1. A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE
ATRAVÉS DOS TEMPOS
Módulo de História da Medicina e da Bioética
Centro de Ciências Médicas – UFPB
Profa. Rilva Lopes de Sousa Muñoz
2. É 1804. Um médico ouve as palavras de sua paciente, que diz:
“Doutor, eu não quero morrer. Diga-me o que fazer”
O médico responde: “Dona Alzira, vamos tratar sua doença com
essas sanguessugas, que limparão seu sangue da doença. Isso,
combinado com repouso absoluto no leito, vai curar a senhora".
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
É 2018. Um paciente com câncer diz ao seu médico:
"Doutor, eu não quero morrer. Ouvi falar sobre um novo tratamento
experimental que está sendo testado nos Estados Unidos e quero me
inscrever no estudo. Eu também quero ter o acompanhamento de um
especialista em medicina paliativa e de um nutricionista...
3. A definição e o conteúdo das representações sociais
de cura sempre foram determinados pelas
configurações sócio-políticas e econômicas vigentes
O comportamento dos dois personagens principais
do processo de cura - o “curandeiro” e o doente –
também reflete o contexto socioeconômico e
intelectual-científico de cada época
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
4. A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
“Tratar a doença dá poder” [ao médico] (SCLIAR, 2002)
O exercício de poder nas relações entre médico e
paciente: o saber profissional confere empoderamento ao
médico
“O Nascimento da Clínica” (Michel Foucault): o saber médico
respalda um controle do indivíduo na nova racionalidade política
que se formou no século XIX, com maior sujeição do paciente
Scliar M. Cenas Médicas: Uma Introdução à História da Medicina. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 2002
5. O médico tem exercido uma função de
controle social ao longo da História:
“Paternalismo Médico”
Paternalismo Médico: Os médicos adotam condutas
terapêuticas sem consultar as preferências
individuais dos pacientes, assumindo o que julga ser
o melhor para estes, sem sua participação ativa nas
decisões
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
6. A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Por muitas gerações, as palavras do médico foram aceitas
como inquestionáveis pelo paciente: relacionamento
baseado no modelo da relação entre pais e filhos – modelo
paternalista (pater: pai) de relação médico-paciente
A História da Medicina testemunhou uma transformação
importante e gradual do papel do médico como único
detentor de todo o conhecimento um indicador dos
processos mais amplos de mudanças
De M. Towards Defining Paternalism in Medicine. Virtual Mentor 2004; 6 (2)
Meira AR. Bioética e vulnerabilidade: o médico e o paciente. Rev. Assoc. Med. Bras. 2004; 50 (3): 249-250
7. A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
• Que mudanças ocorreram nas características e modelos de
relação entre médico e paciente desde a Antiguidade até os
dias atuais?
• Que modelo predominou em cada período histórico?
• Que conjuntos de fatores influenciaram as mudanças na
relação médico-paciente através dos tempos?
• O que é “Paternalismo Médico” e qual a sua repercussão
bioética, na práxis medicina e sobre a pessoa do paciente?
8. Desde Hipócrates, um dos princípios fundamentais da profissão
médica tem sido a busca do benefício do paciente: restaurar
sua saúde sem prejudicá-lo
O médico como guardião da saúde e da vida, usando seus
conhecimentos - “Se o enfermo não admira o médico de algum
modo como a um Deus, não aceitará suas prescrições” (Galeno)
Durante séculos, a beneficência médica manteve-se firme e
incontestável como a melhor relação médico-paciente
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
9. Iluminismo - Em oposição ao Absolutismo do Estado, surge o
liberalismo ocidental (político, social, econômico) – Liberdade do
indivíduo - Gradualmente, resgatou-se a prioridade da tomada de
decisão pelo próprio indivíduo, como pessoa autônoma
Na Medicina, ocorreu uma mudança semelhante, embora mais
tarde e com transformação muito mais lenta
Esta mudança pode ser ilustrada por uma comparação dos Códigos
de Ética da American Medical Association (AMA) nos últimos dois
séculos
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
10. • No artigo II do Código da AMA de 1847, intitulado "Obrigações dos pacientes
para seus Médicos ", a seguinte declaração era encontrada na seção 6:
“The obedience of a patient to the prescriptions of his physician should be prompt
and implicit. He should never permit his own crude opinions as to their fitness, to
influence his attention to them. A failure in one particular may render an otherwise
judicious treatment dangerous, and even fatal outcomes”
• Em contraste, a opinião da AMA em 1990 sobre "Elementos fundamentais do
relacionamento paciente-médico“ agora indica uma posição radicalmente
diferente:
“The patient has the right to make decisions regarding the health care that is
recommended by his or her physician. Accordingly, patients may accept or refuse any
recommended medical treatment”
Chin JJ. Doctor-patient Relationship: from Medical Paternalism to Enhanced Autonomy. Singapore Med J 2002 Vol 43(3) :
152-155
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
11. •A medicina mudou significativamente, sobretudo nos
últimos 50 anos, mas os pacientes também mudaram
• A medicina de antes, artesanal, agora é tecnológica
• Os pacientes que, no passado confiavam completamente nos
médicos, hoje chegam aos consultórios com informações e
vocabulário antes restritos a esses profissionais
• Uma das responsáveis por essa transformação é a Tecnologia da
Informação, principalmente pelo uso da internet
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Figueiredo OJ, Albertin A. Uma Análise na Relação Médico-paciente Frente aos Recursos das Tecnologias da Informação RAI -
Revista de Administração e Inovação 2014; 11 (2): 132-153
12. Evolução ao longo do tempo (resumo)
• Egito antigo (cerca de 4000-1000 a.C.):
Curandeiro/Médico dominante
• Grécia Antiga (600-100 a.C.): Igualitarismo parcial
• Europa Medieval (cerca de 1200 a 1600 d.C.):
Curandeiro/Médico dominante
• Revolução Francesa (final do século XVIII):
Igualitarismo parcial
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Dhingra C, Anand R, Prasad S. Reflection Over Doctor Patient Relationship: A Promise of Trust. JOHCD 2014; 8(2): 104-108
13. Evolução ao longo do tempo (resumo)
• 1800: médico dominante
• 1900: As teorias psicanalíticas e/ou psicopedagógicas começaram a
constituir o paciente como sujeito
• 1950: Participação mútua do médico e do paciente
• 1960: Introdução das teorias psicodinâmicas de Balint na prática
geral
• 1970: Byme e Long defendiam a centralização da relação no
paciente
• 2000: Medicina centrada no paciente
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Dhingra C, Anand R, Prasad S. Reflection Over Doctor Patient Relationship: A Promise of Trust. JOHCD 2014; 8(2): 104-108
14. Antigo Egito
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
A relação médico-paciente evoluiu a partir do relacionamento sacerdote-suplicante,
mantendo assim a ideologia de uma figura paterna que podia manipular eventos em nome
do paciente
Os curandeiros eram tanto mágicos quanto sacerdotes e médicos e a magia era parte
integrante do cuidado
Portanto, parece provável que, na medicina egípcia antiga, existisse a relação atividade-
passividade e que essa relação não tenha sido alterada
As circunstâncias sociais e a falta de conhecimentos técnicos impossibilitavam uma
mudança nesse relacionamento
Kaba R, Sooriakumaran P. The evolution of the doctor-patient relationship. International Journal of Surgery 2007; 5
(1): 57-65
15. O PATERNALISMO HIPOCRÁTICO
• Influência histórica exercida desde a época de Hipócrates
• Século IV a.C.: sociedade formada por diversas castas –“piramidal”
• Base da pirâmide: maior parte das pessoas - escravos e prisioneiros
de guerra - tratados como objetos, sem direitos
• Camada intermediária – cidadãos - soldados, artesãos, agricultores
- tinham direitos e deveres
• Topo da pirâmide (número bastante reduzido de pessoas):
governantes, sacerdotes e MÉDICOS
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Junqueira CR. Bioética: conceito, fundamentação e princípios. Especialização em Saúde da Família. São Paulo: Unifesp,
2011
16. Antiguidade Clássica – Grécia - O PATERNALISMO
HIPOCRÁTICO
• Os médicos da Grécia Antiga eram considerados
“semideuses” - habilidade de curar as pessoas “segundo
seu poder e entendimento” (como consta no juramento de
Hipócrates)
• Com posição hierárquica superior à das outras pessoas, os
médicos daquela época eram consideradas pessoas
superiores às demais
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Junqueira CR. Bioética: conceito, fundamentação e princípios. Especialização em Saúde da Família. São Paulo: Unifesp,
2011
17. Antiguidade Clássica - Grécia
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Kaba R, Sooriakumaran P. The evolution of the doctor-patient relationship. Int Journal of Surgery 2007; 5 (1): 57-65
• Antiguidade Clássica na Grécia: mudança do modelo
atividade-passividade para um modelo mais democrático
de direção-cooperação, no qual o médico não age sobre
um sujeito passivo e sem opinião, mas faz uso do seu
conhecimento para guiar o doente que, racional e
conscientemente, coopera com ele
• Fruto deste pensamento vigente surge, no final do
século V a.C., o Juramento de Hipócrates
18. Antiguidade Clássica - Grécia
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Kaba R, Sooriakumaran P. The evolution of the doctor-patient relationship. Int Journal of Surgery 2007; 5 (1): 57-65
• O Juramento de Hipócrates estabeleceu um código de ética para o
médico - regras que codificam a atitude do médico em relação ao
paciente:
"O regime que adotei deve ser para o benefício de meus pacientes de acordo com minha habilidade e julgamento
[...] Qualquer que seja a casa em que eu entre, eu irei para o benefício dos doentes [...]
• O Juramento de que Hipócrates ofereceu um maior grau de humanismo ao
lidar com as necessidades, o bem-estar e os interesses das pessoas em
relação aos códigos de conduta anteriores
• Apesar da diferença de status entre médico e paciente, a medicina era
essencialmente humanística e valorizava a visão holística do homem, dotado
de corpo e espírito, sem dicotomia
19. Idade Média
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Kaba R, Sooriakumaran P. The evolution of the doctor-patient relationship. Int Journal of Surgery 2007; 5 (1): 57-65
Com o desaparecimento do Império Romano, ocorreu
restauração das crenças religiosas, culminando nas Cruzadas e
na caça às bruxas - enfraquecimento e regressão da relação
médico-paciente em toda a Europa
O médico volta a ocupar um patamar superior ao do doente,
que surge novamente como sujeito passivo enquanto o médico
era onisciente, possuidor, não de conhecimento técnico, mas de
poderes místicos
20. Séculos XVI, XVII e XVIII
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Kaba R, Sooriakumaran P. The evolution of the doctor-patient relationship. Int Journal of Surgery 2007; 5 (1): 57-65
Renascimento, Reforma Protestante, Revolução Francesa:
busca do homem pelo liberalismo, igualdade e dignidade
Liberdade, Igualdade e Fraternidade: Influência marcante dos eventos
sócio-políticos dominantes da Revolução Francesa sobre questões médicas
Mudança na relação médico-paciente de atividade-passividade para
um igualitarismo parcial
21. Séculos XVIII e XIX
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Kaba R, Sooriakumaran P. The evolution of the doctor-patient relationship. Int Journal of Surgery 2007; 5 (1): 57-65
Século XVIII: Poucos médicos diplomados - pacientes
principalmente de classe alta e aristocrática; os pobres
recebiam assistência de curandeiros
Paciente dominante: a disparidade de status assegurou a supremacia do
paciente e os médicos tiveram que competir entre si para agradá-lo
Século XIX: modelo de doença baseado na interpretação dos sintomas - O
médico percebeu que era importante estar atento às experiências
manifestadas sob a forma de sintomas - o foco voltar ao paciente
22. A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Kaba R, Sooriakumaran P. The evolution of the doctor-patient relationship. Int Journal of Surgery 2007; 5 (1): 57-65
Evolução da microbiologia, anatomia patológica, química, biologia
Desenvolvimento de uma nova Medicina: o médico concentrou-se, não mais
apenas nos sintomas, mas sim no diagnóstico preciso de uma lesão
patológica dentro do corpo - o Modelo biomédico de doença
Modelo Biomédico: o sintoma não era mais a doença, mas atuava como um
indicador da presença ou ausência desta - A relação voltou a ser centrada no
médico dominante e o a posição passiva do paciente, ou seja, um modelo de
atividade-passividade (paternalista)
Século XIX
23. Que modelo predomina na Atualidade?
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Ao longo da história, a estrutura da sociedade deixou de ser piramidal, mas
a postura “paternalista” ainda predomina hoje
Os profissionais da saúde detêm um conhecimento técnico, superior ao dos
pacientes – relação de poder
Os profissionais de postura paternalista costumam não respeitar a
autonomia dos pacientes e não lhes permitem manifestar sua vontade
Muitos pacientes não percebem que podem questionar o profissional e
aceitam tudo o que ele propõe sem contestar
Junqueira CR. Bioética: conceito, fundamentação e princípios. Especialização em Saúde da Família. São Paulo: Unifesp, 2011
24. Atualidade: Modelos de Szasz e Hollander
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
• 1958: Thomas Szasz e Marc Hollander, influenciados pela psicanálise
e pela filosofia , propuseram três modelos conceituais de relação
médico-paciente: modelos de Atividade-Passividade, Direção-
Cooperação e Participação Mútua
- Atividade-passividade: interação na qual o paciente aceita passivamente os cuidados médicos, sem
mostrar necessidade ou vontade de compreendê-los (protótipo: relação mãe-lactente)
- Direção-cooperação: o médico assume seu papel de maneira até certo ponto autoritária, mas o paciente
compreende e aceita tal atitude, procurando colaborar (protótipo: relação pais-filhos)
- Participação mútua: o médico permanece no seu papel de definir os caminhos e os procedimentos, mas o
paciente compreende, atua conjuntamente e assume a responsabilidade; as decisões são tomadas após
discussão do tratamento indicado e análise de alternativas (protótipo: relação adulto-adulto – adultos que
chegaram a certo grau de maturidade )
Szasz T, Knoff WF, Hollender MH. The Doctor-Patient Relationship and its Historical Context. Am J Psychiatry. 1958;115(6):522-8.
25. Século XX – 1950-1960 - Michel Balint
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
• O conceito de "médico como medicamento" de Michel
Balint, que enfatizou a natureza dinâmica da relação
médico-paciente: “a ferramenta terapêutica mais poderosa
que o médico possui é ele mesmo”
• Livro “O médico, seu paciente e a doença”: Balint propõe
que o centro da relação médico-paciente estava além das
manifestações físicas da doença; os contextos psicológico e
social passaram a ser considerados fundamentais
Kaba R, Sooriakumaran P. The evolution of the doctor-patient relationship. Int Journal of Surgery 2007; 5 (1): 57-65
26. George Engel - Século XX –1960 a 1980: Modelo Biopsicossocial
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Farre A, Rapley T. The New Old (and Old New) Medical Model: Four Decades Navigating the Biomedical and Psychosocial
Understandings of Health and Illness. Healthcare (Basel). 2017;5(4). 1): 57-65
• George Engel questionou o modelo historicamente dominante na
medicina, o Modelo Biomédico
• Engel delineou as limitações da abordagem biomédica e afirmou a
necessidade do “Modelo Biopsicossocial“, expressão criada por ele
• A proposta de Engel foi teoricamente fundamentada na teoria geral dos
sistemas: todas as entidades (sistemas), do menor sistema discernível da
física ao maior sistema do cosmos, são estrutural e funcionalmente
interconectadas de nível a nível com alças de feedback contínuos
• Para Engel, esta abordagem conceitual tinha o potencial de enfraquecer o
reducionismo, assim como promover a multidisciplinaridade
27. Modelo Biopsicossocial
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
Jull G. Biopsychosocial model of disease: 40 years on. Which way is the pendulum swinging?
Br J Sports Med 2017;51:1187-1188
• O modelo biopsicossocial passou a influenciar aspectos centrais da prática,
educação e pesquisa médicas
• Controvérsias: o escopo do modelo biopsicossocial foi considerado muito
genérico para ser eficientemente colocado em prática; o modelo não
indicava que nível de análise (biológico, psicológico ou social) priorizar
28. Atualidade: Medicina Centrada na Pessoa
A RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE ATRAVÉS DOS TEMPOS
• Medicina Centrada na Pessoa: modelo baseado essencialmente na
interação entre doente e médico – enquadra-se no Modelo de
Participação Mútua
• A Medicina Centrada na Pessoa tem por base a consideração da
perspectiva daquele que procura atendimento – suas expectativas,
medos, ideias e valores – e a importância de sua participação para
o sucesso do tratamento
• Propõem-se mudanças em atitudes na prática clínica cujo
resultado é uma nova maneira de atuar em saúde
• Oposto ao da medicina centrada na doença (modelo biomédico)
29. MODELOS DE RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE
Outras classificações (VEATCH, 1972) - Robert Veatch, Instituto Kennedy de
Ética da Universidade Georgetown/EUA, 1972
• Modelo Sacerdotal: baseado na tradição hipocrática; o mais arcaico, que propõe e completa submissão
do paciente ao médico, sem valorizar a cultura e opinião do paciente; há pouco envolvimento (relação) e a
decisão é tomada somente pelo médico em nome da beneficência
• Modelo Engenheiro: inverso do sacerdotal - o médico tem a função de informar e executar procedimentos
- a decisão é inteiramente tomada pelo paciente - o médico tem uma atitude de acomodação (“lava suas
mãos’’) e baixo envolvimento
• Modelo Colegial: há um alto envolvimento entre o profissional e o doente - o poder de decisão é
compartilhado de forma igualitária através de uma negociação e não há relação de
superioridade/inferioridade
• Modelo Contratualista: o mais adequado - o conhecimento e as habilidades do médico são valorizados,
preservando sua autoridade – há participação ativa tanto do paciente quanto do médico, com troca de
informações e comprometimento de ambas as partes
Veatch RM. Models for ethical medicine in a revolutionary age. Hastings Cent Rep 1972;2(3):5-7
30. Atualização dos Modelos de Relação Médico-Paciente
(Emanual e Emanuel, 1992)
• Em 1992, foi proposta uma alteração na denominação para dois modelos,
chamando o modelo sacerdotal de paternalístico, enquanto o modelo do
engenheiro, passou a receber o nome de informativo
• Estes autores não se referem ao modelo colegial e subdividem o modelo
contratualista em dois outros, interpretativo (médio envolvimento) e
deliberativo (alto envolvimento), de acordo com o grau de autonomia do
paciente
• Emanuel e Emanuel (E1992) consideram um quinto modelo que seria o
“instrumental”, em que o paciente seria utilizado pelo médico apenas como
um meio para atingir uma outra finalidade - (exemplo histórico da Bioética:
utilização abusiva de pacientes em projetos de pesquisa)
Emanuel E, Emanuel L. Four models of the physician-patient relationship. JAMA 1992;267(16):2221-2226.
31. AUTONOMIA
PATERNALISMO
Em geral, a magnitude do paternalismo é
inversamente proporcional à da autonomia
presente na relação medico-paciente atual
MODELOS DE RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE
32. “PARE DE FUMAR! JÁ DISSE ISSO A
VOCÊ UMAS MIL VEZES!...”
MODELOS DE RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE
33. “O Médico e sua Paciente”,
(Jan Steen)
• A consciência da sociedade sobre essa
mudança na abordagem ao paciente
alterou a conotação da palavra
"paternalismo"
• O paternalismo em um médico é
frequentemente descrito em um contexto
negativo, indicando comportamento
inapropriadamente arcaico
MODELOS DE RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE
34. EXEMPLOS DE SITUAÇÕES ATUAIS
DE RELAÇÕES MÉDICO-PACIENTE
Em que se assemelham as características
destes diálogos com os modelos de
relacionamento médico-paciente revelados
pela História da Medicina?
Gomes AMA, Caprara A, Landim LOP, Vasconcelos MG. Relação médico-paciente: entre o desejável e o possível na atenção
Primária à saúde. Physis Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 22 [ 3 ]: 1101-1119, 2012
35. Consulta de paciente de 51 anos em acompanhamento de
hipertensão e dislipidemia
• Médica: “Olá, Dona Fátima, tudo bem com a senhora?”.
• Paciente: “Tudo, doutora!”
• Médica: “Como é que a senhora está, Dona Fátima?”.
• Paciente: “Eu ‘tô’ bem. De vez em quando eu tô querendo sentir assim uma dorzinha de
cabeça, mas eu acho que é devido à quentura. O que deu nos meus exames doutora?”
• Médica: “Tô olhando aqui. Esse aqui é o da tireoide.”
• Paciente: “E o que é isso?”.
• Médica: “Tireoide é uma glândula que a gente tem aqui [apontando para o pescoço] e é bom
que a gente veja se tá tudo bem em toda mulher na menopausa. E quando ela tem algum
problema, os hormônios se alteram, mas os seus estão normais. nos seus exames de sangue,
só o colesterol que está alto e nem é muito alto. Então, eu não vou passar remédio. Eu vou
passar o quê? Atividade física que você não faz e eu tenho certeza que se você fizesse você
baixava esse danado. E também a questão da alimentação, que você vai passar a comer mais
frutas, mais legumes, folhas verdes, berinjela é muito bom pra baixar o colesterol.”
36. Médico: “Quero ver o nível do cortisol. vou pedir TSH e T4 p’ra ver o
eixo hipotálamo-hipófise. Pronto! Vamos agora pensar em tratar! [...] ‘tá
tendo aquelas ondas de calor?”.
Paciente: “Só quando faz calor mesmo!”.
Médico: 5-HTP, 5-hidróxi-triptofano. São cinquenta miligramas. Eu posso
fazer de cinquenta a duzentos, a dose máxima. E vitamina C, duzentos
miligramas. Eu associo aqui, porque a vitamina C vai evitar que o
aminoácido destrua o suco gástrico! Isso é tudo uma fórmula
ortomolecular.”
Consulta de paciente de 40 anos, com queixa de dor de cabeça
37. Médico: “O que a senhora está sentindo?”.
Paciente: “Muita dor nas costas, na coluna. É porque eu cuidava de menino, né?! Aí eu saí,
por que eu dei dois jeitos na minha coluna. nem eu deitada melhorava. Aí, eu “tava”
sentada ali, ‘tava’ morrendo de dor na cabeça.”
Médico: “Você já fez Raios-X da coluna?”.
Paciente: “Não”
Médico: “A dor é no meio da coluna ou no final da coluna?”.
Paciente: “Toda.”
Médico: “Tá tomando algum medicamento?”
Paciente: “Não.”
Médico: “Vou prescrever um anti-inflamatório. Diclofenaco. E você vai pegar na
farmácia.”
Paciente: “Tá. Obrigada.”
Consulta de paciente de 56 anos, com queixa de dor nas costas
Gomes AMA, Caprara A, Landim LOP, Vasconcelos MG. Relação médico-paciente: entre o desejável e o possível na
atenção Primária à saúde. Physis Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 22 [ 3 ]: 1101-1119, 2012