordar, sempre que necessário. Aliás, uma característica
essencial da democracia é a aceitação do confronto ou do conflito, como expressão das
opiniões divergentes. Faz parte do processo democrático a conversação e a negociação
para solucionar os conflitos.
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Sociedade civil
Além disso, a multiplicação dos órgãos representativos da sociedade civil - ou seja,
de quem não está nas instâncias governamentais - amplia e aprofunda o regime
democrático na medida em que ativa as formas de participação popular. É isto que faz da
democracia um regime que não tem apenas um único centro, mas cujo poder se irradia de
diversas alas da sociedade.
Nesse sentido, são fundamentais as organizações - ocasionais ou permanentes -
que representam interesses de setores da coletividade. É o caso das associações de
bairros, dos mutirões, grupos contra a violência, grupos ecológicos, ao lado de outras
importantes instituições como a Ordem dos Advogados do Brasil, a Associação de
Imprensa, os partidos políticos, os sindicatos, etc. A difusão de poderes dá condições
para o melhor cumprimento da vontade geral, bem como para o controle dos abusos e
arbitrariedades. Ao mesmo tempo, colabora com a transparência das ações nas diversas
instâncias de poder.
Extraído de: http://educacao.uol.com.br/historia/ult1704u68.jhtm
Anotações de aula
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TEXTO 4
Democracia: Participação direta e indireta
Sessão do Senado norte-americano
Você já sabe que a democracia é um regime de governo caracterizado pela
participação popular. Entretanto, o modo por meio do qual essa participação se dá,
permite estabelecer uma diferença entre dois tipos de democracia. Ao menos, assim
refletiram os diversos filósofos que, durante o século 18, se debruçaram sobre a questão.
Esses dois tipos de democracia são ao mesmo tempo divergentes e complementares.
Vamos tentar entender o porquê desse paradoxo, mas, antes disso, é preciso ficar
mais claro do que estamos falando. Então, quanto ao modo de participação popular, a
democracia pode ser:
• direta: em que todos os indivíduos de uma coletividade manifestam sua
opinião sobre os assuntos concernentes a esta mesma coletividade, votando em
assembléias ou reuniões coletivas;
• representativa: em que a coletividade elege representantes a quem delega o
poder para tomar as decisões.
História da democracia
O regime de governo democrático originou-se em Atenas, na Grécia da Antigüidade,
conhecendo seu apogeu no século 5 a.C. Tratava-se precisamente de um regime em que
o "povo" se manifestava diretamente, reunindo-se e votando em assembléias, para tomar
as decisões a respeito da vida da sua cidade.
Todo cidadão ateniense tinha não só o direito, como também o dever de participar
dessas assembléias. Todos os cidadãos eram iguais perante a lei e tinham o direito não
só a votar, como também expressar sua opinião e defender o seu ponto de vista,
convencendo outros a votar como ele.
A princípio, esse pode lhe parecer o melhor dos mundos, mas, a bem da verdade,
não era bem assim. Ser um cidadão ateniense não era uma condição de que usufruíam
todos os habitantes de Atenas. Naquela sociedade, as mulheres, os escravos e os
estrangeiros não eram considerados cidadãos. Por isso, estavam totalmente excluídos
das grandes decisões. Desse modo, somente 10% do povo de Atenas estavam aptos a
participar da democracia.
Democracia ateniense
De qualquer maneira, o simples surgimento do ideal democrático é importantíssimo:
tratava-se de um novo valor, que se contrapunha aos regimes de governo anteriores, que,
segundo a definição de Aristóteles, são a monarquia (o governo de um só, o rei) e a
aristocracia, o governo de um grupo de elite (seja econômica, militar, tecnológica). Ou,
trocando em miúdos, em que um ou alguns poucos mandam e aos outros só resta
obedecer.
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Apesar da experiência democrática ateniense, os principais filósofos gregos, como
Sócrates, Platão e o próprio Aristóteles, viam com certa reserva, quando não com
desprezo, a democracia. Bem, no fundo, eles eram sábios e, por isso mesmo,
acreditavam que só os sábios deveriam exercer o governo, numa ordem social que
poderia ser monárquica ou aristocrática...
Democracia na modernidade
Historicamente, depois da Grécia e de Roma, as idéias democráticas só irão
reaparecer com maior força na Idade Moderna, a partir dos séculos 17 e 18. Nessa
época, os abusos de poder dos monarcas levaram os intelectuais a discutir os poderes
absolutos do governante, questionando o que tornava legítimo qualquer poder de
qualquer governo. Contra o absolutismo em vigor, ergueu-se o liberalismo.
As idéias liberais se revoltaram contra a ordem aristocrática que vinha da Idade
Média, quando o poder político e a propriedade tinham transmissão hereditária: os
herdeiros do rei e dos nobres recebiam não só as terras e os bens de seus antepassados,
como também o poder sobre os homens que viviam em suas propriedades.
O pensamento liberal, ao contrário, estabeleceu uma distinção entre a esfera pública
e a privada, entre a sociedade política e a sociedade civil. Para um filósofo liberal, como
John Locke, o poder só é exercido com legitimidade se tiver origem parlamentar. O que
isso significa? Isso significa que ninguém tem o direito de ocupar um cargo político só
porque nasceu numa família nobre.
Representantes do povo
O direito ao poder, para Locke, depende de um mandato popular. Nesse sentido, a
representação política só adquire legitimidade se tiver surgido da vontade dos cidadãos,
expressa pelo voto. Os cidadãos elegem representantes para defender seus interesses
junto ao governo.
Mais uma vez, porém, a representação popular a que se refere o liberalismo dos
séculos 17 e 18, não deixava de ser elitista. Abrangia somente os grupos sociais mais
favorecidos. O voto era censitário, isto é, dependia de um censo - imposto pago para se
obter a condição de eleitor. Com isso, a grande maioria da população estava excluída do
processo político e as decisões continuavam restritas àqueles que possuíam renda e
propriedades.
Além da representação
Ainda no século 18 - enquanto se levantava e valorizava a questão da legitimidade
da representação - um outro filósofo, Jean-Jacques Rousseau defendia um novo enfoque
para a democracia direta da velha Grécia.
Para ele, as sociedades humanas são construídas a partir de um pacto ou contrato
social. Por meio desse acordo, cada indivíduo aliena seu poder em favor da coletividade.
Entretanto, a vontade geral não poderia jamais ser alienada nem representada. Ou seja,
para Rousseau, os deputados e governantes não são representantes do povo, mas
apenas seus agentes. Assim, devem estar subordinados à soberania popular, que toma
decisões por meio de assembléias, plebiscitos e referendos.
Vontade geral é o conceito básico para compreender como Rousseau encarava a
democracia. No seu modo de ver as coisas, todo indivíduo é - ao mesmo tempo - uma
pessoa privada e uma pessoa pública (cidadão): enquanto pessoa privada, ela trata de
seus interesses particulares; enquanto pessoa pública faz parte de um corpo coletivo que
tem interesses comuns.
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Problemas e conflitos
Mas nem sempre o interesse de um coincide com o de outro, pois muitas vezes o
que beneficia uma pessoa em particular pode ser prejudicial ao interesse coletivo. Nesses
termos, aprender a ser cidadão é justamente saber distinguir qual é a vontade geral, típica
do interesse de todos, mesmo que à revelia dos seus próprios interesses enquanto
pessoa particular.
Rousseau não era ingênuo a ponto de desconhecer as dificuldades de implantação
de uma democracia direta, sobretudo em nações de território extenso e grande densidade
populacional. No mundo de hoje, de fato, ela parece inviável. Imagine que fosse
necessário colher a opinião de cerca de 120 milhões de brasileiros cada vez que uma
decisão governamental tivesse de ser tomada...
Tentativa e erro
Por outro lado, alguns instrumentos da democracia direta - como os plebiscitos e os
referendos - são muitas vezes fundamentais para a vontade da maioria prevalecer sobre
os interesses minoritários. Para haver participação popular no exercício do poder,
contudo, é necessário que os cidadãos sejam politizados: saibam o que querem ou do
que precisam e conheçam aqueles que agirão a bem do interesse comum.
Caso contrário, a manipulação, a corrupção e o jogo de interesses acabam
transformando a maioria da população numa massa de manobras, que agirá em
detrimento de seus próprios interesses e necessidades. Na verdade, a cidadania e a
democracia se aprendem no seu próprio exercício. Como dizia Aristóteles, "só construindo
podemos nos tornar mestres de obra". É um processo de tentativa e erro, no qual os
brasileiros, por sinal, parecem ter errado mais do que acertado nos últimos anos... De
qualquer modo, a única alternativa é continuar tentando.
Extraído de http://educacao.uol.com.br/filosofia/ult1704u69.jhtm
Anotações de aula